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VIDA
DO VENERÁVEL PADRE
lOSEPH DE ANCHIETA
DA COMPANHIA DEIESV, TAVMATVRG O
do Nouo Mundo , na Prouinciado Brafil.
CO MTO STu^
Pcllo P. SIMAM DE VASCONCELLOS, da
mefma Companhia, Lente de Prima nafagradaTheo-
logia, & Prouincial que foi na mefma Prouincia,
natural da Cidade do Porto.
DEDICAD A ^O CORONEL
FRANCISCO GIL DARAVIO
ÈM LISBOA.
Na Officina delOAM da Costa.
M.DC.LXXII.
Com todas as Ikcnf as nece farias.
\
.\^^\:v\n
FRANCISCO GIL DARAVIO'
Magnânimo , NobiliíTimo.
O ^.tí^íàlõVtV^tonúivjSos da Companhia de Icfu,
_ ^\, ;^ €tgí^|elicíc^de.
E coM^^^^^^f'^'^^^^^^^^ huuatielda Com-
panhia de Ie[u , dedicar/eus liuros , a hua das
peifo as nobres, que mais fe a(ignalou em animo
de Bemfeitor.&defenforda mefma Companhia;
E com fundada mfequencia, que quem a defendeo nos bés,
* // ^pef
é'p(^foasjambem a defenderâ^msefcritos. ^íi que deter-
mino femirãqueileelliUo^tãopoflú em raZaô^cho que âe-
uodtd̀^.f eflt pequeno trabalho meu ydoliuro do Venera-
uelPadmloT^pb de Anchieta Vrouincial ^ que foi nejia
Prouinciã, a P^ffba vojfa muy nobre fenhor Coronel Frâ-
àfcoGilde Aratijoi porque no feculo âmqueviuo^& na
Cidade em me efcreuo^ nem reconheço ^ nem venero outro ^
que mais fè^matajje no animo publico, &fecreto, de Be-
feitor ,à' defenfor no ffò^O Primeiro líuro, que tirei â iuX^^
noannodei^^^idavidadovenerauelPddre Io ao de Al-
meida^ dediquei ao General Saluador Corrêa de Sâ,& Be-
nauides.Gouernador, & Reflaurador dos Reynos de An-
gola, porque aquelle liâro voWpu7j2oRio de Janeiro ^& a-
chei^que naquelle feculo ^^ naquella Cidade ynaÔauia>
morador entam^ que mais mmpeajfe em Bem feitor, & de-
fenfor da Companhia. Jp: fiando ãuro, que dei ao Prelo
noannode 1663. eram knnaes^&Chronkasdo Braxilto-
do ,à'pâTeceo dedicado ãdReynof[(> Senhor , que Deos
guarde ; porque foram oS Séreniffiniô^ U4^sfius Antecsf
fores os maiores ^emfeitoi^e^tmmtmíãemff^ Rehgfâm,
em todo o Ejladòfiindadorés0dotâddrâ liberaes de [eus
CoílemosMfietercároliurú^foquedenõmfâi^
mejmo eflillo ydeneceffiâãdi^hedeiicado àvofja NobreX^,
è Coronel Magnifico, ptlairaT^ens^qm^lcomo diffi) m*
nhecidémente en vos comc^rmdeBemfhmr^ & d^t^úf
daCompanMa,publico,à^fecretori%^^m^^
Eu nam pretendo trã^ratefreiràpofmânor^ as ra-
\úens^que (upponho de vojfa^aBde lrèm^ciml0h êffijpòf'
que
qnejeyfe off^mde vojfa modejlia com loumres próprios -xo-
mopotnuè Uè con^a^que andam ellas publicas ^ namfo na
Prouwcia, mas ainda na Europa toda^ onde nampode oc-
cukarfe a liberalidade de animo de hum nobre morador da
Bahia.qmde htíafò ve'^fe^ doaçaè de trinta mil CruXà-
doSy pêra edificaçam de huM templo da Companhia de le.
ÍHy E ijlofem que por efiaobrapedijje oagradicijéenro ^
que depois Wâciofamenie lambem lhe offereceô a Compa^
nhia^& d€ que quite lia mefmafa^^r obrigaçampubÈca,
^juridica^ Enâmfoieji^o lanço mayor ofendo tam qran-
dè ) Em mais eflimàmos oums quotidianos ,cò}n què hè no-
tório ^defendeis d rèputdçam^& credito no fo^ dèmàis èfii-
manque o dinheiro: Deixo âè fecontàrtajôspanicâlàresy
por fâbidos , é' publicou Digo jòmmte que pofef
mco)2he€Ídal òbrlgdçòénÈ Nop Renerendo Pãdrè Gop
fuino Nickel Geral dê toda a Companhia 3 ouue porbèM
mcòrpòraruos nèlíà.pot irmão _, . coni todas as graças elpí-
fittidès ; & pàrttâpàçdmdnmmclmmtos^quèàoT^àm òs
próprios Religiófôs com titulo outro f^, de bem feitor injigne
da Còmpdnhid yque dõoudt hãd^JÍH}ei,qu'ãto bãffauã pèrà
fundaçamdehuUCóllêgiõpmtrês Mijjasjè^trts Coroas
por to da d Compdnhid no ^Mkhfpo muhdo^ fumas as Mais
pdnicipaçoens,quêfamddtnJ}tttitò:&0rB tudo ioM ti-
tulo dê fundddof da CdpBíídmòrâo têplo nouo fkfnptuô-
fôydeflê CõlleQiô dd Bãhia^ cÕM direito particular ãbfolu*
tó^pòrefpmalgraçd concedido ãedjfektdr nèlUfepUlmra
perpetuãpera njoS.& iJofo§ dêtcèndenm s tóMinfcripÇãb,
■^^armd3 de nobreza :Co!tfdtèd}ê4 rârys fènhófes . cònee-
\S\
iij
dida
ãidã .quanto ao domínio abfoluto. Efiêfois,& ejíesfaovof
fis m ere cimentos em toda a Copanhia ( o Nobre befeitor)
é^ na m/ó por vos. mas ainda por vojfa família toda no-
biliJTtmadeGys^ Arauj os, G areias . Aragoens ySiluas .Vi-
menteis ; Nas quaes he couja certa Jam tantas aspejjoas.
quantos os Bemfeitores .nam fò da Copanhia. mas daTPa-
tria.doRey.&daFè'
Mas porque foffe entre tantos a pefoa Dofafingular
em merecmentos.co7itra commum dos outros homens, vos
côncedeo o Ccú dous Paes . ambos infignes Bemfeitores\
Hum por affinidade. outro por natureza. Hum por afini-
dade.por fercafado côa Senhora Mariade Araújo. Maf
vojfa; outro por natureX^a.porfer natural Progenitor vo^-
fo enfegudo legitimo matrimonio^, Foi o primeiro o fenhor
BalteXardt Aragam. Gouernador.à Capitam mor . que
foynefle Eflado.mjo animogenerpfo deBemfeitor,& De-
fenforda Pátria, do Rey.& da Fe, mo/l f ou na vida;, & na
morte .• DeBemfeitoro coroou a vida. de Dtfenfora mor-
te, quando faind^ àpelela'?taual, contra hereges inimigos
dapatria^yjà' Fé. chegando a fer acclamadoporvião'
riofo. rendidos jà os inimigos por dejlino alto do Ceo.a nao
Capitania. em que pelejaua forte. ypoderofa, com occaftam
de hum pé de veto. correndo à banda a arte Ih ária. fe virou j,
ér foi ao fundo ; E nellaaffl armado, com o ejlaua ^ hum
dos mais esf orçados, & vakrofos Capita ens . que tiueram
osfeculos prefenteSjGouernador aãual .& Capitam mor
do Eflado.comfentimêto eterno da Bahia. & todo o Brasil
O Pay progenitor vojfo foi o fenhor Capitam Pedro Gar-
cia.
cia que Deos tem em gloria^ tam co nheádopororaiides ri-
aue'^ as f orno por orande animo defaherdejpendelas .- De
aiiemfe afirma ^ que fe todas as dadiuasde beneuolencia^
com que ohriqou a Republica , & mereceo o titulo de Bem-
feitor da pátria Je juntaram em bua .podiam enriquecer
quatro cafas de famílias grandes, F aliem ospohres^os ne-
cejjitados.a Santa cafa da mifericordia, & as Reitgioens;
Entre as quaes a Companhia namferà derradeira, & di-
rá com^ 'verdade que sò emvfo do culto diuino , defpendeo
em fuás lorejas cantidade de muitos milCruTjzdos. Efe foi
bem feitor da Republica por benefceneia.NaÔ o foi menoí
pello efpirito generofo /om que a defendeo pel/as armas,
Foielle hum'' dos primeiros Capitaens .quenoPorto, &
Eraya defta Cidade fe oppOK.perfi,& feus familiares, â en-
trada,& primeiro furor do inimigo Olades, ate caírem ter-
ra morto, com huapehurada, em mjofuccejfo , & comfen-
timento igual fe di(fe entam, o que la o Matuano àe Trota
Troia nunc ftares,Priamique arxalta ni^t\txc%,que fenam
cairá efle Capitão generofo, a Bahia efliuera em pkRefpei-
tando a efles merecimentos fomente da morte de dous Pap,
que deram a vida pe lia Pátria, Rey,& Fe, chegou hum tu-
riofo> emhuaDecima , a daruos titulo dePay da Pátria^
^ de merecimentos dobrados.
. 'nJ^N A ^ *vS.^-'
Pay da Pátria femiguaes,
Vos podem chamar,porque
Por Patria,por Rey,por Fè^
DaesavidadedousPays,
Nam
Nam pôde chegar a mais,
O voíTo alto merecer,
Que fendo hum fó no nafcer,
TraçaíTe o Fado benigno.
Per modo ião peregrino,
Que foííeis dous no valer.
Pois, fepelloquehefàafles dos Vaysfois aualiado tm do-
bro, que fera , por merecimentos próprios : & falando ago -
ra do Pay que vos gerou ; Ouui algum dia por em quefiao^
qual excedera na ienefcêcia?Se o Pay ao Filho? Ou o Filho
ao Pay? Duuidarão muito sjnasfe mepregutarao a mim\
âera meu voto com diflinçam ; Bi fera que o Pay ; Porejla
ú raXam-yPofque pode gerar hu filho igual a fy, & julgo
nam poderá o filho gerar outro igual a fy embeneficen-
tia, por mais que influa nelle a natureza com f eus ihefouros
todos : Aprendi arepojtado Sábio Crejfo em ca7j)feme-
Ih ante. Preguntáua CambiXes Reydos Perfas, aosfabios
d d que He tefnpo^ qual excedera emvirtude Jemelhante , fe
elle afeu Pay^fe feu Pay a elle. Dijferam os Sábios, que
excedera elle afeuPay; Porém Creffò a meu ver mais fa-
bio, dijfeo mefmo por termos diferentes ,'P\^'c\Q tuus tibi Pa-:
ter praciuit. Nam ha duuidãydijfequevojfo Pay vos exce-
deo a vos .• Reparou o Rey, porque fempre querem os gran-
des fer lifongeadospnas lo^o mref cento u Crejfo o meu argu-
mento. Óà\2L te gcnuit filiQ,cui tu parem non habebis,quã-
uis natura theíauros fuos omnes eíFundar. Vojfo Pay
julgo, queexcedeo,&araz,am he ^porque gerou hum filho
^'■' feme-
femelhantea fy,&vèi nam podeis gerar hum. filho igual a
vós. em beneficência, ainda (jueariaturcTji influa com (eus
ihefouros todos. Efiebe, efi^he,(aBemfeMrma'f^Mmmo)
ojui\omeu,queíòniflo,àporifiocÒfià£roa vofo Payem
iieneficcnciamapr,porqueg6rõU-hm filho benéfico nejla
matéria femelhante aíy,& nãmfarece podereis vos gerar
outro, quejejafemelhame d vós hefla virtude ,pojlo que in-
flua a natureXa com feusthefouros to dos. Parece com tudo
que me atreuo milito , porque fiei quegerafles hu filho ,a cujo
venioem tam tenra idade ouço cantar la buena dicha , de
%ianeira quepoffaÒde(mentir juixos prefemes fuás obras
futuras. E em tal caio b afiara diier(edevòs,quefuppoflo
quenao poderes tirarão Pay , o (er primeiro , podeflestirar-
Iheoferfò ,& o ferfegundo. .
Porém tornando ao intento, por outra via pretendo mo-
firar que fendo filho excedefleso Pay,damefma maneira,
que Camhifes Reyexcedeoofeu,poraãosdecreaçam,&
virtude própria ; Porque pode a artegetat filho fnaiorque
a natureXa. Poferam em duuida os Douíosi/e podia a vir-
tude da creaçam produzir efpiritusmais generofos, quea
virtude dagèraçaoià feguirammuitosaparter.egatiua;
forque a virtude da geraçam f dexjam ) he do fangue , &
a da creaçam he do leite ; & mais rigorojo he o fangue , que o
leite pêra a erarefpiritos grandes. As condições, os coflumes,
inclwaçotns,diJpofiçam,fermofura, & todas as mais per-
feiçoensdogerado,atribuemfecommumenteageraçam,&
fangue: Do fangue lhe nace , por geraçam lhe vem, coflii-
mamos dilerfizms alto á fanguine Teucrôm, deZia là o
outro aabandofe defuagenerofidade , por nacer de fangue
itH
Uos Trojanos y ijio pafeceo à ah uns. Vorèm que tenhh
mais força o leite que ofangue^acTeaçam queageraçam^
afim de produXir noíHhofpirimgenèrofos .infinao a ex-
periência^ reXaÔ, & Authoresmaisgraues^Votqueo leite
hefanguejà cofido ^ preparado^ & com qualidades mais
efffcaXeSy que o fangue/egudo AHfloteles^ Alberto magno,
Abulenfe, á" comum dos Au thores .• Segue fe logo que com>
mais efUcaúa infiueo leite da crtaçamnafemelhâça das
todiçoêSjCoflumeSy & inclinaçoensj^oas^ou mas do minino
criado , que o fangue do ventre ^ a geraçam. He refo Inçam.
dos DD.poreJlas palauras. Maior eft ab vbcre quam ab
^teroin filijs (\m\\\mào.NaÔnegãoquedehua ^& outra
pane tomem a femelhança ; Mas diiem que he mayor
adospeitos ,queado ventre; a do leite^quea do fangue;.
ddacriaçam. , quea dageraçam. Supponhamos huma
criança gerada com fangue humano , & criada com leite
de ferassquaes feram entam os co^umes Joumanos fiu feri-
no s'i Saíram ao fangue fiu ao leite? a geração fiu a criaçam?
A experiência diT^y que ao leite y & a criaçam : Mojlram os
feculos muitos exemplos , viofe criança com inclina çam de
correr faltar ^& trepar, & fabida a caufade taes coflumes,
fora criada aos peitos ,& leite de huacerua. Viofe outra,
que tudo eràenhdarfe ,& reuoluerfe em lamas , &fabi'>
da a caufafora criada âpeitos^& leite de híi animal ím-
mundo : Pois affi como nacem de criaçam , & leite co fu-
mes feros i quando o leite , & criaçam hèfera Affi nafcê
coflumesgenerofos .quando o leite-, & criaçam hègenerofa
Em vos í o Coronel magnifico ) muito obrou a gêraçam,
&ranme; Mas obrou raais a criação ,& leite, Foíles
mo
fogo de tenra idade entregue a hçoens de ^íinernalà' co o
fauordefla Deofa, creceflesem beneuolemia dos Mefires
da Companhia, que nella vos criauam , como aquelle ,que
andados ostempos entre ejies ameis de ter Irmandade ,
(emelhança na vida Jajigo^ ^ Maufoleo na morte. Paf
f afies quando de mais idade, de Minerua douta , a Bel lo-
na guerreira 5 Aprendejtes iplojo [eus ejlillos , fe^uiftes
hrwfofuas preeminências , experimxmajles fuás fortu-
nas varias : De huma , & outra Deofa mamajles o leite ,
do de Minerua tomajles a doçura ; do de Bellona , o vi-
goro f o devoffos adeofados brios. Seguindo efies , reconhe-
■ceovojfo valor efla Cidade , quando cercada do poder
militar do Conde de Najfau defende/lés o for te principal,
apeXardofogo ardente de(eus arcabuzes. Talafles cam-
panhas Julcafies mares , tam briofo Capitão naquellas ,
como nefles: Em hua, & outra parte fullenta(les a guerra
^anguinea , â cu/la juntamente de fa'^enda , & fangue:
Diga o, alem da Bahia , Pernambuco, Seregipè delRey^
Rio Reaíy cujas matas^&prayas trilhajles.vertendofeus
campos em Elifeospera os fo Ida dos , que ali fujlentafles,
dr alegrajles,a cujla das faZ^êdasgrofas que nellespoífui-
eis, & os enUqueciam\ Porque entre o leite de Minerua,
ér fangue de Bellona foffes juntamente benéfico , & belli-
cofo, A efla beneficência pois tam conhecida, a efle animo
tambelíicofo , nam só em bem, & defenfamda Compa-
nhia , mas da Pátria, do Rey ,&daFè , dedico efle final
pequeno de agradecimêto , aquífera dedicar maiores per a
memoria de eternos feculos- V ALE^
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'^^%'^^'^ILLVSTRISSJMP DOMINÓ, ■
"■^^^ Sapientiííimo juxrà V ác foti^ísimo Hefoi, -
GÍLÍÕDEARAVIQ^
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Olim pedeftriuíii Copiarum>Clafsifque Prxfeao ftrenuif.-
fimo, nunc Brafilic^ Gentis inVrbè Bahia Tribuno
^'émericiifiíTio,R. P. ac íapíentirícriptoris Simonis de
^ Vafconcclios Societatis í ÈS V^U^ccrím coiendiííi-
'.á 4^ L
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^>€c Tihi digna fui qud munefa àèâicat Autor '-^^
'^^^'Ino-entí luã fum\ nm aliena putes:-^^
MãmfT^^ l(^fl'i<^'àis longe miMm^omniã mm
^<Cum ãedem.ma [unt/jã-ãTtlpí cunque damm^
Accipe.daqmfmul .- quifijlitur^acápe libnm\ ■
,T)espatrodnif,quamftbiqumtfipem,
Uec^uia Dux armUfis deàitm.abjice iihrum, ' ■
, Vàm íihmetiamdeditm vfquefofes,
Vnamanmgladium.ferãtímncmanm altera libnm;
V troque ex titulo fic mihi Cdfarerts:
Hkfub puluino Tibtfit, veiut alter Homenm
Sic,& AlexanderTuquoqueBuãorerls.
Hunc videas librum ; mhil& ,ni(i grande .videbis:
Huncleges nú parmm, nilniji grande Jeges.
Tu, FrancifceX^^'^ fmulefl Ancheta legendm:
Maonum e([e in cunãis esquis vtrumque neget?
^tam bene 7naieries libri, iihriqueV atronm
Conueniti Anchetapar es^&illeTibi.
Ille Nontdmpfimusdecorauh Apoflolus Orbem^
^^rimà Orbem decoras nobilnate Nouuvi.
Ille Nouifuit O rbis Atlas X^ ^^^^^ carenti
Atlanti Alcides auxiliafis ades,
Cimque tuiVitam hanctuearefauoris in aura^
Hicfacis Alcides ^nemoriatur Atlas.
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ÍP * ÍP
.JRODIGIOSl ANCHIET
DigniífiiTio Hiíloriographo.
PHALERICIVM.
nr* Otdeftderijspmtmolm
__ Iam tandem putet Anchieta mundo ^
Viuens à calam o elegantiòri.
Sero de tenebriscfiterere^fêro
TMtiprodigtj exjife Vitam,
Et curas menti otcupaffepmíi.
At lente fuitvíqueprorogaflàum ,
gluo Printepsfactlèvnusinteromnes
Vaíconcelltus emicaret orbe^
Sohisparoperifuturus Ainhor;^
Cuiusfubcalamo AnchietatantuM
JB.qua\is fihi,cMen(que major
[êí^ahsBraJilL^refulJit ons)
^th ^V
Vllo
vOi
i Vi. i.i i.
Vllo effulgerepojfet abfque damm$:^y.^\
Curvltràmororexplkareverumf
Certo cenimefl ,quòd Amhietam
'^numexúmmbusorbismqmlinis
Latéprodiqijs celehrionm
Solumpingereconcolorepenna
Vafconceílms vnm .inter omn es
Scriptorproãmodor^valebat,
yENER ABILIS P ATRIS I O SEPHI A N CHIET^
Cujus Vkam typis mandat Religíoffimus P. Simón de
VafconcelIos,expeaanda propediem Apotheofis.
QVis negat Anchetam jam num fupera alta tenere ?
^is dubitetfuperos inter habere locum í
Illim hd^c meritlsjampridem debita fedes :
Hanc^ vbi!umfa£íis premia certa, tenet:
At nondurnfacris akaribus enitet: lílum
Isíondum/iuo fuperos^rbis honor e colit.
Necmirum efl, latuère diufa£ía inclyta: at Orbis
Vix ea^ qtice nouit.fadía colendapmat. '
N une tamen, vt câlamoSimonis [cripta patebunty
Et to to incipient protinus Orbe legi,
Anchetam Ccelo credent jam defere zentes :
Nam quis Simoni nolit habere fidem /
Vox vbi Simonis Chrijlum confeffa Tonam em efiy
Mox Chrifium cdpit credete turba Denm.
«c^v.
Sic
Sic modo, quem Simonpenna C^loinferit.Orbis
lamfummo Anchetam fentietejfepolò^
Siforfan, P etrlfruimrqui fede vice fque.
Expiei j & in termmumafolus o bit,
Simoni^ vt debety touque ajfemiat Orbi,
Ancheta ex omni parte beatus erit, v
IN LAVDEM AVCTORIS.
^V^-N \1 -
Lia Nouumfubeantne mundum obãuia.faãa '
Ancheta mundo prodígio fa refers.
Tfodimjsnouus tile Nouofluporextitit Orbe,
Tu quoqueprodigium es mundo in vtroque nouum.
Si calamo tecum contenderet Orbis vterque.
Digna tibi duplicijure corona for et. - ^•
^àmjine flore foret Florus i ãluàm liuidustpfô . / :
Liuiusi Ad Curti curreretorarubor, r J
Verba daretfibi luflinusTaàtufque taceret,
Tranquillufque flculis captus& ipfe Cato.
Mille fales illi, tu du leia facch ara mifces:
Gratia amara illis, fedtibi dulcis erit.
Spirat arundineos fert quos Brafilia/uccos
Hiccalamus ; redolet pagina quaquefauos.
Si calamos nullisferretnouus Orbis in oris;
Hoc calamo dulcis mundus vterque foret.
Orbe Nouo ad Lyfiam quàm dulciafercula mittis /
Dona Bm ingenio [untgenuina tuo.
Vtile opus dulci mixtumefl :punõíum omne tuliíli •
Aureus
Aureus inpretíPèfi^rãellem. ofeàl>ey^'{!: m'^\^^^. ^^^^ •
^idtamen Ancjkm vis claudtr^fãBài^wolumen
Hocmagni Amketdtamhreueéme^^ /v^ 1^
Ciaudere vis calamomiraculaMmsiò^ agris;
S^isThaumaiufgusconferetãlttmpem^
O caue^ ne dgrotis noceas^quibusillefaímem "^'^ ^%
Nonita j rem íenèoi^^^oletvtvãocíus^ """ '^"
L
O.
\- . .
Accurrens ^alãihsc tudpènna dãBif. ' ^ ' ^
M r
X?§^K
(^^KTy^^
D £ H V M E N G E N'H Ó "^- "
.:vÀ^; • ^ -5. '5V4'Ç'^^ Ao Autor do í-iurO.- \^ç^^^<^^^^ç,^^v^^ o^ ç
E0aceíehmêmpre^ que tama/ieSy .,-^, . .,- .
F ama immonaiaiVi)ffo nome delias.^. ,.
B apen?2a^com;qMeatodMsfii(pendçJie^^^^^ . ;.,.^
Emvirmozatõbras realça/les. ■■•.; rn>5Va\\\v^Ts -^
Louueuosonouomundo .quehonrafies, ,.yy^,^^./^^ "
OBtaT^l^^eefcreuendoenriqmcefleSy.^^^
Mais rico f orno Liuro.queJixsíieSy . .
^ue com ai. ricas drogas que louuaflts.
De Anchieta as vmudesinãuditaSy "--,
Se terã m,uito valor por elle obradas ^^ , •
Muito temdetúmior por dleefcritas.
Traças Diuinasforão decretadas y
^
:i.
Pêra
Vera que mantidlhas miaica dicas
Torvolfapenafojfempidkaâm,
O V T R O
A?'?
ALLVDfNDÕ A LA P ROFECIA DEL
venerauelP. lofephque predixo muchos anos an-
tes , que huuieííe el crigOjde que oi es tan abundice
laVillacfeS Pablo
Ofephes ^dis^flãmiracion de imundo^
Vnofahiopremnoelpan guardado ,
Ou^yo enfu Dí04^orto j confiado^
SópTofetiXa cíMfader profundo*
: Mas en todo elfegundo ^finfegundo y
Excedíò delprimero ^ lo admirado ^
Pues delpan natural ^y delf agrado ,
Fuedefpenfero entodomàsfecundo.
Vioproph eticamente eíruuio grano
Opimofiempre ,en quanto alfollufiente^
E/pejo feferuiere ei Oceano^
•• «• •»
Da/^
ijfíí
Dando alimento a tantapobregenfe,
Conelpan material, yfoberanoy
Vida delcuerpo^ almapermanente^
\¥t
il!
~íi'Sl:
PROLOGO
A O L E I T o R
Vare NT A, &: mais annos ha , que a
ProuinciadoBrafildezeja fahira luz có
a vida do grade Padre íoíeph de Anchie-
ca^naó porque falte no mudo noticias de
feus feitos heroicosjmas porque náocraõ
cabais. Porqae as primeiras, que efcreueo
o P. Pêro Rodrigues da noíTa Cópanhia ,
Prouincialquefoy nefte E:ftado,foraõ tiradas mais de
corrida do que pedia obra rao grade, bc mais por acudir a
dezejos,que à grãdeza da hift;oria:& por efta primeira in-
formaçam cõpós o P.Sebaftiaó Beretario os cinco liuros
com que fahioaluznoannode 1617. por mandado de
noíloR. P. de louuauel memoria , Cláudio Aquauiua
em lingua Latina 5 &c depois os traduzio na Caftclhana o
P, fcfteuaó Parernina , da mefma Companhia , huma ; &C
outra, fe bem obra de eítilo elegante, & graue , diminuta
com tudo em muita parte, &ia!ta das circunílancias de
cazos , tempos , Òc lugares , que coftumaó fer alma da in-
telíigencia,èc fatisfaçaó da hiftoria Nota que raramente
deixa deacontcccr aos que efcreuem auzentes, ôc mais
quando a diftanciahe cal , qual a do Brafil , a Europa,
^¥^
De-
■?!'ii V
,;'i;
•^y^epois-dâquellaprimeirainfbrmaçamdo P. Prouin*
cia] Pêro Rodrigues, fundada na inquirição de feu zelo:,
& alguma diligencia juridica ordinária 5 por breues Apo-
ftolicos dofummoPontifice,Prefidenteentaõna Igreja
de Deos ,0 fanto P. Vrbano V 1 1 1. fe começaram a fa-
zer deíde o an no de i6zo. por diante , em todo o Eftado
do Brafil,geraijuridica,& exaãa diligencia fobre as virtu-
des^heroicas deite venerauel P. & fe formarão delias pro.
cciTosautenricos, nos quais fe deixa ver por extenfo a
excellencia das obras marauilhofascom que tem ^dmira^
do aomundo.Heílà noua diligencia Apoftolica,& Pon-
tificia vemaíerarezao, porque ha cantos annos, como
djffe/efuípiraneftaProuinciaporhúa hiftoria cabal de
taríi prodigiofas marauilhas.
Cometeofe em primeiro lugar eftaemprezaao P.Igna-
cio de Siqueira de noíTa Companhia, Theoiogo , Prega-
dor,& judicioro,de cuja penna fe efperaua obra igual a ka
engenho 5 Poréaifruftrarameftas efperanças enfermi-
dades de muitos annos, & depois a morte deíle Reli-
gíofa Entregoufe em fegundo lugar ao P- Macheus Dias,
iieligipfo de feipclhantes partes, que recolhendo em á
os documentos do primeiro,& começado a pòr em efti-
loa hiftoria;a variedade dos tépos, & guerras da Prooin-^
çi:^,.& as do Reynode Angola o leuaram áquellas partes
em cópaohia do Gouernador Franciíbo de Sotomaior J
onde acabandoa vida étre rigores das armas Olandezas,
queíenhoreauama terra, ficaram juntamente com elie
fepultados os documentos , & principies do que hia
obrando: até que andados os tempos no anno de 16Ó6.
confiderando os Superiores que tardaua dernafiado a
hifloriadezej^da das façanhas raras defte fegundo Tau-
»..-n
^^4'
sa-
MáÉ
maturgo do nouo mundo , a maior feruiço ào Deos , 5c
promoção da Beatificação que efperàmos da benignida-
de da S. Sede Apoftolica ; comeceram ao fraco talento
de minha penna eíte intento,maior que ella •• no qual fia-
do na graçadaobediécia,coftumadaa obrar milagres, eu
poz logo a maõ, interrompêdo a hiftoria geral das Chro-
nicas defta Prouincia , com que me achaua occupado, òc
dasquaistinhafahidoaluz, como primeiro tomo. O
queíuppofto.
Nefta determino ajuftarme em tudo com os proceí-
fos juridicos , &: autendcos,alTima refcridos,examinados
em ordem á Canoniíaçam Pontificia tam efperada, òc al-
gumas outrasquc antes deftes foram tirados com autho-
ridadcdos Bifpos.&c Prelados deftaDiocefis,apontando
fielmente â margem os lugares do depoimento das te-
ftemunhas , &c fam eílas cantas, 5c tais,que merecen cre.
duo legal, 6c tanto maior , que hoje faoi mais os Autho-
resque1:em publicado pello mundo eíla matéria, entre
todasasnaçoens,òc línguas, 5c todas poucas pêra tan-
tahirtoria.
Aduirto aqui aos leitores , que naõ he fô elte grande
P.3quclle,cujas e^cellencias andaô diminutas pello orbe,
fenaô quefaô tantos os Varões illuftresque nefta Pro-
Viincia acabaram a vida com fama publica de iantidade,6c
exemplos raros, que le aíTi como andam Tuas notícias def-
r.edaçadas por vários Authores,ouuera neílas a mefma
diligencia, lahiraó a luz grandestomos,5c hiílorias tam
peregrinas,que puderam lUuftrar a Companhia ; mas foy
a caufa dcfta falta, porque no mundo nouo em que efta-
mosjoccuparaôfe os Miííionarios mais no obrar que no
cícreuerj 5c ha differençamuy grande entre contar os
*=•"* iij tra-
os trabalhos osqueeftamauzentcs, ou defcrçuellos os
qus iam prefences-Iram com o fauor diuino refufcicando
daquiem diante eftas fepultadas noiicias , & cotejadas
coBi as que hoje viuem, &: fe veneram por outras partes,
acharfe ha que eraõ fomente reliquias em comparaçam
de hum corpo mteiro: Vale.
TESTO D OAVTOR
SVccede muitas veXes nejia hifloriãvX^rde nomes de
Santo, Mamr, Profeta, Múagrofo , & outros fe--
melbames falando do fuj eito delia fiu de muros PP,
"veneraueis que occorrem : & chamar fuás obras mila^
grafas , Proféticas , famas , & c. Declaro que tudo faço
fegundo eflilb commum dos Hi/loriadores fomente , &
modo de f aliar ^ entendendo bem quefo a (anta Sede Jpo--
flolicapode dar lhe de veras femefh antes títulos. Pello que
pretendo alujlarme c6 os decretos que nefa matéria fepr o -
mulgaraôdafantidade dojummo Potifice Vrbano VIIL
&(e contra o theordelles neffes efcritos /e acharcoufa que
defdiga, tudo fometo â correiçam da mefma fanta Sede
Apoílolica pêra que o emende. Bahia trinta de laneira
dei66Z. Simaó de Vafconcellos.
B
LICENÇAS
9
POr ordem do Padre Antam Gonçalues da Companhia do
Icfus, Prouincial da Prouincia dcPortugaJ reui eíla vida -tio
iníi<>ne Varam oVenerauel Padre lozeph de Anchicra.quc còm-
poz o Padre Simam de VaíconcclIoSj Prouincial que foi da Proum-
ciadoBrafil nella admirei o eftillo do Audior.pois he dar ]uz ao
xjieímoSol, ter palauras pcra encarecer virtudes tam raras> & tam
peregrinos milagres, & prodigios,por fitam marauilhofos&erclare-
cidos,quea qualquer outra pcnna abatera os voos o iiti^oíTIucl dá
iaualarofobido da matéria , mas a felicidade dcfla lhe da azas pêra
que fcf^uramenit poíTa voar onouoTaumaturorodomunJo nouo,
admirando a todos juntamente com òs pof tentos queobrou,&com
>a elcírãcia de quem os cfcreueo : & aífiai nie parece obra múi digna
defc imprimir : Caza de S. Roque 27.de lunho 6^p. ^ ^ ^.^
' . ' 1 L Trancifco 'Leite.' t
HE admirauel cfta vida do maior Taumaturgo no Brafil, re-
trato na America d^s marauilhas do grande Xauicr na Afia»
VVtncraucl Padre lo^cph de Anchieta : o Author qucacòmpoz,
he conhecido jpor outras obra^ que imprimio. Quanto cila fedi-
lata.tanto fcpiiuam os fieis de grandes fruitos, ôco mefmo Deos
de caloria. S.Roquei dclunhodeióyo.
, —António Ct^ruiíílhol
-3Uti
•'V .k;
i_.., .",..-ii'-Çfj^g y4'*iÇiJ>
oíwanM^i^ivwi^
ANtam Gonçalues da Cornpanhia de lefus,Prouir»cíàl em Por-
tugal y pdrpàrticular cemíniíTam que peraiíío tenho do Rc-
uerendo Padreloam l^ulo Oliua nofio Prepofito Geral, dou licen-
•"^a pir^-fe irnj^í-ímir-o Huro da' vidai& milagres do Vcnerauel Pa-
Gi^tírózephdé Anchieta da Conípanhia de Icfus, Taumaturgo dô
'■ÍÃTáíil",c<)mpoft'apelJò-padrcSimâHi; de VarconcelJos da dita Com-
iitniiq panhia
j' í i;: I
" M!i:
pãnhiaque nomefmo Brafil foi LMáie prfiMádeTli-aoíogiâi&Fi^
uincial.derpois de vifta,examinadâ, Sc approuada por pcíToas doij •
.tas, ôc grauesde noíTa Companhia. Em teftemunho doqtfsldti
cftapor mim aíTinada^ôcíeíadacom ofellodemeu oíEcio.Lifboa
I de Iulhodei670.
u^ntamGcnf alues
Vlílasasinformaçoensquefeoúuerampodeíe imprimir o li-
uro da vidado Vcnerauel Padre lozeph de Anchieta da
Companhia de lefus^compoftapello Padre Simam de Valconceí-
los da mcíma Ccmpanhia,na forma que vai emendado, & ácfpois
de impreíTo tornara ao Confelho pêra fe conferir com o original,
&fe dar licença pêra correr,ôc fexn ellanam correra.Liihoaii.de
Ianeiro<le 1^71.
"Diogo de SoH\a. Fr. Pedro de Magalhaens, Manoel de Maga .
íha'^ns ãe Mcnez^es. TyVertffimo de Lanca^ro. Alexandre da
Sjlua, Francifco Barreto.
o
Doutor Manoel ílibeiro Ferreira veja cfteliuro, Lisboa, &:
em Cabido fede vacante de Janeiro ts.de 1671.
. Cordes»- Teixato: -
í eftelíuro, &nam achei nejle couzaque impida dar voíTa
Senhoiciâlícença pêra qafi-fedn)pi;im^Xi^hpa.5. de Fçuer^
Ribeiro^
•iO/-. :.b
■^."Tx^^,?. íif''
Odefeimprimi r Lisboa,& em Cabido fede vacante de f euc-
rdro.4. ide 67 li \ii :íb çiíkicqn^c' :^ íd ò^ují^noD rnciM
Ormiandado de vòífa Alteza vicfte liuro da vida dioPadre
íozcph de Anchieta da Companhia de Iefu§> & nclle nam a-
hei cou^apelia qual fe poífa negará licença que fe pede pçra fe im-
primir
primirjntcs méparecefer mui conueniínte fairaluzpera eduica-
çam de todos os queolercm.fabendo os exemplos deluas grandes
virtudes.o zcUó da faluaçamdisalmas.emociualcom tanto trui-
to trabalhou. S-popingos de Lisboa.hoje 2 de Março de 167,.
QVercpoffa imprimir viaas as licenças do Santo Officio, &
Ordinario,ôc dcípois de impreflo, córnea efta mezaperaíe
conferir,ôctaixar. Lisboa, 27.de Março deé7i.
;}
S '^Monteifoi Magdhaens de Menezj^.
Vlílocílar conforme com feu original pode correr efta Vida
do Padre lozephde Arjchicca.Lisboau.deNouembro ^t7i.
Fr Fedra de M.igjhaens. Magalhaens de Alenez.es,
Alexandre da Sylua. Manoel Timmtel de Souz.a, Fernam
Corrêa de (a Cerda» '-'^-
TAxamefteliuro emdes toftoens . Lisboa u. de Noucaibro
de 1672.
Monteiro. Lemos. Miranda. Carneiro^
ítc**:*
J^
DOS LIVROS, ECAPITVLOS
contem nefte volume.
LIVRO I
e s E
Cap.L
;:ii''
EJuà Ta-
trta > nact-
\ mento iCria"
' çam^ C^ oc^
cupafõensnofeculo até entrar
n^ Companhia de lefm. Foi. i
Cap. lí. "Varte íoz.eph de An-
chieta per a o Bra/il^juntamen''
te com outros Rehgiozjos da
Companhia de lefhs* Foi. 6
Cap IIL Defcripçam da terra ^
agente do BrafiL Foi. IO
Cap. II li. Sabe em terra lo-^eph
com feus Companheiros : Co -
meça apor em obra feus dezjs^
jõs t He mandado pêra S»
VicentCi ^ dahtpera os cam-
bos de Ptratininga^dajje nO''
ticia delles^FoUij
C^p.V^Adododa pobre z^a^ ^
ordem com cjue ajfentou ca^
%a i ^efcola nos campos de
IPirdtminga : Como igual-
mente enfmaua a Imgoa lati^
na.aprendia a dos índios ^^
attendta ao bem dai 'almas-y
^ conta fe hum caz^o celebre
àafufpenfam da chuua. Foi;
Cap. VI . Modos nj avios com o>ue
conuerteo muitas almas por
Jii& feus difctpulosz, E mo'
dos njanos com que o Infer-
no opertendta eJioruar.FoL
28.
Cap. VIL Mortenjenturõz^ê do
Irmam Fedro Corrêa efiu-
dante^humdos mais ferno^o.
ZiOt
Z.OS difcipulos de loz^eph : ^ Cap.lX. De aígumus 'coi^z^a^
de feh companheiro loam de notauets (]ue ^tconteceruo^^.r
Cap.VlIL Dos méíis dtÇci^ulos loz.eph. Fol.^y
da e/cola de loz^eph, alem do c^P ^-^^^ ^'^^^ ^^'"^'^ ^^ ^^'
Jrmam Fedro Corrêa, Foi. zephpera os enfermos dt Vor-
LIVP.O II
Cap.I, |-^y4 RebelUam dos
jL/ ^^àiõs Tamojos
confederados coma naçam
francez^ contra os Portt^^
guez^es no Rio de Janeiro -F. l.
Cap. 11. Chegaram a oumdos
dcl-Rej Dom loam Hl as
reUfoens da entrada dos
Francezes no Rio de lane iro -^
acode ao Bra/ll comoGouer-
nador Men deSà-^^ do que
começa a ol^rar.FoLào
Cap-Ill. Tarte o General Men
de Sà pêra o no de lanetroy
acomete i ^ rende a Fortale-
z,ítdeVillagailhon\ Vatre-
fazerfe a SVicente^i^njolta
vencedor à Bahia» Foi. 6^
cap. IV. Continuamos Tamo-
yosfua Rebelliamy aptltam,
^ matam muitos a tmtta-
çam dos TamoyoSireb^llam'
fe tombemos Tupts.f^ farn
deJbaratados.Fol.6i
Cap V. F^irie lozeph em com-
panhia do Tadrc Manoel de
Nóbrega a metei fe entre os
Bárbaros a fim de effettuar
pa\es,oi4> acabara ^td^ : fao
hofpedados delles : Encon-
tram ^ pazes do Rioyperteri'
dem a matar os Fadrts : Tí?-
mafe o primeiro .ajfento, FoL
Cap. Vi. Corremos Padres ou-
tro notauel perigo da'Vtdai
^ efcafam deile por merce
de T>eos : Fafmam os ^ar--
baros de fuã commencía - ^
Jirmafe o fegundo affento dc^
pazes, Fol.yg '
Cz^.VlLRefolue Nóbrega par^.
ttrfe pêra S .Vicente : Jue-
.rYígua ahi três profecias de Io-
Zeph : Fica lo\ ephsô entre os
^Barba ros,feumoao de vmer
a dm iravi el : Compõem a vi-
da de N. Senhor a emverfoy
^ prome telhe ella,que narn
**^* ij ha
m'
ha de morrer em qaãnto a
nam acabai p,or mais a ff om-
bros que lhe metam os 'Barba-
ros.fol.%^
Çap. VIII. PrafetiZia la^fpho
refugio de hum grande fen^
go a hum amigo ; da 'vida. a
huma criança com a fagrada
agoa do Baptifmo : K^ft^f-
cita outra defh&is de enter-
, rada : Pertendem matalía os
^amoyos do Rio com grandes
ajfomhro^ifem effettt) : Def-
cohrefe hum grande enredo^
confirmamfe aspaz^es, ficam
todos a mtgos.foL 9 o
Cap \^,Ve nadas as dtjpculda-
des do amor que ttnha aos
índios , ^ eftes a elle , parte
lozjeph pêra S. Vicente em
^^'hama canoa de casca : pa-
dece h uma fera tormenta i
profetiz^a que ham de chegar
afaíuamento : Lima os ver-
• fòs que fizer a> tí d^dicaos a
Virgem Senhora noffa^fòL^^
C^ip.X.Chegam aTortugal no»
tias das paZies 3 Adanda a
Eaynha a Efiacio de Sã com
dousgate oens a Bahia . '^ar^
te dahí afenhoriar o Rio.- ^^
eh a que eftam rehe liados ou-
tra veZt os Tamoyos : yai re-
faT^erfe a S. Vicente; Entra
^m duuida da empre^^a ^ ^
refoluefe de acometera Rict
fol.99
Cap- XI. T^arte o Capitam
j^yór Efiacíode Sà de S.Vt-
centât^com elle lozjeph , ^
outro companheiro : Chegam
ao Rio : Fort i fie amfe dak^V"
rap era dentro y ç^ alcançam
'vitorias r?$emoraueis,fol. 103
Cap XI í. 'Varte loZoCph pêra a
Cidade da Bahia, 'vt/ítando
de caminho o Efpmto Santo:
l?er[uade ao Gouernadcr
Geral o necefiAriopera ague-
ra : Ordenafe de Ordens
facras^Ç^ volta com o mefmo
Gouernadort em foc corro d^
Rio : Cotafe hum fmcejjo ma-
ramlhoZiO de vencimento de
l%o.canoaSffaL no
C ap.XIlI. .Chega a armada de
Aien de Sa ao Rio , ^ com
eUa o Padre loz^eph : aco-
mete Ejiacioie Sà a todo a
poder o inimigo , ç^ficafe-
ridamortalmente : 'Pr ofegue
agmrra Saluador Corrêa de
Sa até render do todo os con-
trarias 5 E toma o Padre Io-
\ eph a S, Vicente foi. 115
Cap. XI V, Parte o Padre lo^
z^^ph de S, Vicente : He iture
o batel emquehia à terra de
huma Ballea acanhada por
fhccejfos maramíhofos : Che^
gam
' gam ao RiOydJjííte afâdaçao
do Collegioy^ cÕuerte ahihu
Herege Francês y foi. 12 1
Cap.X V. De alguns caz^os di-
gnos de memoria do Padre í o-
Zfphyqiie acoteceram por efie
mefmo tempOy em cjue efhue
no R to de lan eiro,foL 1 1 8
LIVRO III
Introduçam, (^ aduertencioi
aos Imros fegmnteSifol-MZ.
Cap.I. T T E eleito o Fadre
X A logjeph em Reitor
do Coilegio de S^Vtcente^^
caz^as a elle anexas : Sua íw
tellegencta em l^heologia^ Ef-
critHras fagradoAy^ púlpito'-
B aUumas maraailhas de
dentro de ca^ afoLilS
Ca^ ll.Contíníéam as maraui'
lhas de caZia^foLi^x
C^i^ ^^^- Adarautlhas fora de ca-
^ayreuelaçoenSy^vífoens, ^
proftfciaSyfoL\4,^
Cap V^ .Continuam as maraui-
lhas de fora de caXji , relafO"
en^tÇf pyofeciaí»fd,i$o
C2i^>^ .Hifloria celebre de Dio'
go índio refufcttado : E de
outros dous Indtos que líuroíi
da morte, e fiando em cordas
pêra ferem comidos ,foi\^^
Câ^y^' Do grande efptritode
mijfoensde loz^efh , ^ dos
favtores extraordinários cjue
nellas Ihefazja o Ce o 5 Efpe^
ctalmente da canoa perdida
de que efca^ou com milagre**'
E de outra ij irada , de que
fahio fem fe molhar ^nem jeíS
BremarWyfoL 16 1
Q^^yi\.,Contínidam as mara-
mlhas de fuás miffoensi*'fpe-'
ctalmente de S* Vicente pêra
ltanhae,folM%
Cap VI II. Outras miffoens por
ruarias panes ^ efpecialmente
deS.Taulo,foU7>^
Cap. ^^s^aconuerfaodos Ma^
ramomis deS.Vicentey ^ hu
ca,z^o ejiranhoique tndo 'vtfi-
tar a S Vicente lhe aconteceo,
fol»\%4.
CsipXVarias reuelaçoens,^
profecias do mefmo tempofoL
189
Cap.XI.Z)^ outras reueUçoens^
^ profecias do m efmo tem"
pofol. 195
Cap. XII. T>e outros milagres
que fez. em S*Vtcente,foL
Cap.XllI. Outros milagres fe^
melhanres,fil' i07
^*i^* u] LIVRO
LIVRO IV
Cap.I. X T Em chamado o Pa-
V dre lozj^ph pêra o
Collegic da Bahia, & obra
neUecazjis maramlhozjOs*t\}
Cap.ll. De modo com que foi
eleito Proutncialt ç^ do e/pi*
rtPo com que governou afi, ^
m fi4 hdttos^ foi. j[8.
Cap 111. Defeti modo de 'utuer
ordinário defpois dèfetto Pro-
umaaUe quato ejieue naBa-
•i. : hía,todo maraUílhoZiO'foL 12 $
Cap, IV. /)^ outras mar anilhas
matsnotaueis^ que obrou no
mefmo CollegtOifoL 232
Cap. V. Milagre celebre dafau-
dedo l*adre FrãcifcoPintOiÇ^
profecia dos trabalhos,^ mar-
tino que auia de padecer y 238
Qíi^MUParte Ioz,eph a njiptar
o Río de laneiro , ^ capita-
mos do SulfÇ^ obra diuerfM
maramlhaSyfoLx^.^
Cap. Vil. He recebido em feu
Collegio com aplauz^o de to-
'^dos, ^ começa a obrar ma-
rauilhastfoizsi
Cap. Viu Vaivt fitar as far-
tes de S. Fícente,(^ obra nel-
lasalguas mar anilhas, foi i^V
Cap. IX. Outros milagres íio
Río de lanetro ^tè o anno de
\^%lfoLz6Z
Czp.X. Profecias .^reuelafo-
ens do mefmo tepofol. a 6 5
Cap. XL^Z)^ huma armada que
aportou ao Rwde ianeirot^
das maravilhas que com ella
obrou, f 01^270-
Cap. X I L T)a pef caria celebre de
JVLaricaa,f^ das mar malhas
que nella obrou, foL 274
Cap. XIII: Scenafegunda das
marauilhas da mefma pef
cariafoLx-j^
Cap.XlV.T^r/^ do Rio de la-
neiro pêra a 'Bahia , liura o
nauio de dous perigos gr aues,
(f alcança faude m ilagroz, t
aolPadre Ignacio de Tolo^a
folMi '^'
Cap. XV. Succeffos murauilho-
7 os que obrou na Bahta^até^-
caba rfeu Prouinctalado. 2 8 $
LIVROV
Çap.I
*uat per mudado pêra o Rio de
"' ^ [j. 291
Cap;
xY^^^SixaloZj^phocaT"
1 Jfo da Promncia, Janeiro, ç^o queallifaz,. 291
Cap.II. Vai permudado do Rio
de lanetro fera a Capitania,
\M Effirito Sãto^^faz^errefí-
dencia em bua das a Ide as . ^96
Cap.lII.Dtf ontra carta digna de
memoria que efcreueo a hum
Sacerdote , toda de falauras
dafagrada EfcriturayfoL 301.
Cap.lV. Cazjos maramlhoZiOS
de profecias y (^ remlaçoens
que teueneflaaldeayfol' 309
Cap V. Parte pêra a Bahia a af
Jlíiir em hvimx Congregaçam
Proainctal Jorna pêra a mcp
ma aldea,^ obra cazsos ma-
raí4ilhoz.oSifoLl\^
Cap. V I. Entra loz^eph afer Su-
perior na caz^<t do Efpirito S,
(^ fuás reZiidencia^^^ como
fe ha noofficioyfol.iid
Cap. Vil. Dí? do de fuoi profecias
& reuelaçoens njfta cafa, 320
Cap.VllI. Entra o Irmam loam
de Almeida a fer dtfctpulo de
lozjfphf ^ como aprende em
JuaeícolafoLizz
Cíi}p.\X. De outras rtuelaçoensi
t^ profecias do Padre loz^eph,
que mofiram maiSiaf acuida-
de de He dom fupremo.fol.zz?
Cap "K.Reuelaçcens i^ fiofc
cias particulares crn jucccjfot
degucrra,fol'y.o
Cap.Xl. AiíUgres que obrou pof
ejte mefmo tempOifoL }3S
Cap.XlI. ^Dafim lo\eph afeti
(uperioracio , torna pêra a aL"
de a de Kentigbay &' osfuccep;
fos quenella tcue^foL^iS
C2p.'X\i\*Cctfnuana ca^afua
comAãlefenciattorna {fo<a do
efperaJo) a fer Superior , ^
continua ju(U marauil''^ oi ^te
tornar pêra Kentigvajoi^ Sj9
Cap- XIV, Torna loz^eph pêra
Reritígbay põem fim àfuape^
reerinaçamiÇ^contafe o modo
defua dttoza morte ^foL 3 42
Cap X V. Sentimento dos Indi^
os na morte de lo z^eph^^ co-
mo foi por elles UuadokVil'
la emproaram de planto, 34J^
LIVRO VI E VIL
Cap.I. C^ Ara muttos de di-
i3 uerfas fortes de do'
resfol. 3 5 3 {febres^ 360)
Cap. II. Qjiehe aduogado das
Cap.II K Que he aduogado de
partos, ^ apojlemastfol. 371.
Cap \Y .Doutros 'varios caz^os
marauUhoz>9StfoLv^
COí^.\* áf^Omo dominou os
\_j e V ^ me nto x, ^c. 382.
Cap. 11 • Como dominou o mefmo
hmiSiCreait^a mais nobre *190
ç^gp 111 De (ua perpetua inno-
cerictd^ tlli/firadade todos os
âoens,qt4e Adam teuenopn*
m eiró efia do foi, 399
■-nx%'*^m'^<lrXí.q^7) ^^E t\:. ^o^n^íí^í^H^vv Vv-I .II.gS^
\/enei^bi!is f hsefh Anchieta e^ SocicUtc hsn s^
LIVROPRIMEIRO
DA VIDADO
PIOSEPHDE ANCHIETA
da Companhia de Iesv.
CONTEM OS ANNOS DB SVA PVERI-
" cia ide fuaentradana Cõpanhia de Icfu 5 partida pêra
'" o Brafil , & Capitania de Sam Vicente 5 & do que neftas
partes obroU , fendo Irmamíem Ordens facras ate a e-
rade 1)56.
CAPlTVLOl.
p efuaV atria .nacimento ^criaçam ,& occupa^
çoens nofeculo , até entrarna Companhia
de lefu^
A no meyo domar Atlãtíco cerca-
da das goas immefas do Occeano
hiiallha, a quem os homens der ao
O nome de Tanarife,õc a natureza o ^^^ j^,, n^,,
fcr húadas dozeprincipaesqoece-|---a.*^ .
lebrou a antiga idadade. A todas ru,.
chamaram fortunadas ,quando ain-
da naõerão conhecidas todas fuás
venturas; ôc nos hoje lhe chamamos Canárias, ^.x..;
z De todas eftas fuás fortunas, afim antiguas ,^Como mo-
dernas , podemos ter em conta de f^^^'^^?^.^''"'^^^^
narifehum iofeph. fcaeito maior do que cabia ern noua^,,^ ^^,^^^^^
pena , pois no Orbe todo naÕ cabe :E defta principal trata- dcftMiih,^-
rei fomente aqui, por que parece maior acctto empregara
ZT Vida DO P. Tos EpH DE Anchieta;
^!ío^ii'%] penPxa em fortunas moraes de hú Santo, quenasnaturaes^
n. « 4y. /'/í de huma Ilha : cantem em bora os Homeros , & os Antigos
^"^^'^^"^'^^/ckYiptctcs de Tuas glorias, as grandezas que acharão
iMõííí^^rr^Jíiaqiiellas Ilhas 3 defcreua5 feiís campos Eli zeos, feus cli-
j. cap^y. mI mas benignos , feus doces frutos , em fuás bé limadas Odèá.
fh-htfi.pai» Celebre Platam as felicidades doReyno, èc Ilha de Atla-
pa^.é^. chro- tc conucttida em mar -.Cujos ofscsfaó neíle tempo (fe da-
%']f'iy/^ mos credito a hiftoria de feu Timeo ) eftas Ilhas éc as de to-
feufiihooinf. dt)0 mar A tlauMco partes de corpo taÕ feliz , que foy maior
D. :nrtqiie. ^^ ^^^^ ^ Africa , ôc Azja. Celebrem finalmente os Mo-
dernos , os Barros , os Mapheos 5 as mais hiílorias chro-
nologicas de noíTos tempos , fuás boas fortunas mais nouas,'
de quando gentilicas , òc de quando chriítans; Que eu pre-
tendo fomente tratar da primeira . & principal de todas , v-
nicofruito que enriquece© o Ceo, & o mundo 5 & he fo-
mente lozeph de Anchieta. Mas hcjufto também que fefai-
Outrafortun«ba outra fortuna boa, que cabe o ao Brafilj&hcqueeílas
Tâiurifeper- Hh^s (fcgundoa defcripçaÕ geographíca dos mais peritos)'
tepceioBra- ncm peítenccm aEuropa , ncm a Africa, nem a Azia;&côi
íequétemêtc pertence ao mundo nouoda America: Cont
rezao logo coube à eftaregião efte principal fruito feu 5 ^
o communicar ao mundo feu valor , ôc eftima.
deftasiíhTs!" 3 Demoramcílas Ilhas cm sj. graos da Equinoccial. Fo-;
joat^t Barros. Tztn dcfcubridores delias em noíTos tempos (de pois de po-
SiXÍ/jíTí)' ftas ja por feculos em efquecimento) osportuguezes, (que
joaõiMma fempretiueramcfta fortuna de achar, & defcobrir coufas
: J^i ' grandes) reynando em Portugal o íereniílimo ReyD. loáo
* ■' II. & paíToudcpoiso dominioaCaftella, tendo alli o cetro
ElRey D. Fernando.
4 Nefta Ilha pois Ta narife, huma das bem afortunadas,
í^*"!?^j^^°'^5tcuefeunacimentonoíro lozeph de Anchieta , fogeito v-
fortra feus nico delta hiítona, pella era do Senhor 15 33. Foram ícus Paes
igualmente nobres , ricos, & de conhecida virtude , (a me-
lhor herança dos filhos) Era o Varam natural de Bifcaia>
dccendcntedacazados Anchietas, de parentes maiores em
-. ~ GuU
Pâc$.
Livro T Cap. T. $
Guipurcoa Defta cafa fe dis , que algum tempo andou en-
contrada cornados Loyolas , folar de noílb Santo Fatriar-
chi Ignacio (^dos porquês naõ meconfta)&: fcaííi foy , o-
tra do Ceo parece que vieíTem a vniríe cm humíòeípiritu
de reli<Tiam, os dous ramos maiores de tam altas profapias.
Nam taltam com tudo conjcaiuras, que foy efte varam
Portuo^uez , ôc natural de perto de Coimbra. Tudo podia
fer , nacido elle em Portugal , &de Paes, & caza Biícai-
nha: roremoqucachoemefcritos, & teftemunhas fide
dl<^nas , he fomente que foi natural de Bifcaia : Foy a May
namraldagran Canária, cabeça principal daquellas doze
Ilhas , & outro fi de progénie nobre , & rica.
y Crioufe lozeph em cazadefeus Paes , em perfeito te-j^^ ç^^^^^j
mor , & amor de Deos, doutrina pura denoífa fanta Fé ,9»"''«^ p"-
primor iuntamente , &: cortefia , que competia a leu eltado. ,í,ío,.
Depois de deílroemler, efcreuer ,&algus principios de grã- «t>iv »4»
matica^que cabiam em feus tenros annos, foycnuiado com ,^
outro Irmão feu de mayor idade , à celeberrima Vniuerfi-
dadc de Coimbra, (que entam florecia no mundo) para que ^^ ;.
alliíeaperfeiçoaffe na lingoa latina , & atendeíTea maio-^^^f^y j„Ef.
resfciencias; eílas verfou nasefcolas dos Padres da Com-coi.s dosPP.
panhiadeíefu 5& creceo nellas de maneira, que em bre-nhude i.fn
ue tempo foi confummado em todo o género de humanida- ^jí"J^™*j=
dcs , quealli coílumam infmarfej ôccom conhecido lugar nho.
entre os mais finalados engenhos, que pella doçura com
que oraua em profa,& cm verfo, lhe chamauão por antono-
mazia , o Canário, por aluíam à Pátria , & paííaro , que
mais agrada aos ouuidos dos homens. AíTi o celebraua no
Brafil, depois, feu grande amigo naquella Vniuerfidade ,
o Bifpo D. Pedro Leitam. PaíTou ao curfo da Philoíophia ,
ôc penetrou com não menor engenho aquellas fubtikzas
inexauftas, que foram fempre aluo de habilidades.
6 Deíla maneira andaua lozeph occupado j contempo-
rizando com o mundo, idade, rezam de eftado, ôc vonta-
de dos Paes, que para efte fim o mandaram àquelle lugar
A ij celebre
maiores.
4 Vida DO P. losEPH íinchieta.
celebre no Orbe , proua de engenhos , Aula de bons co-
ftumesjôc fíorda nobreza de Portugal, 5c ainda de Rey-
nos eftranhos. Porem o Ceo que tinha intentos maiores, &
cobiçara o génio , ingenho , dirpoTiçam , & vontade pura *
^qui ohu CO defpgeito tam grande , pe ra vir a íer o Apoílolo de hum no*
p:racou£.s uo mundo, hia difpondo nelle outro modode eftudo muy
differente 5 outras claííes , ôc outros preceptores de fcien-
ciasmaisaltas; Deftescftudos mais que dos primeiros , e-
ta viílo a temposTahir a defabafar aos campos , pellas ribei-
ras, & finceirais do Mondego inflamado o peito, & fufpi-
rando ao Ceo dezejando acertar a feruilo.
^^ 7 Entretodas as outras virtudes , â que mais lhe arre-
rf?a w\xpnA bataua a alma , era a da pureza virginal , qae até efte tem-
Ssuhor", & po guardara inuiolauel, fogindo de toda a occaíiam de per-
proiroem (je||a . tcquc cntrando cm humaio-reia, que dizem fera
de vida da Sc Cathedral , Ôc pofto ahi de joelhos ante a imagem da
Virgem Senhora noíTa , feRtiohtimimpulío interior , que
cl^. 4 Vlff'.lhe acendia o coraçãoj & deílahora lhe confagrou com vo-
^j^ 1*^.1 C.2 toexpreíío fua virgindade:foi fempre crecêdo depois daquel-
&prHef.paf \c voto cfta alma ditoza cmfciencia, & intellieêcia do Ceo,
•'' ■ bufcãdo nouo modo de vida , em que pudelTe aííegurar fua
Cõfagrou
voto lua pu
faluaçam, & ajudar ade todos os próximos. Efcolheoparae-
íl^ efFeito feguir o eílado de alguma das fagradas religiões: E
veio a aíTentar que efia foífe a Companhia de lefu , que flo-
recia naquelle tempo em Portugal , erpecivlmente em Co-
imbra , c5 exêplos notaueisde pobreza , puteza & derprezo
do mudo. Foy fácil de efíeituár onegocío,porque era afsas co-
nhecido na Vniueríidade fua virtude, exéplo.&engenho^ôc
iam amaueis, & dignas de fer admitidas partes femelhances.
8 Entrouenfím lofeph na Companhia de lefu, deu vitimo
n"^Comp^.&'^2^^ ao mundo ,aosTegalos da verde idade.âs efperanças de
ttítaneiia de f\ja caza3aPâes> parentes , & amií^os 5 para de todo liure
fua perfeição. ^^r^^^•r^r ^
entregarle a Deos. Aqui fendo íomente de 17. annos , aju-
dado da graça diuina , & do fauor da V irgem Senhora nof-
ía, que para fempre tomara per Patrona , obraua ja, nam
:,.- como
ertcnde o
mon cftío*
LivK O T. C AP. I. ^
como pequeno , mas como anciam na idade. Trataua fo de
co-rrheGCríea íi mefmo , os enganos da carne, 6c os dclcn-
gon-osdo-efpiritopormeyodo caminho ícguro da obediên-
cia, & mais virtudes religioías.
9 Senam que no meyo deftes feus cuidados, nam defcui- J*^'
daua o inimigo commum dos homens j pretendeo atalhar- nsrfuí pcr-
Ihe o i^aííò ,comhumagraue, ôcperigofa enfermidade jôc ''^'"
foj derta maneira. Coftumaua o feruorofo principiante en- n^d. & Pau
tr^eosmeios , quecfcolhera deíua perfeiçam , ajudar na I-^"^'"'
g«eja âMiíía, todas quantas vezes podia, que ao menos vi^
nham a fer oito em cada dia. Poré como era tenro na ida-
de , 2c a continuaçam de joelhos neíteofficio por tantas ho-
rasdemafiada , caníados os oííos com o trabalho exceíTiCio,
eõfti cearam aí entirfe fracas ,& doridos por aquella parte
que fe ajuntam com o oíío, a que chamamos facro , viti-
mo do eípinhaço,Ôc logo a eílEderfé a dor por codo elle com
afflicçamdemaíiada. Mas como era o efpirito forte, & ofer-
uor de padecer conftante , nunca reperfuadio lozeph, que
poderia o corporecebermal,donde a alma recebia gofto
iam grande; Refiftia com todas as forças ao conflióto , oc-
cultaua o perigo da luta ,eom maior valor que prudência j
fofria, gemia , dobraua o corpo ahuni doslados , ôc cin-
giaíe eftreicamente com cintas apertadas Porem nefte mef-
mo remédio coníiílio a mor força do mal^ porque apertado
o cfpinhaço com demazia , lançou de fi junto aooíTo facro
as cabeças dos oííos, que allifeataó com os mufculos, ôc
dcfatadcseftesíem firmeza , contrahio lefam disforme no
cfpinhaço & coíl:ellas, ficando o corpo a huma parte penfo:
outros querem ,que efla lefam foíTecontrahida da pancada
de huma efcada , que caindo lhe dera nas coftas : Huma
Ôc outra couía feria , que fam vários os ardiz do inimigo de
noffas almas.
lo Sentia ofoldada nouelverfe diminuido nas forças, 6c
com fealdade no geílo 5 temia nam foíTe efta falta , caufa'
de fer repudiado de entre os outros de Companhia tão efco-
A iij ihida.
iJDi
£ VlDADOP. loSbPH ANCHIETA^
Vcfc m'.tido[jyiJa^ ipor rnenos apto pêra fuás emprezas. Porem foy h'
P?rpíml'de-,ur^ defcujclado fc via , por ma-
he iiiire delia j-auilhofo rutccíTo 5 porque encontrãdofe com elle o Padre
fequ^vrioSimãoRodrigues de Azeuedo , varam deconhecida faii-
^"^''" tidadc, companheiro quefora do noab fanto Pacriarcha, ôc
Ro4. U.i. Prpuincial , queentamera de Portugal , lhe diíTe as paiaiiras
/Ji'^'/'''" feguintes. Filho lozeph, perdei cíTecuidado.com que andais
.1 ' porque Deos vos nam quer commais faude. Eílaspalauras
fe lhe imprimiram na alma, & remontaram delia toda a tri-
llcza. Ecahio entam, que donde pretendia o inimigo, que
o combatia , tirar vidoria ,dalli tirouo deftino fuperior do
Cco , a traça vnica de feus intentos grandes , porque con-
tinuando fua enfermidade por tempo de três annos , & pa-.
lec^ndo o mal irremediauel, confultados os médicos pe-
ritos, refolueram osSuperiores paíTalo ao Brafil, terra noua-
ende por fama a clemência dosares era benigna, ôc acom-
modadososmãtimentosâfuacompleiçam : Da executam
deíiepropoíitodira o capitulo feguinte.
GAPITVLOII.
Parte Io feph de Anchieta pêra o Brajiljuma-
mentecomomrosReligiofosda
Companhia de lefu.
lORRiAoannodonoíraredempçamdei553 Sc
corria ainda como coufa noua,&: portento za
entre asgétes.o eílranho defcubriméto do nouo
__ mundo,que aparecera entre o abifmo das agoas
do Oceano , pouoado de nacoens fem numero de gentih-
dade,dezemparado dofocorro Euangelico , & alheio do
conhecimentoda Fé, depois de nellaseftar efcondido defdc
a mefma criaçamdaterra.
i A fim de alumiar eftas gentes , & cíle mando nouo, ti-
nha
Éâfti
mahclado o Padre Simão Rodrigues de Azeuedo Prouincial .J^cóV cm
de Portugal com fauor do fereniílimo Rey D. loam 1 1 1 ';^^^;'^^^
o primeiro focorro de féis Varoens de prouada virtude , a pordu^vc.c»
faber o Padre Manoel de Nóbrega fuperior , o Padre Leo- í^'»'"'^»"^-
nardo Nunes , o Padre loam de Afpicueta Nauarro, o Pa-
dre António Pires, ôcdouslrmaons Vicente Rodrigues, &
Diogo lacome , partidos de Lifl3oa ao primeiro de Feue- 7^,^.,, ^^
reiro do anno de 1540- & logo oucro por meyo do Padre ^'^^^^J;^^
Miauel de Torres vifitador da Proumcia de Portugal , de
qua^tro Padres, a faber AtíonçoBras , Saluador Rodrigues.,
Manoel de Payua , Franciíco Pires, parados de Liíboa no
annode(55o. ^ ^.^ n^m uni.nor,.
3 A eíla empreza pois tam aílinalada mahdou agora ^m^ *;j,^^^^^l
terceiro focorro daquellas almas dezemparadas ao "^^"^p;";*^!;^^^.^'
Miífionario lofeph de Anchieta em companhia de outros 5^o^„o,.
íeis Religiofos , que dezejaram ir acabar a vida entre aquella^^^^^^
eente barbara , & eram os feguintes OPadre Luis da Gram , chro. /,«.i. da
Keytorque fora do CoUegio de Comíbra , o P.Bras Lou-^-^i^-d,^''-
renço.oP. Ambrofio Pires , 5c três Irmaons loam Gon-
falucs , António Blafques, ôc Gregório Serram P.mdeLJíb.
4 Partio eftetam importante focorro de Liíboa as. de»D.dein}.
JMayo do ânnoja dito de i^ss- (fegundo o computo que te- ^^^^_g^^^.
rho por certo, cuja proua , contraosque temo contrario /^.^^»^«n5^
depois trarei a tempo , que nam interrompa o fio da hifto
ria ) em companhia de D. Duarte da Cofia 1. Gouernador
do Brafil, fidalgo illuftre.filho de D, AluarodaCoftaEmba-
xadorquefoydel Rey D. Manoel aoEmperador Carlos V.
5 Deu finalmente ónoífoMifionario juntamente avela ao^ ^ ^^^
vento, & vale ao mundo, no mais florido de fua idade, que ^^aò^^sr
era fomente de 20.annos5 fez troca do velho com o nouo
mundo , largando naquelle a natureza , ôc bufcandonefte ^ ^^
o cfpirito. Nam acabaua de crer tanto bem 5 configo mefmo ' '%^^]j
fe efpantaua de fua boa. dita No meyo das noites mais fere- - '
nas retirado a lugares fecretosera fentido como arrebatado ContépUccíí
o o J A ' T que í'nh» pelo
cm contemplaram , a vifta do mar , oc do ceo , Aqui lo-mac
feph.
■tié
f%
,fii^
5 VíDA 00 P. losEPH Anchieta:
feph,deziaro configo, fabe agradecera mercê que te faz o
Autor deftes elementos. Que coftas vio em ti o Senhor pê-
ra pezo tam grande? quedirpofiçam ? que faude ? ouquo
talentos .-^ que junto com os mais apodados Toldados te mã-
deconquiftar hum nouo mundo cheyo de milhares de Bár-
baros /"o Deos r* o luizos eternos ? diz bem a Igreja Tanta ,
■qaeeTcòlheis Senhor os mais bayxos da terra para emp rezas
^£ grandes^Talcícolheíles hum grande Ignacio Patriarcha
noíTo /depois decoixo, pêra correr o omúdo &c5quiftar
asalmasdelle, paraque viííemos que aquellespaííosnam c-
ram effeiío dos pés do corpo , Tenam das azas do espirito.
BemTey , meu Ucos , que o Arlantedefta carga, namham
de vir a Ter minhas coftas -, Tenam as voíías lauadas em Tan-
gue. Viraõ a Ter as minhas ( Te vos me ajudares) as de hum Si-
rineu, que ajudem as voíTas, ôc cooperem na Taluaçam das
almas de outro nouo mundo. Aceitai Senhor hum nouoSiri-
neu que fem fer cõpellido, Tem Toldo, Tem intereífe propõem
de àjudâruos hurem€nte,atc morrer com voíTa meíma cruz.
6 Quanto mais creíciao curTo da viagem , tanto creTcia
. AMcíter- o vigor de loTeph,no corpo , & no eTpiriro. Elle eraoque
uií^iw^N.ô, Teruia aos companheiros , na cofinha , deTpenía , & mais
&^4e Peos. oíficios neteffatios , com Tummo cuidado, &c amor. E nao
>(n «
^Vi
ío aos ReKgÍDTos j a todos os Nauegantes Teruia , como Ir-
maons 5 Sc comofe ja come^çara a Teruir Teus amados Braíis.
Enfinauaâ dou£bfina chriftam aos Mareantes , no conués;
falauâlhe da Taluaçam , Ôcobrigaçam que tinham a Deos.
E veio a Ter de maneira que parecia a naô hum Gollegio de
gente reformada.
7 Defta forte hiam vencendo as dificuldades da viagem
caqudieseTpirituaes Argonautas , quando chegados a prin-
cípios de lulho começaram a ver conhecidos íinaesdater-
BMffiTiânça '^ ^ dezejada: Pullam os corações de prazer, Taéaver com
ferro na Bahia ai egriaos montes,os aruoredos,as praias, quehamde pizar
Samos. tantos annosrE aos is.do meTmo mez de lulho lançam ferro
na Bahia fermofa chamada de todos os Santos
Onde
.A 7 Li V RO T. C AP ITVLO IT. ^
8 OnJe ia que ellanios recolhidos, tomadas as velas , ôc
maii ddcaníados . aucriguemos o co mputo do tempo quef;;7>;,^';j^
leuamos .fcauado arriba prometemos 5 6c porque nceamconna a';;as
* o , . , ' ,,. j ri <t q'^' rinha n
muitos o anno da partida , dizendo que toio de 15 ^ 2. c>c oconuzz,c,
naóde 15 .3 como affirmamosiEvaimuito peraaboadiípo-
íkam, & fio dahiftoriaverifícarostempos delia. Pêro de ^^^'^^'j;^^^;
jvíarisde vária hifloria noV)fW-: 5. ^^p- ^- tem para fi que
foi a partida deftes Miífianarios no anno de 1552. ôc o
que mais he , que o liuro dos aílentos do Collegio da
Bahia, em quefeeícreuem por ordem de annos-, & dias os
Miílionariosque vem para eíla Prouineia , tem aííentadoa
vinda dos prezenres no anno de 1552. oque fem duuida foi
erro do computo, ou de pcnna , que achei também em ou-
tras lembranças de maó ancigas Senítoerro auenguei cla-
ramente por aífento mais certo do meímoP. lofephde An-
chieta, que temdefua pfopia letra, cm partes diuerfas de
íeus apontamentos que foi eftachegada noannodeiss^par*
tindo de Liíboa em companhia do Gouernador D. Duarte
daCofta as. deMayo, & chegandoa Bahiaa 13. delulho
do mefmo anno. Omermo feguem Nicolao Qrlandinonas
Chronicas geraes de nolTa Companhia , Im. 13. n, 6^- &c
o P. tíleuam de Paternina na vida do P. lokph, pag. zj.
e^ 44 6co P.Balthezar Tellesnas Chronicas de Portugal
part. 2. iíií. 5. cap. 6. 6c daqui fica dado principiei© á foluçáo
de outros cômputos errados,que ao diante nos pretenderão
cftoruar.
9 Temos contado a nâuegaçam de Tofeph, &: feus com-,
panheiros ; & como o gofto , & ainda a obrigaram da hi-
íloria . he ter noticia dos lugares que vai fupondo, & por
onde Icuao fogeito delia; demos aqui numa breue noticia
daterradoBraíil, ôc da Bahia cabeça delle ondeentramosj
digreííam neceííaria , ôc feguidado commum dos Auto-
res.
B
CAP.
lo
Vidado P.Ioseph Anchieta:
Arrumjçam
ca cerra
«*3*í*-8S>3- í^-£^.8#3'.£*l i^- f*3 S*» É*â-*í*S*3-g*3'.g3>3'€®a.g^.£^. e^ -S^S -KK 6*3- 8S>3 •^- í^' '^J-
CAPIT?LO III
Defcripçam àa terra agente do Braíil.
Al lançada a Regiam do Braíil do meyo da
Zona , a que os Antigos chamam Tórrida,
pêra a parte Auílral do trópico do Capricór-
nio , éc Zona temperada. He Tua forma
triangular. Pella parte dó Norrc , ôc do Oriente , que
Ircfpeitaaos Reynosdo Congo, & Angola, he lauada das
agoas do Oceano, Te feu principio junto ao rio Gram Pará,
por outro nome das Amazonas , da banda do Loeíle , def-
de o Riacho chamado de Vicente Finçon, que demora de
baixo da linha Equinoccial, &vay acabar em outro gran-
de Rio que chamam da Prata , com iioo. iegoas de coíla
pouco maisou menos, ôc 33. grãos <ie altura , poílo que al-
guns Ihedem mais. E fam eílas as duas faces do Triangulo,
que a terceira faz alinhado fertam.
2 Ficam eftes dous Rios.o do Grâ-Parà,5c o da Prata, fen-
do termo,principio, fim, ôc ainda largura da terra do Brafil,
Brsíí? , os porque abarcam có a excenfam de feus grandesbraços a cir-
rT.l^D *J° cúferenciado fertam,fazédocom elleshu como femicircuio
&daPrau. dcmaisdc Koo. Iegoas Samos Rios majores detodo o Vní-
uerfo, qualquer dos que celebram as antigas idades , a vifta
do Rio Grã Pará fica hu pequeno Pigmeo ,em c5paraçam
de h u Gígante:E a vifta do Rio da Prata pouco menos,por-
que aquelle tem70.ou 80. Iegoas de boca,eíle 40.& amaneí-
radagrãdeza da boca.hea dos corpos. Do Grã- Pará aífir-
mialgusque tem de cQprimento 1500, lego<ís,outroi 1600.
outros mais. O Ganges , o Tigres ,0 Eufrates, o Nilo, jõ-
tosem hum corpo, fam pouca agoa , em comparaçam de
hum fo Gram Para. Quem quizer veras coufas portento-
zasdcftesdous Rios , de fuás Ribeiras, de feus thczouros ,
de
9B
Liv i^ o T. Cap. IT. it
de fuíi fertilidade, de fuás Nacoens , mais de cem diuerfas
cm lingoas , & coílumes , de Gigantes , Pigmeos , Monftro-
{os, Amazonas&c. Veja o liuro primeiro dos Prologome-
nosda ChronicadoBraril,derde^/>j^.i«. ^ n.ii em diante.
Alem deftcsdousRioshe todaaterra amododchubofjiue,
receada de muitos outros , que vem pagar tributo ao mar,
fazédo íuas prayas alegres com fuás bocas,barras, bahias.ala-
poas. Contamíeem numero zoo. caudalofoSj&naueo^aueis.
o . . . , 1 n Aviltída
3 A vifta primeira junto ao mar ne como murada eltatcrca hc %W
terra em grande parte pclla natureza de altiíTimos montess"-
todos alegres, enfeitados , ôc verdes 5 que quafi excedem o
voo das mais ligeiras aues: Os Pireneos, os AlpeSjOsOlim-
posmaisafamados da Europa, nam tem que ver comeftes
arandescnontes. Arrebatamos olhos aos Nauegantes , que
correm a cofta , nam fó fua altura immenfa , mas fuás for-
mas admiraucis, a frefcurado aruoredo, ôc o quebrar de
fuás agoas que vem correndo ao mar. ^
4 Efta terra , & toda amaisque refponde â Zona , que os
Antigos chamam Tórrida , ôc foy infamada por muicos
dos primeiros Sábios , cujo Capitam foy Ariftoteles nos feus
Metheoros cap,% com toda a efcholade feus Difcipulos, de
terra inútil, feca,requeimada, incapas de fontes, Rios,pa-
ílos , aruoredos ^ ôc por confeguinte de inhabitauel pêra
sente humana. Confirmaram o mefmo Vircrilio , Ouidio,Fo"^""<^°*
& TN 1 o OS pareceres
Cicero, Philo ludeu, Phnio,Scoto, Durando , & o que.w phiiofo-
mais he S. Thomas. Foy contudo fentença dada contra par- ^[;„^;;^';f;''
te,téentam nam ouuida, nem ainda vifta. Tema expe-íu» bondade.
riencia moftrado o contrario com euidencia , & eftam con-
uencidosaquelles Sábios a olhos vidos , dehum Cólon, &
de hum Cabral, os quaes primeiro que todos os mortais cõ
feu valor , ôc trabalho mais que humano, defcobriram as ter-
ras deftamefmaZonajatéaquellestepos, como encantadas
aos homens do antigo mundo ; Depois delles, a vifta das
mais Naçoens do mundo , que a cilas paííaram.
5 He toda a terra doBrafil por excellencia fempre ver-
n ôi.»
\2
ViDÀDoP. Igseph AncHíETA.
m\
Wf
^^J^'^^*'^J de, abundante de erua,& àruoredo de vários géneros, en-
Ihor áruorc- tre todas às mais terras do Vniuerfoj quer de veram, quer
do do mifndo j _ • A * r >^^ 1 n ' r -
Cie inuerno, eíta lempre em numa perpetua Primauera- Sao
femnumero os montes, & prados , que íeruem de paílo
de imménfogado , quefoecontarfe por milhões ; o àruo-
redo aito j he fem duuida abono das maÕs do Criador , glo-
ria , &: cbroa de todo o outro das mais partes do mundo,
formado em borquès fombrios , & deleitofos ; He admira-
uelagrotfura dos troncos, altura das copas, & variedade
dos géneros de paos prttioíiffimos, & fobf t todos a delicia
das aruores dos Balfamos , Copaigbas , òc Ybicoybas,
Canafiftolas ôc outras de grande eftima
O CHmâ hè ^ Q Clima he conhecidamente hum dos mais faudaueis
rnuy laiidauel ^^ t i 11 ^
doOrbe; Ehgrandecemnoos melhores Autores , ocGoto-
Maftoiift. a fredoern fua Arcontologia coímicadizàspalauras que po-
jKdica. Thca.T Cl âcfiiy porque comprehôndem ãs dóá outros, rruitur
trum "f"j»'^ ^ya filia aere óptimo propter ventos fuauiíEmoSi am fere
defcrtpç.o do^ J ir*- 1^1 r 1 / • • ri •
Brafii.GmUr.^èTfiPer íht [ pira/it .' í^bundat jontwm ^ jií^mi^ t JUuisque,
7''Áod7mIde'.^^ft^^^^^^^^^^^^ ^^ P^^^^' (f í^^^i^r edita collibm 5 ftm'
fids partes, per amáiho Dívore fpeãanda , C^ 'vartetate plantarum , ç^
animdlm^ .Cotho dizendo .tíoza ô Brafil de ares bonif-
íimos, por rezahi de ventos muy fuaues, que nelle quaíi
femprè aípiràm ; Hê abundante de fontes , Rios, & bofques,
variâdofuàuenaente de valles, ôc outeiros 5 & reueftido de
dospcixes,^& verde fempre aprafiuel. Da bondade dos ares , & agoas na-
*"=•• ce a bondade das Aues Ôc dos peixes ; nam me detenho em
contaf a fermofura , & fpecies varias de hus , & outros ne-
fte Clinia, Vejam os Curiofos dous liuros inteiros d.>s pei-
xes , Òc auesdefta terra, compoftos por lorge Maregraue
Suas tíquczasfta hiftofia natural do Brafil , como também dos animaes,
qucíUdii/' que contem coufas dignas dcfefaberem; As riquezas defta
regiam famfabidas no mundo 5 requeftadas de tedisas gen-
tes, fuás doces drogas , f eus paoá Brafis , feus tabacos, ôc
outras femelhantes , de que carregam grandes frotas todos
os annõs.
Porem
Li VRO í C AP. II.
7 Porem a vlftade cancãs , ôc tam boas venturas dana- ^,'!,Z\lit
tureza,he multo pêra notar a pouca dita dos naturacs dcfla Bc.fxi ...
re<nam : Porque todos falando geralmente ,ôc em quanto
habitam ieus (ertoens, ôc feguem Tua gentilidade , viuema
maneira de feras faluagens montanhezas j nemfeguem fé,
nem lei, nem Rey.pella qualrezaõ faltam em fualmgoaF.
L. R.viuianelles tam apagada a luz da rczaõ, que chegou
a poricem duuida de alguns, fe eram homens racionais ,ou
nam. Mais parecem brutos em pé do que homens racio-
nais. Todo.- nus, aíí] homens, como molheres fem empa-
cho algum da natureza : Nem tem arte^nem policia algua>né
fabem contar mais que até quacro,osde mais números pel-
los dedos das ma5s,& pés j & osannos da vida pelloí fruitos
das aruores , que chamam Acajus , andam eíburacados
muitos delles pellas orelhas , faces, & beiços, ôcneftes bu-
racos engaftam pedras de cores , & eíles íamos mais prin-
cipaes entre elles. ^ Sat,v,gabú-
8 As mais das Naçoens , nam tem morada certa , viuem dos.
hunspellos montes , outros pellos campos, outros pellas
brenhas vagabundos^ora em híáa.. ora em outra parte, fegu-
do os cempos do anno ^ ôc occafiam de fuás comédias, ca- >
cas, ôcoeícas He ^ente paupérrima, a terra lhe ferue de Gente pxa»
rneza, as igoarias pendem defcuarco, ôc neftcfam deílrif-P'""™*'
fimos , fuás grandes riquezas vem a fer huma rede, hum
Paticruâ hum pote , hum cabaço , huma cuja , hum cam.
Os ^campos , os bofques , &1 os Rios lhe dam de graça
o comer , & beber : No lugar em que lhe anoitece, tem
certa ã caza , fogo , òc cama 5 pêra caza nunqua lhe
faltam ramos ,& folhas j o fogo tiram de certos paos , hum
molle,&: outro duro j que roçam a força hum com outro ,
òc com o mouimento concebem calor , & logo fogo 5 a
camahe fuarede (^osque fam mais polidos )amarrada de
troco a troco ou de pao a pao 5 no comer fam pouco delica-
dos , còtcntamfe com ratos, que nace pellos cãpos , em cãrj-
dade,rãs; còbras,lagartos jacarés, ôc outros bichos femelhã-
tcs. B iij A
i^
\â
14 Vida DO P. Ioseph anchietâ;
barbaras de ^ A fcus dcfuiitos fazemcxequias barbaras , huns os en-
€eas enterros, terram em hum vazo de barro, que chamam ígaçaba, com
os inílromentos de feu trabalho ao pefcofo, pêra que pof-
ía na outra vida fazer feias plantas , & nam morrer de fo-
me , (cotnodizem : )Outrosmelhoram a fepultura, porque
os metem em fuás entranhas, comas ceremoniasfeguintes.
Tiram o corpo do defunto a hum campo , acompanhado
de todos feu s parentas : & chegados alii tiramlhe as entra-
nhas , os feiticeiros^ & agoreirosmais veneraueis 3 & logo
vam repartindo em partes a cada qual aquella que lhe cabe,
fegundo o grão maior , ou menor do parentefco : Eílas par-
tes torram no fogo , certas velhas a quem pertence porof-
ficio : Torradas eilas , cada hum come aquella que lhe cou-
be , com grande fentimento , Sc tem para íí , que he o final
úc maior amor , que podem oílentar neíla vida aos que fe
. auzenram para a outra.odarlhesfepultura em feus ven-
tres. Os Tapuyas em particular comem os filhos,quando fuc-
cede morrerem lhes , pouco depois de ferem nafcidos : a-
chando que eft apodo em rezam, tenhao por tumulo depois
demortosomeímoberço/emquegozarãoaprimeira vida:
Sl?nokLs '° ^^ maiores titulos de fua nobreza pêra com huns
- coníiftem nas maiores oííadas de feus inimigos, que depois
de mortos, & comidos, guardam em lugares particulares
junto a fuás cazas 5 quais nos cartórios , os brafoês das mo-
res fidalguias. Pêra com outros coníiíle efte titulo em hum
como Tufam, ou habito, que trazem lançado ao pefcoço 5
&he hum colar de dentes enfiados , dos que mataram em
fuás guerras, 6c defafios. Pêra com outros fam as vnhas
crecidas.Pera com outros o cabello tozado,ou tãbem creci-
do. Pêra com outroshiã fraldam de penas luftrofas. Fera c5
outroso maior numero de buracosnasfacesj&beiços-De-
ftes titulos todos fe prezam como timbres de fua nobreza j
& dado hú deftes, ou fio de détes,ou pedra de face ,ou beiço
em penhor de fua palaura , nam faltam com ella , ainda que
lhe cuíle a vida. £ftes,ôc outros muitos > que feria largo con -
" tar
Li V RO I Ca p.III; ts
tar , fam os coílumesdos índios do Brafil , em quanto an-
(iam em fcus fertoens, & gentilidade. Verdade he, que ha
entre elles algúasNaçoensmaisracionaueis, ôc dóceis, que
conuertidosanoííafantafé, conuerteram também os co-
ítumcs bárbaros de fua gentilidade em policia verdadeira*
mente Chriftam , como noutros lugares veremos.
Efta hc a fumma da defcripçaõ Brafilica , que pêra meu Summa das
11
intento bafta : O curiofoque quizer ver mais em forma 0^°"^"**°^"'
modo admirauel com que foy defcuberto efte nouo mun-
do i como foy diuidido entre os Reis de Caftella , & Por-
tut^al ? a dcícripçam defeusrios, Porcos , cabos, enfeadas.
fcrranias i" quacs foram os progenitores primeiros deftas ge-
res/em que tempovieram a eíla Regiam ? de que parte? de
que naçam? por onde entraram ? da mudança de fuás lin-
goas , de fuás cores , de íéus coftumes , de fua religiam , Sc
outras coufas dignas de hiftoria, veja os dousliuros primeis
ros prologomenos da primeira parte das Chronicas do Bra-
fil, que imprimi no anno de 1663» &ahi achara fatisfaçao
de tudo, mas porque citamos na Bahia parte principal de-
íla regiam , heneceííariodar brcuemente noticia delia.
12 Bahia he a cabeça,& parteprincipal do Brafil , auetitâ •
iadaa todas as mais em fitio & felicidade do clima Eftàòc^^'-''^?»";^''
cm altura de 13 graos^Ôc meio etreahnna,& trópico AuitraU cm aUurade
rica em meio de outras Capitanias, que a acompanham de/^"efo X' ^
hum,&: outro lado; da banda do norte a Capitania de Se- de fuás c».
rcgipcdel Rey, de Pernambuco, de ltamaracâ,de Paraiba , ?''*""•'•
do Kio-grande , do Ccarâ, do Maranham , ôc do Gram
Parà^da bãda do fui a dos llheos. do Porto feguro,do Spirito
fanto, do Cabo frio, do Rio de laneiro , Ôcde S. Vicente d» terra, &
Eíle nome Bahia he fingularnefta regiam, porque nao ^«'^^^^i^i»-
13
fó diz a parte do mar que a faz , mas também a parte da ter-
ra , que a cerca : A parte do mar que a faz , he huma ca-
pacidade de agoas de 12. legoas de diâmetro , comfeus bra-
ços mais groííosjôc por confeguinte de circunferência, 36.
He eftanciafiel de nauios, abrigada dos ventos, & tempc-
ítades
'■'1
16 Vida d o P. í o s e p h d e A k c h i e t a,'
ftãdes do Oceano. Dentro de hiima Barra real de mais de
2. legoas de largura, encradã feiura de grandes Galeoens ,
& fufííciente pêra todas ás armadas da Europa juntas. Enfei-
tam efta circúferenciadomar, diuerfasilhasíhúas grandes,
outras peque nas, com diuerros boqueiroens, entradas, & fa-
hidas que vem a fazer Bahias diíferêcesi Ôc todas nauegaueis ,
capazes * ôc apraííueis com fuás brancas praias, & arredo-
res verdes , ou de mangues, ou de canaueais de âçuquar.
J4 A terra parece foy fauorecida da natureza tom mam
particular pêra fenhora & cabeça de híà Eftado grande, que
auiade vir a ferenueja de muitos O torraõ he fino Maçapé,
fértil pêra todoo género de planta , ou de Europa , ou de
America , mas efprcialmente da cana doce de açuquar , c5
que tanto enriquece a fi , & a Europa > & fe faz conhecido
no mundo. Ennobrectm efte fértil contorno as machinas
de fetenta engenhos , officinas frequentes daquella doce
droga , & de tam grande cabedal , & numero de gente ,
^ft! deíeiTo^^^^ ^^^ ^ ^^^ outras ktenta villas enriquecidas de groíTas
2â ,&osdo fazendas de canaueãis» o clima he melhor do todoo Braíil 5
& confeguintemEtedos melhores detodoo Vniuerfo,puro,
vital, ôchumaprimaueráperenne,onde raramente íefen te
frio, ou calma; E zombam dosditosdosantigos Philofo-
phos , que o infamaram de tórrido , requeimado , inha-
bitauel.
nosiicos.
CAP-
LivroI.Cap. IV.
i?
CAPITVLOIV.
Saè em terra lofeph com [eus companheiros .-
Começa apor em obrafeus deXejos : He man-
dado pêra S. Vicente ,&da/jí pêra os cam-
pos de Pirâtininga .• Daje noticia deiles,
Esta parte pois do Brafil , a fermofâ Bahia
de rocios os Sancos,fahioe0i terra o noíTo oeíembarci
nauegante para Apoftolo^ehúnóuo niúdoi^l^P-^.^^^^j^^
foi da A merica , luz da gentilidade , honra da do c™ que a.
ComSi^g^cria de feus Irmãos , exemplar de MiíTio^f^.^^co":
nariòs • E juntamente feus companheiros por todos fete , fiaria.
qual oucró fete Eftrello do Ceo pêra ornato daquellc Emif-
pherio Achou alU fundada ja caza da Companhia pellos
MiiTionarios primeiros, que diíTenios tinham partido de
Liíboaos annos atras de 1540. ^ i55o. Eoy recebido de hu
fô Sacerdote, Ôc dous Irmaõs : de que cõílaua fomete noíla
Comunidade , à íaber doP.Saluador Rodrigues, & dous Ir-
mios Vicente Rodrigues, &: Domingos Pecorella , afli
chamado por fua eftremada candura ; Porque os demais
quereftauam , prefidiauam diuerfas partes da Prouincia, o
Padre Manoel da Nóbrega andaua vifitando a Capitania
de S. Vicente, parte aíías neceíTitada, onde mandara ao
P Leonardo Nunes, ôco Irmaõ Diogo lacomé , que ti-
nham feito alli refidencia ,& lançado grandes princípios a
faluaçamdaquellas almas > Portuguezes, & índios^ Afon-
ro Brás com outro companheiro tinham fundado caza
na Capitania do Spirito faiito , que pouco hauia começara. ; .
O Padre António Pires refidia na Villa de Pernambuco»
o Padre loam Afpifcueta Nauarro , (que depois de huma
glonofarniíTam . que fizera com immenfos trabalhos , &
per.gosdavida, tinha aíTemado Aldeã de grande numero
«fi
< li'
■■'fi
ri
rolos inten
tos.
i^^i.&ãn
18 r Vida dó P.I<5SEPHr Anchieta;
de gentilidade , que configo trouxera do ferram pcra a lei de
Deos, )ete porto íeguro, onde cfperaua coríl grandes âii-*
fias companheiros pêra ram giraíide meíTe!
2 Aqui d^u principio lofeph aoferuorde feusgrandes inté^
Dâ principio ^^^ Começou logo elle.ôc os companheiros a por a caza eni'
íóíorintr" ^^™^^^ Collegio , pregando , ainda os que nam eram Sa-
cerdotes , abrindo claífes de ler, eícreuer , grammati ca, &
fazendoosmais miniílerios da Companhia, com a mef-
jmaperfeiçamde muitos, fendo de dez fomente o numero
dosqueeftauam, & chegaram de nouo. E defte numero
tam pequeno , hum mes andado depois de chegados a Ba-
r./ í. Ília, paííbu a milhorvidaneíla caza o Padre SaluadorRo-
/ " drigues,hum dosfogeitosde vaíor, & erpirito, 6c como
; : ; tal íentido,& chorado de todos, Religioíbs , 6c íeculares,
£>iftrib«içara 3 Pouco dcpois foram mandados a Porto fcguro o Padre
peíiaEn- ^«ibrofio Pircs , & o Padre Gregório Serram , em lugar do
^"- Padre loam Afpifcueta Nauarro , que no fim da MiíTam,
a€ma referida, alli ficara debilitado, & quafi confumido
nas forças do corpo , mas nam emfeu grande cfpirito, c5
que tinha obrado > & obrou depois as marauilhas ,que
delle contam noíTas Chronicas. Chegou no entremeio
defte tempo a Bahia o Padre Leonardo Nunes > que acima
, diíTemos , fora mandado a S. Vicente ; o qual feeundo
Capit»nii<ieaordem que trazia do Padre Nóbrega ,no mes de Ouru-
s.m Vicente. j^^Q^jo prcftnte anuo , tornou a voltar amefma Capitania.
G5 efte Padre partio também noíTo lofeph» â fama da gran-
de empreza dasalmasdaquellasparrejneceílitadas de obrei-
ros. Acompanhou os o padre Vicente Rodrigues jaentam
Sacerdote , & outros quatro Religiofos do nouo focorro
em duas embarcaçoens repartidos.
Padece 4 Porcm aqui começa ja a perturbarfe o inferno, & ar-
íiScrpe- ^^^^^'^^^^^s fí^^Ç^s de lofeph. Efpera os dous nauios , aíTal-
ftíde prauo- taos na mais perigoza paragem dos baixos dos abrolhos,
«tlgolnfir- (1^0í'"ueis ainda , quando mar fereno) com tamdefapode-
nài. rada tormenta, que chegaram a ponto de perderfe os pe-
quenos
Livro TC AP. IV. . *^ . ^y^
quenosbaixeis; rotas as vclias, cortados os maftros^perdldas ;'^j^ ' ^^J~'J;
as ancoras, batel, ôc fatoalijadoso emquehiaolrmam Io- '« '"^^««Z^'-'-
feph.foy daratraues entre os arrecifes , onde padecendo o//*í«<< /<«.!}<
por todahuma noite o Ímpeto das ondas, poderam eftas"-'^'
viralla , ôc qucbralla , masnam poderam concraftar a con-
fiança de Iozeph,quecom hua imagem da Virgem nas maõs,
vefporadeíuaíanta Aprezentaçam ao templo, imploraua
fuas; miíericordias.-.te que rompendo a alua alegre do dia
4g, Senhora > Ôc com fauor íeu milagrofo , íahiram à praia
viuos todos , lofeph . 5c os que com elle nauegauam.
5 Fruílradono mar Satanás, nam defiftede fuas traças ^^^^^.^.^^^^
em terra Sahirà lofeph , & os Companheiros quafidefun-tírracõfajs
, 1 •!• , , r o r\ C ' traças O ini-
xos, debilitados de tam forte , <Sc nodurno nautragio , eia^^jgo.
força procurar refeiçam ; Efta lhe impede o inimigo , to-
mando por capa de medos o lugar deferro , 5c mal feguro
de gente faluage, ondefahiranii que nam era bem entrar
pellos matos, nem auenturar fuas vidas 3 5c como nas
1 ^ . • j Modo ma.
praias , nem achaíl em fruicas , nem eruas , nem ainda agoa rauiihofo
pcra beber , veio a fer a neceflidadc extrema, Que faria en'^^°;^j;;^^J^^
tre efíes apertos o grande eípiritode lofeph ! punha tudoafeasCom.
nas maõs da Senhora. Por infpiraçam, como fe cré da p*""^^''"'*
mefma^pode tirar de entre os baixos a embarcaçam em
que viera quebrada, 5c rota 3 ôc com a madeira dafegunda,
que de todo fe desfizera ,& fahira â praia , pode a induftria
necefitada fazer hum pequeno barquinho , que leuou a to-
dos com o fauor da mefma V irgcm , a porto feguro do Spi-
rito fanto 3 onde puderam refazerfe em caza, que ja alli
auia nofía , das fomes, Ôc trabalhos paííados.
6 Efla mefma tormenta , ôc naufrágio defcreue íozeph
em feus apontamentos , ôc diz que naquellas praias acha-
ram huma Aldeã de índios que os recebeo bem junto a hu
Rio 5 efte Rio he o que hoje chamam das Carauelas , en-
tam defpouoado . A elle foi vltimamente condufida fua^^^^^^,,.
embarcaçam quebrada, pêra allí fe concertar na forma
queeífa dito , fegundoo modo de contar de outros com-
C ij panheiros
-illr
s*
16 VíDÃ DO P. Tose PH Anchieta^
Wi£o° pànhèifos. à qui acrefceta lofeph , que acharam huma rne*
tíe i.úa criai níhâ in extrcmis , òc que auido o beneplaciío do Pay a bau-
rizaram , & t^úe voou aquella alma ao Cco , logo depois
de baátizada , 6c dera por bem elnptegado o naufrágio
pella faluaçam daquella alma
> Toínada refeiçam, embarcando còiiíigo o Superior da
Farte doSpi
rito S:^nt05
ch rgi aSiin tàza , queeraoPadre AfFonço Bras,Ôc deixado cm feu
Vicc.te , ^le- |y^^^ ^ Pãdfè Brás Lourenço . deram todos a vela no mcf*
he lec ! ido íiíjc pè^qaeno baixel , em que alli vieram , òc cheo-aram a íal^
doP Nobre ^ rr A C c X7- J C
ga. uamcntóa lançar rerro em S. Vicenteem ^4. de vbetem-
brodè^^s"?!; nam ha cobiçoío que aiii fe alegre coma che-
gada de naôsdalndia,em que eíperaos retornos de feus
groííos'trripr'egos , como aqui fe alegrou o coraçato de Nó-
brega , cam a chegada defte rocorro 5 nam vira nunqua a
lofeph , & namfe fartaua de abraçallo eípecialmente, &
darlhe as boas vindas : Qué parece lhe dezia ja defde allio
. coraçam , quem por tempos hauia de virNãíerefte fogeito,
C'Ompanhsirò de íetís caniinhos, conforte defeus trabalhos,
aliuiode fe-us cuidados, dezempenho de fuás cans ,& honra
-da Miííam do Brafil . E quando defta maneira pronofticaua o
"""**" " coràçam de Nóbrega , quenâm faria o de lofeph, que taõ
cheio hia dé Dèos , & ram fundado em fuás efperanças.
^ Gouernâua Nóbrega atéaquelle tempo com titulo fó-
mentè de Vice- Prouin ciai, fubordenado ao de Portugal;
porem coníldêrandó o nòíío fanto Patriarcha Ignacio ,
a grande diftacià dè lugares, & os incõuenkntes que podião
íoccaíionarfedeconfultar detam longe negócios, que pe-
Hc deito o p.diam ordinariamente prompta refoluçam , defpedio paten-
Prodfci,T! 'te nefte annòao Padre Nóbrega , perafer Prouincialcom
o primeiro jurifdiçam diuidida , ôc independente de Portugal, aííi-
Companhia '«andolhepor Gompanheifo collateral, com os meímcspo-
do Bnfii. jef es ^ (^porque a(li o pediam as circunftancias daquelle té-
ckro».fi0Br<ifpo)o PadícLuisda Gram , varam de grandes partes, &
^^^■J' ^* "^ efperinças : Com ordem outro íi , peraque de feus
companheiros , efcolheíTe alguns de mais experiência
, pêra
LivK o I. Cap. I V. II
pern Confulfores : Dos quais hum, (qual elegefíe) feria o
companheiro de ícus caminhos : E era eíle commummente
loíeph , poíto que ainda nam Sacerdote.
9 Depois do iiouo titulo de Prouincial , poucos dias an-
dados, coníiderando o P. Manoel de Nóbrega . que fendo
ja o Brafil Prouincia de per fi , feparada de Portugal , era ne-
ceiiaf io aucr cíludos , ôc criar fogeitos em numero , que po-=
deflcm bem acudir às neccílidades vrgcntes de tam vafta
regiam -, pois nam poderiam vir de Portugal, viftas asem-
p/ezas com quede preicnteíeachaua em diuerfas partes doxriude hn-
mundo ^ tratou de fundar hum CoIIcpío nos campos cele-f»^^'^^' Coi
. *-^ Icgio nos ca»-
bres chamados de Piratininga , abundantes , & acommo-posdcPir.ti-
dados á fuílentaçam de muitos noííos. E com cffeiío poi^^f^ifiJ.*^
cfta,&:por outras occafioens principaes da conuerfamíephcoa,do-
, . ,* ii\ /- -A - • • • J T ze Ditcipolos*
dos Índios que alh fícauam mâis a mao,no principio de la-
neiro feguinte de 1554. (deixando ^^ ^'^^^ ^^ que pareciam cbronJoBra.
neceííariosperaominirteriodosPortuguezesjforaõmáda-^'^^''^^^^^^
dos pêra eíkfím treze Religiofos , entre ellesoírmam lofeph
pêra Mell:re ; E o Padre Manoel de Paiua com cargo de
Superior de todos. Efcolheram firio acommcdado, diííe- V'
ram nelle a primeira Miíía em 5. deíaneiro diadaConuer-
íamdo fagrado Apoftolo S. Paulo, aufpicio bom dacon-
uerfam dos Índios daquellas partes , de cujo no^ne fe de-
nominou entam acaza , & depois à Villa. Defcrípçem
Cio E porque eíles campos foram outros Elizeos, bem a- ^<^5 campos
r T r . . . de Piiitinin-
fortunados pêra lofeph, ôc nofla Companhia, por primei- g».
roSen)inariodosnoíl"o$,& da mais numerofa gentilidade,
direi alo ua coufa de fuás muitas felicidades.Saõ eftes húapar-
te celebre, & nomeada em toda a America, feitos parece da ^
natureza , como de propoíito : Quanto ao terreno , he hum
efpaço de muitas Icgoasem contorno, de grandes vargens
infeitadas da natureza , a marauilha com variedade gracio-
fa. Da parte do mar cerminaõfe com aqaellas quaíi muralhas
nacuraesdasferranias , ou cordilheira do Btafil, que excede
os Alpes, Pirmeos , ôc Olimpos , & por aquella parte tem
i: . C iij por
^a
20 V I D A D O P, í Ó SE PH A Sc H I E T Á,^
por nome Paranámpiacabaque defcreuemosnoucro lucrarij
Porootra banda dam ^priBcipio a fertoens alegres, os mais
afamados, c]ue fazem caminho pêra bonos Ayres, Chile,
C-hiío^ & af^ os diftriros do grande Rio das Amazonas.
!©os moradores deftes fertoens foram fempre muy reque-
fiados eftes campos , qual fenelles habitara alguma Diuin-
dade , &: poreíla rezam temidos os moradores deíles, por
íuas ârmm r,§c gente guerreira j fam abundantes de todo o
iiecefíariò pêra a vida humana , ôc ainda pêra recreaçam
dos homens • Degadovactimj Cauallos , Carneiros , Ca-
bras , fercos maníos , montezes , & aquários 5 Caça infi-?
nita de animais, 6c aues. Vefteinfe hoje de cearas de trigo, ôc
fecundas vi rthas, a eftender de olhos. Reueílemíe deflores
de codaa forte ,efpeeial mente de Crauos, Rozas , x^çuífe-
nas 3 he fértil de Vuas , JVíaííans , PeíTegos , «& quafi todas
as fruitas-de Europa ^ a culpa fera dos que as nam plantam >
fe faltarem algu mas.
Ji Osarredorçs deftes campos, & feus fertoens fam na mcf-
mâ forma.os mais férteis do Brafil , cheios de pinhais fermo-
Ss *r"rtó. ^^^^^^^^ ^^^ fobem âs nuues,& carregaõ de pÍBhâs,cada qual
es , & n a£»s. do tamanho de féis , ou (cte de Europa 5 cujos pinhoens fam
mais compridos que eaftanhaSjpofto que nam ram ^roíTos
masmaisdoces: queeílas.He comer ordinário dos índios &c
fnr>"iv:s í ^uftéto de grandes exércitos, quede comino andam ncftas
çãpanlias a fazer guerra ao gentio que habita nos feri ocs do
'""'''\vNRio da Prata, Chile, & Chito , marchando porellesannos
inteiros. Nas matas acham grande abundância de caça ,
Antas, Veados, Porcos montezes, Coelhos, Emas, &
rGutras caftas de feras , & aues 5 & o gado he tanto em al-
gumas paragens , que podia encher muita parte de Europa 5
ferue de cobiça aos Portugezes, que por mercadoria matão
as rezes 3 6c carregam dos couros feus Nauios , deixando
a carne pellos campos às feras, 6c às aues. He tam grande
acantidade demelfilueftre, que podem encher pipas delle,
ç^ carregam os exércitos que paífam a mais nam poder. Ha
certa
LlV ROl. Cap ITVLOIV* 23
cert â cafla de Palmeiras, de que fazem farinha, como de
mã dioca frcfca, & feca.quechamãode guerra, beijus,cari-
nú.&c ainda vinho como damefma mãdioca.fuftéto commu
doBrafil. Vai retalhada a terra toda com caudalofos Rios ,
que fazem os bofques frefcos , & aprafiueis. Ha alagoas gra-
des , que criam em fi cobras , (k lagartos de grandeza inv
méfa que chegam a tragar hãhomé.ou veadointeiro. AsNa-
^oens de gentes quehabitam eíles fertoens , feus vários ritos,
éccoftumes , feria infiaitodeÍGreuellos : Indo correndo a
cofta do Oceano habitam os índios que chamam Goaya-
nâs Tupis, Carijós , Bigobebas ; mais para o interior das
brenhas , outros que chamam A baciis , gente mais fera , Òc
guerreira, correndo mais ao norte, ôc os que chamam Ca-
rijós do fertam , menos agrefteSjGuaramunins, Tupiares ,
Ibigrayàras , por outro nome os Bilreiros,lanceiros &€.
E eíles fam os campos Ehfeos defta gentilidade, & {c\is
fertoens , onde agora vem habitar o noíTo lofeph, & do2e
feus difcipolos. Como aqui fe ham, dirá a leitura feguinte.
C A P I T V L o V, ^ íí^« y;^= f
Ti f rt ■ f I
Modo da pohreT^a _, c^ ordem com que ajfentou
caia,& ef cola nos campos de Viratininga; co-
mo igoalmente enfinaua a lingoa latina ;ò^apn^
dia a dos índios ^ & atendia ao bem da^ alma^ 5
& conta fe hum caTj) milagrofo, & celebre defuf
penfam da chuua.
Tx t 1* /r *« \, PobreiiReiíJ
Pobreza euangehca , com que aílentou ca-giofacomquc
za , & efcola nos campos de Piratininsa, víuú em Pi-
1 • 1 /- 1! J ratininga,
nam poderei eu defcrcuer melhor do que, o
mefmo lofeph o fez por curta fua de Ago-^^'''^ f^^'--»/
ílo de i554,anoíloReuerendoP. Geral, que entam era.jj.». x5j.
i.i3>í Santo
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Santo Igíiacio de Loiola jÔc he á feguinte. ^ l anuário vf-
que ad prdifhns, nonnunqttam pUs vtgmttffimul enim Tueri
Catêchifi'^ degehant Jin pàupèrcuía dòmc-^ luto^ ^ Itgntscõ'^
textá ipàleis cooperta i qmtuofdecim pajfns lon^a^ dece
latamd^n(iwi^tis. Jbèfchola^ ibi njáletudinanum ^ihi dormi<-
'tòrmm» ^•c^naculuyni item ^ ^ co quina, ç^ penuí fi^
mui íunt: me tamen ampíarumhahitationum qtabus aliqui
frami noftri '^íuntur-i nos mouet de/ideriurr/t, pquidem T)0'
minus nofier hfàsChnjim in arãiore loco pcptusef,cum
tn psupere pmfepi i tnter duo bruta ammalta njoímt n^fcii
multo i-^ro àfãtffiWio cum intruee prò nobis digna tus eji
morto < ■ /.yhíí^icj
2 Vefti à dker que dos princípios dálanèiro ate feittlra dâ-
pôíílgu^s^ quella Cefe^alli humaCofinha de torram , & palha, ca-
torze paíTos de comprido , & doze de largo ,em que
tnorauam bem apertados os Irmãos ^alli tinham efcola ,
alli enfermaria , allidorríiitorio, reíeitoriò, cofinha, &
deípença, contentes Com a kmbrên^^à do Senhor lefupo-
ftoemíeuprerepio 5 Sena Cruz Àtéqui acarta. Mas eílc
aperto era ajuda contra o frio, que naquella ter ràlie grande
com muitas geadas. As camas eram redes , que os índios
coftumám 5 os cobertores o fogo que os aquentaua (pêra
JD qual os Irmaonscommummente acabada a liçamda tar-
de , hiam por lenha ao mato, & traziam as coftas pêra paf-
far a noite ) o veftido eramuy pouCo , 6c pobre de algoda5
fcm calças > nem çapàtos. Pêra meza vfaram algum tempo
de folhas debananaserri lugar de guardanapos 3 quebemfe
cfcufáuadci toalhas j onde faltaua 10 ct)mer 5 o qual nam, ti-
nham donde lhe vieíTe, fcAam dos índios quê íhes dauam
âlgua efmola de farinha , ôc as vezes alguns peixinhos do rio>
' '\ &c caça dò mato, Faziàrti alpergatas de cardos brauos , que
iheferoiam de çapatos ; aprendiam a fangradores , barbei-
ros i & todos os mais modos , Ôc oííi cios > com que podiam
ferdepreftimoa todos os próximos naquelle deílerro do
inundo, -i
■ ; ií.G Nefta
^^ 1 n '
w
'::115
íl>b
Livro I.G a p. V,\ (, , ^^ , ^/ i|
-^ Neftaeflremadapobrezaíeabrioaqui aregUnd^claíTe^^^^^^^^^^
de (Traminatica que teue o Brafiliporque ja na Bahia íe finha do Unn.
aberto huma ) frequentauaninadoze dos noíTos , que corn
oMcftrc eram treze, qual outrp Collegio de Chrlílo: ^Jm\]\.
outro bom numero de eftudantes brancos, & Mamalucos , , úWtr,
que acodiam das Villas ja principiadas. cirçumvç^iphas. O
trabalho era excceííiuo! Amda naqudi^remponamhauia
naquelias partes copia de tiuros , por onde ppdeíícm a-
prenderos difcipolos o> preceitos da grammatica: Eíla
talta rcmedeauaa charidade de lofcph, a curta de feu fuor >
ôc trabalho, efcreuendo por própria mão tanros quader-
nos dos ditos preceitos , quantos eram o^ difcipolos » <quç
cnfinaua. E paííando niílo as noites , femdormit , porque
os dias occupâua inteiros na^obrigaí^oensdooffício , & c6-
iieríâm dos índios. Acontecia, nam poucas vezes , romperá
manhaâ ,& achar a loíeph , cÔ a penna na mcão.Não parauão
aquiícus trabalhos 3 era de viuo engenho , &: er^ infaciauel
íuacharidade,dehua, Ôc outra coafa tirana grandes forças.
A. No mefmo tempo era Meftre , & era difcipolo 5E osN^ "^efmo
mermos lhe feruiam de difcipolos , & Meítres 5 porque ,i,ngca j
acina
na mefma claOe falando latim , alcançou da fala dos^*P[.^"'^^*
que o ouuiam â mor parte da lingoa do Brahl , que
breuemente perfeiçoou , cora tal excellencia , qUe pode re- lUdem «. v^s
duzir aquelle idioma bárbaro, a modo , ôc regras gram-
macicais, compondo arte dellas,tam perfeitas que aprouada
dos mais famofos linaoas , foy dada â impreííam » & tem
íermdo de guia , & meftradaquelia taculdade aos que de- a^te Vocaba.
pois vieram: E delia ha líçam particular em alguns Colle ^l^^^J^J^^-,
gios daProuincia Alem da arte , fez também Vocabulário ta bem cólC-
damefmahngoa: Tradufioa doutrina Chriftam, Sc miftc-[|^;^f^",\in:
rios da fé , difpoftos a modo de Dialogo, em beneficio s^a.
dos índios Cathecumenos, & fez tratado , Ôc interrogaco-
rios.&auifosneceíTarios ,perâosqueoUueífem de confef-
far , & confeffarfei Ôcpera inftruir principalmente no te-
po da morte aos jabautizadosj deixando aliuio com feus
. D -tra
'^idem.
té Vidado Í^.ÍósépH Anchieta:
trabalhos àos Vindouros > que fe ouueíTem deoccuparno
trato da faíuãçam^àsàlfrtaSj íj^. -upL. »
5 Eíii quatro lingoâs era dcftf o, na Por togue za, Cafte-
Ihana , Latina , & BrafilicajCm todas ellas cradufio em ro-
poffmantcspios, com muita graça , ôc delicadeza, as canti-*
gas profanas , que andauam em vfo ^ com frud:o das al-
íces pios, j^^as 5 porque deixadas as lafciuas , nam k ouuia pellos ca-
laos.
Traduíií
todas as
lingoas cm
roínãces
os lífciuos ,.,-** r r ■ J' ' * 'J
porque can minhosòutrâ coula , íenam cantigas ao diurno , conuiaa-
&^Tcft'erraV ^^^^ ^^^ ^^ entendimentos do doce metro de lofeph.iií j:^ «4
femos profa- 5 Coòipos nam fó aqui , mas em varias partes do Brai
íil ,com viuojôc raro engenho muitas obras poéticas , eni"
toda a forte de metro , em que era muy fácil, todas aodiui^
no , & afim de euitar abuíos , ôc entretenimentos menos
honeftos. Entre eftas foram as de mais tomo , o Huro da vi-
da ,& feitos heróicos deMem deSà terceiro Gouernador
quefoy defte Eftadoem verfo heróico , latino 3 varias co-
rbediáSjpaíTos, ôc eglogas defcripçoens deuotiflíimas > que
ainda hoje andam defua mefma letra , & ávida da Virgem
Senhora noíTa em verfo Elegiaco ,de que em feu lugar fa-
laremos De h5a das comedias he força fazer aqui menção.
7 Em S.Vicéte afim de impedir as indecêciasque fe come-:
tião em z&ios reprcfentados na Igreja, introduíio c6 aplau-^
fo dos moradores da Villa , & parecer do Padre Nóbrega
feu Superior , hum âdo feu, muito deuoro , a que chamaua
Pregacam vniuerfal , porque feruia pêra todos , Portugue-
íts,t!. índios, & conftaua de huma , & outra lingoa , por-^
que de todos foííb entendido; A efte concorria a gente to-'
da, reprefentauafe nas vefporas do lubileo da fefta de lefu^í
porque também a Volta do ado foíTe vniucrfaí o
Cafo celebre ganho de fuás indulgências. Aqui neíie a(5to aconteceo
da fufpençarn )^^^ ^^^^ milaerofo , da fufpenfam da tempcílade , celc-
datempeftíde , V t- • r r, i- i i
bre em todas eftas partes. Fazvaíeeita comedia huma tarde
'^'^«"'f^**'''^"^ em lugar defcuberto junto ao adro da Igreja; Eis que co-
i>4rír«./i«.i. começando a fahir a theatro, começa em todoo Onzontc.
"'^' ^- à ameaçar agente huma cempeftade medonha : A perpen-;
diculo
£rt Poeta
goalmenle
facil , Sc
denoto.
\ '
^-«%
m
!3«rns:)5l
,A . LtVRO I CÃp^V.n 7 «7
diculo fobre o auditório íe formou huma nuuem carrega-
da de Jgoa. quecoxncçauaabriríe em partesj ôc qu^çiam
rcLolhcríe os qu£befta.u^ma(;Gomtnodyos , compercur-
bacam, ôc defordem.- Porem toreph,acu)o cargo , & dC
Dcoí^eílaua o íuc^eílb, leuanWn^oa , voz , .m^tVÍp^X??
Pouo . que namfeperturbaíTe, dando palaura qiie narri
choudcfla antes que a comedia de todo fe âcabaíle. Côufa
marauilhofa/ (uòCeaco alfi ; Coiicmuoufe com^a obra >
que durou três horas ,com quietaçam, & focego , ate o
fihi5 recoíheramfe os ouuintes todosa fUas câáas^ àcMiO
ifíõ'desféchou a mais horrenda tempeftade de chuuas.Vén-
tos í^ tròuoens que té entam fe vira naquetlas partes j Co-
mo fedaquellemorírEto alcançara a hcé^a, que por três ho-
ras lhe faltara. M eteo em efpito aos homés^ôc por outra par-
ftíem confiança dasmiíéricordias do Senhor, & mtcrcetj
fam de íeu íeruo lofeph , por cujo meiò ãquelU grande nuud
cmvezdeeftoiuoJeruiodetoldoaoaaroGom tammani-
feftc beneficio Eílecazoatribue lofèphao Superior, que
entam era o Padre Manoel de Nóbrega 3 &: âo2ielo Gom qtíe
prccurauaeuitarna Igreja ados profanos: Porem a ma-
rauiíhafoy atribuída por todosa lofeph, que fes a pro-
meíía, a cuja fc comprio Deos a palaura 5 aífi o crem
todos, & aíTioefcreuem as memorias antigas, que temos
íia Prouincia. O Padre Faterninà//^. 1. í-^/7. 7* & os procef-
fos authenticos de lofeph a cada paffo.
8 Eílas eramasoccupaeoens delofeph , em quanto Me- s^eujmc^^^^^^
fírecíludiofo. Outras porem lhe leuauam mais o efpifi^o 4",^,^^^ d^s
òc eram eftas as principais da faluaçam das almas , aque forá*i-«,
chamado, ôc de que fevia cercado , defemparadas todas.
Deftacfchola, & deftes doze difcipolos de lofeph , fahio
doutrina, & fahiram Apoftolos , que entaÔ , & depois repar-
tidos por vários fertoés , & partes do B rafil , ajudaram^ a con-
uerter muita parte da gentilidade delle,como hirà mo-
ílrando a hiftoria porque vejamos que aíTentou neíles cam-
pos efcola, maisdealmas,qucdecorpos5 mais^de fciencia
debem fazer , que de bem falar. D ij CAP-
,.■:■;>
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VíDA DÓ P.IòsEPH Anchieta^
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CÀPITVI.O Vi;^,',
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^Mo^òsvarm tomqueconueneo muitm almas :^
'^ p^^ J^fèmdúá^ &modosvams ^com
, que,oinf§Tm o pretendia ejlrouàr, ^^^
Conuerfam -
^e fazia por .
meio de feus
Piícipolos.
O R meiodeíles feus difcipolos deftros na
lingoa , & deftros no efpirito , mandados
oraahuma,ora a outra Aldeã, quaes App-
ftolos de Chrifto , a MiíToens valentes , per»^
íuadidos os moradores daquellas brenhas da verdade, 8e
ícrenidadedenoííafanta fé ^corriam bandos deixando feus
fertoens , pêra o lugar aonde morauam os padres.
mS Vii" í Deceram primeiro que todos hum Principal por nome
ciFaes,&na- Tíbvreçâ , & outro Pór nome Cayobig , Senhores ambos
çocQs do ícr- . . J Lj
um. áegrandes familias , ôc terras : E logo a exemplo deftes , tã-
tos Principaes , & tam grande copia de gente , que ja nam
Brlf^tem, i. hauia íitio pêra todos. Chegauam eftes menos aptos pcllo
itHr. i.f. 116. canfaço dos caminhos , & ignorância do nouo iugar , pe-.
ra fazer fuás habitaçoens : Porem aqui foy logo a charida-
Traçam , & jje ^je jofeph , & feus difcipolos , feitos traciftashuns ,ou-
aiudam à fa - * l . • i i /- i • «
zet as mora tros pcdreitos , outros carpmteiros , ajudando a rabnca das
âcnt°uò^vcm cazás neceflariaá pêra cada familia , arruadas , & feitas ao
,. modo Português ; E como a vontade era igoal em huns,
doutros, em breue tempo agazalharam todos 3 nam re-
parando em fuor , Ôc trabalho os noífos , trazendo junto
com os Índios a terra , & agoa âs coftas , por fazerfe huma-
nos com elles, & fenhorearlhes as vontades.
-3 Feitas as obras das familias particulares, & feparadas
as naçoens , fizeram logo de mam commum huma Igreja
de taipa , que chamam de pilam, com grande gofto , & ale-
gria: Feitaeftapafmauam os bárbaros ver nellao aparato
-' . do
IivroI.Can VI. ,' 10
do culto diulno, Ôc as ceremonias dos fantos Sacramentos, & IJ-f^*;'*™. **'
cada qual queria ícr primeiro , em gozar do pem, d^.r, ler n- vtr o apar.to
lho dos Padres , como elles deziam. Çomeç^f^ni^ *fcr ca-
no»
tliequizados , fazendolhcs praticas * or^; í)- m^ftre , ora os
mais dcftros , & eloquentes difcipolosna lingog Brafilic^ > &
era grande o goílo de lofeph, vendo o conceito ^ que fazia5
das couzasdiuinas,genteta5 barbara por outra via. A ícauão-
lhes os ritos de fua gentilidade , o abufo da carne humana,
das muitas molheres> das fciticeirias, das bebidices , -ôc to-
<los os mais, tam conformes a fua natureza 5 & tudoouuiaõ,
^ aprouauam 5 & o que mais hc, admitiam com vpntad^
firme : (que onde começa a entrar a luz da fc diuina ^
defaparecemlogo as trenas da cegueira gentilica;& ct>nhece
perfi a rezam, o que he conforme a feus didtames. ) Nain-
ílruçam dos Tantos Sacramentos nenhuma repugnância ha;
nefta gente , porque como carecem do abufo dos Ídolos, fi-
calhes a vontade liure , dezembaraçadapera abraçar, o que
he conforme â rezam.
4 Todasas traças bufcaua o grande efpirico delofephípe-^^^^^^^çj^^
ra doutrinar aquella gente barbara Hauia e:ii S. Vicentefephna ccn-
hum Seminário de muitos filhos dos índios do fertam de Jq^Í™ •
Piratininaa, que os Padres lhes tinham pedido para crialos ']''^^f^
na doutrina Chriílam/Eftauameftes ja baftantemente in* i%bnBi3
ílruidos na fé , ler , efcrcuer , ôc cantar : Foy traça de; Io- ^ ' ;
feph , que vieflemeítes menmos pêra os campos encorpo- 0$ ctoípos oif
rarfe com feus difcipolos em fauor , & ajuda dos Paes , c6 "l^;^
o effeito, que logo veremos. Continuauam eftes na noua Al- em ajuda do»
dea fua efcolâ ,a)udauam a beneficiar os officios diuinos^" '°*'' 7:^
cm canto de orgam,ôcinílromentosmuficos. ( Omor go- *>
fto, Ôc incitamento, que podia auer pêra os Paes, que ja.
allieftauam, vindos defeusfertoens.)Efpalhauamfe a noite dj^u 5^0 foy
pellascazas de feus parentes, a cantar as cantigas pias de ^^^^J^^llt^^
feph em própria lingoa contrapoítas âs que elles coftumauaõ
cantar vais, ôc gentílicas .• Com os Padres ajudauam a ca-t
thcquizar. Na efcola inftruiam aos feusigoaes , na doutri-;
'''m\
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^fD V I D A é ¥ Pi - I^S S>H A ãcH 1 E T a;
^õ^V^'á^1ii*tie^a^Sakl©deíSÍôíí^Sentóav^^
òra^&'€toíàntó'ée'õi^^i$í í^As (e
ííítmrPê^ipMas^iJít^íá^íàm de linho de cardos bra,uos4-
í)uaá ^áseS lió dia dauam liçafin da doutrina Chriftam , Ôs
ciii^bítiab^ífípoií^ílâí forma ; foram bauítzados , pãííantié
de tímtà^èóma íol^bmdade poííiuel , cípevândo osgvindts
ttierèíÉt^áttielliantêf ôWíiftà :^A x^ifta dos filhos feanimauaõ
gr^tiittnmtè ^s Pâes> ê& túffi^tiam algiíns ^íft t:aío d& hd>
rá, cjtieeie^lliebuudfém d^gânhar par mao. Com d\á
■tbntóôliam os Padres mais de vagaf , parqueie aí
fêtrr^ na féy ôc defârreigaíícm dos íicos gefítiU
ftientekíe^inhos demâfiados , ntctitas molheres y 6c gula dè
càírií^lítftiiâ^èk ; E neftes Vícios a nenhuns tinham mais con*'
irainí^'^Ui2'í(^&s filhòsfrôprios^porq com zelaja
Chriftam vigiauam os Paes , & os acufauam ao^ Padres , ôt
.oí 3í.â.?r T^í^ês m^ííAb^ ^údauam alhesquebrar as talhas de vinho em
'«;^ «-^"-^íiiás^bcbedicfís;' '■ -- > '
íreináeel "^ •' !í ' ií!ânddtudoBèftâ bclla paz í cntroti o inimigo per-
ftrouar o tuTbaddr *í-'^ue ja tardauam feiís embufteç, a defcompor os
grande ftuitoatómWd^^ pobres Ifidios, por meio dehuacomapeftetere
í^g^^jl! ríut^íie ^riôi-itó, tom tàl rigor , que era o meímo acome-
doenç,; ter , q^é derribar i pr itiâr dois fentidos , ôc denrro de três *
ch'ro».4pBr4/0^ qtJâtrodias kmtà fépultura : Metendo o fagas inimigo
íif«??, i, //»c I. em cabeça áquella gente fimples . que os Padres lhes cau*
/eA/>íi p4^.''Tauam2fníarte , queeram os preceitos de ftia doutrina muy
4J- or/w. frabâlhofos, & muic<intràriosaoscoftumes defeusfertoés 5
quela íiaõ mornao íata a preíia , &: outros embuítesícme-
xo) o:£.ip Ihãtes.femreíam mas cotn tâl eífeito, que os Padres fe viam
wjbt:^ L . cm grande aperto, & com o curío da conuerfam em perigo.
Traçou lofcphj & feus difcipolos, noue praciííoens, aos
noue choros dos Anjos, com todaa fokmnidade polliuel.
Hiam nellatodosos faõs, homens, Ôcmolheres, com luzes
ílíí
.^3l
Li VR ol. Cap.VI. 3<
de cera nas maõs 5 & os meninos da efcola com cruzes
áscoftas, dilciplinandofc muitos delles , até derramar
langue: E a viftadeíla piedade hiam trocando aquelles bar-
ba i^s feus conceitos , porque parauaa medida delia, a fú-
ria braua da doen(^a,
é r- Alem defte ouue outro meio humano 3 ôc foy que ^^.^^^
vendo os Padres , que era o mal força de fangue, & nam '■^'
auendo na terra fangrador , nem aindalancetas, começou Aguçam io=
loíeph , ôc logo alguns feus diícipolos, à aguçar os cani- d,^^,,^,,^,
uetes , com queaparauamas pcnnas , ôcafangrar com el- J---"-
les os doentes . com tal eíf eito , que raro foy o que mor- ^,^,,. e, c é-
reodalli em diante & os perigofos melhoraram. A vifta de--^-^--
hum , & outro exemplo ficaram os índios fatisfeitos , & fato.
.deziam ja , que a doença daua o diabo , 6c a faude dauam
os Padres , que amança o meio da charldade os ânimos
mais feros. . Outroetrba-
. ^ 7 Com outros enfayos fahio o diabo , nam menos peri- ^^^^^f^
-ttofos, tinha perfuadidoà muitos homens moradores d^-cenoiUtn
quellas partes, que era licito, & ainda honrofo o trato dei^cos
faltearos índios, ou nos caminhos , ou cm fuás Aldeãs, ^ ihidm.
fogeitalosa feruiço feu , & do pouo; Entre eftes hauia
ccrtosMamalucos. que vendo a doutrina de lofeph, tam
contraria , conceberam contra elle,& todos os mais Reli-
aiofosnoíTos ódio mortal : Amotinauam toda a creatura,
que conjuraíTe contra elles em vingança daquella que elles
tinham por injuria ; Aos Indi os perfuadiam com o argumen-
to de mor força , que pode auer entre efta gente , & era lan-
çarlhes em roftro, que fe acolhiam a Igreja por couardes, &
nam preftarem pêra a guerra , ( impropério que fentemfo-
bre todos os outros. ) Aos das Aldeãs deziam , que largaf*
fcm os Padres , que eram homens eílrangeiros , degrada-
dos.gétevadia.quemaiorhonralhesferiafogeitaríeahomês
valentes de arco , & frecha , como elles, que a hun^ eílran-
geiros couardes. Com eftes, òcfemelhantes ditos afim per-
turbauam os ânimos daquella gente ignorante, os Mama-
lucos
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ibidem.
B2 Vida DO P. Ioseph AYjghiita;
lucos 5 & cohi fua nátúrál eloquência , (€iíi cujos "^cíorpioíl
parece fâlàúà o diabo ) aííi os cmbrà-bècefáni , & arnoti-
naraiíi qúè ouueram òs ladres paf ie-ntam dé deixalos , até
melhof íucceííb; '^^^ " ''^^ ■ ^
fte. 8 Outro embuíte do inimigo. Amotinàramlcòs índios
'brauos-cÒnlarCGens, contra os índios de Piràtminga ,
feitos ^mh^ni coirpo vieram à acomeçeílos coiíi gran-
"°í fni8?i;§A .^e alarido Sairarii ao encontro os Piratininaanos ar-
rol. q,3i!a libados igoaimente' de arcos ,& da rc , porque eram ja
""' 'fi '''?. Chriítâõs , ou cathectímenos parte dellesi Porem chega^
dos ao campo , viram que era multidam de gente nam
/ ,..• aa: iniaginada .Entraram em defconfiança, & medo. Notoa
•°^*^ âquellapértiírbaçam a moiher do Gâpitam mor- de tódõSj
que (fegundòcoftume antigo deíla gente ) íempre vai ao
lado do marido nà guerra » & era bautizádà , grande Chri-
-B<jro5 01.» ftam , & varonil , & virandofe aos foldadados. DiíTe, que
©skwoioLai: toUardia hé efta Toldados ) nam vos lembrais , que peleia-
«rnsM 2C3731 mos jadapàftc de Chrifto , & que eftes que vedes , fam g6-
tios, tragadores da carne hu mana .'afazei , fazei todos a^
quelle bém€nal , que o Padre lofeph , ôc os màis Padres vos
iníinaràm, áafanta CruSiÔc com elle confiados acome-
tei: Ditas eftaspalauras foy couza de efparjfo , depois de
feito ofinal da Crus por todos, ver o animo intrépido com
'que ãcofnètéram , tam conhecidamente, que defmaiarani
logo os contrários i ôcíe poferam em fogída ■■, com eílrago
fíiiferarídò de mor tos, feridos , 6ccatiuosque deixaram no
campo. De dous fomerite fediz que ficaram mortos dos nof-
vitimo - ^^^ ' porqlienam deraõ credito â índia > que os amoeftaua.
bufte. 9 Outra pertutbaçam. Foram a guerra contra feus
inimigos alguma gente dos índios dos Padres , tomaram
nella hum prifioneiro Goayanâ de naçam , ôc voltando à
DetèrmiaSíe Aldca , cònuidados pârcce defuas^oas carncs , & efqueci-
mVr"era°y°"^o^^^ ^o^^í^í"^ dos Padres 5 deterníinaram comei lo em
reiro hum terreírO , & pêra proua , , que importaua aífi a cauza publi*
ca, bmefHio Principal jâ Qiriftam , por nome Martim
Affonço
aoaíi.
»".«5.ir;l.
Ibidem '.
Goayànà
' -ii.
«AT3 LlV R o I,C A PlTVtO VI. =/ ^J
Ãífonço de Meíloj mandou alin7par o terreiro de fronte da
caza dos Padres, com tal reloluçam , feita, ôc alarido,
comofe emfeu fertam eftiuerajque parece nam ficam em
fi neílescazos , ou arrebatados do odio do inimigo , ou do
amor da carne humana, ou do apetite da honra , que cui-
dam , ganham em femelhantesados. Ia chegaua aíer pre-
fo cm cordas o pobre Goayanâ , ja corriam os brindes , ja
fe apreftauam as velhas repartidoras , que hauiam de fer das
carnes do trifte padecente, fegundofeucoílume bárbaro:
Procurauam fogo , lenha, panellas,em que cofelas : Ia fi-
nalmente feenfeicaua aquelíe valente triumphador , que
hauiade fer oqueobraííetamilluílrefeito Senam quenefte
tempo fentioo defcomedido , & arrogante Principal a força
deeipirito de lofeph, que junco com a |de Nóbrega, qu6
alFifeachaua, depois de tentados fem efíeito os meios de
brâdura,fora5 os primeiros Religiofos refolutos, que quebra-
ram as cordas, largaram o preío , afugentaram as velhas,
desfizeram o fogo, quebraram aâ panelas ,& talhas de
vinho : E oquc mais efpanta , fenhorearanifc dapropria ma-
^a, ouefpada, com que coílumauam efgrimir) ferir, ôc
matar neftas occafioens , & he cntreellcs o fumnpQ^dos
aggrauos efte.., ohrfT^h-^ríç "5^ . ^h fhcih
(ro-írAquife deupor afrontado o bóm Principal Martim^^f^ii^^»»
A ffonço, gritou yaíTouuiou ,bateo oarco , & opc 5 apelli-M*rtimAf*
dou os feus.&amiaçou, que lançaria de fuás terras gen te que^*^"^"* "*
namdeixaua deíafrontar de feus iniíftigos hum Principal.
Pretendeo tornarão intento , ouue huma fouce as mãos ,
& quis obrar com ella a morte , que com a efpada nam po-
derai porem lofeph, ôc feus diícipolos lha tiraram da mão;
E o fim da tragedia foy , que quando fe eftaua efperan^o de
hum Principal aggrauadojôc vafalos tam inconftates hum
grande defatino , a vifta da força do eípirito, & eloquên-
cia , efpecialmente de lofcph , que lhe afeaua o delito , que
cometiam homens ja da Igreja de Deos, o Principaljiôc,
todos cllcs voltando as cofias fe foram como enuergonha-
- - E dos
.a- J.ia
Í4 Vida úo P. los iph de Anc hi éta,
dos iweter em fuás cafas .- £ patfeílo^o furor cahiramtío
mal ,.<jue'fafiam*3&:foramláíicarfeaos pG5 dos Padres*
Dêftes ettibiift es nam fahio bem o inimigo.Traçou porem
outro impedimento de maior conta , & foyamorte deí-
bumana de hum dos mais incançaucis companheiros y que
tinha a efcòla de lofeph. A cujo fentlmento dedicaremos
o feguinte capitulo^ qudnam cabe cm pouco papel, per*
vdatam grande, ^ri.fir -^ í;ueílsiqso^
ílM '
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1ÍH : .
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CAPÍTVLOVII.
Monewmurofa do Irmam Pedro Gorreã ^eflw
dante 5 hum dos mais Tèruofofos díscipoíos dé^
Z,Jpfeph^ & de (eu companheiro laam de SoufiÚ
Trifte /ôc junicaiiiente alegre cafo da mor^
tedo venturofo Irmam Pedro Corrêa-
eáudante . difcipolo de lofeph de Anchic->
,^^^,^, ta *& de feu companheiro loamdeSoufaíi
tiraTei d^ que tenho efcrito,&auerÍguado,.(fe bem com
<«^^^'^^â mudança , & breuidade neceíTaria ) no tomo primeiro
^<^:Lí^ Chronica deíle Eftado , porque em huma, ôc outra parte
s «««. 170. i^ç neceíTariamente dêuida ^ alii , porque fam annaes do.Bra»^
fil , aqui pc^ue bebida de lofeph , & «fta a prenda íua.
Biaisamada, • :^^^ ^^"^-^ ; ,.rii o^ieí^oí ' ;'->-,^^-i^
^ <if iD^ixados agora outros motiuosTkntos-, quecperaíCttáS
Mifí^niapoma o Padre lofeph, ôc eu moílrti no lugar/da^.
Ghrònicas citado j oprincipal foy o fegumtc. Auia^guer-t
^as acefas entre aquel\asdmsnaçoens. Tupis, &Xan)os
dos Patos, deílTuindofe, & aíTolandofe huns aos outros.: h.
era brande incoueniente efte pêra os intentos da coinieríatn,
da fé & fò Corrêa poderia acabar com eftes bárbaros íà
depofe^cm os arcos,ôc fe rcndeffema f^poreftcfim.alto^
Principal
n^oriuoda
niíTam»
LivkoI.Cai^. VII. 35
de outros , Sc fe refolueram os Padres , a mandar ao Ir-
mão Pedro Corrêa a cílaglorioíarniíTam , con6ando del-
k , que comÍLia grande eloquência , & feruor do eípirito ,
íahiria com cmprefa tam dezcjada.
\ Pêra eílamiílam pois , foy auiíado cÕgride jubilo de fuarw^^íj-.-;
alma, ( rorquc eíles eram íeus mais eítimados empregos ),.«.,7o.
Partio a ella cm 24. de Agofto dia de S. Bartolameu do;^^;^^-^-^^
annodeMSf. tomando a bencam, abraçando , &: delpe 49.
dindofe defeus Irmãos, Meftre , ôc diícipolos, ^^m ia-^^^^^^^,^^^
<»rimas dealegria, ( que parece lhe adeumhaua o cora-^^^^^^e 1554»
eamaboa ventura, que por aquellas matas lhe tinha
guardado oCeo.) Acompanhoao , o irmaÕloamdeSoufaChega^;^^^
coadjutor. Chegados ao porto principal dos Tupis , f erapis.
cntam , o a que hoje chamamos Cananea,)entrou pregando
á aquella gente, & comfua graça , & eloquência catiuouAkança p>-
os animos^^de todos Tratou logo da paz , ôc negocio da fé,^;"/^'.^^^; ^*:
&L deram palaura de huma , & outra coufa , õc de fazer^i^.&de
hum lugaríeparado onde todos podeaemajuntaríeaouuirj^i^^^^fé. ■
a doutrina Chriftam. E o que he efpanto , chegaram a^^^^^ ^^^^^
entrregalhe os catiuos , que tinham ja em cordas, como a en-^;'^'^^^ ^^^^
gordar pêra pafto 5 primor mais raro . a que podia chegar tr^cdks^hu^m
eílanacam. Entre efteslhederanihumCaftelhano, que ti-^j^^comer.
nha vitido com os Carijós contra elles â guerra. :
4 Partio daqui oirmam Corrêa , ôc depois de largos, cheg^aj^rra
& afperoscaminhos, chegou a terradosCanjos • E como&ac.b.com
era tam conhecido feu nome , graça, & eloquência , ^li^y;^;^;/^^,,
ouuiam de boa vontade feus fermoens , & vieram em.
tudo o que pedia , aíTi das pazes dos Tupis , como
de recebera doutrinada fé. Pós fe outra ves em caminho ,
comintençamde tornar aos Tupis , com a boa noua d^a
paz , que c5 elles querião os Carijós, a aíTentar as condições
delia , ôc introduíir de efpaço â pregaçam da fé neftas duas
naçoens. ;> ííí.^í. .
5* Senam que fam incomprchenfiueisosjuizosdeDeoS}
entrou aqui o mimigo infernal , inucjofo de tam grandes
E ij principi-
li
V
IDA D O P. I O S t PH A k C H I E T a;
«fiií\ P^^^^^P^^^-' Aniotinoudeimprooiíoõs Bárbaros contra as
■fcfoiucn-.íe
cm inatáí os
Irmaós por
inducçam de
hum Cíftc-
U
Pregadores da verdade , & decerminaramfeemdar a mor-
te aos que pretendiam darlhes a vida, A caufa detam gran-
de variedade, hecerto , que foy hum Caílelhano , homem
peruerfo,queallife achou como írmam Corrêa. Qual
cfte foííenanvhe tam certo , porque huns dizem que foy
hum EÍ|)ánhoh que o Padre Manoel de Chaues de noíTa
Companhia Hurara das cordas, & dentes dos Tupis, Ôc de-
pois de hure apartara de huma Índia , com quem andaua
amancebado: Eque pelloodio que tinha aos Padres da
Companhia , fes matar eíles dous innocentes, achandofe
nefta occaíiatn.
6 Outros dizem , que foy aquelle mefíno Caft elhano,
que o Irmaõ Pedro Corrêa huràrâ do poder dos Tupis, entre
outros priíioneiros , como vimosj&t^ue o mefmo Írma5
Ihetiraraaamiga, caufadofentimento. Aífi o efcreue Or-
kndino nas Chronicàs da Companhia, rí?;/'/*?!. imroi^., nu-
^còm^míir mero !i5. & o Padre Eufebio Nieremberg dos Varoens illu-
^mmlxi'*.'''" ftr^s abaixo citado. Oprimeiro parecer tenho por mais cer-
to, & pof ellc eftà o Padre loícph de Anchieta. FoíTe qual-
quer dosdoxis ; certo he^que impaciente aquelle pobre ho-
mem de verfe apartar de íua mâ conforte , ou por via do Ir-
mão, ou do Padre, cobrou tal ódio aos da Companhia , que
determinou vingar íeu fentimento nos dous innocentes, &
defacâulelados Irmãos : E como era fagas , manhofo , & de-
firo na lingoa Brafilica, mcteo aos fimples índios em cabe-
ça , que os Irmãos vinham por efpias dos Tupis ,feus con-
trario^ , & que conuinha tirarlhes as vidas muito a preíTa ,
antes queefperimentaííem cm fi as frechas , ôc dentes de kns
inimigos, Nam foram neceífarias mais palauras a gente ta5
barbará , & vâriauel ; facm a terreiro ,âppellidam gente ,
batem os pés , os arcos , & as frechas , finais de amotma-
dos , & arremetem ao caminho em bufca dos dous feruos
deDeos
7 Tinham elles chegado , bem fora do fucceffo , a huma
campina
L 1 và ol. Cap.V 11.
37
cnmpina» rezando fuás dcua^oens a pc, & com feiís bor- ^;,"í J„, d;
doensemas maõs, quando ouuiram alaridos de vozes, s.ufa.
que arroauam os montes vefitiios ,& de improuifo vecm-
fc cercados de bandos de Teus niermoshofpedes ^ & junta-
nienre de hum chuUeiro de íuas frechas. Encontraram pri-
meiro com o irmão loam de Souza, com hum cedinho de
pinhoens , pendurado do braço , viatico que auia de fer
do caminho, o qual vendo os bárbaros , conheceofeu da-
nado interno, ^ podo de joelhos, inuocândo os Santos
nomes de lefu , òc Maria , toy trcfpaííado de fuás cruéis fre-
chas, tè que caindo dcfmaiado em terra, deu o efpirito ao
Criador.
8 Tudo via o Irmão companheiro Pedro Corrêa 5 õc em
quanto duraua aquelle eipedaculo fanguineo . prégaua em
aha voz , reprehendendó tam grande defatino com aquel-
lafuâcoftumadaeloquencia , que abrandaria os mais da-^^^'^'^^^^^''
TOS penedo:,. Porem nam eram ja ouuidasíiaas palauras , néCoaca.
cramaquelies coraçoensosmefmos 5 trocaramfe em cora-
çoensde feras 5 endurecera os o fogo ardente do ií)fcrno.
Carreira logo fobre o cordeiro maço húa nuue de frechas, Ôc
feitoo corpo rodo em humcriuo ( qual outro mártir S.
Sebaftiam ) paliado o peito , & entranhas, nâm pode terfc
cm o bordam, caindo de joelhos , leuantândoas maõs ao
Ceo.rompeoaquellaalmaditozaasatadurasdacarnemor-
tal , ôc voou a terra dos viuentes , por quem auia tanto
fufpirado , & padecidonefte deílerro. Ficaram os corpos
defuntos no mefmo lugar do martirio , pêra ferem comi ^
dos das aues , òc feras, & ficaram alli até o dia der-
radeiro feus oíTos em teftemunhode tam grande maldade.
9 Foy o Irmão Pedro Corrêa no feculo de geraçam no Qu-mfb^^^^^^^
bre , dos Correas do Reyno de Portugal. Paííoufe ao Brafílcr*"'
naquelles principios na Capitania de S. Vicente, &foynel-
laomaispoderofo dos moradores. Gaitou muitos annos de
fuavida , acommodandofe ao modo de viuer do lugar,
falteando , & catiuando índios por mar, ôc por terra ,dc
E iij que
^occe*
et:--
38 VíDA DÓ F. lÕSEPÍí ÂncSiETa;
<]U€ enriqueci rfuacaza.Nam entendendo agrandeinjarliè
que niíTo fazia àquellas creaturas racionais, por natuf
reza liures ^ aoces parecendolhe fazia íeruicoaDeos , com
capa que entre Ghriftãos poderiam redufirfe a Chriílo.
•Chegou âquella Capitania o Padre Leonardo Nunes no
anno de 1340. E ouuindo Pedro Corrêa fua doutrina , ôc
asrezoefis com que eftranhaua aquelle modo de viuer , de
fakcar , & catiuaros índios 3 como era homem capas , ôc
bem enccfidido , fez nelle tanta impreííam , quedehberou,
nam íò deixar o officio, mas com elleomundo , & dedi-
xarfeto4oa hum perpetuo íacrificio , entrando em Reli,
giam. lulgaua que fò dcfta maneira poderia pagar (eus pec-*
cadòs. Tratou com o Padre Leonardo , foy delle com ef-
lEnmnaCõ.f€ÍtofeceÍ)ido na Companhia, ôc foy femelhãce íua conuer^
famâdehumS. Paulo j porque foy iníigne o zelo , com
que tratou os índios ,dalli em diante padecendo pwlla li-
berdade de íeus corpos , & vida de fuás almas , fomes ,
fedes , frios , calmas , malquerenças , perigos de mar , &c
de terra , & todo o género de trabalhos ,com conftancia
ÚQ outío Âpoílolo das gentes. Foy ouuido dizer muitas
vezes , que nam poderia alcançar perdam dosgrandes ma^
les que tinha obrado contra os Braíis , fenam empregan-
dofe todo em feu feruíço até morrer, Aííi o cumprio 5
porque finco annos que Ihereíloude vida , foram outros
tantos que teue de catiuo dos índios. .1
- 10 Nam podem contarfe facilmente os fertoens què
fuT^ df qucí^^^'^**^^ ' ^^ mares que nauegou, os rios que paífou , as bref-
cia , & !,n- nhãs que rompeo em bufcâ de íeus amados índios. PaíTou
g a o ra \* jj^^j-^pj^Q aos Arraiais dos Tamayos , as terras dos Tupis ,
ox^-^Kí-íiC dosTúpinaquls , dos Carijós: Sufpendeo feus arcos, 6c
r^n niuito mais feus coraçoens , o grande efpirito , & eloquên-
cia de Corrêa. He coufa aueriguada , que foy o melhor lin-
goa daquelle tempo : Dillo efpreíTamente leu Meftre lo-
feph , éc que era tal a corrente de fua eloquência , que em
começandoafalarfufpendia os ânimos. Entrauapellas ca-
^ . i - ias
laote
.ATri LivKO IC A P.VM.' ^ . 7«5
fas dos índios, pregando , como entrara pellafua , ainda
quefoflan gentios. A prcgdçam era commummente de
noite , ôc fuccedia começar , ances do meio delia, & acabar
alta manham, ícm que alguém dormiííe. Com eílc dom,
& ícu grande eípirito nam podem redufirfe anumeroos
muitos que trouxe de feusfertoens ao grémio da Igreja:
Os muitos que caihequizou ,que bati^izou , que curou,
òc liurou da morte .^
II Foy difcipolo do Padre loreph , nam menos na ar- Foycftud-_._
te dagrai^matica, que da virtude 5 &c de íua claíTe % d>^;p;'° «*«
mandado por obediência a efta vitima, ôcdiíofa miflam ,
& nam foy coadjutor temporal , como efcreuc o Padre
Baltezar Telles na fua íegunda parte das Chronicas
i/«. ^ cfip.^2 num. 13 enganado paréci£> ou de que nam
cheaou a fer Sacerdote , oudos officios baixos » que no
íeruiçoda Companhia txercitou por fi^a humildade; o cô-
trariohc certo : Dilloeípreíramentefeu mefmo Meftre lo-
fcph por ettas palauras. Cornepu o irmão Pedra Corrêa o
ejtudj dx grammattca com mmta àiltgenau , çffermr^
por ftr ordem da obediência , ^ com Zielo das almoi , pêra
foder fer ordenado y ^ empregar femats emfiuferuifo.
12 Sabida a morte dcfte Santo Irmao em Piratinitiga , piiotoi qoe
ouue planto geral entre os índios í Enchiam os montes os^f^^^j^^^^p*^^^^:
fccosdefeus aislaílimofos : Ia mais fizeram a fcu modo ex-tiMog« peii*
equias mais fentidas 3 nam faltou pregador ;Ao redor doSp^^g^^ot. '
triftes enojados, andaua hu dos mais ôfcolhidos ,ôc eíle em
vozes altas fe queixaua aíTi: AondeeftàonoíToPay ? o noffo
Meftre? o noílb Pregador/ Aqtaellô que com fua cloque-
feia íufpendia por inteiras noites rioífo fono , & noíTos co-
raçocns .'=' Aquelle queera medico de noíTas enfermidades, :^
& coníolaçam em noíTos trabalhos ? Aonde cftà ? aonde .í^.iÍTí
eftà preguntauam a íeu modo âos caminhos , aos montes,
aos rios , aos defertòs , que feito he de noífo -Corrêa ?
chamauam cruéis , ingratos » aos coraçocns, aos braços,
& aos arcos , dos que íhe tiraram a vida , 2c a nam ferem
t. Chriílãos
sg?
I
m
c4ô VipA SÓ P.IÕSEÍPH Anchieta;
íChriftãos, alguns delles ,& todos difci poios dos Pa-
dres, armaram fuás frechas contra gente tam fera.
%em (of o n o Irmão loam de Soufa foy também dos primeiros
^Ti^uzlr"^^^^^^^^^^^^ Capitania de S. Vicente, ôc dos primeiros
, querecebeo na Companhia o Padre Nóbrega. Porem fuás
: virtudes liam pertencem aqui onde tratamos , principalmé-
jed<3,humdifcipolodeloícph. Deftes dous ditofos man-
cebas efcreueram o Padre Nicolao Orlandino na primei-
sícfií^oAa-co? ia parte das Chronicas da Companhia //«. i4- depJe o ní
'^«|*^5^»tf'H8- MaíFeu&.,i^ da índia. O Padre Pedro
ímchtom, 2. de feu thczouro Indico hu. i. cap, 24/0
Padre Pedro de Ribadaneirana vida deS. ígnacio r^íp-n,
,0 Padre Sprnelo na vida da Virgem Senhora Noífa cap^ 20.
O padre Balthezar Telles nas Chronicas de Portugal part^
i Xé Im, s.cap, si. o Catalogo dos Mártires da Companhia
de lefu. António de Varconcellos na defcripçam de Portu-
gal. O Padre Eufebio Nieremberg r<?/». 2. dos varoens il-
vluftres da Companhia. E primeiro que todos o Padre lo-
fephde Anchieta em km notados ma nufcriptos.
4^„.CAPrTVLOVIII.
lesque efcrc
U6ram deftes
Santos Ir-
mãos.
-íil to msiiSB
;,!'' ,'*f « £)(jí piaUdmipoiosdaejcolade lofeph alem do
■-'•'^''""*'"-'^''" Imam Pedro Coma. ' ' '''"P'
.20Í.52SJ
a07
1
t>oi mtis dif'
cipolds de
Zofeph.
Os quekrcm ahiftoria fentidiíílma do iní
figne Irmaõ Pedro Corrêa humdosdozç
difcipolos de lofeph, he natural , que ve-^
nha logo ao entendimento o preguntarnos
que feito foy. dos outros condifcipolos de humaefço?
!a tam fanta , tam afamada, por cujo meio obrou
Peos nas almas tantas marauilhas ? porque , (como
idiíTeram dos fagrado? Apoílolos , alguns zelofos do efpir
fcW,^jÍiÍAÍ •»!'*
rito
LiVR oT. Cap^VíTI. -#i
rito) pêra maior edifícaçam , í<: confufam nofla, duuc-
.ranios de inquirir , & notar com letras de ouro , nam í6 a
fuftancia das peííoas deftes grandes V aroens ; mas todas fua-s
acçoens,circunílancias , intentos 3 que caminhos andaram^
que íertoens penetraram?que matas romperam.'' que almas
couerteram.^ porque eípertaffeo grande inceadio daquelles
tempos, o menos feruor dos de agora. • r^:^ - *:? «o^^ íi-^nj
X Nefta matéria porei a que pude colher dos efcritos de
Anchieta Meftreíeujooutrolrmao (diz loleph) que con-
correo a pouoar Piratininga, foy Manoel deChaues , o qual ooirmaó
notempoemqueeftudaua , (oque fazia com diligencia grã- ^^^"^^^^l^^^
diífima ) como era hum dos principaes lingoas, & mais a- fcus eocomios
creditado com os índios , juntamente feoccupaua na cultu-
ra dellesj vifiraua de ordinário fete, ou oito Aldeãs a pé ,
tíift antes três, & quatro kgoas , enfinando , cathequizãdd,
bautizãdoíemqueadureza,& ingratidão dos corações ín-
dios foífe cauraperaenfadarfedelles.Emoutraparte diz.que
'údãc o ponto defua conuerfam à Companhia, fe deu efte
irmaõ por dedicadoâ dos índios de Piratininga, com tam
grande feruor de efpirito, que nenhuma outra couía cui-
dauamaisdeíeu goílo: Acujo proporitotrasocafoíeguin-
te , que lançandolhe emroílroreus'filhos, parentes, Ôc a-^^troi cx|-
rnic^os a demafia com que fe defprezaua por feruir aos índios:
Por dar repofta dehuma ves a eítafua queixa mundana 5 en-
irou na Igreja hum dia de concurfo, onde os principaes , *ibnsqlíi?.
parentes eftauam , & paíTeando pello meio deites, hia can-e
jandoem alta voz, como zombando, aquelle prouerbio
antigo Deulhe o vento no chapeiram, quer de quer nam.
ífomolançandolhes em roftroo pouco caio que fazia , &
íeue fazerfe do mundo > & de feus primores , com as
fluaespalâuras fomente ficaram os parentes eonfufos , ôc
jreprehendidos. -. . :• O'.; '^bV'ò*^^r;aH zonr. -
73/, Foyaquellerefolutoferuo do Senhor, que atropel-
Jando dificuldades, caminhos afperos , & carrancas da
inerte, penetrou as brenhas, õc entrou na Aldeã guerreira,
f onde
#00 800'»
^^#f ViDÀÍDOP. T'0S>PH ANCHIETA;
onde eítâua aquelle Caftelhano , ( de quem difíemos qtíc
foracaufada morte cruel do írmaõ Pedro Corrêa ) poftõ
ttn cordas a engordar, pêra fcr comido em íuas feftas, fegu-
^ofeu ooftume gentílico , por fer apanhado em guerra 5 Sc
fendo couza tam difficultoza, & chcade perigo pretender
cftrouar femelhantes exccuçoens , que clles tem por de
tanta gloria jaífi falou , Ôc com tal eloquência, que fuípé-
^co os ânitnos , & alcançotj de todos que fe lhe entrecraíTe
foko, ôcliure, oquc era ja condenado a paílo defeus^en-
ires»
jbftiros, 4 £ftc trâoqíáeâtraueírauafertoensarperrimos, ape-
% de fomes , frios , geadas , rios , & feras , a fim fomente
ée refgatar gente Chriftam , ou Pagam , dentre as naçoens,
que tinham guerra com os Portuguefes . & nella lhe
leuauamcatiuos, filhos, molheres , & parentes > com
perigo da vida, & almaj ocas fêmeas com perigo mais cer-
to de deshoneftidades,queconiellascoftumam vfar eftes
barbaros,em vingança deíeu inimigo. Deíies catiuos depois
de liures vinha acompanhado efte zeíofo feruo do Senhor,
comellcserttrauaem pouoado , ôcasmolheresdaua a feus
4^5 í- niandos , os filhos aos Paes , & ospagaõs meninos encom-
- itiendâua emcazâs virtuofas, pêra que os criaífem , ôc dou-^
trinaffem.
iSuípendiâ oi'?"t ' Efte finalmente , erao quc fufpendiá os arcos ^uefr
LXtf. ^^^^^^* entre os índios, & Portuguefes 5 nunqua ja mai^, em
quanto efteue em Piratininga , (foy por muito tempo, diz
feuMeftreíorephy'fe abrio guerra entre huns , & outros $
auendo caufas , & aggrauos que asfolicirauam 5 porque
entreuindoo Irmaõ Chaues, & ouuindooslndioso pe^
2o de fuasfézoens , aplacauam os ânimos , & fofriam ao^-
grauos Hamafò vez fe aufentou , & foy mefmoque rõper?e
guerra^quecom fua prcfença depois parou^durando a pàs por
todafua vida, ôcacabandofe com fua morte 5 tudo teílemu-
tiha feu Mellre. JEeílefoy ofegundo difcipolo da efcolade
^^•^^ ^ loí^ph.
Lívido I.C Aí»: VIÍI. iV
■43
lofcph, & defte diz em diucríos lugares, outros enco-
niios grandes. " ibíaiui'
,6 O terceiro Difcipolo delofeph, que com elle co-Doirmaô
niecou o eftudo , òc trabalho do nouo Collegio , foy o^/;^^^"*^
JrmaõGreoorio Serram dos mais adiantados, f como í^us encómio»
.teftemunha íVu Meftre , ) em feruor de efpírito ; E que
fendo ainda Irmaò ,com occupaí^^am do eftudo, tinha cui- /"'x»'*»»
•dado de huma das Aldeãs dnquelles campos , juntamente
com o Irmão Manoel de Chaues , afimdeeftudara lingoa
&c ajudar aos filhos dos índios , noscoftumes da fé , ler ,
.'cfcreutr, ôc cantar. Aos Domingos , &: dias Santos eram
focorridos de hum Padre , que lhes dizia Miíía , & os cõ-
fcííaua , ou vinham elles pêra efte effeito , juncarfe com
os demais Irmãos , à pé, 5c defcalços , com aííasde tra-
balho, & frios dos caminhos: Que aíTi fe criauam neftes
b( ns rempos, nos menores trabalhos , pcra os grandes. E
dcfta efccla fahio depois efte Varam , também adeftrado
nas cauzas do efpirito , que toda a Prouincia aferuorou.
Foy efcolhido por Procuradora Roma por íuas grandes
partes, por Reitor do Colícgio da Bahia /cabeça da
Prouincia , quafi por vinte annos , & íeuaua aposíi os ani-
mes namfò dos íubditos , mas de todos os com quem
trat aua, de cujas virtudes emparticular agora nao tratamos. ^ ;,,v
7 O quarto foy AfFonço Brás , aquelle fendo difci- AfFo^oèirti
polo ,diz delle lofeph, que foy iníigne entre todos os ou-*^. ^^"'^^so:
tros , no feruor, Sc trabalho, com que ajudou as obras das
cazas dos índios , naquella primeira pouoaçam : Elle Í2iÇ\2iChroK. uu. t
os petipés, trraçaua paredes, lauraua as madeiras, comfua'
enxó na ma5 , fem que nunqua o tal officio aprendeíTe ; El-
le era juntamente obreiro com os de mais , trazendo os
ceftos de terra as coftas , a agoa da fonte , & o mais necef-
fario , prezandofe dos trabalhos de Chrifto , por ajudar
aquella gente miferauel. Foy o primeiro Superior que ouue
na cazada Villa daViâroria da Capitania do Spirito fanto,
aonde , ôc emdiuerfas outras partes da Prouincia, foy co-
'^-' • F ij nhecido
num, zoit
;flf1?T oCF'
Í-O M \
'It
#4 V í D À DO P. I O st 1>H An C H i e t a ,
nhecidofeu grande tão de faluar almas j que remeto â
hiíloriadas Chronicas, ;
5u)^'o"i*aco- ^ Q quinto Difcipolo foY O írmaõ Diogo íacome ,
Mç, & feuscomparílieiro primeiro do Padre Leonardo Nunes, ôc nao
ençomiôs. Çq^^^^q j^^ fírjiraçam deícu grande ^élo , òc trabalhos
cw /,». naCapitania de S. V icente. Dtlie teftemunha feu Meftre
^^'?4 «. 68,<jue tinha entranhas abrafadas da íaluaçam das almas , que
'Sa7chí»?p, ' j" por elks defprezou os Colleglos de Europa , & fe veio me-
clrc'f'de^^^ ter nas brenhas da gentilidade Braíilica ; Foy aqueilc^que
PortHg.i^^ I fnandadt) depois a Capitania do Spirito fanto, tcue aill
í« j. '^^^lo cuidado da Aldeã do afamado Principal, por nome ogram
Gato , em a qualhauendo trabalhado incancauelmente na
culturadaquella gente barbara , quiso Ceo apurar no fím
da vida Tua paciência , com huma pcfte deshumaea de bt*
xigas , que dcceofobre aqutllas Aldeãs. Té que canfado ,
Ôcconfumido do trabalho d^ curar , preparar, & dar à
terra mortos , entre triílezas > & efperanças j clamando ao
Ceo deu a alma a feu Criador. Vejamfe nos aponta-
ínentosde ftu Meílre loíeph > na^ Chronicas do Brafil , ôc
mais lugares a margem citados , os grandes encómios de-
íle feruodeDeos.
iDoirmaô 9 Foj O Tcxto Lconardodo Valle, ftgutido nouiço
vXVaTfcw '^^c^t)ido etnS. Vicente pello Padre Leonardo Nunci ,
en^^emios. 0^35 entre os primeiros em feguir Teus exemplos ; com elie
entrou nos fertoens , conuerteo muitas almas a pé , quaíi
defcalço , com alpergatas feitas de cardos brauos , que era o
2 . couro daquelle tempo , iníinando a índios , & Angolas pel^
*' " las ruas , & pedindo o fuílento da vida por efmola , de por-
ta em porta. Efte foy o fexto Difcipolo dàquella efcola de
lofeph , ôc profeguio neíla conformidade , fegundo o fer-
Uor, Ôc çfpirito dellaaiéo fímda vida.
GíVarLou- ^° ^ feptimo foy o Irma5 Gafpar Lourenço Pay
ren<5o.& feusdos Iitdios ,rio dc eloqucttcia Brafilica , cujos echos fòaram
encómios, ^jj^ j^ p^^ muitos atinos depois de fua morte , nos fertoens,
chren dtBraf.^ brenhas mais remontadas , como moflraramnos lugares
if ^^•/'•'^^ ^^ jjjargem ,onde fe podem ver O
•í[ i
Livno I.C A p VIIT: 4$
Tl O Irmão Vicente Rodrigues foy o outauo defta
efcola aquelle fcruorolo Miliionario , de quem primeiro viccmc Ro-
o mcímo Meftie aprendeo , logo c]ue chegou a Bahia, ;^;;g^"^^»^^
huma traça , té entam nunqua viíla de bautizar em perigo mio»,
de mortes ^ ^7 a feguinte. Em huma Aldeã da Bahia ^^^^^^^^^^'
tinham os índios prefo em cordas, & poftoaceua pêra ma-yí^f^^. i*». »•
tarA comer em terreiro comas ceremonias, òc leisdefeus'^^-
ritos bárbaros, de queja faleioutra vez. & por ventura def-
creuerei, quando mais forçar a hiíloria : 7 eue noticia o
Irmaõ Vicente Rodrigues do dia da fefta, ôc antes delia ,
nam confiando de fi , poder auer o prefo do Principal ,
que era gentio , & foberbo -, contentoufe com alcançar po-
der falharlhe por interprete, preparou-o, &c inílruhio quan-
to era baftantedas coufas da fé Porem quando quis bau-
tizalo, achou repugnância no Principal , que com feuera
prohibiçam, mandou aosfeus , que ninguém deíTcagoa^.
tendo perafi ( fuperftiçam infernal , que o diabo lhes me-
teo em cabeça a efta gentilidade ) queaquella agoa dofan-
to baurifmo embora o godo âs carnes , dos que fe bauti-
zam.Trifte cazo ? conhderaíe o Irmão Vicente perdido o
trabalho, òc fim defeu caminho. Porem acudio o Senhor
a feuzeío; porque tornandofe ja . encontrou huma índia
coiii hum cabaço de agoa a cabeça, pedelhe de beber , a
molher , que ignoraua a prohibiçam de feu Principal , fim-
plefmente lhe deu huma pouca de agoa 5 nefta enfopou o
zelofo MiíTionario hum lenço , ôc fc foy íém íofpeita ao
Tapujà, que hauia de padecer, ôcefpremendolhefotilmête
o lençoíobrea cabeça, juntamente com a forma daquelle
fanto Sacramento , odeixoubautizado.ôc ganhou aquella
alma pêra o Ceo 5 & efta he a traça que aprendeo lofeph de
feu difcipolo , antes de ler feu Meftre , motiuo de maior
aíFeiçam.
12 O nono, decimo , & vndecimo Difcipolos da-
quellafanra efcola de lofeph , nam acho nomeados por ellc 2°"^;^ Dic!,
cm feus apontamentos Mas fegundo colho de efcritos an-cipoiojdcio-
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4g V 1 D A b o P.l o S E p kO A IT € íi I E T A-'
t) v.Bm çjo-os , forao o Padre BrasLourenço ,& c» In-nãoslóão Gon-
>cíia5j..ioamíaiues, oc AníonioBLalques Caitelhano , companheiros que
A^íltSo^Slí íiíiham fido de fuás viagens , aílim de Portugal a Bahia ,
^Qcs- como deílâ Cidade a S Vieence 3 parque feito computo
,^ dos Religiofos , que nefta Capitania fe achaoam, quando
^ partió a fundar eftudosem Piratlninga , he forçi qu e fof-
femcom elle eftes três pêra complemento do numero de-
feus difcipolos . E he certo que trabalharam neíla parte com
o zelo , & feruor dos mais.
13 O vitimo , & duodécimo foyo Padre Manoel de
oÍM^noe7Paitiá, de quemdà teílemunho feu Meftre, que acabou
dePaiaa. ^|j| ^q tftudar latim * & ficou nelle confumado , fendo.
Mephpa .1X3 juntamente Superior dos mais > & dando exemplo a todos
na cultura da faluaçam dos Índios: De tam raro feruor
nas pregaçoens, quefuccedeo pregar por muitas horas hu-
mâpâixam toda de joelhos ,fem que a força deefpiriro lhe
deíTelugar , a fentir o trabalho.Que por tirar de occaíioens
de peccados aos homens, fofreo por muitas vezes , afron-
tas , Ôc injurias graues, com animo, & valor Apoftolico
Que nas guerras dos noíTos contra Tamay os, onde dmer-
fas vezes fe achou, andaua intrépido entre nuuens de fre-
chas , com huma cruz na mão, com efpanco dos que pe-
kjauam ainda inimigos , fem dano algum. De tam eílre-
mada obediência , que confentio andar em pregam, nas
praças da Bahia por mandado de feu Superior Manoel de
Nóbrega , pêra fer vendido , ôc com o preço focorrer a
neceííjdade dos Religiofos : Quefoy mãdado laçar a rodar
por hum mote Íngreme abaixo , & o fez com fumma prom-
ptidam, a te parar âvoz do mefmo Superior, fem oíFéça al-
gua. Eeftes eram os difcipolos daefcoladelofephde An-
chieta dos quais quis dar efta breue noticia porque fe veja
quam bem empregados foram os fuores neíla primeira
parce de fcus trabalhos^
IivròICapitvloIX.'
T'
A7
CAPITVLOIX.
De algumas coufcumtaueu que aconteceram poT
ejie me [mo tempo ao Irmam lofeph.
E celebre o cafô da Bullâdolubileo da Al- ;^
I deade Ibiràpuerà. A efta Aldeã concorria Milagre ceis-
no dia do Orago da fefta, copia de gente^^^ <^* ^""*i
Portuguezadas Villas de S. Paulo circum-^^^^^^^
uefinhas. Eftauam as V^efporas da feda , quando aduerti-
ram os Padres , que faltaua a Bulia do lubileo , que vie-
ra de Roma, Ôc fe dcuia publicar a manhãa feguinre :
Que fariam em fucccíTo tam duro ? neíle trabalho acudio
loíeph , aliuiando aos Padres , & oíFerecendofe , a ir buf-
caia aS. Vicente ,onde ficara. Era o caminho de quinze -
legoas , como diííemos muitas vezes , fragofode áfperas
ferranias , hiafe acabando aquellc dia , & na menham fe--
guintehauia de fazerfeafefta, z5baramosquenamconhéi'
ciam bem a lofephdo dito j porem ellepartio junto a noi-
te, &: quando chegou na menham feguintea hora de pu*
blicar a Bulia , eílauâ com ella na Igreja com efpanto de to-
dos. Ou foíTe que neíle breue tempo andaífe trinta le*
goas, que tantas hauia de ida , & vinda 5 ou que algum
Anjo lha adminiftrou no caminho , qualquer que foíTe,
nam podia fer fem milagre, -'••^^^'•' »'éi*v>i-iv ili^u zi^ n-j a^^j
1 Ajudando a abrir o caminho das ferranias dítás de S/j^^^^j^^j^
Paulo peraa Villade Santos , viram os companheiros com »"ebattdo
qucmandaua hum portento grande. Sahiohuma vez , fe-*""""^'™*
gundofeu coftume , a fazer oracam ao mato ao pé dehu-?mí/. ,
maaruore Jugar mais feparado do reboliço dos que tra-
balhauam : hntrou huma chuuà, & depois de algum
tempo , foram cm bufca delle , ôc viram que eftaua arreba-
'?i..
i.?È l
tDortepor
rnodo mik
4íjt ViBa Bo P. losf PH Dt JÍnCííI ETA,
tado dt maticirâ que ciiamando-o três vezes à vozes alca? ,
||áõdeu fé delks , nêdaciíaua , d^ qoe ficai am admirados.
3 Aiidaua mal encaminhado na Villa de S. Faulo com
certas aíFeiçoens hum Pedro Colaço morador no me*mo
k^gar. Era conhecido de lofeph, & dezejofo elie d^ feu bi
efpiritual. Sahio huma hora depois da meia noite a por em
himenídf ^^^^ ^""^ mâieficio.graue , foube-o lofeph , Ôc áquellas
horas achou Pedro Colaço no carhinho hum minino, que
da parte fua o chamaua logo > logo . que era cóufa neceíía-
. ria, ficou fuípenío oèomem ,â inclinaçam o ieuaua , mas
o mifterio do tempo ,& lugar o reprimiam Ouue de ir ao
chamado de lofeph, acliou-o no choro em oraçam. E diíMhe
•- ' ' fom^te eftas palauras.Eecolheiuos» rccolheruôs;rêcolheíuo^!.
Colaço : Ficou be^m entendido^ fello aífi.E vindo a manha
achou que eílauam a mefmahora efperando por elie dous
Íi,omen;s pêra matalô Enram acabou de entender Colaço
^ perigo em que eíliuera , & teue o minino por Anjo , ôc
ajofeph por Santo.
,4 Certa molher da mefma VÍllâ , viqiâ eftandolofa-
mence , mal amigada comhiim índio , fendo cafada ; E
com tanto çxçe ílb , que fogiocom o mefmo pêra o ferram
a ;feu marido , Òc fe meteo entre o gentio. Soube-o lofeph,
Ôc. compadecido da honra do marido > ôc alma da molher,
Víy to fertaô fçpos 3 ç^mínho , pcnctrou as brenhas , òc chegando aos
e^ufci^ índios ,Mcàn ella , Sc a elles com tal eloquência , & eípi -
iiutTja aiaaa tíio , que çonucrteo a peccadora , & perfuadio os eentios
a tazer j>azes com 05,ror<;uguezes , coufa mui dezejadaj ôc
comefi:is duas vidòrias, voltou a S. Paulo, nam menos
admirauel emhuma , qtie na outra 3 pois na primeira cor-
obfiV^fb .iera perigo > do mal amigado ; E na fegunda de tantos ou-
tros bárbaros, que qualquer outro ç^§ lofeph riam fora,^
.-^ ^ fariam pafto.de íeusvençres:^^ ^ ^^r^,.,]; «íí-n^
^ ,Na comedia , que, adi ma-diííemosj fizera a S Vicente do
c^fo dafufpençam da chuua.Çelebramfe algumas profecias .
«j.^çenxenanqs_ditpSídas£^ras,ôc peí::tpnci.am acadahua :
.k;*^5,í
LivroLCaKIX. V 49^ ^ .^^^
delis feaundofcueftado, que podiam reruirlhedeamfo, pe^^ - ^/:\^;
raemen^alos. Humadcftas figuras era hum Francifco Diasnosd.osa.s
Machado , homem de ruim viuer , a quem parece tinha
auifado fem efíeitode emenda : em parte de feu dito deziaPa.eu.figu.
aíS, pronoaicandolheocazotrilledeíuamorce..:,i/ .w.^a;
\ ^^taaemejik acabada ,.?^ ' rm-g^f i^
.j > .. ^TJaovatfe^fiUg^ndo, iObEn^.'
Ede(la ^id^,emcjtseando, -.Z'\r^'iÚ(i
Tor tantas cauz.<t5 errada , r.Ví^mnq ?.fi-b Brriu . .
Mep^dla^iarJamfammda;a^ohn,z^^lV:^l^:^^^^\-
Toís peccoportarítaí^ias: , . ríí^jíli-'
Tri/iedeFramfco Dío^l ..lvjuc':. ^^^-^^^
Namlhe/intofdtiaçíi^f^y
. ., Se qjos Áday da Concerfam^k^oh^^ ,-_^ { -• - ..:,!\si.'»í:t«i
( Nam pagais oa au^^rim. .<,.n:.-.. ^ -• - - .
Asauariasdeftaalmaprouâuelhe.queâsnampagouaVír*
aem , porque o que commummenie íedis, he que mor-
?eo maUefcommungado, & obftinado por muitos ânnos:.
E aal fe teuepor perdida , ôcie entendeo defta perdieam i
a profecia do Seruo de Deos . . ç,„nhj,fi„„^
6 Outra figura era Pedro Guedes , homem amance-S-gundafigu,
bado, & dcuiafercõeícandalo pêra cuja emendalhepedia.
lofeph.que cafaííe , naquella mefma Villa , pêra que tiraíTe o .
erc5dalo;comorupoéos relatores deite cazo.Aefte pois poti
bómodo prophetizou o fim futuro, ôcfeu dito era o íeguinte
-rj Virgem f tira , fou quem^edes^ -^ «^
Diante de 'VOS me "Vtnho, '- -,.„jt,„,2
dLUi ii. Tirai ,^os peço efias redes » ' ■■
^ioíiL^ ^ efle pobre Ter o Guedes . - ■ - ^
'S- - ■ E quantospeccadcs tenho; -y" ^^ o^-J
^rLm. r^^ enredado, ,>bn5)bdoio0id
£«f /;í'/ ^T-if^^ da perdiçam -^ cboJ loq , t^^m^^
-£mi3Í7 "^
i-iiil-i
nchieta;
4i| !
I
50 Vida d o P.Ioseph
,í Sj^em deixar o pecvadoi
£ f&rdmomcaZiado^
Nú Filia daCvncéfaWt,
Todos viam t}u€ loíeph {«fopkt!zo« ( fendo difficultofô
decreer ) porque Pcro Guedes infpirado .ao quepare^co
da Virgem, fe cafou logo na mefma Villa, com huma
filha de hum Heitor Mendts , com efpanlo dos que o co.
nhcccram , fazendo aadiânte vida exemplar.
7 Huma díisprimeiràsveíes que fobio de S. Vicenrc , a S.
^í^ f '"^^^^ anoitecendolhc no caminho , entrou m caza de hum
m.r buo^a Home Dl , fera paffaralli algumas horas : TraUou pratica
XfeH.Í^"'^^^^°^^^^^^"à.> q^enunqua dantes vira, nem conhece-
ra , ôc coni impulfo mais que humano ( ao qaedepois pa-
/m-V-ioLS-eceo ;ihe preguntoa como lhe hia , U como viuiaíref-
pondeolhco homem : Vaimc muito bem, porque tudo
meruccedeameugofto,52 fobejammeos bens dâ vida.-
5)0. deilas palaurãs deu fé o Companheiro , he ccttô que
viooSantiomâis doqueellcouuio ; porque fahio logo da
caza &diírenamheidêtílaremcaza onde nam ha ra^
mosdeCrnz. Piroposlhe entam o companheiro, dizendo
que nam háuiâ outra pouzada , que vinham canfados,'
era noirc , & o fim da jornada cftaua longe , que nam pare-
cia acerto , o que fafia .Porem loíeph confiante deu a en-
tender oquelogo viram : Eíby que alongados poucos
paílos, virando atras > apareceo a cafa feita em viuofogo,
& log5> desfeita em cinza , & com, horror grande do com^
panheiro,que entam deu por acertada a refoíuçamde lofeph.
8 Ia nefte tempo , fendo Jrmio ainda , era coufa pu-
seusrapto, ^ ' ^ '''^''''' ^""^ ^""^^^ Capitania de S. Vicente que
cmCsnà.o- íe arrebataua em extaiis,&c!eua^oensde efpiritoem fuás
"9oe.s.& oraçoens. Era tempo decantar, certo dia tinham tangi-
do a meza , nam parecia lofeph 3 bufcaramno em feu cu-
bículo batendo a porta, nam refpondeo 3 fizeram a mefma
diligencia , por todo o Collegio, nam foy achado ^ tornou
vitima^
MiíTas.
Livro I C AP. IX. St
vltimamente o Refeitorciro a feu cubículo , porque
lábia que namíahira fora , & abrindo a porta, vio o feruo
do Senhor íuípenfo do cham, couza de meio couado,
cem as maõs leuanradas em forma de oraçam ,tam alhea-
do dos íentidos , que de nada deu fc , comadmiraçam do
Irmam. Fechou a porta , ôc foy dar parte do que vira , ao
Padre Nobreza enram Superior, o qual, fegundo a experiên-
cia que tinha de lofeph , dilíe ao Irmão, deixaio eftar , que
depois comera, dando a entender que eílaua em melho-
res conuites.
9 Apagarafe huma noite a candea ao Padre Amaro
Gonfalues , fahiofora ao corredor do Collegio a ver fe a- «dmiaíX "^
chaua alampada, onde podeíTeacendella: Vio que fahiam
da camará de lofeph finais deluz, que reuerberaua > abrio^''*'^' ^•^"^'
a porta , & achou , que a luz nam era da terra , fenam
rei pland ores diuinos , fuaueis , admiraueis, que tinham em
meioenleuado , Ôc fora de todos os fentidos a lofeph, nam
fofreo o padre Amaro gozar fò de vifta tam agradauel ,
deu recado ao Padre lofeph Morinello , & ao Padre loam
Bautifta , entraram ambos no cubículo , viram, & goza-
ram do mefmo efpedaculo , & foram teílemunhas íide
dignas deíle fauordo Ceo.
G i CAPI-
■|t V í D À D^ P. I Ó^ E PH An C H ; E T A ,
CAPITVLO X.
<2ana do Irmam lofeph de An chiem tem os
enfermos de Portugal
'U
m
O R fim defte primeiro liuro me paréceo
trcíladar aqui huma carca que efGreueo o Ir-
mão lofeph aos enfermos de Portuga! , ôc
moílrabem feu grande efpirito : He a fê*
íguinte.
Pax Ch/tp. A gyàfa de Nopo Senhor ^os cm fole-,
canffímos IrmaÕs enfermos ^^n)os dê obras conforme ao
nome que tendes. Awten. la eÇcreúi outras t prtnctp alme-
te pelio Padre Leonardo Nunes , depois de cH]a> partida
chegaram áS'uoíf as , £Í nos deram grande confolaçàirti. As
nouas que por ca hây nas quadrimeftres fe veram larga-
mente '. Ne fia qmro fomente dardos huma noua ^ ^ he qm
Virt^s iniiifirrnitate perficicur, aqualfoy pêra mim a jf as
noua todo o tempo que ahí efime j rnmto tendes canjfímos
Irmãos , que dar graças ao Senhor , porqt^e 'vos fas partki^
pantes de fetts trabalhos * ^ enfermidades em as q^ats
mo(trou o ^ amor que nos ttnhai Kez^-^m fera que o Cir-
namos ao menos algum pouco i teyido grande paciência nas
enfermidades y ^ neflas perfeiçoar a Virtude, A larga con*
uerfaçamqaetiue né fas enfermarias , me fas nam poder ef-
quecerme de meus cariffimos coenfermos , de\ejando velos
curar , com , outras mais fortes mezjnhas , que as que la fe
vfamhforquefem duutda pello que em mim experimentei
níospoffo díà^r que ejl as mezjnhas materiais apouco faz^^m,
çf aprouéitah. "Vor outras cartas vos tenho efcritoja de mi-
nha difpofiçam-, à^quaicOfda diafe rénoua de maneira, que
nenhuma diferença, ha de^mim a humfam^ ainda que ai-
Li V RO I. C A p X* 55
çitmas veTes , nam deixo de ler algumas rei) c^ui ai âa4 en-
fcrmtdades p. f^^das ; porem nam faço mais conta delias
.aus fe namfojfem* Até agorajempre tenho e fiado em Vtrati'
ntnga , aue he aprimura Aldeã de Indtos , que efia de^
legoâs do mar^ tomo em outras cartas tenho efcrho , em a
qi4al efíarei por agora i porque he terra mm hoa , ^ porque
riam tinha turbas , nem regalos de enfermaria , muitas ^e-
2 es era neceffarío comer folhas de mofiarda cofidoi com ou-
fros legumes da terra , t^ manjares que la podeis tmagtnari
juntocom entender emenfinargrammaticatem ires claffes
dtíferentes : E as ^ez^eò e fiando dormindo me vem a de f-
pertar para faZifirmepreguntas 5 ^ em tudo ifi o parece que
faro y ^ affi he -^porque çmfaz^endo conta que nam eftaua
enfermo comecei a e fiar fam]^ podeis ver minha difpofi^
fam pellas cartas que efcreuo ^ as quais parecia impoffiuel
poder efcreucr efiando la : 1~oda a Quarefma comia carne
como faheis , ç^ agora a jejuo toda. O mefmo digo do Ir^
xnao Gr^goriOyO qual ainda que efta tanifam como eu , por
fer de mais fraca comprei çam , toda via nam quer elle
darme ave nt agem ; ao menos 'VOs fei dtz^er que pêra hum
negocio de importância , ir daqui a Piratimnga mui de-
preda , qi4e he caminho mm afpero , Ç^ fegundo creo o
peior que hano muniode atolladetros i fuhidas i ^ mÕ"
te , oefcolheramaeíle como mais rijo ,auendo outros mais
faos em ca7ay ^ ^ffifoj > dormindo coma cami\a enca-
pada em agoa ifem jogo entre montes 5 ^viuit ^ óc viui-
mus. Nç^t tempo que efliue em 'Viratimngary (eruv de
medico , ç^ barbeiro^, cubando i^ fangrando. a .muij^osda^
quelles Indíos , dos quais viueram alguns, de quem f ena
efperaua vida. , por ferem mortos muitos daquellas enfer"
miâades. Agoruejhu Orqui em S. Vicente, que vim com
nofo Padre A/lanoelda Nóbrega para de fpachar efi as cartas »
Demais dijio tenho aprendido hum officiccfuemeenfinoti
a neceffidade , que hefa^er alpergatas^ ^ fouja bom meflrs^
^ tenho feitas mintas aos Irm^ios , porque fe nam pode
-Ví.i Gil] andar
%
il'ííi
''W'
I4. Vida DoP. Tosfítt DE Anchieta,
andar por cÀ y com fapatos de couro pellos montes. Ijio tudo
he pouco pêra o cfue N. Senhor 'uos mojlrara quando ca vier-
des ^quanto a lingoa eu efiou adiantado ■, aí?jda que he mui
pouco ^ pêra o que foubera ,fe mp naÕ occuparaem lergram-
matica^ toda mia > tenho colegido toda a maneira delia por
nfte 5 ^ pêra mini tenho entendido quafi todv o fiu modo ,
nam aponho em arte , parque nam ha ca a quem aproueite >
fá eu me aprouetio delia , ^ aprouettarfcham os que de la
vierem > 65 fouherefn gram matica 5 finalmente, cartffimos ,
fèídizjer que jt o P* Mtram quiz^er mandamos a todos os
-que andais opHados -y & meio doentes > a terra he mui boa,
(^ficareis muifaõsi Js medicinas fam trabalhos i ^ tan''
tomelhores ^quanto mais conformes a Chríjio 5 tombem 'vos
digo carijjimos Irmaõs que n^m ha^a com qualquer fem^r
fahir de Coimbra^ fe nam que he necejjario traz,er alforje
vheo de 'virtudes acquirtdas , porque d^ verdade os traba^,
ihps que a Companhia tem nefia terra fam grandes i ^ avo-,
tece andar hum Inmav entre Índios > fets , ^ ftte mezjs ,
no meio da maldade , ç^ feus Miniftros , ^ femter outro
to quemtonuerfar fe nam com elles , donde conue fer fanto
parafer Irmão da Companhia « Namdigomais^fenam, que
aparelheis grande fortaleza inter/or , (f grandes deX^ejos de
padecer^ de maneira que ainda que os trabalhos fèjam mui-
tos vos pareçam poucos \faz,ei hum grade 'coraçam porque
nam tereis lugar pêra eftar meditando em vojfos recolhi-
mentos fe nam in médio iniquitatis > & fuper flumina
Babilonis , ^ fem duuida porque em Babilónia , rogoms
omnes > vt femper orecis pro paupere fratre lofeph. A meus
canffimosTadres i çff Irmãos em fuás orafoens ^ (^par*,
tkularmente a meu cariffimo Padre António Corrêa , ^
aos n?adres que foram > ^ fam meus Fais, rogo, (^pcfo
fe lembrem defle pobre que engendraram em Chriflo , hc nu-
trierunt, opto vos omnes bene valcrc. Pauper^ôcinutilis.
Ipfeph.
LIV-
5J
LIVRO SEGVNDO
DA VIDA DO
PIOSEPHDE ANCHIETA
dà CoiHpâúhiâ de I e s V.
CONTEM OS ANiSiOS QVE C ORRER AM
dcfde 1556* ate o de 1559. & às obras marâuilhofâs , que
nelles fez ; Da íebclUam dos Tàmoyos De fuá ida ao fer*
tam, ôc demora nelle por finco liicfes ,em refensdas pa-
zes rDcfeueftadode Sacerdote , &c do que vlriítiamen-
te obrou are' a expulfam total dos 1 ainoyos,Ôc futldaçam
dô Rio de laneirOk
CAPITVLO I.
Da rehelliàm dos Índios Tamoyos ^ confederados
com anaçam Francefa contra os ponugefesm
Riode laneirõ^
o s T õ qiie cm grande parte a hiftoria
dcfte feguhdo liUro efteja contada
no tomo primeiro das Chronicas do
Braíil , à pedaços, como ali pedia a
rezam de Annaes : Aquihc força tor-
nalaa referir por inteiro , & íegdda
fegundo o cíliJo da vida de hum Varaó
tamilluílrej nemdeuo nifto parecer-
idcntico , aos c^uefabemas ki5 da hiftoria, porque fupofto
que
.:in!
I
.1
m\
55 Vidado P.IosEPH Anchíeta,
qiiefejaa matéria a mefma , o meihodo hé dififerente,',.^
mais fucGintos ô«: dado que algumas partes pareí^amasmef^ :;
mas, naõreràmuitoquefeparc^amconfigo.poiso Auchorhé '
omefmo; ôcconuemeííaspartes namíe mudarem pornam
encontrar a verdade da hiíloria , & ou|ros intentos que
proíigo. ^*
I Eivando ascouzâsdo noíTo loíephdf Anchieta, & a
educaçam , ôc conuerfamdos índios, com tam bom roftro^,
como temos vifto, noliuro atras, eisquenoannõdeiB^.l
começama foarnouas triftcs , quemereram em turbaçam
a toda aquella terra. Deziamdias que na enfeada do Rio
p^.^^. de íaneiro , diftante quarenta , & quatro kgoas da V illa áá)
nonTs'd'/rn-S. Vicentc , tiiiha entradobuma efquadra de nãos. F rance.
cercsnoRio'"zas . ôc come^auam a/ortificarfeem terra com beneplaci-
de imeico. to dos Tamovos , & C0UZ2S maiores , que fempre em ^ffc-
melhantes carosfoemexageraríe.Deueftanoiía muiio, em
que entender aosPortuguezes , & índios daquella banda,
& fobre todos a Anchieta, & maisReligiofos miffionarios,
queconfiderauam introdufida guerra, diílipadora do íoííe-^
20 , neceííario para a conuerfam das almas E porque íaibam
todos o tbeatro,ein que tantas tragedias de guerra hamde
reprefentaríe , & em que tanto ha de trabalhar noíTo foi eph,v
defcreuerei o fitio do Rio de Íaneiro.
2 Ha hum lugar horriuel , forte , ôc guerreiro , íobre
Defcripç^m todosos qucformou a natureza no gr.ande âmbito da A-
doRiodeia-j^^j-j^^. jieftinado parece da mefma pêra theatro de em-
prefasgrandes. Demora em. vinte, & três grãos da Equi-
noccial junto ao trópico de Capricórnio Coníla de huma
Bahia fermofa , & de hum dilatado reconcauo : h he cha-
mado pellos índios Nitherô , ôc pellos Portugucfes Rio
de íaneiro. Efte lugar quero defcreuer ao rofco , como fa-
biodas mãos da natureza . queaífi (erue mais ao intento 5
v-irà tempo , emqueo pintemos ao galante, com as cores,
que depois lhe daram a arte. ^ o esforçados Portuguezes,.
.03 Todaa Bahia,£i reconcauo do Riodeianeiro.cftam ;
, ' rodea-
TiCilO.
.AH i I Livro II C AP. í. 57
irodeados daquella horriuel ferrania , de que ja noutro lu-^"^'^"^''''"
gar diííemos, que corre a cofta principal do Brafd , & hc
cfta do Rio , huma de fuás partesa maisafpcra. A certos
montes delia, chamam as montanhas dos Orgaõs, porque
a maneira daquellesinftrumentos , vamkuantando cm or-
dem defigual montes fobre montes , fazendo altura im-
menfa , que excede as nuucs , Ôc chega parece à fegun-
da regiam do ar. Pveprcfentam aquellas grandes íerranias
muralhas , ou torres formidaueis , entrepoílas a humas,
òc outras naçoens , porque alli fulmina a natureza em tem*
pos tormentofos tais rayos , corifcos , èc eftrondos disfor-
mes detrouoês , queaíiombraò a terra; Chegauaó a fufpei-
tar as gentes agreíles, que efíauam armados aquelles m ontes
pcra defenfarti fua. Sam com tudo alegres aquelles picos
inacceííiueis > por fua forma /altura, & fermofura , reue-
ftidos de verde aruoredo , & arrebentando em ribeiras
de agoá, que defpenhadas dos altos cumes , vam pagar tri*
buto ao mar. í .oríhrnnv ocq ob '
4 Da Barra pêra dentro fc vé huma eftendida , 6c ifer- ^c wJ'''
mofa Bahia ^ formad.i dos enchentes do oceano , que em*
bocando pella barra dentro , chegam quaíia lauar os pés
daquellesmonreSia que chamamosOrgaõs.Temefte A la-
gamar como outo legoas de diâmetro , 6c vinte , 6c quatro
de circumferencía Eílàentre(^achado de Ilhas .boqueirões,
&c eftciros ; eftes ornados da verdura dos mangues , &
vermelho dos paííaros , a que chamam Goaràzes , fazê
a vifta aprafiuel. Defembocam nella caudalofos rios , huns
do fertam , outros das ferranias cifcumuefinhas , que com
o doce de fuás agoas fazem guerra continua ás do mar >
querendo preualeccr, humas â s outras.
'-l-$-; Foy cfte fitiofempre formidauel a todo o inimigo f^v^^""?'^!?
• • 111 r ^ ■ r o formidolol»
marítimo , porque na verdade , he temerofa, & iníuperaueiefte fuio.
aquella muralha natural , que vay cercando toda efta pa*
ragem junto ao mar (alem daqucllas ferras) das mais e-
ftranhas penedias , que ja mais fe viram : Aííombro he das
>-i H ar-
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5« VibA DoP. Tose PH DE Anchieta,
armadas mais forres, quando chegam de mar em fora a
terTiftada rerra , & cm vez de prayas, c^uc alegrem , co-
meçam a veremminenciaS disformes de rochedos tam al-
tos , que fobem as nuuens, Ôc efpantam aos homens. Eílc he
o ficio do Riodelaneiro , queoccupamosFranccfes» coiíi
beneplácito dos nacuraes da terra.
6 Mas antes, que os Francefes obrem hoftiHdades
insentojdos com OS noííos , vcjamos primeiro os intentos, que aih'os
trouxeram. Tiueram noticias em fuás terras , de como a
genre dos Tamoyos, natural daquella paragem, muita
cm numero , & guerreira, depois de aucreftado emamsía-
de com os Portuguczes , guardandolhe a fé prometidai
vieram com tudo a quebrala , irritados de aggrauos -, que
deziam ter recebidos , ôc que de amigos , eftauam feitos
feus contrários 5 & como era o fitiodo Rio de lanei ro, tao
acommodado, como vimos, â fua defençam ,& tirar gran-
des proueitosdas drogasprincipaisdo Brafil , efpecialmen-
te do pao vermelho, porque tanto fuípiramas naçoens
^ eftrangeira^ : Vendo por outra parte apouca , ou nenhu-
ma rcíiftencia , que podiam terna entrada.pois nem tinha
preridio,nemnellcauia Português algu que a defendeíTe;
Animòufe a eftas nouas que corriam , hum Nicolao Villa-
gaiíhon homem nobre Francês, Caualleirode S. loam,a fa-
bricar huma armada de Toldados , ôc vir occupar inopi-
tiadamente aquellaEnfeada , como em effeito fez , fem que
alguemlhc refiftiíTe , aflcntou liga com os Tamoios, ôc
\<^m palauras, ôcdadiUasliberaisCefez fenhor dos cora-
íçoens de todos , feitos cm hum corpo contra os Porru-
7 A íTi viuiam de conformidade Tamoyos, ôcFran-
cefcs icftes fiados na muUidamdos arcos de Teus confede-
rados 5 aquelles an m idos com as armas de França que
cada dia hiam crecendo, contentes huns , ôc outros, com
o fitio notauel, quca meírna natureza fizera: Porem pe-
ita mais cautela > começaram a fabricar huma forta-
leza
; A T .• ÍL IV R o I í. <^» i p. 'h o o A « I V 5^ ^
leza foberba , junto a barra : E tal , que ffncfo em Tua ^f '^';^^^^^^
perfaçam, fe prometiam íeria Jnexpunauçl , 6c tinhao t^aõ ^-^au«
porque a fortaleza vinha a fer hu^Uha.(chamadahoje Villa-
aailhon , tomado o nome daquelle General jonde tudo o que
era Ilha, éra Por talcza > & tudo ox]ue era Fortale^a.cr^ Ilfiâ.^
E eftà (excepto hum pequmo porto da praia^ cercado tp-
4pde penedia braua , onde bate o mar j como cem bra-
ças de cumprido . fincoetiVa de íárgo. Em cujas vitimas
duas pontaskuQdtou a natureza dous cabeços talhados
ao mar, 6c no meio de ambos hum fmgular penedo, co-
iTfo de quatro braças em alto , & íçis em contorno Da cir*- ^^íi-b -»cO
c^mferencia dos recifes, & penedia delles, fizeram àckú-^.^^^;;^:^
f^uel muralha .• Dos dous cabeços . com pouco artificio , -;... > .i
duas juntamente naturaes , Òc artificiais fortalezas . Edo .,.,.,, ,.i
penedo hum pouco mais cauado ao picam , caixa de polb .i^"" oi> ob
uaiaícgura , ôc conftante contra toda a aridharia : E .co<
mo eram muitos os Índios , queajudauam.em bfeuetem-
po íâhio perfeita a obra. jinç^m^na:^: ^^ ^^^^^^^^
8 Pcfto que tam fortificados OS Franceí es , liam raziam^atT faziam
eontudo hoftilidades , nem guerra otffenfiuaaos Portuge-^^ft^^'^*^"'^
ics , íatisfeitos com gozarem da terra quietos , ôc tratarem,
doquemaislhesconumha, que eram as drogas , ^rique-
zas do Brafil, que dallí embarcauam cm (ms naòs , 6c
eíperauam foflem crecendocada vez mais j contudo os Ta-
moyos, naçam guerreira de natureza , & fauorccida daostamoyM
potencia Francc^ andauam iníolentes , òc perturbauam a '"
cofia marítima, & ainda parte dofertam, dando aííaltos,
&: fazendo danos gfandiírimos nas fazendasdos Portuge-
Tts : Em tanta maneira , que era neccfiãrio andar volantes
em viuotxercicR>loíephvt?oda fuacícola . ôc todas os mais
Miíííonarios daquella parte, acudindo ja mais aos danos
das almas ganhadas , queaogadio.dasque auratn de con-
uerterfe.
o:ms
G' 'fi-ii
H ij CAP.
6o
m
i
■|í! 1
Vida d o P. I osei^h ANCHíiETJt,
'<:>} í:^5l
-X..*,^i |.^.í^.t^|^.í^;.|^.ç^..j^.ç^^^.gj^.j^,,j^,|^.,e5^.g^
Ouuc el-Rey
as nouisdo
Rio de lanei-
ro , ôc ficodc
com Gouer-
nadorao efta
"m
C A P I T V L O 1 1,^'-^^^ ^* i^ í í^ :>ijpiot5
chocam ms oumdosdel-Ref D, Toam IJI: 'ml
reíaçoens àa entrada dos Francefes no Riódé^
^ Ic^neim,: Acode ao Brajil como Gouernadóf
Mem de Sé ^ &do que efle começa â ohranj. i -^ui
A z I A M ja em Portugal grande ecco as rela-;
çoensdo que hiam obrando os Françeíes na^
enfeada do Rio de íaneiro , & de comofçt
tinham fortificado, & cada dia Grécia o po-'
do do íiraa dcr donumero de feus confederados , & dos íocorros que
vinham de França 5< ôc que fcgundo os Tamoyos folicitá-'
uamas nacoenscircumuefinhas , fe podia temer , queaco-
meteíTem maiores emprefas em damno das outras partes
do Brafil,Efcreuiam também os Padres da Companhia de
lefu ,aos Tribunais Reais os damnos maiores daturbaçam
que recrecia na cultura dos índios , & pregaçam de noíTa
fanta fé. Asquaes rezoens viftas em Confeiho del-Rey D.
loaml II. que enram reinaua , refolueo mandar ao Brafil
hum tal Gouernador ,< que juntamente pudeíTe obuiar daíxi'';
nos futuros , &: remedear os prefentes.
2 Foy eleito para efta emprefa , Mem de Sa o ter-
ceiro em ordem dos Gouernadores do Eftado do
Braíil 3 homem de grande coraçam , zelo , ôc prudência,
acompanhada de letras , Ôc experiência em paz, ôc guerra.
Chegou à Bahia de todos os Santos cabeça do Braíil no an-
^""'^'^^'^jSno do Senhor de 1558.,
3 Defte grande Varam MemdeSa , ôc de feus mui^
tos talentos , ôc façanhas compôs hum liuro inteiro o noC-
fo lofeph de Anchieta, feu contemporâneo, que intitulou
'de rebiisgejtis Adem í/f Si^, Tem coufas dignas de hiftoria ,
mas
%&X«;tii
Chega d
G u rnador
â Bahia no
;. • . LlV ROlíC A f ITVLO 11. V ^l
mas nam faõ tantode noíío intento , a^clle rqmetó o cu-
rioío , que quizer faber delias O principal do regime-^ tine* ai ^
to, que trazia de fcuzelofo Rey.erao legaincç. Que pro- regimento it
curafle em feu gouerno por todos os meios po(íiueis tra *^"^''*-
zer à fé de C hrifto os índios dQ.Brafil .- E que entendeíTe,
que a primeira parte de feu officio ^ era desfazer os
eftoruos , que podiam impedir efle fim, da liberdade de^
fíagentç , òc quieraçam do Eíl do
,!.;;4 Todo efte regimenro era muito conforme ao génio,
Ôc fentimento donouo. Gouernador. Aprimeiracoufa que
obrou depois de fahido em terra , foy lançar bandos em
fauordos índios, que foííem poftos em fua liberdade to-
dos aquelles, que contra juíliçaeílauam em leruidam , fei-p^^ ^^^
tos efcrauosdos Portugucíes, que era quantidade notauel em fjuordoí
E pêra o futuro > que mnguem foíTe ouíado à catiuar ín-
dio algum , fora de guerra jufta , cem condiçoensjufti-
íicadas. E na execuçam deftasleis fes finezas.
$ Depois deftas leis fauoraueis, publicou outras ,nam^^y*'*P°^
.1 ' í -' tantcsque
menos importantes , foya prmieiraquenenhum dos índios mandou pu-
íioííos confederados j dalli cm diante comeííe carne hu- '"'"
mana (^abuío ordinário) ainda que íoííe de inimigos , to-
mados em guerra. Segunda que nenhum Principal , ou Co-
munidade fizcíTc guerra contra outra , fenam com caufa
juíla, ôc approuada por eile , ocos de feu Confelho. Ter-
ceira que fe ajuntaííem em pouoaçoens grandes a modo de
Republicas , leuantaííemnellas Igrejas , aqueaciidiííem os
jaChriftaõs a cumprir com as obrigaçoensdefeu eílado 3
òc os cathecumenos a doutrina da fé , fazendo caza aos Pa-
dres da Companhia de lefu , pêra que redifiíTem entre
clles , a íim de inftrucçam dos que quizefíem conuerterfCé
Sobre a execuçam deftes bandos ouuefucceílbs memoraueis,
em que mofl:rou grande conííancia , ôi generofidade de
animo.
6 Deziao Vulgo contra eílas leis, que eram violen-
tas, imprudentes, ôc podiam vir a fer caufa da deílruiçam
.LiLià H iij da
"ti'
M; I
• '■lill 1
m
Queiías <ío
Vblgo cón
itis. V
Reprftadas
niurnaiira-
-Ú-i
'di V I DA t> o P. To s E ^ ti ']\%"díí I E T a: ^ ^
da Republica Que acerto he ( detiani ) qàèrcr pfohibíf a
xTcíitios tãi quaníào fáõ , km Mú^osínbs? qtíem Çúáé
^rohibir a hum tigré , que fenáítf céue em éàfíié hílíílarfâ?
quemquii^ér tirariha dentre ds d^ntés?'tiam' liá de iÚ^àf'^
rcrreutigot? pois nám mehòs endoíf età néíííâ gêfltê ^ô
de tantos íitilharesde' arcos , qbe pode armaf eôíiti»à i1Ò5
eáapfbhibi^vim. Que fenos da que façam guerra butt^^
outros ? nam vemos qiieneítá mefma eílà hoífà rà^rg^^^
que dluéftido poder ta m grande, nam caia fóbt-e noflfas
cabeças ? pois ò obrigMlos a que íe ajutiteni em pdUò* ^^
des , nam he omeímci què ajuntar exércitos grândtS c:'otí»-
tra noílb pouco poder^ qne façam igrejas , & câzas àoè
Padres, iftbnam he violentara liberdade dtílagéntéP dif*
goftalos , metelosemindignacam contra os Portuguefè^i
7 A eftâs, Ôc outras murmuraçoens do Poiiò , xcífò-
dià o prudente > & confiante Gouernacior : Que os
bandos reaes fomente obrigauam aos Bárbaros ,iioÍIoí éòn -
federados, & tributários a elRey feu fenhor 5 ôc fendo e-
íles, feria afronta do nome Português > fofrer que a Viílá
de Republicas Chriftans , eftejam elles oííendendo àò
Creador em âcçoens condenadas por direito da rnefnía na-
tureza , qtiai he a de Comer hum homem a outro , que os
tigres riam offéridem akidarezaniemfemelhantesaclos,
porém oshonieiisfiiÔc nefte crime deuém ôc podem íer
ftfreado^ , alias o que nos índios he barbaria , em nós fé-
ria impiedade, ou medo E que pello mefmo fLihdamcncò
dè cosífederaçam , deúebílos impedir guerras injuftaá enk
prejuízo de hiins , & outros confederados -, qUe confiados
Viíjtm de baixo de noíía protecçam.Aífirefpondiao c5-
fíanteGouehiádor, venciendoefte, ôc maiores encontro.^
dignos de memoria, mas nam um próprios deíle lugar.
Baila íaber pôr hora qué comeífcito fe foram reduzindo
os Bárbaros , na Bahia a quatro poderofas Aldeãs , de S.
Paulo , de Santiago , de S. loam, ôc Spiritofanto, viuen-
âo com mâispohcia.ôe âcommodadosâos nouos preceitos.
m Eram
,ATi. Livro II Cáp ÍI. uV ^>
' «^'"Eríni todas eftas diípoíiçoens bem fundadaí, 6c ac-
commodadas aos intentos , quc trafia nos olhos da conuer-
fam , & quietaçamdos Índios Tamayos do Rio de lanci-
ro , pêra cujo effeitoimportaua ficarem íeguros ,ôc refrea-
dos os das outras partes. Eis que goucrnandojjncílc meio
tempo o Reino de Portugal y a Senhora D Cathcrina doMand». Sei
Auftria . Irmam doEmperadof Carlos V. que por niortc^hof.D c^^^
del-ReyD. loam feu marido, &c de leu filho o: Principe D..,acncam*rti.
loam fazia o lugar dei Rey D. Sebaftiam neto feu por J^^li^^';;^
íer ainda de pouca idade: Efta Senhora com os de feuacmprei» do
» 1 1 • r> Tf ' Rio de líOCl-
Confelho de guerra , mandou de mais ao Dralil
1 Rio de Uaei'
alguns,^.
os COO*
nauios , ao melmo Gouernad^or, a fim de inrencos dezejados
da foízcicaõ do R io de lanciro (pncómendado.de nçuaq aÊ-
feito com toda a efficaciâ. , . -
9 Mcm deSa, que de nenhuma outra coufa cuidauâ ^^^
póz lò^o em confelhoa partida aeíle intento ,ofFereccn -*'*"«*
áo Tua peíloa pêra General da emprefa. Forami muitos de
parecer , que nam conuinha com ram pouco poder * a-
commcter inimigo tam forre , que fc deula dilatar o (ííf ei-
to ate milhoroccafiam, cm que ouucíTe cabisdal ícguro í
Menos mal he , (deziam ) íofrtr o aggraiiò;por algum
rempo mais, que arrifcar maior ignominia defeàrmospropul-
í^dos. Que era jade confideraçaõ a potencia do Francês^ 6c õ
fitioquafi inexpunauehosauxiliares quafi infífiifblsVQue as
riaòs , baftimentos , & apreftos deguerra entrauam cada dia
deFraftça ^naoifegaftauaõs 6c noíTâsnaás perátâíJtâ em-
prega eram poucas, & â foldadefca nam podia íer rtitíita,
nem também os aprcftos E íobrèíudo nam conuinhâ > que
à peíToa de fua Senhoria fc arrifcaífc 5 & que fuccedcndo
fortuna aduería ( tam Comua tiâ guerra) ficafífe a Pràuincia
priuada de cabeça, 6c expoílaádãaosttiáiores. <]
"irfi^íioporémoGouernador que era efficaz no feruiço^ffp^^jf^»
de Deos , 6c feu R ey , dezia que quanto mais tardaíTe , tan- foiaefc t pit-
tò mais arrifcada feria a emprefa , engro(íandóo tempo as"'*'""^" **
forças , 6c a paciência dos noífos , o animo ao inimigo.
* ' Que
'Á^H^vr*
! )
::>HÍ!i
m
w
64 VíDÀDO P. losEPH.Al^CHlETA,
Que paliaria a ganhar outras praças , com maior ignominia:
Nem facilínente íe poderia juntar eàno Braíil maior poté-
cia,que^ com que feachaua deprefentejÔc mandou fazer
preftes a Armada. Conftauaefta dosnauios do Reino , Ôc
de outros que pode juntar , & barquos pequenos da cofta
com amor quantidade de íoldados Portuguefes, & índios,
quea occafiam deu de {u Eram por todos os nauios dez >
até onze ( afora barquos) em que entrauam duas naòs de
«<:& * IS. ar.
*ÍJp i &f ii
íi:!riiiái''' guesrra , & eram eftas ás principaes
t .
í^i-tc Meni
de Sj per» é
Rio no anno
de 15 óo.
/ta Jojêph f.
6f,
,; ;; CAPITVLO IIL '.^
•N - ■ . ;
oOeneralMem de Sdpera o Rio de taúèh
ro .acomete y^ rendeafõftaleiddeV^ílíagai'
ihdn^Vay fefazefjfè â S. Viceme ^é" volta
vencedora Bdhiâ. -"^
■ . "■ ' ■■■■ ^ ^ '.. ^ ■'.^j-^i^q
O M eíi atam peque na frota partio o Geíie-
ral Mem deSa a tam grande crriprefaj nos
princípios do anno do Senhor de 1560. che-
gou à Barra do Rio de íandro com profpe-
fã viagem ,;Ôc fuppoftoqueo confelhoera , que logo che-
gando nonlaiscrcondido da noite fe entraíTe a barra, &
de repente feaconimeteíTe o inimigo defacautelado , conl
tudo, cp^mQ psfucceííos do mar fam incertos j foram os nof-,
fos primeiro auiftados dê fiias fentipellas, & obrigados a
lançar ferro fora da Barra : Poferamre os Francefes em
preu^cnçam , ôc deixando todas fuás naás , fe rccolheram.^
âfortakza- com mais de outp centos frecheiros Tamoyps ,||
porque vnidospodeíTemreíiftir com mais vigor. -n
2- Mem de Sa confiderandoa falta que auia de noíTa par-
te de canoas, & embarcaçoens pequena? , ^ de alguns
praticosnaquêllaenfeada , & cofta: Defpedio fem demor,
,ra à S. Vicente menfageiros em bufca de íemelhante focor-
ro
-m
LivroII.Cap. III. 6$
TO ; E como o Padre Manoel da Nóbrega , que hia com
clle na mefma armada , era tam conhecido, & amado na-
quella paragem, Ôctinhaalli a lofeph (eu amigo, que pode-
ria ajudalo :Foy elleo principal embaixador da propofta ,
com efperanvcas géraes de bom fucccílb i ôc nam fe enga-
naram , porque embrcues dias, & quando menos o cui-
dauarh , chegou á encorporaríe com a armada hum fer- vicentc agé-
mofo bergantim artelhado , com algumas canoas dec"dopeiiop.
guerra , com mantimentos , ôc refrefcos da terra , ôc boa " '^^**
copia de foldados , deílros na cofta , ôc peleja naual de
cmbarcaçoens pequenas , Mamalucos , ôc Índios, guiados
por deus Religiofos da Companhia Fernam Luis, 6c Gaf-
par Lourenço,
3 Com a vinda defte focorro ficou com alento toda
a armada , ôc como com prefagio do Ceo , mandou o
Ciéneral embocar a Barra , a pezar da defenía Franceza , que
pretendia empedirlhe a entrada. Metidas de dentro noÃas
embarcaçoens preparadas , & efcoihida conjunçam ã
propofito, acommetem a fortaleza principal ida Ilha , cha-
mada hoje , Villagailhon , que parecia inexpunauel , por ^'=°"'^^«*
onde quer que fe punham os olhos, porque como diflc- viihgailhoa.
mos aíKmâ , toda a Ilha era fortaleza, Ôc toda fortaleza
Ilha cercada de penedia a pique inaccceíííuel , ôc de circum-
ferencia noradel ; Horror caufou de perto , o que de 15-
ge parecia mais fácil : Soube porem o valor Português
hnma vez empenhado , diííimularomedo ; acommcteo a
todo poder, & embreue conflióto ganhou huma peque-
na praya , quie fomente auia. Aííentou nella artelharia
groíía , foy batendo forramente dous dias , Sc noites c5-
tinuas as principais partes da forças porem de balde, por-
que era viua a penedia , accommodada fomente por arce
a poder de ferro a feu intento. Nam era poíliuelfcr rendi-
«da por efta via. Chegáramos noíTos a defconfíar da em-
preza , ôc a tratar da retirada , canfados da demaíia do tra-
balho , ôc de combate tam rigorofo , em que eram ja mor-
I -: tos
■lii
êè Vida Bo PIosEPH Anchieta;
toís muitos, ôc bons foldados, ôceílauam feridos muitos
mais.
4 Viofc porem aqui hum íucceíío notauel ,fauorecido
do auxilio diuiiio , &. do vigor das oraçoensferuorofasífe-
gundo cntaôíecniendeo)do Padre Nóbrega ,& lofeph de
Anchieta, que nefta emprefa fe tinham empenhado : Por-
que a força que pode refiílir ao pilouro Português, iiam pode
reíifl-ir àfcubraço, refoluemíc todos leuados do brio natu-
ral corridosde fuás rerolLiçoêspaíradas,& feitos em hú corpo
Rend.fe a arrcmeCem-ao cabe<^o principal , que oiha pêra a barra , cha-
cX mar^ut «^^do das PalmeJras , entramno , &c rendemno com morte
^hoio. de muitos inimigos j Sc animados com a vi6toria, acom-
meté emfegudolugar aquellefoberbo penedo de que atras
diffemos , lhe feruia de caza de poluara cÕ tal valor , que de-
femparadodos feusfoy ganhado , ôc perdido com elle jun-
tamente o animo de Francefes , & índios 3 que fiados no
íecreto , & eícuro da noite , fe foram defpenhando pouco
apouco das muralhas abaixo , & embarcados em bateis ,
6c canoas fe acolheram , parte âs naòs, parte as brenhas ,
deixando aos Portuauezes a fortaleza, & huma das mais
iníígnes vidorias daquelles tempos.
5 Na menham feguintc fes o General Mem de Sa ac-
çamde graças a Deos N/Senhor por mercê eam grande ôc
celebraram os dous Padres da Companhia a primeira Mif-
fa, que vioaquella Ilha. Poz em confelho , fe parecia mais
conueniente preíidiar , & conferuar a força, ou antes ar-
rafala ? pareceo entamarTaíala.pella rezam commua,_ que
as forças diuididas ncceíTariamente fc enfraquecem ,& as
com quede prefente fe achauam , nam eram tais, que po-
deííem prefidiar a Ilha , refiftir ao inimigo, que ficou em
fuás nãos, ôc acudir as neceííidades precifas da Bahia 5 fe-
guindo eftaopiniam , mandou condufir a noíías nãos a ar*
telharia , ôc mais defpojos em quantidade grande , que o
inimigo deixara ,& pôr por terra , ôcdeímantelarna for-
taleza , tudo o que era obra da arte , ôc podia feruir de
reparo. 1 ^^^*
Arrazafe , ôc
áefpojtfc a
fjctakza)
, A T ^ ! ' L I V R. o 1 1. C A P 1 1 í» ^T
6 Preparada a Armada , mandou o General fazer via
a Cap itania de S Vicente , aíTi por ver o amigo Nóbrega ,
& lofcph , &: darlhes as graças do bem que auiam ajudado
feu[ intento , do focorro , & Padres que agenciaram, co-
mo juntamente porque feachaua dcfpezo de mantimentos vai airmad»
que naquella Capitania eram em abundância , & a viagem ^^^^^^^^^"^J^!
fácil por ferem tempos de nordcrtes -.Chegou ao porto def»zMcmdc
Santos no vitimo de Mafço doaÀho dcijdo Foram gran-"*' ^*-
des os extremos de beneuolencia , & charidade religiofa ,
dequevíaram o Padre Manoel da Nóbrega , lofeph de
de Anchieta , & alguns de feus difcipolos , que allí entam
fe achauam, com toda aquella armada , & foldados delia
debilitados , enfermos > & neceííitados os mais dellesdos
trabalhos paífados ; E aqui fez também o General algu-
mas couzas do feruiço de Deos , & bem da terra àpe-
tiçam dos Padres.
í f 7 E logo aos 25 de lunho doaníio corrente , defpedido
de Nóbrega , Anchieta, ôc mais Padres , fes dar àvella^^J^^^^P^^^*»^^
em demanda da Bahia de todos os Santos , aonde chegou lunho chega
-a lançar ferro aos primeiros deAgofto,&: foy recebido ;j3^p^f^^^[^^^^^
com viuas , & parabéns do pouo, tanto maiores , quanto ^i^^Agofto de
foram mais rigorofasasdefconfianças em alguns de aucr*^^"*'
de tornar com vidoria. Daqui defpedio auifo de tudo o
fuccedido â fereniífima Rainha D. Catherina , que como
vimos gOLcrnaua em lugar do Senhor Rey D. Sebaftiam
neto feu , deufe cila por bem feruida , mandandolhe as
graças, ôc juntamente ordem, que meteííe todo o cabedal
por fortificar o Rio de laneiro, & fazer alli noua Capita-
nia, poreuitar nouos intentos do inimigo ^ firmar o efta-
do , & defempedir a conuerfam dos naturaes da terra,
que com as guerras fe perturbara em grande parte. Porem
efte mandado da Rainha nam pôde ter efFeito, fem que
procedeífem as guerras dilatadas . que logo veremos.
lij CAPÍ-
Vida d O P. 1 oseph Anchieta,
CAPiTVLOlV.
Continuaúam os Tâmoyosfuà rehelliam: Affal
tam 5 à^ matam muitos. AiWiitaçâmdôsTamoy os
rebellamfe lamkmp^T^upis^fam dejbaratados
A R T 1 D A a armada de Mem de Sà > dcfaC-
íonibrada aquella enfeada de feú pòáer , ôi
foldadeíca , em ves de atemorizados fícaram
os Tâmoyos do Riomaisinfolentesconcraos
''^"''."''^moradores de S. Vicente. Traziam a terra em continues
t(s os ta- àííaltos , & andauam â caça dâ gèrtte y como das feras pe-
arorporto-rapafto, juntamente da guUa, & da vingança. Acomme-
•guefts. tiai„ repentinamente , oradas ferras áos que Viuiam no
fertam 5 orà das canoas j aos que tinham o mariti-
mo , fem^ue algum fe deífe pórícguro de feus arcos , Ôc
dentes. E htftes aíIaltos fuccederaõ cazos eftranhos da cruel-
dade dêftes bárbaros , & da conílancia de muitos Chri-
ftaõs , quenella padeceram corii lealdade , Òc fé , traba-
lhos,Ôc maríirios,que deixo por liaõ fazer Ioga a leitura. No
meio deftasaíBicçoens, osferuosde Deos Manoel da No-
brecrà , & lofeph de Anchieta nam ceflauam de pregar
pellõs púlpitos , & pellas praças, quanto conuinha andar
apparelhados , cuidar das conciencias , & fatisfaçam de
peccados , qiiaés feandàíTem coma morte em braços.
2 Com eftesexceííos continuaúam furiofos os bárba-
ros Tâmoyos , o defaggrauo da injuria > que receberam
no Rio de íaueiro ; Cada diacreciam os infultos ; ja nam
tratauam de àííaltos fomente fenam que animados, &
ajudados dos trancefes , queda fortaleza fahiram rendidos
à fuás nãos , tratauam de inuadir a terra toda , & Ca-
pitania deS. Vicente , & fazella Prouincia fua. Pêra eíle
cíFeito
Liv ròIICapitVlóIV. 69
cffeitQ fabricauam canoas de guerra de grandeza notauel, ^^^^^^^^^
ád\ roncando as matas , naquella paragem immenías , viço- ^^"^^J^-J^s^^^J-
las , &: que fobem as nuués , & cáuando aquellescorpx)s"Xrc„'ho"
oroVos, curados do foi . & dos annos , faziam embar «^-^^««'i*»
^açoensfortiíTimas, capazes as maiores de cento & fincoe-
ta auerreiros, todos remeiros , 5c todos íoldados , porque Dcfaipçam
com O meímo remo em punho de numa parte , ôc ou-
tra da canoa , fuftenta m o arco , & defpedem a feta com
deftreza grande .- E quando o pede o perigo , com o
meímo remo Te efcudam , porque era feu remar cm
pé, & tinham os remos, huns como efcudetes, com que
reparauamasfrechasdoscontrarios. Eram os remeiros por
ordinário neftasoccaíioens 40. ôc mais ainda * por banda 5
voaua, & defapareciao leue vafo . nam (ô qual gale eí-
quipada , mas a modo de páíTaro : Andam também à vel-
la, feoundo aconjunçam opede. Prefidiam alem dos re-
meiros > à popa , proa . ôc o coraçam dá canoa dos Tolda-
dos liures , que vfam de outras armas * ou das ttieímâs ,
quando hé neceííario.
3 iMetiam eftas prepara çoens em anguftiás grandes os
moradores : O noíío Irmaõ lofeph , queentam aíTiftia tia ^^^^^^^^^^
ViHacomfeus difcipolos, ôc os mais refidentes daquelle iofe{,h,&
Collegio chorauam eftas calamidades com lagrimas de ^^-J^^^^^^^^^^^^^^
fanoue , & com ordem^&obedienciadefeu Superior No- deatiiiçc*™.
bre^^ que feâchauá naquella occafiam em Piratininga,
checaram a fair todos pellas ruaspublicas>dirciplinandore,&:
pedindo a brados mifericordia , porque entraíTem em li os
Portu(>ue^es,ôcchoraííemtambéos peccâdos daquella ter-
ra , que entendiam , eram caufa de Teus caftigos 5 cf-
pecialmenteos que commetiam com demaziâ , contra a li-
berdade natural dos índios . Faziam frequentes pro-
ciíToens , ôc penitencias í& repartiamfe em oraçam peren-
ne de noite, & de dia, mascadavézachauamos Tanioyos
mais ferozes , ameaçando maior ruina^ porque o exercicío
os tornaua mais deílros , a carne hunaanamaisencarniça-
1 iij dos
7^ Vida doP. Tosiph de ANGHtETA;
dos , & oconforçio que tinham com os Francefes , mais
oí !n foberbos.
4 A todos €Íles males recreceo huma rebelliam pcrigo-
fa em Piratininga 5 porque outra naçam de índios chama-
dos Tupis do icrtam confederados noíTosquejaandauam
meios arruinados , com efta occafiam acabaram de decla-
Refeeiii.ro4os^3j.('g pof contrarios , ôchiamcada vez mais reforçandofc
com o poder de outras Aldeãs circumuefinhas, queeftauao
neurraes , & de muitos outros , que ds nos fugiam por
defcontentes > ôcbufcauam aquelle , que lhe parecia me-
Ihorpartido.lunto poder, que parecia groíTo , refoluc-
ramfecm todo ofegrcdoirdarfobrea Villa de Piratinin-
ga , acabar os que nellaeílauam , ôc fazerfe fenhores da-
quelles campos , que muito cobiçauam. Abalaram com
eíFeico por caminhos occultos , multidam numerofa , mui-
tos milhares de gentilidade , & de miftura Chriftaõs fu-
gitiuos , deftros nas entradas, ôcfahidasda Vilía, ôc cria-
dos nella, cuidando tomar os noíTos defcuidados. Po-
ré o Senhofjque pretendia mais caftigar , que aíTolar aquel-
la Capitania , ordenou que hum índio , compadecido de
noíías aíflicçoens , & lembrado da doutrina dos Padres i
fe apartaííe dentre elles , & vieíTepor atalhos mais breues
rompendo o mato, a dar noticias aosnoíTos de tam gran-
de poder.
5 Aos três de íulho de 1561. chegou a noua aos Padres,
quefeachauam nacazadaquclIaVillasficarammctidos em
confufam , porque o poder do inimigo era grande , & o
noíTo muy limitado : Porem aquímoftrou a mão de Deos
feu poder pellos que brigam por fuafc. Coufa foy pêra
louuar o Ceo^ vero como em continente esforçou os co-
ra^oens dos índios , cathecumenos^ & bautizados nof-
fos difcipolos , como fe nelles tocara ai arma a Igreja , ôc
infundira brio guerreiro pêra defendella , & tomar armas
contra os mefmosíeus. Com eftes vieram logo ajuntarfe
alguns amigos noíTosde fora , com os que poderam reco-
lher
IiVRo II.Cai*. IV. 71
llier de féis , ou fete Aldeãs circumueíinhas centraram
emnoííaseftancias , pêra com noíco morrer , ouviuer
juntamente.
6 O que deu moftras nefta occaGam de mor valor ,
de lealdade , foy hum Índio . chamado cm feu sentiliímo
r. ^ t T ^M • K rr riiJ Animo, «
Tcbyreca, &no bautirmoMarnm Aftonço, rrmcipal de 3t,,codo
: Piratioinaa. Obrou eftc índio marauilhas ; recolheo ^í^go"^;;;Te^y£
agente de três Aldeãs , que tinha fuás , pondolhesas cazas.â.
por terra ^ & deixando íuas granjas , & roças ao furor dos
inimi<Tos , porque perdeííem de huma vésa efperança del-
ias. Sinco dias que tardou o inimigo , & durou a prepa-
raram de guerra , andou incaníauel , ora difpondo as cou-
ias do combate , ora pondo em confiani^a os Padres, ora
animando os Portuguefes , que eram poucos. Fazia pra-
tica aos feus de dia , & de noite, que defendcííem a Igreja,
&: os Religioibs Paes feus , que os enfinaram , & criaram
na fé j que viííem que eftaua Deos de fua parte , porque
dos contrários huns eram gentios , outros desleais arrene-
•gados , que deixaram a doudtrina dos Padres 5 & elles era5
filhos da Igreja : Que viííem o como elle mefmo contra
feu propio Irmam carnal , conhecido de todos, por no-
me Aràrayg, & hum filho íobrinho feu , que vinham em
ajudado inimigo, eftaua animado a pelejar pella fé , que
huma vez tomara , & pellos Padres que lha enfinaram ,
arrifcando molher , filhos, & quanto tinha. E que asmef*
mas obrigaçoens lhes corriam , aos que jaeramChriftãos,
& aos que o nameram , pellos dezejos que Deos lhe ti-
nha dado de querer fello.
7 O cazo deíle fobrinho feu , filho de A rarayg , foy a f^^^^^J^X
maior fineza defie índio. Porque leuado o fobrinho do a afihofobri^
mor natural , & confiderando que vinha tazer guerra co-tranonoíTo.
tra hum tio feu. Capitam da parte contraria , fez o pof-
fiuel por reduzillo. Deulhe a faber a multidam de arcps ,
que vinham contra elle, & cobriam os campos : Que e-
ra certa a vidoriadapartedeíles, que nam quizeííc per-
derfe
<i^^^C^^<
rt Vidado P. los^ PH Anê Hl ETA,
derfe a fi , & ã fua gente : Que coiíio robrinho,5£
fangue fe condôhia , & oSerecía afazer de maneira , qUefe
lhe deíTe boà euazam , & à todas fuás coufas. De todos e-
ílcs ofFerecimeiítos zotnbou Tebirecá , reípondeo , que
confiaua em Deos vencello , & matallopor caufa da fé, Ôc
defenfamda Igreja fanta j cuja bandeira logo aruorou da-
quelleponro em diante, ornando fe todo de fefta , & das
melhores armas. Recolheoas molheres dos PortugucfcSj
& índios , na Igreja . por fer lugar mais forte j & porque
fogaíTem a Deos pello fucceíTo do confli(5tOé
8 Eisque ao romperdâ aluadodia oótauo da Viíita-
^am da Virgem Senhura Noífa, dâm os inimigos de irn-
ttdíiniS prouiío ^obre a Villa de Piratininga , com tam grande
go- eftrondo de gritos j aíTouios , & bater de pés , & arcos,
fegundofeu coftume , que parecia que o mundo fe vinha
abaixo , & fe ârruinauam os montes vcfinhos : Todos
pintados, empennados , jadlanciofos ', prometendofe a vi-
storia 5 & deixando nas coftas canalha de Velhas carrega-
das de azados, em que deziani , hauiam de cozer as carnes
doscatiuos , conforme as leis de fêus coftumes bárbaros.
Vaiordos Porem traçou dííFerentemente o Ceo : Porque osnoífos
'^ '"^ r fahirama recebelos com bandeiras da Igreja de Deos, pel-
la qualpugnauam Era pêra ver neítecontiiao , pelejar as
frechadas Irmãos contra Irmãos, fobrinhos contra tíos>
primos contra primos, ôc filhos contra Paes. Foram vá-
rios osfucceíTôs de guerra , te que por fim cançados , ôc
desbaratados fe retiraram os contrários, com perda de
mortos , & feridos , fem que morreífehumfó denoíTa par-
te de muitos que ficaram frechados-
nofliè. Sc
vidoí
gne
■,..!
CAPI-
Livro ILC AP. Vk V
4«»IJM'-t^&i»»89»«Í^%4'^ ^ ^f^f^ -£^' (««^ «^«^
j-T ^-01 .ríí
CAi»ITVLQ,„
Pane Anchieta em companhia do P ^ Manoel da
'Nobreza â meter íe entre os bárbaros a fim de
: effehuarpãies ^ ou acabai ávida, Sam hojpe-
dados delles ^encontram a^ paXesosdò Rio ^pre-
tendem matar aos Padres \tomafe o primeiro
ajfento.
vij* i;i í
O M eíle fucceíTo fauGirâuti de" Piràtininsá chegaScie Si
*-^ Vicente i DC^
refpiraram, mas nam ceíTaram as turbações, rigodebrgar
& perigos de S. Vicente Por^we a guerra ^^^^"^Ys'^
fícaua aberta por aqudla parte , & por eíla
nam parauam os acommetimentos de morte , & po-
der exceíHuo. Viamfe os moradores , em rifcodt; deixar a
t^rra , nas mãos de feus contrários por faluar as vidas. An-
dauam Nóbrega , & Anchieta feitos huns profetas zelo-
zos, bradando por púlpitos , & praças penitencia , porque
eftauam os índios naturacs períuadidos , que tinham os
Tamoyos a juftiça de fua parte , & que Deos pugnaoa por
cllesjdandolhe animo porque os Porruguefes lhes quebra-
ram as pazes, os aíTaltaram, catiuaram , ôc entregaram
algumas vezes a outros índios contrários feus^, pêra que
os mataíTem , ôc comeííem ; & nam achauam arrependi-
mento deíles peccados. Efte cuidado trazia fufpenfos ,
auiaannos aos feruosdeDeosj Scfentiam em feu coração j
notempo em quetrarauamcom Deos, grandes impulfos
de irfe meter entre aquelles bárbaros , ou pei"a acabar as
pazes com elles , ou pêra acabar a vida entre elles : E tra-
tando o penfamento. com os; do Gouerno , o aprouaram,
como traça do Ceo. PellO' que fiados no poder diuino,
K juíti-
■: -^ c :• ri^iíC-^i-^i^âtó^iifiStóí^^
Vida d o ^P* '1 ò Í i ?k Á n c h i e t a,
^^"^^^"^^^^juíliçada caufa , & Nóbrega na fufííciencia de lofeph ,qúè
nhii do Pa o acompanhaua , tanto na emprefa , como nos fentimen-
amcterie fn'tos V & cVa ama^Q /.^ fonhccido .dc todos OS Indlos pof
tre os Ta- f^^j partcs , & eloquènciá no fálai: Brafilico. Renouados
acabar as pa- primciro OS voto$ íaticoscle lua religiam i na primeira ói-
^"'^'''^'^'■taua daTafioa de 21. de Abril,defpedl^^^^
íbs,Íc ! oftpli dos reusdifti poios, partiram os dous miíííona-
rios pêra os lugareè fronrtiros dos Tamoyos : ôc chegara5
a fuás praias a 4. deMaio de 1563.
2 Difta efte lugar por computo do mefmo lofeph ,16.
Defcnpçara (egoas de S. Viccnte correndo ao norte 5 altura de vinte
T&moyos. & tres gfaos , &Z hum quarto. Tem feu principio vindo
da Villa deS. Sebaftiam aoful , da vitima ponta da en-
^'y^-A- feada chamada dos MâramomiSi fronteira à Ilha dos por-
cos , & correndo as tres efifeadas feguintes dos portos de
Vubatjgba , & Laranjeiras , até enteftar com o gram
Cairuçú , penedia disforme , efpanto de nauegantes , ôc
cerco horriuetpellofertam , de altas ferranias , incultas,
impenetraueis , muros em fim eternos da nature2a. Efte
era o fitio daquelles bárbaros. Daqui fahia o mor terror
dos Portuguefes daquellas partes ; & deftas praias defpe-
diam numero de canoas guerreiras formidauel : & do fer-
tam exércitos temerofos de frecheiros , que como feras
rompiam as matas , & trepauam a penedia pcra poder ac-
commeter , & nam podiam elles fer penetrados , nemac-
commetidos. ' •"" ^"^^'^
3 No ponto que chegou a noticia defta barbaria,
que tinha aportado a fuás praias gente eftranha , arma-
ram logo fuás canoas à empedirlhe o paíTo 5 chegando poré
a prefença veneraueldc Nóbrega, & Anchieta , ja conhe-
cidos delles por fama devaroensinnocentes , amigos de
Deos, dos Chriftaõs ^ 6c Pais dos Índios , Sc muito mais
ouuindo a eloquência dasfaudaçoens de lofeph, em ftu
próprio idioma , ficaram fatisfeitos, fíaramfe delles , òc en-
traram emfeu barco fem receio algum detreicann.Ouui-
ram
LlV ROIICa Í^ITVLO V. 7^
fam os, meteram-osem porto feguro junto ahum Ilheo,
& dcfpediramrc. Aó dia feguinte vieram os Principaes de
duas Aldeãs pêra tratar princípios das pazes , ôc deixando
no barco doze mancebos em reféns , mandaram que par-
tiíTem eftcs à S. Vicente , ôc elles leuaram por terra os
Padres com refpeito deuido.
4 Foram hofpedados na cazadchum velho por no-
tne Caôquira , entre os Tamoyos Principal , & poílo que
gentio , de boa ihdole , ôc pêra com elles de grande
authoridade. Antes de OUtra coufa , armaram os Padres i^^ej^lc
Igreja entre hum arUoredo , cuberta de palmas, pobre, í=»"ifiça6 cor
mas limpa , ôc decente : Aqui fizeram aos noue deMaiobnbar°os.^
o primeiro facrincio , que vira entre íi aquella gente barba-
ra , primeira acçam de graças dos noíTos , pelías mercês
ate ii recebidas, & primeiro propiciatório pellas que efpe-
rauam receberem miíTam , tanto do feruiçode Deos. C5
eílesfacriíicios continuaram todos os dias , & era grande
oerpanro,ôcreuerenciadaquelia gente , que nunqua viri
coufa femelhante Feita T^rejá , em lugar de íino , a vozes ^^""^ *
altas conuocauam a lanta douctnna , primeiro os mim chnftam,fa6
nos , & depois os grandes , que corriam a bandos , huns'^^'^ cuuidos.
a nouidade do a(5^o , outros a noticia dos filhos, por cu-
rioíidadeiporém logo paííadosbreues dias , de veras, por-
que ficauam conuencidos da eloquência de lofeph , &
fuaspalauras , que como fetas penetrauam os coraçoens
explicandolhescom frazes, femelhanças , 6c metaphoras
propias de fua naçam , de que elles muito fe leuam ^ os
miílerios de noííafanta fé, em forma , que refere o mef-
mo lofeph , que breuemente chegaram a ficar inftruidos,
Òc podcram ferbaurizados, fe eíliueram em parte fegura 5
& que fazia nelles grande impreííam o rigor dos caftigos
eternos , com que auiam de fer punidos os que comiam
carne humana,&:commetiam femelhanres delitos aosfeus^
pafmauam , & prometiam emmendarfe. A mefma doutri-
na annunciaram nas Aldeãs circumuefinhas, muitas , ôc
K ij nume-
^mÊÊá
:-v';"r^'4<->:..íâÊ$!í!K<?:íii^
■
ftí»!
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j6 Vida doP. Iosiph de Ancí!iita>
ntitMerofas ^ ^ moârauam afeiçam aos Padres , tendo os
em conta de homens, qae tratam com Deos , fuperrores a
todos fcus Pais, x^ueclies tem emcontade Profetas.
Defcobrem 5 I^ chegâuam a deícubrirlhes todas íuas traças de
aiVcph du55^ygj.j.^ ^& as que tinham preparado pêra de nouo acom-
fo>ça?d"e ' "" meter aos Portuguefes : Por mar eram as canoas duzentas,
gueira. por tetra eram todos os arcos , que habitauam as ribeiras
do Rio Paraíba , com pado feito , que deííem todos jun-
dos fem ceffar , até acabar com a Capitania , ôc fenhorea-
rem a terra. Entam deram por mais bem empregados os
trabalhos , & perigos de fúa milTam, quando a viftadeftes
apreftosconfiderauam os dos noíTos tam diminuídos em
6 Eftando as couzas neíles termos também afTombra-
nXcuío dos .foy corrédo pella coíla a famafempre acrecentada,de co-
**" arilnd ™^ °^ Padres eram chegados a paragem chamada por lua
fo%nteT'linooaaem íperoig, & oa que vinham 5 a efta voz todos
cípTi" mr"qu? habitauam nas partes do Rio de laneiro. intereííados
tar®sPadres,j^^u^efj^a auerra, fe alteraram , tomando mal o trato
& eftormia.. ^^^ ^^^^^^ Partiram fem demora de diuerfas partes em fuás
canoas os mais zelofos , determinados a matar os Padres,
ôc com fua morte eílrouar os concertos. C hegou entre
todos primeiro com dez canoas a ponto de guerra cfquipa-
das , hum grande Principal chamado Aimbiré , amigo
dos Francezes , & fogro de hum delles , inimiciííimo dos
Portuguezes , porque fora aíTalteado^ delles , metido em
huma barca com huma ferropea nos pés, donde fogira a na-
do 5 lembrado da injuria , &: de natureza tam cruel, que
por há erro que cõtraellecommeteo hua de vinte molheres
„ . . que tinha,a mãdou abrir viua, & tormentar até morrer.Eíle
rigoT^idr^ois chegado a Aldeã , onderefidiam os Padres, tratou de
dosPàdrc. J^^.^^ ^^^ ^^ ç^^^^ ^yg feni duuida os mataffem na mi-
Ihor occafiamque podeíTe, & aposiírolançaíTemmaÕdo
barco , ôc dos Portuguefes que alli os trouxeram.
7 Feito efte confelho fecreto , ao dia fegumte de-
zejando
Livro lí. Ca ^. Vj?
í^r
Entram eni
das
zejando OS anciãos da terra tratar das pazes ; quizeram íe^^"J[*"J
achaííe prefente eíte Principal das dez canoas , por fer en- pazes.
tre elles de grande authoridade ; Sendo auizado, veio
à junta 5 porém com grande multidam de armados, mo-
ílrando bem Tua tençamíacrilega. Fauorecia mais a occa-
fiam de fua maldade , que no mefmo tempo fe achauâ
auzentea maior parte dos pou os daquellas Aldeãs j idos
a (eus lauores. Tudo prefentiram os dous feruos de
Deos 3 porém feu coraçam eftaua forte , dczejofo de pa-
decer a maós áos infiéis por caufa tam jufta. Chegados
aos votos das pazes , o defte Principal foy dirigido
a ícu intento 5 & a primeira condiçam que propôs compropoft^aé
grande arrogância, foj que lhe hauiam de entregar pri-imbuè.
meiro três Principaes dos Índios de S. Vicente 5 que fe ti-
nham apartado dos feus, dandolhe guerra em fauor dos
Chriftáos , pêra os matar , & comer. A eíla propoftataô
iniqua , refponderam os Padres com grande quietaçam,
ôc n-odcftia , dando rezam da impoííibihdade 5 porque oSp^5°^j**^°^
qu ' p-diam , eram ja da Igreja de Deos , & amigos dos
Portuguefes : E fendo aíli^ nam era poííiuel entregarlhos ,
porque iriam contra a ley de Deos , 5c palaura dada ; Que
entre Chriftaõs a primeira coufa, queandaua ante os olhos
era a guarda da fé, & lealdade , a quema prometiam, ôc
que tendoa prometido àqueiles Principacs, como que-
riam clles queaquebrafíem í' antes daqui era bem que to-
maífem exemplo pêra folgar de ter por amigos os queaf-
íi fe rxioftram confiantes na palaura dada 5 ôc o contra-
rio deuiam eftranhar , collegindo que quando com aquel-
les fe qiiebraua a fé . também fe quebraria com elles ; Qud
por outras vias poderiam moílrar os Portoguefes íerem
amigos feus , mas que nam conuinhá por efta.
% Diííeram os Padres , & moueram com fuás rcfoeá
os circundantes , porem o peito deííe bárbaro ficou tam^"[^^^V^^
duro , como de primeiro, ôc concluio com mais foberba,
& arrogância com eftas palauras em feu eílillo : Pois que
K iij vos
r^:->€.^ ^
Findobuçu.
âlTento vi
mo que fe
ÍOtíSOU,
^8 Vidado P. Ios£pH Anchieta,
vos outros íois efca^os de meus contrários , que tem mor-
to, &: comido os meus , & nam os quereis entregar , nao
•tenhamos pazes 5 & viroufe defcorteímente à outra parte
filando os que o feguiam armados com o olho nelle , ef-
perando o minimo aceno do que ouueíTem de fazer: Pore
neíleeftado tomou a ma5 o velho Pindobucu , Capitam
da Aldeã , & com taispalauras Ihemoftrou fua pouca re-
zam, que ram oufou paíTar adiante , ou porque entre efta
gente he grande o refpeito que fe guarda aos velhos j os
quaes veneram como pães 5 ou porque Deos lhe intimou
a eííícacia com quefallaua. Nam era com tudo coufa fácil
à desfazerfe a dificuldade daquelle apaixonado Principal,
que dependiam as pazes muito de feu voto 3 porque fala-
ua em nome de muitos , que eram quafi todos os do
Rio de Janeiro, mas pêra diuertir o negocio aííenta-
ram hum meio, ditado parece do Ceo,& foy que o ponto
dos três Principaes que pedia , fe mandaíTem propor a S.
Vicente as cabeças maiores do gouernc. Aceitou o bár-
baro a condiçam, ôc quis elleíer o embaxador da propo-
íla, confiado que, ou fairia com afua , ou com fuás ca-
noas perturbaria o eílado das pazes , aífalteando os lu-
gares dos Portuguezes, Porem Deos difposao contrários
porque os Padres efcreueram aos da Republica , que de
nenhum modo deíTem ouuidos â propofta tam impia , ain-
da que por negala pofeíTem em perigo feus legados de fe-
rem mortos , & comidos dos bárbaros : Segundo o que
nam teue effeito eíla parte : Nem também a outra da
intençam do embaxador ; porque foy recebido , & tra-
tado dos Portuguefescom tais fauores , que entrou eo-
tente , & de pas.
CAPI-
*^. IivròII.Gap. cVÍ.;
•17.: CAPITVLOVI. 'í't"P«í-i ■
Correm os Padres outro nõtauél perigo du^da^
Efcapam delle por mercê de Deos .• Pajtnam os
c*-;/ iarbaros de (ua continência: Efirmã[eofegm^^
\ do a ffento depares. b^m'sv\ . ^^f}o^^í: <.
l V REs ia osPadresdo perigo aííimà , en-
tram no legundo mais apertado porque an- ^igo j» vidt
dando ambos na praia, encOmmendan-^"!,""^""'
\ r Ti^ n ' osPalreí,-,
doíe a Deos como coítumauam ^ viram quecomo fcram
vinha iiuíDa canoa a toda apreíTa , efquipada com trinta re-^*""'*
meiros , ôc demoraua pêra o porto onde eftauam. Eerao
cafo , que vinha nefta Paranàpuçu » que quer dizer mar
efpaçofo , Índio Principal , filho do Capitam que gouer-
nauaaquellamefma Aldeã , onde os Padres entam habi-
tauam ( por nome Pindobuçú , que fignifica palma gran-
de , muito amigo noífo ) deixando atras outo canoas que
capitaneaua j o qual fabendoas nouas que tratauam os
Padres de pazes , & tinham pevfuadido aella feu Pay , vi-
nha a toda a preíía reíoluto a tirar a vida a taes embaxa-
dores , por perniciofos ao bem commum de fua naçam ; B
tinha dado ordem aos feus , que em chegando lançaíTem
mão dos Padres, ôcque elleos mataria ; Porque meu Pay
(deziaelle)he velho, & nem por iíTome ha de matar. Vê^
do poisosferuos de Deos a canoa , fabendomuybem quã
mal tomada fora fua vinda de todos os do 1^ io de Janeiro , ôc
que tinham confpirado em fua morte , furpeitaramlogoo
que era , & começaram a retirarfe ao pouoado da Aldeã j ^^^^^^^
d iftante como quinhentos paííos. Porem aqui traçou o Ceognciofo.
hu como entremesgraciofo. Era Nóbrega velho , & Ipfeph
rendido pellas coftas, a retirada longa > & tinham hum
rio
Jt};jr.n:36 -á
f?iíl,Sg^*^
tê \
■m ;
m
m
^ V 1 b A-Bô fé Íò-ÍE-PH Anchieta;
rio , cjuepaíTar, fem peíToaalguma^que os ajudaííe : Tudo
fazia áiiicuMadevmas era fdrca eoncraftállá. Apertarámo
paíToquantopuilê^fa^ pòr^queilas ajrçis feitas , mal fegu-
ras , fenam que chegando ao rio , quis parar Nóbrega pe-
Taíefedí^f feuÉriá:^ 6átas que na \'eíhice lhe tinham recei-
tadc).:Q,%^dicos;^^5ie4içina de fei^s aeháqiiçs 3 via lofc-
jh^.qijea canoa inimiga vinha voando , &: nam daua lu-
2iar a vagares ; tirou forças da occaíiam , & tomando ove-
lho âscoílas , pretendeo paííallo aoutra partejmas cõmo
eram ellas quebradas , & o fogeito fraco , gemendo com
a earga^ , no meio do pio j deu com ella nagoa, rq0l|ian-
ii;, dofe ííam fomente as botas , mas todo o rnais fato. Que
-Br- gracioío a<5i:o efte pêra oGeo, que eftaua à mira, ôc fol-
rni-í i ^ gauade ver as ãc(pQns deílàs duas figuras. 5 que fariam
molhados , & pe^à^os, avíftadas azasda morte, que na
canoa vinha chegando. Meteramfe entre o efpeíTo do ar-
uoredo, ôc tirando Nóbrega as botas ,& ambos a roupa,
deixând^D fomente a interior, que nam pode efcuzara mo-
deftia , tornaram a tentar o caminho com o faro âs coitas,
mas como eíle era pezado , Ôc a vereda ladeira ingrémej
cançados tornaram a parar. Ia nefte tempo hiam
ouuindoos golpes dos remeiros apreííados , a cujo aíTom-
brofe dauampor rendidos à morte: Porem depois de
poílos de joelhos em oraçam , quando mais faltos do fia;-
mano , traçou a prudência diuina , que hum índio dejcir
do ali da Aldeã ^ como a cafo/lhe leuaíTe o fato , ôr psr
ajudaííe , ate introduzillos , antes de chegar a canoa., iia'
mefma cafa do Pay do Capitam do Capitam dellá% q
Brincipal Pindobuçu. ioq^Uii
Acabícm bí ^ Námfe acabou aqui a comedia 3 porque eftaua' âvP
ointentode zcntc da caza O fenhor delia Pindobuçu , em quem con-
atâDapuçu» £^y^j^ osnoíTos , & vinham chegaudo OS contrarios Que
remédio /o Ceo , parece que andaua de propoíito compo-
dpfcenas , pêra fahirao depois com hum fim alegre : Por-
que entrando o fenhor da canoa accompanhado de muitos
feus
tTVRoII.CAVVl. niV i5jf
fcuscm cazado Pay,achando o auzonte , ôc aosReligio-
fos portos de joelhos, cncommendandofea Deos, ôc rezan-
do as Vefporas do íanro Sacramento ( porque era o dia fc-
guintc do Corpo deDeosJefperando por feu vitimo trago
no tempo que chegou a fua prefença aquelle animo dana-
do 5 conccbeo tal terror , ôc refpeito que ficou parado.Con-
ucrteo a fúria cm pratica, & ouuindoas palauras , cfpe-
cialmente de lofeph , eloquente cm fua lingoa , acabou de
mudarfcconfeííou de plano o intento com que partira,
ôc o com que entrara naquella caza , mas que em vendo
fuás prezenças , Ôc ouuindo fuás palauras ficaua ja troca-»
do , & pcríuadido , que peíTcas racs nam vinham com
traíram , ou engano.
3 Veio de fora o velho Pindobiiçu fenhor da caza , & ^^^ ^ p.^ .
fabendo do fucceífo do filho , moílrou roílro alegre, fi debucòdefò-
gnificando que fentiria muito, fefuccedera algum mal aos"*
Padres. Era índio de boa capacidade , 6c chamando o fi-
lho a parte , lhe fes huma pratica , fobre a grauidade Pratic. que
de coílumes que víraemfcus hofpedes : Gaboulhe fua^"*"^'*""*
ap:aíiuel prefença , fua grande conftancia de animo, def-
prczador de todos os trabalhos , & como entre tantos què'
procuraram oífendelos, nunqua defcompuferam fua fere-
nidade s & concordou em tudo com o conceito que forma-
ra o filho. Huma coufa fobre todas as outras tinha admi-
rado efta gente, & era cfta a grande continência que guar-
dauam , porque tendolhc ofFcrecido os Principaesdaquel-
las Aldeãs liberalmente filhas , &Irmans , coílume
commum entre elles , com a mcfma chaneza.ôc facili-
dade quefe brindaram huma cuija, ou copo devinho.viaõ
quefempreos Padres as rep;ciraram. Difto pafmauam. & ''*^'*^*™^*
cnegaram a preguntarlhes , como era poífiuel aborreceredosP'<ir«,
o que todos os outros homensappctcciam .'^refpondeolhes,^,^,''','/^''^
a iíío o Padre Nóbrega , tirando da algibeira humasdifpli- <*«'**•
nas , moílrandolhas , ôc dizendo que magoando com aquel-
las feu corpo , aífegurauarn a continência, & defendiam
L de
Sc^un
^ Vida doP- IosipH de A.Iic ht Eta,
4e Ímpetos ^lafciuos, & vmouimentQS defor osnado^ da carnCé
Aqui fícaraxji elles niais acçniicOs de jcòufa -tam nona.
Tinham aos Padres nor amÍ2;95 do Creadox das couzasj
ticàie Findo- ^ cntre rodos Pindobuçii najo QeUanà de.praíicaraos ieus
''"^^* tjae eram Jiomens , qaefalauam com Dcos , aosquaesxlLe
d^efcobiria íeus fecreto^ ; E aos do.K io de lanelro dizia , que
yiííem que £e algum àggr ano IJnes faziam , hauiam de fazer
vir do |Ceíb.n;^ortaodade de peíles coníra elks. Punhalhes
lexemplo ; S,e pos ;outro5 temos medo de no&s Paes ( fam
ícus feiticeiros) Ôc naai ouzamos offendellos 5 quáto mais o
deuemos ter deftes Abarés(aííi chamão aos P P.)queíam ver-
dadeiros Paes,fallãocõPeos, & nos lançarão (íequizerem )
camarás de Tangue, & febres malignas,comqoe todos unorr
ramos ? cõ eftas pratí^cas de Piiidobucú,ningl]cm íe atreuia à
tratar mal aos Padtes, ôc .trataua-os elle coo^o íilkos , &
lhes pedia o encommendaííem a feu Deos : Quenam ret
meífem 5 que elle » & os feus fe poriam em terreiro por
.^,,., ellfts. ,Çoinful;taMa-os todos os dias, ouuindo com gràiidc
.;rí;B í atjençam, eípecialmente os mifterios da creaçam do mu-
do, & Encàr;jaçam do filho de Dcos ; E fendo combati-
do por varip vezes dos quecada dia vinham do Rio , que
mataffeíin os Padres,, fempreos defendco , abominando a
tal refolgçam. AcHàuare fempre prefeme âMiíía , & paí-
maua de ve;r aquellasfa gradas ceremoruas 5 ^ifoydema-
FiT,áitofoteneirafeuapro;ueita:tB.ento,que por premio do€eofoy cílc
Pmi.bu^íi. v.eaturoCoJndioPindobuçú, depois de perfeito carhecu-
mcno dos Padres, hum gwnde Chriftaõ, notauel entre
mi^itopj & como, tal obrou ate o fim da vida.
V . A Che2áuafeOítem.po deconcluir o aííento d35 pa-
Srgiindó CO. ^ • O * r-^ r i\ C ^c O-^
(cihoÁjiPi' zes , jentraram outra vc;z tm iLonlelho prelentes os ra-
dres. Aqui djefabafaramentam alguns dos Anciãos , quei-
xandoíe de ^í^itigâs magoas. Diziam que os Portugucfes fo-
ram os prinleiros qtie quebraram as pazes , firmadas de
huma . & outraparte , lhes fizeram guerra , & os catiua-
rgm, & tra,tauam , como beílas de carga : Vos outros ,
(deziam
dres.
,*■.-?
Livro II.C AP VI; , /
»J
(^ diziam elles) quando nos cometamos guerra contra Ti- AÍ^-^ôsf"**
miminos ciente dograndc Gato, confiados na mulcidam
de arcos de noííbs inimigos , os ajudaftes pelejando corti
clks contra nos 5 mas Deos nos ajudou ,& podemos mais:
Porem a^ora : ôc aqui calaram. Sabia mui bem o Padre
Nobreí^a , que tudo o que diziam era verdade- E parece-
dolhe fazia melhor negocio em conceder com elles , dif-
íclhes aíTi Eu porque lei que Dcos efta irado contra os
meus , me offcreci a vir tratar pazes com vos outros pê-
ra com iílb o amançar .- Porem agora por fua parte narrt
feham de quebrar eftas pazes , que por iíío trago eucâ a
minha cabeça , & a de meu companheiro fem medo al-
gum, porque trato verdade. Mas também vosaffirmo da-
qui , que fe vos outros as quebrais, entendei , que a ira
de Deos fe ha de vir^ircontra vos, & haueis deferdeftroi-
dos. Eíledito de Nóbrega , afíírmao Padre íoíeph, qucRcfoem ao»
ramfoy fomente ameaça , mas profecia , que depois feP*'^^"-
vio cumprida a rifca, porque todos os que quebraram
cftas pazes, experimentaram os ameaçados caíligos. Por
profecia a tiueram os mefmos Índios , &c com tal a foram
publicando pcllas Aldeás, & Cornélia metiam medo aos
que tinham penfamento contra o que allíaíTcntaram ^ No
que fempre fe acharam confiantes os moradores de 1 perujg,
& pello contrario fraquearam os do Rio de laneiro, êc
Cabo frio.
C.ÍJ
:■ itj '■
Hõ
:D OJíLT- 1
ai»!
Í4iKfK'
Líj
CA PI-
soe, ..;:^ ,
81 Vidado P. losEPH Ancíiiet A,
■ '■ '.'' ■ '..'■•'■ i- i. ' ' ' -
CAPITVLOVU-
fie/õhe, NobregâpaniffeâS^ Vicente : Auerigua
. ahi tre$ Pfofecm de Ivjeph : Fica lafepb (ò
■ emre 0$ bárbaros : Seu modo de viuer admi-
rauel: Compõem a vidrada Virgem Senhora
IsíoJJa em verfo i & promete lhe ella , que nam
ha de morrer em quanto a nam acabar ^ por
mais ajjombros que os bárbaros lhe mnam..
•o V s me^es hauia, que refidiam os Padres
entre os índios , & nam acabauam de conn
cluir as pazes , pofqae dependiam amda de
algumas circunftailGiás: Pêra que eftas tiuef-
R.foiueN.. Tem efícitô » pareceo fer muy neceííaria aprefença dos Pa-?
^%%P;"'''"drescm Sv "Vicente, ôtaíí) lho fi^nificaramos do Gouerno'
i., & deixar ^aquellâ Villa; poréni os bárbaros , que -amda de todo íe
Í:t'b:r nam dauarti por regoros . derconfianam fem duuida , fe
por bem da ^^^^5 jj^ vltima aUênguaçam fe lhe fôfem os Legados das
^'''' pazes. Pello que feita^nefta difficuldade oraçam , reíoluco
o Padre lofeph conílgo , que feria feruiço de Deos parrir a
cõtendâ,& cõtentarhua, & outra parte > indo o Padre No-
brega, &ficãdoelle,&aíri lho incimoM-Sentia Nóbrega de
auer de partiríefem vitimo eííeito, &muitci mais deixado o
copaíiheiro fo entre bárbaros : Vertdocõcudo a refoloçio
que o mefmo íofeph tomara , 5c tinha por de Deos , & a ne^-
ceíTidadeVígencederuâidapera bEdas pazes^queficauaÓ
aííi contentes os Índios , cujo'de%olío ftriapccafiamde
muito dano nefta matçria, refolueo partirre*
2 Hauia de embarcarfc Nobfégá ao outro dia pella
ma
Livro TI Cap.VíI. ^ . «5
hinnliarti s na noite antecedente teuc loíeph conhecimento
de trescazos occultos, que Deos Ihereuclou , &cllecom- J;°^';;""'p.
municoii ao Padre Nobrcna por cauías iuílas. Foy o pri- Nobre; «ms
meiro , que aquella propia noite entráramos bárbaros a ^_,,i5uçrad(í.
fortaleza de S. Vicente , mataram o Capitam delia , & fuâ^^Q*-
molher , ôc leuaramcatiua fua familia. Segundo, que tu-
Jano, ( homem conhecido , & amigo de Nóbrega ) pof
delaftre de hum carro , que pafíou por íirtna delle , era
falecido. Terceiro , que chegaria fedo a S. Vicente hum
Galcam de Portugal , carregado de fazendas Com a noti-
cia deftas três Profecias panio Nóbrega na menhamdefti-
nada, nam muito eípantado de que íoubeííe couzas tarrt
occultas ( pella experiência que unha de feu grandeefpiri-
to. \ Cheaou a S. Vicente no fim de lunho do corrente Auetigu»
anno, ôc auenguoulogocom magoa lua lerem as duas p ri- s Vic'ntcâs
meiras Profecias verdadeiras 3 porque os inimigos ^^^^^^^"^^^'hf'^"^^
entrado â fortaleza , morto o Capitam , & fuá molher, vèidideiraí.
ôc kuado catiua todafua família ; & o amigo erà rrtorto
pello fucceífo trifíe docarro. A terceira profecia fe cum-
prio logo 5 porqiie depois de chegadofinco dias, aportou o
Galeam , quediííera aquella Villa, dando por tudo Ko-
brecra muitas cracas a Deos. Foy recebido emi S. Vicente,
como aquelle que era Pay de todos, ôc que de prefenre ti-
nha acabado a coufâ de mais importância daquella Re-
publica , tanto afua cufta > ôc fem opreíTam alguma Ao
V. - t ^ j Traíam do
Pouo. Começou a tratar com os do Gouerno á cerca davicimofimdt*
vitima auer iguaçam das pazes, infonmou-os ,oc concluio'*^"'
tudo bem. AosTamoyos que ali achou , fez grandes mi-
ríios , ôcagafalhos, Icuando os a noíTas Aldeãs , & re-
creando-os afim de ficarem contentes, Ôc firmes na paz.
Pôfem em quanto o Padre Nóbrega em S. Vicente trata
cftas couzas , tornemos a acompanhar a lofeph, que ficou
fò entre gente barbara , continuando reféns das pazes^^ ' :'
'^i*-- Nam^fey que maior proua podia fazer o Ceô em
hiitna alma^muito mimofa fua , qtiede propofitò qaifeífe
L iij laurar
^o''
^ 1
11
«6 VidXDÒ P. ToSEfH xANClífiTA;
laurarparà fi , que a cjuefcz com o noíío lof^ph, Nam he
hum fpeótaculo de Dcus , dos ^ njos ^ & dos homens , ver
*, . , r- hum mancebo na flor da idade, de trinra annos, ainda naó
gutânçt de cabacs > no mor vigor da nacureza , oc quando a carne, oc
•cõpanSio^ Tangue mais íenhorea , metido cm terra barbara , entre ho-
inensferas ^ entre molheres nuas 5 eile configo fò , íem
quem pudeíTe notarlhe excelTos , com combatei continuos,
& quaíineceíTarios, de olhos ,deouuidos , da carne , dos
homens , do diabo , & do propio inferno ? namfei em quç
Vr Caldeorum podia fer mais apurado hum Abraham 5 né
cm que terra Hus, hum lob ^ ai do fò { diz o Spirito fan-
to) porque fe cair, nam tem quem o leuante. Aqui hum
Chrifíam fò , huni Rchgioío fò , entre tantas occahoens
depeccado, 5c morte? ondeie cahir nam tem quem o le-
uante , nem quem o coníole,nem quem o anime, ou co-
munique Sacramento algum ? o certo he , queo nam fer
lofeph ao apartar do companheiro , felhe apartaria o co-
raram , 6t tremeria de pés , Ôc maõs , outro qualquer
homem. Entrcgaramfe muitos âs Thebaidas , aos
Erítios , aos défertos .• Neftes porem fe eram íôs, nam eram
tam malacompanhados : Porem lofeph fícafò em dcfcrto.
& fica acompanhado de gcntc peííimade U3ainfídelidade,de
fuaiílconftancia , ôc de fua crueldade. He fô no meio át
humpouo bárbaro , Sc de hunia Babilónia.
4 Queria laurar aqui o Ceo hum nouo modo de
Anachorttafò, ôc acompanhadoi que juntamentcVcncef-
fe o difificuliofo dafolidaiH , & da mà companhia . Hum
S. Antam folitariono Ermo* & hum Abraham acompa-
nhado em Caldca : lauraua aqui hum homem raro, hum,
fanto vnico > hum exemplar de Varocns illuílres , coxx^rj
poftodas peffeiçoens demuitos: Hum ioíephnacaftidade;:
hum Abraham na obediência, hum Moyzes nos íegrcd<)s,
do Ceo , hum lob na paciência , hur^ Elias no zelo^ &
Tntâ feu hum Dauldna humildade : Hum portento dem^rauilhas, &
humaflbmbroílo mundo. E eílc he o companheiro quci
Kóiiò anedo
de Anacho-
tetâ íô , &
acomp»Qha<
do.
corpo com
liÈi*5JÍ*.i
Nóbrega
^ T 1 J^ r V R* 0 1)1- C A >.i vvlqVIX. " :S7
«tíobíesa deixa fò ,. ôc acoaipartliido de h2À'}^oí. ;'V'*c
' 'r> ri i i r ... di-lo. & "1»'
,5 . Bem violoíeph ó eítaao eni ,que nc^ua ^ ççem ria - »cou pauhad©
|bU lofcph qiiecraneceíTario hau<;rlccci)-iofô,&: caíi)ip^;il
jacompanrb^adp -^ craca de guaríiarfea íi ôc de guí^rdaríb
daquclla gente barbara. Pêra tratar de gyíiXdarreail ,
; t;ra for.<ça ha.ieríe cottio morto a^ tropci de obj^étos torpes,
< que f r^m aeceflariosonde a Aatiiie?a nam cOAbecía .pej.o,
•^ a -hoiiHÍl idade nam era conhecida j que be guerra mais
■fpr,iiÇ. tra continua íua penitencia , cilicip , jejum , cohtê-
;)pbçam . quediuiríiam .a alma àDeos 6c apô^>(la 05Dlhos> ^^''^^'^^J^^
^ dczcjos. Eín lemclhantescxeírcicioshéía-bido , que pai- Viigcm s. n.
fauaamór parte das noites, porque os dias podcíTe gaílar
<çm bfOi dos homens Tomou eai primeiro lugar por ad-
■uogada daempreza , 6c muito em efpecial de fuá caíli-
-dade.a Virgtm Senhora N.cíla , nomeio do incêndio
d(e Babilónia. E era tal o eífeÍ!óderiiapro.cecçam, qnc mm
chegou acUeominimo calor , nem ainda fuiup daqjuel-
içfogo iilfernál,
6 Aqui fespromeííaà Senhora de conipor fuâ vida
em verfo Mas como cantaria verfos de Siam em rerra
.alhca , çndenam tinha liuros , nem papei , íiçm tmtâ , nê
rpenna. A tudodeu craçaoamor da Senhora. Saiafei praia Cotvpocm
éo mar , & ah junto ao brando murínurar das agoas , p^f-
-fca.ndo cpmosolhosno Ceo , compunha os vcríos, & lo- vctfo
go virando-os â praia , fazia delia branco papel, em que ps
eícreuia , pêra melhor metellos em memoria ,òqueíenti-
mentos! ôque confidera^oenS'! 8c que conceitos dizia.
Deu principio a obra por fua puriíTima Conceiçam , foy
feguindo todos os paílos defuavida , chegoy â íua felecif- •
/ima Aííumpçam , & íobio com ella ao alto trono de fua oa hum»
olofia : Nam:ticou paíío da faíirada Efcriptura , profecia T'T'!^''^*
OU dito celebre de fanto que nam enx^riíieçm íeus camos. foy v.ítano
Foy depoimento commum dos índios , que vir^im por ve- coií,pòíi9»r
zes ncfta praia huma auefinha graciofamcnte pintada , que"
cpn? hum brando voo andâua como faz^cndo feita , cm
. - . quan*
a VKla da Se*
fihorí em
:Í!Í
m
^^ Vida Do^P.IosEpH AnçhiêtAí
qiiânto lofcph hia compondo , õc cfcreucndo . & lhe fâl-
taua brincando , ora noshombros ^ ora nasmaõs , ora na
Parcctr do cabcça , OU pcra moftrar a lofeph o cuidado que o Cco ti-
Aut..rfobre nha dcUc: OU pêra moftrar aos índios o com que hauiam
cftaAuí. , r ' \
dercípeitalo.
7 O que eu tenho pêra mim fobre aquclla auefmha
hc , qucdcciaella a trazerlheo deípacho da que pretendia
da Virgem , cmgalardam de feu trabalho , & amor; &
era o dom da confirmaçam da pureza 3 porque o cantou
aíTi o mefmo lofeph cm Teus verfos dizendo , que cila o
guardara puro , & limpo de todo o penfamento laíciuo,
nos vcrfosreguintes.i¥/6- tua matemp me grana fou -t amon-.
T> corpm mtum , menscji^e regente fui f. E aííi o diíTe de*
pois de muitos annosa hum Padre^ amigo , qudxandofe-
ihe efte de pcnfamentos i^uporiunos , & tcnraçoens da
fcnfualidade : Aconfclhou-ò que nam pediííe a Deos lhas
tiraílè 5 mas que lhe deíTe vencimento nellas >& acrcccn-
tou ; porque cu fey outro , ( he certo que fallaua de íi)
que 6 pedio defta rnaneira , 5c foy ouuido ; porque com-
batido largo tempo de femelhantes tentaçoens , fauoreci-
do de Deos, & fua May fantiíTima, naí;n fô nam caio,
masrecebeo promeíía fcgura de nam cair ja mais : Fez o
amigo o que lofeph lhe aconfelhara , Ôc dentro de trcs
dias o aííegurou , que dali em diante ceííar a aquella im-
portuna batalha de fuás tentac^ocns , õc cxperimcncou o
aífi.
8 Nam foy cftc fomente o premio de feu doce cã-
yf.Tar; teuc também reuela^am da Virgem , que paíTaria
srandcs aííombros . & cfpantos da morte entre aquelies
nas que nirr barbaros : Porem que o nam matariam, porque queria
'~"'tlxft que acabaffe , ôc aperfeiçoaíle fua vida. Afílodiííe omcf-
'«1* mo lofeph por fua propiaboca 3 porque tardando a repo*
íta da paz de S.Vicente , enfadados os barbaros , feitos feras
cruéis , Ihedifferam hum dia : lofeph aparelhatc, ôc farta-
tc de ver o foi 5 porque tal dia temos alíinalado pcra fa-
zer
Tem rcufl»
çtvn que
f«tia grínács
kfíonr.bros
nas que
jTorrciii sté
nam
çoir • tT
da Senhora,
AT.
zer banquete de ti , fe ate cntam nam vier repofta dos
teus. ReípondeolhesIoíephccmorironaboca.Eufermui
bem que me nam haueis dematan E perguntado depois
porque falaua com tanta confiança i diíle claramente,
quepella palaura , que a Virgem lhe dera , quen^m con-
finteria que alguém o mataffe antes de acabar fuá vida.
9 Parece que Hia igoalmente poetizando , èc pro-
fetizando efteferuo deDeos^ porque por eftemeímò tem-
po, em quanto as pazes fe acabauamdeaueriguar , enfa-
dados de eípcrar alguns Tamoyos , ou leuados de fua na-
tural inconftancia , nam obftante as tregoâs , deram aíTal-
toem certa parte de S. Vicente , & trouxeram a Iperoyg
algúsPortuguefes catiuos. Tratou lofcph fobre feurerga-
tej & como o preço concertado tardaíTemais doqiíeaf-
fenfaram .refolueram os bárbaros fazer pafto dós Portu-
guefes. Querendo executallo chegou lofeph, & com cfpiri -
to do Ceo lhes prometeo aííi. O diaquevcm quando/ofolP.foteáS
chegar a tal lugar , (moftrandolho com o dedo ) nam de j, chegada
vir Icm duuidaalgumaosque trazem opreço do refgate ^^àottfgt^c,
iò até entam peço que erpereis ; Ediííeihes os nomes dos
homens queotraziam,onumero, ôcacalidadc das peças
de pano, & ferramenta ( que eíleheo dinheiro dos ín-
dios ) ôc concluía queempenhauaíuâ cabeça , &: íeviíTem
que nam era verdade , lha quebrafíem Satisfeitos os bár-
baros com a efperança de tam boas peças , dando inteiro
credito a Jofeph, que tinham por Payeguaçu dos
Chriftaõs, defiftiram, & viram com Teus olhos o effeito,
aíTi comolofeph o pintara 3 tomaram feu refgate , &: en-
trega'a n liures os catiuos. Defta tam fmgular Profecia faz
mençamoP. Efteuam Paterninana vidaque tradufio de
Latim em Caítelhanodovencraud ?.Jokph,imrofe^m-,
do cap. 5»
M
Cá?'
íWi
I
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YiDÃDÒ P.IõsEPH Anchieta,
4^««3"e^-'i
. . cAmTVLomii
Proj^â^Iq/èpFo refugio de hum grande perigo
abum amigo .- Dd vida a huma criança com a
facada agoa do hamifmo .• Refufcita outra de-
pois de j a enterrada :T?retendemmatàlo os Ta-
moyos do Rio com grandes ajfombros, fem ef
feito : Defcobreje hum grande enredo , conjir-
mamfe as 'pazes i ficam todos amigos.
H E G A á A a efta terrra barbara hum
Aires Fernandes amigo de lofeph , com
certa occaíiam; Tratauamos índios em fe-
gredo de catíualo , & fazer delle hum ban-
quete : Foyauizado o pobre homem, ôc dezejaua aco-
Iheríe daquella praia auara^nam tinha porém embarcação.
AíTas aííligido deu conta ao Irmão lofeph de feu grande
Outra Profc- • ^ r- j n n v-r i ^ .
ciacomque pctigo , rdpondeulhe elíe : Nam tendes que temer ami-
go , porque em tal parte da praya haueis de achar ame-
nhaã huma embarca çam cm que vos faluareis , diífe, ôc
fuccedeo afíl.
2 Eftas fam zs obras de lofeph fó : As de acompa-
nhado fam asfeguintes. O tempo todo que lhe fobejauadc
fi , do trato de Deos , ôc da V irgem , empregaua em prouei-
to dos bárbaros. Todos os dias tomaua horas aííinaladas
pêra falar com elles do bem de fuás almas, & declararlhes
a doutrina Chriftam : Dizialhes, que hauia outra vida .
VI 1 lia us < t .
bárbaros coip prcmio para bons , & caftigo pêra mãos , cfpecialmente pe-
grtn e rmto. ^^ ^^ homicidas , Ôc tragadorcs de carne humana : E ouuc
muitos que fe abftiueram por tempo deíles peccados, (&
nam podia chegar a mais a eííícacia da doutrina) poderá
bauti-
lira hú ami-
go de morce,
Doutrina os
Livro ir Cap.VIII.iiV 91
: báutízàr quafi todas aqudlas Aldeas5nias atedendoâo peri-
go de retrocederem ficando (os , o nam fazia : Bautizaua
lomente os que eftauam iii excrcmis. Entre elles hé no- . ^
tauel cazoofeguínte. Parira humà índia > & vinha clpiran- criança, po-
do a creatura > trataliam fepultalla : A efte tempo che-^ j^";°";^-
oou lofeph , pedioa, bautizoua , oc cobroiUogo vida:agtaçt avi-.
iChamoulhe Maria , cntregoUa a feu Pay , que era hum ^~ ^*- •
-lho de Pindobuçu , por nome Guirâaobuçu. Foj cafo eíle
jnarauilhofo de que ficaram pafmados os índios.
■ 3 . Mais efpantofo fov outro cazo , & mais celebrado sçgojjjoÈafd
dos índios. Tinha certa velha enterrado viuo hum meni-^^^utro qufe
no filho de fua nora, no mefmo ponto em que o parira. pois dccú- '
por Ter filho â que chamam Márabà ( que quer dizer de'"'*'^°'
miftura âborreciuel entre efta gente ) & era o que pârio
a Iridia eili poder do fcgundo marido i tendo fido gera- .,
do por oucro , com quem fora cazada primeiro .E
íiam era parto adukeríno , cohio cuidou o Padre Fater-
nina aíima eirado. Foy lofeph auifado do cafo depois dè
paíTada mais de meia hora,a<: indo ao lugar , defenter-
rou o , ôc bautizou o viuo i & fam \ ôc entregou o à mo-
Ihcr fcíTura pêra que o criaííe. Succedco o cazo a vinte Ôc
outode iunho do prezcntç anno 5 & foy ferhelhante á
outro que lhe aconteceo em S. Vicente: Foy aífi. Tiuera
noticia que huma gentia hauiâ paífádo hum filho , ôc veri-
doque era monftruoío emalgumas partes do corpo , ^^\^^^^^^^^
«ergcnhadâ , contra toda a piedade de may, oefcondera,
& encerrara viiio : Acodio a preíTa, defeiiterrou-o ainda
com vida .applicoulhe áâgoa do bautifmo i & logo en-s
tre fuás maõsmorreo , pêra viuer eternamente. Viam os
bárbaros eftas marauilhas > êc tinham a lofeph por máis
que homem.
4 Porem nam defifte o inferno. Keftemeio tempo ^Ef^^jj^g^^^
primeiro de iulho decorrente anno, chegaram do Rio detropcrigçí
Janeiro outo canoas guerreiras de Tamoyos com
intendam ainda de matarem o Legado das pazes, de cujo
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Leuantímen-
^t VidAD;QP* loSHPH ANCHIETA,
reato fenif ri fe ag^tiau^ram ,' Porem depois de faltsareih
lem. terral ; dbe^ndora^lar com lofephj ôc ouuindo fuás
palauras /ficaram outros 5 èc diíTeram , que tinham rezaõ
os qiJe diziam queeíleera o gram Payeguaçudos Chri-
ílãos , que amarraua as líiãos aos homens. ,, .,3
5 Aos féis ác , lulho chegaram as canoas que
° tinham ido a S. Vicente com o Padre Nóbrega 5 & c5
avinda deíles intentou ò inimigo , pay dasdifcordias ,âr--
EnreJo dia- niar hum cnrcdo tcrriuçl. Chegaram dizendo que vinhaia
Ao^LTll fogindo , porque lhes diífera hum efcrauo ^ que os Por-
tugueíes os queriam matar 5 & que com eifeito hum
Domingos de Braga matara hum índio da companhia
de Aimbiré ( aquelle Principal , que rinha ido fobreapro-
poíla da primeira junta j ôc fizera que hum feu Irmam
IhequebraíTe a cabeça. Com eftas mentiras ficaram trium-
todos dp Rio. pnances todos os moradores doilio , que tinham vindo
com mà intençam contra lofeph / & dandolhe credito , fê
leuantaram logo , & na fcgumre madrugada fogiram pre-
tendendo leuar configo a lofeph , & certa gente que tir
nha vindo de S. Vicente, porem Pindobuçu ^ & outros
Principaes de íperuyg , os defenderam , reprehendenda
aquelles de maneira , que hum delles corrido cahio na
contado feito tam feio por dito de hum f6 efcrauo , & fe
ficou dizendo que queria antes morrer com os Portugue-
fes. Seguiram os outros feu caminho 5 ôc hum por nome
Caàquira , o mais poderofo entre todos, teue poder pêra
entrar de paííagem nacafa de lofeph , ôc alTombrallo, di-
zendolhe a modo de ameaça : Eis aqui que imos fogindo,
porque os teus nos queriam matar ; A ifto nos mandaíles
a.S. Vicente, pêra que nos confumiíTem a todos ? Mas
diíTe , Ôc foyfe.Ficou lofeph turbado com tais nouas , po*^
rcm logofoube o fundamento delias.
Chegam Qu- 5 Ainda bem eftes nam tinham ido, quando
trás dez cano>s ' T.
lofeph, chegaram outras dez canoas do Rio, cuja gente logo
a
na
faõ aujinte. "^^i^^^^^car a lofephcomgrandcs eílrondos> ôc carran-
cas
X.IVRO II. C A^.;YIJtv. v 9^
c^\^mzs (heganidoaruaprefença, nenhum fe aí;reueo á
Jan^arlho a maõ: fizeram com tudo q pêra que fò tinhain li-
cença do Çeo , 5c da Virgem^ ôc por finco dias gob;
tinuoso aííombraram , maltrataram, &: roubaram a po-
breza que tinha, intentando leualo a fuás terras, ou ao
menos hum Português que alU eílauaa fua fombra ^ cha-
mado António Dias, que tinha ido arefgarar fua molher,
& filhos catiuos em as guerras pâíTadâs. Keriíliram porém
os da Aldeã valerofamente 5 até que o Principal Pindobu-
^u (queíò por refpeito defegurar as pazes , 6c ferem el-
les hofpedes , tiuera paciência ) enfadado ja , (t foy a
elles com a efpada de paò na mão ^ a vozes alças dizendo p^^^-j^^ ^^
afli :.Nam querem eftes vagabundos fenam quebrar ca- Pinciobuçu
becas de brancos / pois eu o nam hei de confentir , que rí"Í"°*
tenho empenhado minha palaurâ 5 ôc hei de fazer ^ pazes
com elles : E faibam que eíle Páy dos Chriftaõs hc cònfe-
Iheiro de Deos j&fe alguém ooíFender, ha devera mor-
te fobre íi , & os feus : £ faibam também que aquelle Por-
tuguês António Dias faz as cazás dos Padres , êc do Deòâ
dos Lhriftãos/^iílo dizia porque era pedreiro) Sc fe algueni
lhe empecer ^ que ha Deos de tornar fe coiltrá elle ) còmò
fe oííendera aos Padres. Ifto dizja cbm tal brauefa , &c
bater de pés, & palmas, (final de defafio ) que âcudiranl
os feus armados j & ouueram de vir as frechadas.- Porem
os contrários calaram. Ag<'ande fidelidade dcíle Principal
moílraua bem o que depois hauia de vir á fer. Daqui foy
ter com o Irmaò , & lhe diíTe °. Filho lofeph , nam tenhas
medo, porque bem vez d corno eu torno por ti : Por iíTo
falia também com Deos , que me dé larga vida, /^na8
íabia ainda entamrn ais pedir , J nam. hajas medo que te
deixe matar , àiiidaTjue os teus matem os meus em S. Vi-
cente 5 porque íei'Ç[uc tratas verdade. Serã porem mal, fe
as coufas que por aqui fe dizem ferem aíli. Agradeceiílhc
lofeph o offício de Pay, prometeulhe fua intercedam dia-
te de Deos, E com animo ãíToíTegado lhe aíTegurou;
M iij qtie
amigos.
H ViDilbb P. Ioseph; Anchieta,
qúo cedo àuia de vèr que era falfo tudki) o que fediiía;
Chegam To Nam tãrdoú Dcos ein àcudir pcllos fcus ; poí*-
dioedeSVi- . _ 'i 11 - i i
ccnte,defco-que qmndo inais 'eíiauam embrauecidos aquellcs barba-
daíentodT TOS , chcgou aprayaòpropio Indio dâ companhia de Aim^
todo o enre. |3Jj.g ^ ^^ qucm diziam quc fofa inorto por Domiogos Jé
feVs pazes . Braga , & declarou o fundamento do enredo todo : E foy
ficaratodos que^fte intJiopor hum medo mal concebido que teúci
íe meteo pellos matos , & a cabo de hum mes que por eiles
andou, ch^gaua entam viuo, & fanbi , como todos o viaõ^
moílrando ter mentira tudo o que fe difíera. E após efté
vieram logo aparecendo outros índios , dos quaes fe W
nham femelhantes defconfianças^ & contaram eftéSiComô ò
Padre Nóbrega os leuara a Itanhaé , ôc fizera Pazes en^
treelles, Ôc aquelles moradores , abràçandofe de parte a
parte , na Igreja pêra mais fegurança ; E depois os ajun-
tara em Piratininga , & fizera o mefhio ; E logo aíTen-
taram as mefmas pazes com os do Rio , Paraiba, & os
Tupis difpolosdos Padres de Piratininga, & Mayran^
nhayà, também na Igreja 3 ôc conucrlaçam , & tra-*
tauam huns com os outros como amigos , & Irmãos ; A-^
qui acabaram de ficar enuergonhados os que tam facilmê"
te creram vencido o inimigo, que os perturbura 5 ôc
todos fe moílraram fatisfeitos das pazes , Ôc lofeph liurd
de feus aíTombros , ôc tido cada vés em mor conta de
de Payeguaçu dos Chriílaõs.
CâP;
Liv Roil' CápitvloIXí
tf
nfA
ii
CAPITVLOIX.
Vencidas as difficuldades do amor que tinha aà}
índios , á' efles a elle ; parte lofephpera S. Vi-
cente em huma canoa de cafca: Padece humà
fera tormenta ,profetÍ7^a queham de chegará
(aluamemo : Lima os verfos ,que fiXera ^ &
dedicaos a Virgem N. Senhora.
Ada porboâa confirmaçam das pazes, fei
o Irmaõ lofeph commuas , &: particulares
demonftraçoens de acçoens de graças àDeoá
Noíío Senhor , que por efpaço de finco me-
zes de íeu deílerro tirara o fim dezejado de tantos. Sendo
tempo dederpedirfe , fegundo a ordem cjue tinha do Pa-
dre Nóbrega , achaua ainda difficuldades ^ porque aaf- Difficuláaáéí
feiçam que lhe tinham , Sc elle tinha àquelles barbaros,*^»?"^»^^
fazia preza na vonta de. E elles chorauam a falta de lofeph
feu amigo . o Paye mayor,queadiuinhaua feusíucceíTos fu-
turos, que Iheenfinauaa boa doutrina , que os curaua;
fan^^raua , & coníolauaem fuás doenças : E lofeph cho-
rauamaisfentidamcnte , ver ficar tantas almas defempa-
radas do remédio de fuafaluaçam , tam dóceis , & inftrui-
dasja òcoque mais he.tam dezejofas do fa grado baUtifmo.
Cortaualhe eíle fentim entoa alma ; & era tam forçofá
nellea caufa departirfe , como ade ficarfc, Confideraua
tambcmporoutra via aquellelugar,que fora pêra elleoutrò
como deílerro de Patmos pêra o mimofo loan? Euange-
liíla 5 porque alli golaraentreo rigor do defterro , & af-
fombros da morte . tam mimofa!? lUuílráçoens, & fauores
de Deos , & de fua Mai fantiffima , que podia cliamarlhe
com rezam lugar de fuás confolaçoens. Tudo ifto vem a
dizeí^
■M
^^ V I ÍXÂ ^^ P^ I o S É> H A N GH lE T a:
dizer humasfuaspalauras, que deixou efcritas fobre efte
xleftermrSamasreguintes , falando em terceira peíToa. Af-
fiefteueoIrmão'( a laber lofeph ) até meado Setembro
* entre os Tamoyos /entregue â prouidencia diuina , &:
muito confolado , paíTando muitos tragos da morte, que
caufauamos que vinham do Rio, ôc outros combates ef-
pirituais de que noíTo Senhor oliurou &c.
1 Ouueporfimde partirfecfteprouado Abrahamdo
LXLfcf lugar de VrCaldeorum j efte Moyfes mimoíodocatiuei-
coxdec^íca. jo de Egipto 3 Ôc O períeguído lofeph de feu defterro,aos
quatorze de Setembro de 1363. em huma pobre canoa de
cafcade madeiro , barca fraca pêra tam fortes mares : Po-
rem lofeph tomara bons Pilotos a Chriílo, &a Virgem
Senhora Noíía , May fua , em primeiro lugar. Akro deftes
leuauam a fua conta Cunhambeba grande amigo feu , o
que trouxera de S.Vicente as vitimas nouas das pazes. A efte
fe entregou lofeph , como a fuperior na viagem , & por
elle fe deixou gouernar nos perigos grandes que teuc.-
Ainda aqui nam ceifam embuftes fobre as pazes : Che-
gando a defcançar â ilha dos Porcos , acharam allihuma^
canoa de índios do Rio , ( caufa de todas as contendas ;)
eíles pretenderam tornar arruinar contra lofeph o cora-
, . , cam de Cunhambeba. Tu donde vas / ( lhe dizem J fabe
ftc entra as que nos outros vimos fogiudo , porque os moradores de
Piratinincra quebraram as pazes , mataram a hum noíTo,
& osPortuguezes vieram apôs nos até à Biritioga , Sc
pretenderam matamos âs arcabuzadas. Baftantes cauzas
eram eílas pêra mudar qualquer coraçam , quanto mais
os índios ; Porém Cunhambé^arerpondelhes aíTi.-Ide em-
bora , queeubem fei que os Chriílãos fam bons , & tra-
tam verdade: Se iíTo foy aíli, vos outros Ihedarieisacau-
fa. E deu ao remo com a mefma firmeza que dantes.
5 PaíTada efta , entra outra tormenta , conju^
rada parece pellomefmo inferno , para ver fe poderia aca-
bar no mar ;, o que nam pudera na terra : Brama o
venta
pazes.
. \T j I TT . L 1 V R o r. c A ?. r X. jf»7v . „
' - o 1 » U Vtòçci lo-
vento, dcfcoiTipoemle oiliar , oc as ondas acoutam a bar- ^^^i^i^-j^fc
ca , & remeiros , chegam a ponto de perderíe. Que faria- --enu >
huma barquinha , caíca de huma aruore , & ainda naôneiu »os jn_-
bem fcca? comera a gemer comopezo, & àlagaríe com^j'^';^^^^/''^
a acToa , dandoíe por perdidos os Índios ; Porem lofeph , faiuamcnto;
que tinha oráculo da Virgem May fua que nam.hauia de,
morrerantcsde perfgcoar lua vida. Animaua os Índios,
que tiueíícm confiança cm Decs , lançaíTem fora a agoa,
nam dcfemparaflem o remo j porque lem duuida auiam
de hir aíaluamento. Tudo viram os índios (nam fem ad-
miraçam da confiança de íofeph ; ) Aplacou a tormenta,
chefiaram ao porto , faltaram em terra , & foram
recebidos com applaufo aov 2-1. de Setembro : Foj
leuado lofeph como cm triumpho por homem de Ceo. ven-
cedor de tantas difíiculdadcs 5 que alcançara tan-
tas vitorias Aqui fe informou Cunhambéba , 5c achou íer
embufte o quediílcram osda Ganoa do Rio de Janeirp.* &,
ficou mais firme na verdade dos Padres. ■ /. -^
4. Reftituido lofeph >à fua caza, Òc á feus amados Ir-
mãos, recreado , ^ agafâlhado nos próprios corações ^
cfpccialmentcdo P. Nóbrega Superior, & companheiro de
feustrabaíhos , que namfc fartaua de abraçallo , &.dar-^
lhe os parabéns da chegada > & dofucceííode feudefter-
ro : O primeiro t.^mpo queteue, acabou de dar compri- Dà lofeph
mento a paláura que dera a \Mrgem Senhora rvolla, 1 a-^pai.ura que
trona fua , de perfeiçoar fua vida Começou à defcmro./;^;/^^^;^^.^^'
lar daquelle thezouro feliciíTimo de fua memoria, por coar f^a vida.
ordem de liuròs, cantos , ôc capítulos, toda a comprida fe-
rie nam menos que de quatro mil j cento & fetenta & dous
\'tríbs , que fazem dous mil 6c oitenta & féis diílicos.r^g^^^^^^
Prodigioío parto de memoria ! acabado delimar, Ôc ef-^e ka^omd»
creuer o Poema , oííereceo o à Virgem fua May com^ a; '**
dedicatória feguinte* a:^ » mis wíj--'^ i> mL ^ íjj:?uííí o jup io
^llhD
N
En
•: (
yiDA DOP. loslPH DE AncHIETAí
•u5í;.M:
NtihitjMA *voui Míttef fànãijjima^ cjHondam
Catmína.^tumJx.vioangererhofl€latus,
Dum mea ^amuid:s praj^entía mitigat hoBes i
, fí^iloí KfraBèCfHè traní^mllumpacés tmrifitsopHs'''^
, f>b £ití í: ! -íif/ír íí^<í2 ntãterm me gratiafowt amore,
c^oir ' ^e corpos tutum tmtnfq^e regente fuíí.
iiOj>^ L i iSdpius optaui > 'Domino tnfpirante ^ dólares , o
íiSBrUB ú: Duraque cvim f&.Hofunere vmcla pati.
~ hii mi) '''jí'tfuntpa^\ tarnen meritarn mea nJota fepulfam^
, fã n j m Sc ditei íieroa^ glotta tant^dnet»
5 í Por ^fta dedicatória podefa ver o qUe entcndcc;'
da matéria * que he digno compararfe noíío Poeta, com
qualquer dos melhores da antiguidade. O fentido da de-
dicatória he efte. Eis aqm /VUy fatitiffima j os ^erfos
ãueoffâreaa njofos íouuoves ^ quando me -vi cefcado de
tmmtqos feros > (^ cjuando (oJfegau4 com minha prefença,
os^amofos^ 65* defafínadútfataua de pazes entre ar-
madãs harba^tos , Jquiteue vofa beneMolencia cóni amor de
Ádây itmdddode mm j ^ & afombra dt 'vojjo emparo %}mi
fegurúhú corpo t ^ ãímat mutíoí vez^^^s dez^^jeicom dmii
na^tn/pírafoens, padecer dores i priZiOsns i ^ morte ^
ãqrtÁ k .parem nam foram admitidos meus dt;z^ejps por- que <t
cjrnmnirn^^^^^^.^^^^^^^^^, ^^^^^^ Ç^,rj^ grandes títr^OA, E por^.:
que efta obrada vidada Senhora por fua excellencia, ôçr
pellas marauilhâscomque foycompoftahe humdos por«i
tentos notauels dcíle grande Padre , & parecera defedtuo* «
fa fua hiítofia faltando ella v rne refolui â que fe impfin
niiííe/pofto que anda ja impreíTa no tomo primeiro dâ
Chronica do Brafil ) mas fera no cabo de toda efta obra %i
por nam interromper â leitura aos que naõ fabem latim j Ô$ ?
osqUfcofâbera ,alliopoderam ver* ;áiu^^- . >b
:^,tCir
í3.
CAPÍ-
Livro 1 1. C ap. X.
^9
CAPITVLOX.
chegam à Portugal notías das pa^es .• manda a
Rainha à Eftacio de Sà com dom Gaíeoem a
Bahia .• Vane dahí afenhorearo Rio : Acha que
ejlamrebeUado^ outra veT^os Tamoyo%\ Vay
refaXerfe à S^ Vicente \ Entra em duuida da
emprexa , d^ refoiuefe acommetero Rio.
H E G o V a Portugal a noua das pazes , quê
por meio de Nóbrega., & lofephaflentado,
encre Tamoyos , & l-ortuguezes. Foram Foram fcftejà
eRas poreftreOiO feíkiaclasdÊ todosos que"^"'* p"^"
* . ' T cm PurtugaU
bem entendiam O perigo, em que eftauaíiquella parte j ôc
todasasmais do Brafil. Chamou logoa Rainha l). Cathe-
rinaa Lílacio de Sà ,(obrinho do Gouernador iViem de
Sà , homem de valor , & prudência ^ & mandonlhe que
prcparaííe dons Gahoensde guerra , ordenandolhe que
foííe a Bahia. & ahi eftiueíic ás ordens do Gouernador
geral feii tio: Porque queria que daquclla Cidade Foííe a
humaempreza de feu íeruico.
2 Chegou efte Capitam a Bahianos princípios do anno ^
deisó4. & aberras as cartas da Rainha , continham(dtpoist,"d*k°ynh*
de darfe por bem feruida do que com feu valor obrara na-
quclla cnfeada o Gouernador Memde Sà ) quéconfiderã-
do o tempo acommodado , aíli pellobom íucceíío paííado
jioíTas armas, comopellas pazes ^ que depois diííoíe aííen-
rarão com os índios 1 amoyosj parecia boa occafião de me-
ter <zenreno(ía no Rio de laneiro/en! i:^ cara terra lançar de
todo fora o Frances^ôc cómccTrapouGir nàquella parte:Pe-
ra o cjue lhe mandaua oquelle Capitam de eífeito corn duas
naò^ de guerra ,que aggregadas ao poder do Eilado, ícriam
N ij baítan-
ii' 1
: i 1
Chega O Cl
jJÍCartimòr 2
batra do Rio
lòo Vidado P. Ioseph anchieta,
baftantes pêra a emprefa j &: tudo ficaíTea fua ordem , St
difpoíiçam. O cuidadofo Gouernador, que nenhuma ou-
tra couíamais dezejaUa , Vcndofecomíam bom Capitam,
& fócorro i âggregahdo à elle os iiauios da cofta , 6c al-
guma gente militar ^ com amor prefteza que pode,
âuiou a frota, & âdefpedioiiô principio do anno corren-
dcfpede*à ^c- 1^ , com o regimento feguinte. Que foííe demandar a bar-
ta. Regimen- f^ do Riô de lancito , Ôc entraííe neílaa fom de guerra, Ôc
dorgèrrai. obíeruaílc allí as dirpoírçoens ^ & confelhos do inimigo,
èc fe achalTeoccafiam , que prometefíe efperança de vito-
tofia , procuraíTe tirar d inimigo ao mar alro, &c ahi rõ-
peíTe com elle , fazendo fempre por coníeruar as pazes
com os índios Tamovos.
i Chegou o Càpitaíii mòrEftacio de Sà a barra
do Rio delaneiro no mes de Feuereiro .- Foy correndo
âcofta,& portos deíla , ôc achou por dito de hum Fran-
cês quetomâraní , coiíioos Tamoyos do Rio de laneiro
tinham alterado as p^zes, ôc eftauam em guerra. Duuida-
ram os homens do mar, ôc alguns foldadosjmas logoacufta
defeuranguéíedeferiganaram 5 porque entrando em baceis
da barra perâ 'dentro a fazer agoada em huma ribeira, hu dei-
lesquemaisfe empenhou foy acometido defere canoa? dé
Tamoyos, decujasmãoisrupoílo queefcapou.foy có niórte
de quatro marinheiros frechados. Declarou eftefucctíío a
duuida , Ôc logo a foymoflrãdo mais âsclarasaexpericncia^
porque eftaua todo ardêdo emâpreftosde guerra. Os portos
por onde podia fer acommetido o inimigo , cubertos de ca-
noas armadas: Asprayas cheias de Tamoyos empennàdos
ferindo O cham > ocos ares , ameaçando rompimento de
guerra ; Tudo difpoíiçoens induftriadas peilâ naçam
Franceza. Inteirado de tudo o Capitani mor Eftacio de
Sàí^ depois de feita alguma experiência de menor empenho
faindo dos encontrai feridos alguns foldâdos , ôc outros
mortos , femeffcito J poiído em confelho o que viam do
grande poder do inimigo , ôcde Como vfaua de cautela,
nam querendo fahirao mar â batalha 5 ôc como nam era
baílan-
^ortc de 4
marinheiros»
Rcfoluc o
LiVRoTI. Cap ^. loi
baftante o poder com que fc achauam pêra fair em terra ,
por falta principalmente de embarcaçoens pequenas : E fo-
bre tudo porque teue noticia por via de hum cariuo dos
Tamoyos fogido, que eftaua S. V iccnte cm guerra , refoí- c!p°.cam tròr
ueoqueera bem ir àquella Capitania; porque de fua ida^Y^'^»^^»^-
refultauam dous bens , focorrer a terra , & próuerfe de
cmbarcaçoens de remo, Ôc mantimentos.
4 Deram à vella , 5c dentro em breuesdias che Panem .s.
garam ao Porto de Santos. Achou o Capitam mor que ^"'''''*'
continuauam aqui às pazes firmes com os Tamoyos decdPtinu«rrt
Iperuig, entre osquais eíliuera Nóbrega , & lofeph ^^^^'^Ij^!*'
que morauam muitos delles entre os Portuguezes , & c5 mcy s de
lua frecha os defendiam de alguns inimigos : Erpecialmeri-^P'''''^'
te o fiel Cunhambcbá , que aííentara caza com toda fua gé-
te fronteiro aosmefmos Tupisjò pornofTa amizade* EpeKo
cõtrario achou queos Tamoyos do Rio dè ianeiro tinham
feito por toda aqueila cofia varias hoílilidádcs , inimigos
de toda a paz, 6c foííego. Porem aqui começou o Capi-
tam mor a experimentar graues difficuldades acerca da em-
prczi , mouidas por várias peííoas da meíma armada , as
quais nam parecia bemacommeter em tal occafiam de tê-
po. Diziam que o inimigo era inni5merauel, fortificado cm
caza propia com mantimentos à maõ , com embarcâçoens
tám ligeiras como o meínio vento , com armas que ja mais
lhe podiam faltar , induftriados na guerra pella gente Frá-
ceza , cujos princípios tinham experimentado : E que íudo]'^ ,^'p,eL"
o contrario achauamos em nosj porque éramos poucos ,
acommetiamos com o peito a frecha, em terra alheia, on-
de nam fabiamos dos poftos que podem fazer a noílo in-
tento , os mantimentos acabados , a terra impoííibilitada
adarnos outros , pellosaííaltos continuos dos inimigos.
as cmbarcaçoens grandes ,&pezadas, a muniçam limita-
da , & noíla gente Portuguela, pouco defira no modo de
pelejar dos Índios: Que poderia fucccderhuma defgr^ça
que deíTe que chorar : Que femprefoy prudência nam
N iij arrif"
I®2 VíDADO P. lOSEPH 'AncIíIETA,
árrifcar a graues perigos ^onde a impreza he voluntária^
& pode eíperar occaíiam fegura, Ifto diziam , Ôc a cfte
fim mouiani muitas traças , huns com zello , outros com
receio , outros por enfadados.
.^ . 5 O Padre Nóbrega j&Iofeph, que tinham saíla-
Sentimento ' . , D -K r f r rr
doP.Ncbre-dD muitas noites em oraçam com Deoí» íobre o lucceíio
f^jj^f^^^^^^^deftaempreza, tinham fentimentodo Ceo, que auia de
píeza. fair com eífeito, quefeauiadepouoar o Rio , òc que os
eftoruos eram inuençoens do inferno: Opportramfe fir-
íobreomtf memenre a todos OS pareceres contrários, diriam que
'"'^' emprezâs grandes nam fe acabam fem trabalho , ôc
que a viíla da imporcácia defta, nenhu trabalho ou perigo
deuiarcpucatie por grande: Porque fe púnhamos diante dos
olhos a Capitania dcl Rcy aíTolada ,o inimigo pujante , ôc
refolutoâ acabai laja pouca potencia da terra pêra refiílinhe 5
& o poder de Portugal, &: Brafil empenhado pêra libercala;
parece que nem a Porcugalnemao Brafil , nem a Capita-
nia , nem a reputaçam Portugueza , conuinhi íicaííe mal
logrado cabedal que tinha cuílado tanto, & tantos an-
nos auia , era efperado Que dirá Portugal , o Brafil jcfta
Capitania , os propios inimigos , fe depois de tam grande
fama de poder , virem que vokamos as coftas fem fangue?
mais honra feria cm tal cazo moftrar elías coftas feridas na
peleja, que fans fem pelejar , porque feridas moílrariam
defgraçada fortuna, & fans moílrariam defdouro da fa-
ma Quanto mais ,que nem o inimigo ( diziam ) he tam
formidauel , nem fuás fortificações iam muralhas , nem fuás
armas vomitam fogo, como as noíías; fomente excede em
mantimentos, & canoas ligeiras; Porem nos, ainda que
com tam poucas poííes , nos obrigamos a remediar efla
falra a Volla Senhoria. Concluíam que Jilataííeo coração
com grandes efperanças em Deos , porque de fua parte
lhe pronofticauam fucceíío vcnturoío . & entendiam que
pium niòraseraíeruidooCeo, que defta vez feedificaííe Cidade Real
NÓb!c"% "O Rio de Janeiro. Era grande o conceito que tinha o Ca-
pitam mor da prudência, Sc virtude de Nóbrega , & ío-
^ fcph
Livro irCA^. X t. lo^
fepti, ate cntam por fama , agora ja por experieilicià. to- !°Sòdo'
moli per modo de oráculo do Ceo luas palauras, ôc pro- Cco, & rc
pos de cumprillas á rifcâ , mandando apreílar a partida.
•64» t«' £^- •£** fcM' e*3 flW í«* í«4 6« *Í« í*?- 6°^^
CAPITVLOXÍ.
Pane o Capitam mor Eflaáo de Sd de S Vicente:
^ com elle lofeph, ér t)utro tomp alheiro - Che-
qam ao RiO: Fortijicamíe dà bafvapera dentro "-
C^r alcí^nçafn viãó rias mejÉoraueis,
Chavàse ja o Capitammdr Eftacio de
Sà comfua armada preparada i féis nauios
de guerra j alguns barcos ligéiifos> Ôc houè
canoas deMifticos , & índios. Com eftes
mandou o Padre Nóbrega dous Relimofós, oPádreGon-
çalóde Oliueira , & Jòfeph dè Anchieta , pêra animaloSjí^stÉeitrnâí-
ik dirigilos em huina^ôc íoutralingoaem queeramperitoc. j*^^.
Partiram do porto a vinte de laneirodeíle pfcfehte ahno,
dia dedicadoa S. Sebaíliam, que por bonipronofticò to-
. laram por Patram dacmprcfa, por ferram grárídé Már-
tir, & por fer nome defeii ^ty D. Sebaftiám. Chegaram
a occupara barra do Rio de íânéifo ao prirttipio domes^^p^,fi\°^^
de Março; Aqui lançaram ferro junco ás llhas^que eftam pro-^° í^»»*
ximasa ella , efperando pella nao Capiíania, queà medi-
da de fua grandeza , & contràfte de mar , & de ventos pou-
co fauoraueis vinha mais devagar,
2 Con^a detença da Capitania , ácontecco aqui
hum, cafo digno de mcrnoriá ,derhóftraddrdo íucceíTo fu-
turo. Porque os índios do Efpirito Santo impâeienres com
â efpera da Capitania , ôc mantimentos que tambetn tar*-
dauam , ôc fobre tudo de fua natural ihconfl:ancia,eftaua5(épT
amotinados pêra partirfe comas canoas que t^^zisi^ >^'']JJ°^yi*'^'
pcrâ fuás terras, & dcfempararem os Portuguezes, Cfae ^oiiadios.
gauam
LSkUI''
í:l04 Vida t)t) P. Ioseph Anchieta;
gáuam a ponto de executar a tençam : Eis que lofepfi cm
lugar diftante,íentio em fi impulío de ira virualos,&: che-
gando âfalia com tiles, femouuirlhesnada, lhes eílranhou
fua refoluçam* Vendofe defcubertos , deramacaufa; Que
cftauam alli morrendo à fom.e , nam podiam mais
cfperar. Encam com grande confiança no Ceo , lhes
empenhou. lofeph fua palaura ; Que nam feria aííi , fe-
nam que antes queofol chegaíTeatal parte do Ceo , mo-
ílrandòlha , chegariam fem duuida os mantimentos , ôc
ap6s ellcs pouco depois à naò Capitania. Coufa maraui-
Ihofa r nam eram ditas as palauras , quando começam ap-
pàrecer três barcos , que eram mandados abufcalos ao Ef-
:j)irito Santo, ôc em chegando o íol ao ponto que promc^
terá , chegaram elles ao porto. Pafmaram os índios , &
fizeram conceito do íucceífo mais que humano : Obede-
ceram a tudo refõlutos a ajudar na empreza : E logo em
a Elianham feguintê chegou a naô Capitania , tudo em
comprimento da profecia de lofeph.
4. 3 luntas ia as cn7barcaGoens , entraram todas a bar-
danoRiodera do Rjo dc laneiro : Salta em terraa mfantaria,õc co-
lanci.o , fo- jneça afortifícaríe com trincheiras, & foífos,no lugar onde
nneçaiTi a ror- 5 . t } T
tiíicatfe em dcpois chamaram Villâ Velha , junto a num penedo altil-
paTa^^ru- fii^^o ' q"e pella forma fe diz pam de .açuquar , & outra
^"*'^ penedia , que por outro lado cercauá , com que ficauam
^c.B em parte defendidos. Deíle lugar auiam de fair a conqui-
ílar os noffos , & auiam de fer conquiftados com defigual
poder 5 porque fuppofto que eram efpantoías aos índios
hoíTas armas de fogo , &, noíías nãos poíTantes :Era mui.r
ito mais formidauel a grande multidam d^canoas volan-
tes , Sc guerreiras , & infinidade de Tamoyos armados
Poder de ini.^yç cobriam OS maícs , Sc ás praias, todosafomdc guerr
«X'd^u f a r Elksuem íeus lugares Cercados,valados,in(blentes das
íf í^r^cí {^ií^orias paíi[adas,& íobre tudo a)udados,& animados com
nãos de alto bordo da naçam FrancezaSameftesTamoyo$
entre todas as naçoens do Brafil oufados no acommeter >
fagaze;?;
1#'
Fizf tn os nof .
Livro II.Ca i^ XI. los
fagazes n as cilladas , no arco dcftriííimos : Defpedem a Te-
ta com tal for^a que paíTa o cícudo , & chega ao braço:
rTal vez íucccde paíTado o corpo todo , continuar a frecha,
5c pregar qualquer aruore , aindajcreniolando :Comeíta
aente oauiam os noíTos.
4 lofeph & feu companheiro Ohueira , faziam praticas
aos Toldados Huropeos , nam Goftumados atai modo de f"'j5"chgjo.
guerra. Diziamlhes , que era vío do gentio o que viam^^^sp'»''^»"»»
mas queàviíta daquclks eftrondos r& ferocidade , emropeoj&in*
vendo o fogo de noííos arcabuzes , fe acobardam , & fo-**"'*-
gem : Queacommeteííemconílantes, ôc experimentariam
que eram verdadeiros os Padres. Aos índios noííos confe-
derados praticauam em fua lingoa própria 5 lembrauam-
Ihes a perfídia contraria, com que quebraram íeus inimi-
gos a palaura das pazes , os infultos , que nam obfían-
tes ellas , lhes fizeram , catiuando , marando , & comen-
do as molheres , & filhos de muitos delles , pretendendo
aíTolar , & acabar fua Capitania •. Sobretudo lhes traziam
â memoria os feitos valentes, ds feusantepaíladosjque he
o maisfíno daRethorica , pêra perfuadirefta gente.
5 O Capitam mor Eftacio de Sà, mandando ajuntar ^ ^ .^
a Infantaria , faloulhes nefta forma : Soldados com pa - Caj içam mòc
nheiros , poucas palauras baftam a ânimos refolutos:Naõ*"* íoididos,
hé de ontem noíía empreza , depois de largo tempo , &
de varias fortunas , vimos a wtt o que auemos de gozar.
A hum ponto chegamos que,òunosbadecuílar ávida'; ou
nos hauemos de tiralla a todos eftes bárbaros. Deita eflã-
cia nam ha ja fazer pc atras: Por hum-lado nos cercam
eíles penedos , por outra asagoas do Qccano 5 pella ma5
direita , & efquerda noííos contrários ; Se deíle cerco
ouuermosde fahir , he força que feja rompendo inimigos :
Eftes nam fam tam duros de vencer, còmo os penedos^j
nemtamdifficultofos de paííar , comoo Oceano : Aquel-
les fcus eílrondos calam os ouuidos , mas nam os coracoe;^:
,0 fom denoíTa mofquctária calalhes ouuidos ,.ôc p^ito^j
c O aviíla
: Jtú6 V í D A TH^Cf P. I O SE PH AnÍ H i E T A ,
-^a viíla deftes os vereis logo , oa cair; ou fogir ; nam
?;»podem mediríe feus arcos cooi noíFos arcabuzes , nem
. fuás frechas com noííos pelouros Teinho por efcuíado pôr
£ idiante dos olhos as juftas cauías,que aqui nos trouxeram De
todos hefabida a arrogância deíles fajuagcns licenciofos,
os ódios antigos , & prefentes , com quefempre nosqoe-
bra^ram a fé, ôclealdâde,derprerando a confederaçam de
noÚTa genre , & admitindo a de noífos contrários , os in-
tentos de deílruirtíos , & os aííalíosde mar ,& terra, com
quepermrbam toda rsoíía coíla , roubando , catiuando ,
matando, comendo como feras as carnes humanas dos noí-
fos j & bebendolheso fanguc. Aííasdejuftificadaeftà nof-
fa vingança 3 nam fera bem que continiem lantos dam-
nos , nem que fe digapcUo mundo , que tendo metido na
emprefa tanto poder, Portugal, o Brafil, o Pvey , 2co Efta-
do, ficaram huns,& outros fruftrados.x^cabefe de huma vês
efta praga, tiremfe de aííombro os moradores , liurefe
a terra , ieuantemos nella Cidade , & fique cila por me-
:ínoria denoíTareroloçam, Ôc trabalhos , & pêra exemplo
dos vindouros , & freio de femelhantcs bárbaros. O co-
imoficaramanimadososfoldados > diram os fucceíTos fe-
gumtes
Primeiro aira 6 " O primeiro aífalto que deram OS inimigo'? aos
^'"^^^"'^^''noíros > foy depois de alojados aos féis de M.ifço quafi
prouando fua difpofiçam , & valor. Acommeceram fe-
gundo feu coílume . empennados , com repentinos alari-
do? ,i eftrondo de vo2es, ôc arcos , que entre aquella gra-
de penedia do fitioiazia pauor , &i efpanto Acharam poré
valor , & refiflentiai qual nam cuidauam : Peleijoufe
por buma, ôc outra parte cem esforço , ôc labe-
mos que parou o eftrondo na morte iômencede hum
índio noíío ja Chriílão , dos naturaes dos campos de Pi-
ratininga oqualpoderam fazer prifioneiro , &: tanto que o
ouueramasmãos, pêra terror de feus contrários , o amar-
raram em hum pao /fazendo delle aluo de íuas frechas ,
&ms' acajo
Li V ROlI- C API TVLO Xi. 107
a cujo rigor acabou a vida. Sahiolhcs cara ava^crttlà; por-
que em lugar de íe acobardarem ficaram os noíTos com tan-
to brio aviíla de ral crueldade, ^jue rompendo tranquei- ct?rT^j**^"
ras fairam fora após elles , mararam a muitos , puferamos í'^».
viuos em dcíconcertada fogida, ôc fizeram preza nas canoas
cm que tinham vindo.
7 Pouco tempo pafíado , tiueram noticia os nof-
fos que osTamoyosem cillada com vinte fere canoas de a^nlàzl^.'
guerra , cm poftos , onde de torça hauia de ir a dar noíía "*^*'
gente , apreítaram dez canoas com duas lanchasde remo ,
ôc foram acommctellos , com tam boa fortuna ,que ao
primeiro encontro fe fizeram fenhores de huma das prin-
cip.iescanoas ^ & as demais fugiram a força de remo;
quais tímidas aues a viílade homarmadogauiam.
8 Foram eftes dous íuccetíos princicipio de maio- i • ,
res vidorias : A vifta delias fe conta , quedeíprezauam ja "^í^^í.
osnoííos os arcos inimigos , & que quafi todas as foma-
nas dalli em diante alcançauam fucceííos felices , ou em-
bofcadas , vfo commum de pelejar dos bárbaros , ou a
.peito defcuberto , mais conforme ao noíío , ôc viofe aqui
hum fauor conhecido do Ceo , admirado nam sò entre
nos , mas entre os mefmos inimigos i Porque muitos pe-
louros dos francczes dauam em os peitos dos noííos , co-.,^*/^*"""*"^
mole deram em duro rerro, caindo aos pes, ou tornando os pikurcs
fruílrados pêra trás: E as feridas que. ale;uns recebiam, ain4l'ÍÍJâl°fVcii!
da que mortais , com tal facilidade farauani , que era for-'^^»"e»st£ti-
b- r r \- • tT r diS mcrtai».
^ uirle acuraao rauordiuino. He cazo: que refere
o Padre lofeph de Anchieta : E diz que huns atribuiam ao
fauor da Virgem Senhora NoíTa em cuja deuacam an-
dauam deftros os íoldados : Outros ao. Mártir infigneS.
Scbaáiam , cujo fauor por Padroeiro inuocauam; 6l foy
lofeph companheiro , ^ ceftemunha de vitiafíde digna.
< ' ^ Poy mais notauel o (úcccúo , queacontecco
DOS primeiros de lunho. Appareceramà vifta de noíío ar-'^**^'^™^^-»^
• 1 1 r o I 11111 caucíacóincti"» T
faial tres nãos poderolas , òc bem artheihadas dos, France m.mo ám ^
5b;>b O ij zes
UIU W.O'i
.:0
'- il » '
les.
108 Vidado P. I oseph ancííieta;
inimigo?, &fe5 . Schiima fomainnurrierâuel de canx)âs de guerra, que
tlucmos^r â^ acompanhauam , coniauàmíe cento ôc trinta, quaíi o
reílo detodo o podcfdo inimigo. Prcíenlafa6bataihaaos
noífos feíliuais todos i com faiscoftumadas libres de tin-
tas, &: peníias , alaridos de votes , & bufios quea-
troauam os mares , Sc os montes 5 ôc sò pode cuidallos
queinfabe o coftumedeíles bárbaros. Lançauâ cadaquala
frecliamais empenhada , òc de niais efcima , fobtcoar-
raiai, por principio de guerra , ôc como defafio NamdeC-
fakcem potem os cora^oens dos noíTos : & primeiro que
tudo recebemnos com femelhantes ímaisdeíeíla difparaa-
do fobre elles quantidade de arteihâria , ôc arcabuzaria
comtam boiti emprego que a Capitania inrmiga (^ feri^
dos, ôc perturbados os marinheiros yfoy dará coftaentre
híáapenedia, dondeapenasdepois de grandeforça & algus
mortos, a tiraram pêra a mar. Sâlua a Capitania, acomr
meteram os inimigos em ordem de guerra ; Astresnaos
Eraticeías f qual outro Ethna ) desfazendofe ém fogo de
pelouros. , bombas , alcancias 5 os Tamoyos cobrindo
os ares com nuués de frechas > que vindo caindo Cobre p
arraial a Tom de eftrondo da artclharia, reprefentaua hu
chuueire entre trouoens medonhos Porem feruiodeem-
paro ã protecçamdo infigne Mártir S. Sebalíiam, que
com fé iniiocaram 5 porque paíTada â tormenta , corrcn-
dofe as cftaíicias , nam fe achou morto algum , fendo
que daparte inimiga o foram muitos , ôç os viuospoftos
'*'" cmfogida ; porque nam eftaua também. ociofa no meft
mo tempoda tormenta noíTa ârte!haria.3b dqii.oisib
10 Aqui refere Anchieta hum ca2o tido por mi ^-i
<: . ff^. .,. la^rofonaquelle arraial. Eftaua no tempo do combate re^.r
rauiibofo yidô na Igreja pofto em oraçam o Padre Conçaio deu»'-.
ruaX/oVhueira , encommendando a Deos o fucceífo (qual Mo)r4
Gonçaode ç^^ ^ ^^^ gj^Qj ^^ ifrael ; ) era efta feita de palma 5 ôc co-
uSa/"" mo as frechas vinham de alto , trefpaíTaaam o tedo,- ^ÔCi
lados; & foy coufaadmirauel, que fendo em grande cantm
dade
-il.;f i 11. ■
-iJ3Í ti ::
fríchisde
bárbaro í
dade , iFicaram todas a redor do Padre , pregadas no cham
fem que algumas delias lhe tocaííe. Viram iílo os que recor-
riam álgreja,& erpantados dofucceíTo que tinha por mila-
gre cobraram nouo animo pêra tornar âguerra r ;;
i- H O Capitam Eftacio de Sà , nam fatisfeito de„ ^^ ., .
defendcrfe dentro do arraial , quis moítrar que tinha po-mòt brado
der perabufcar o inimigo fora delle : Acoíneteo as nãos Jj^^g'.^^ jf je.
Francefas , ôc fez ndlas deftroço de muitos mortos fcri-í^fo^o no uni-
dos com aartelhariade íúa Capitania. Defpedio no mef-""^"'
rho tempo efquadras , que acommeteíTem as Aldeãs dos
tíonrranos , outros as canoas de pefca, qile eram grande
numero 5 & em todas fizeram boas prezas de duas Aldeãs,
cfpecialmente fizeram prifioneiros os moradores todos,
cpni que ficou aíías atormentado o inimigo-^^^^^í^,
12 Aos quinze de Outubro feguinte foy outro o.tra viaôriá
fucceíTo digno de hiftoria. Sahiram (ctc canoas noííasemdc<'4 c*no«s
bufca de preza , mas viramfe a ponto de ferem ellas priíia- *°* *^'*'
neiras do inimigo 3 porque lhes fahiram de cillada feííentâ,
& quatro , que dando aoremo velociíTimo^ cm breue te-
pô as poferam em cerco perigDÍo j porque de todas âs
partes juntamente defpediam frechas contra ellâs ; Co-
mècoufe alli huma peleja bem ferida , de huma, 6c outra
parre ; Eram os noíTos de rcfoluçam , ôc valor ; porem
no meio de tam grande poder, era força arreceaíTém o fuc-
ceíTo. Eis que neíte confliâ:o acodem defocorroâos nof-
fos outras fete canoas , à vifta das quais como fc foram cé-
tò^^romàràm animo os foldado^ contra feííentâ & quatro :
Acòmmetem ja aquelles , dos^ué érâm acommetidos ,&
depois de larga peleja , fairamcóili vistoria , fenhoreândo ^^^^
quatro canoas, ôcdeílroncando, ôc pondo emfogida as ''ifciõjmf^
demais v - .;-.. ^!^j
' 13 '•'•^ Seja á-vttiíttâ nam tilénos illuftre farGanhá^ de- vititriavióto.
ílie tírefente anno. Sairá o Capitam mor Èílaciô de Sàcom "*/f*l'"
i r 00 com mor*
hum troço de feus foi dados , córnintento de dar fobre hu te demuito$.
ma Aldeã, tcae noticia no caminho coma em outra c,tii '^""°'
iciuos.
^u a
Oiij
mais
im Vida DO P. IosEí>H AísGHIITa;
rnaisaffamada íe tinha ajuntado numerofa quantidade de
íiíâios , porcaufa de certa^deuaçam chaniada àfantidade/
Gonuerteo o a^oitefobre efta , ^c pondoa em cerco, af-
fi a opprimioaferra , rôc fogo , que exccptos poucos que
poderani fogir , todos os outros , ou morreram, ou
■ íe encregaram catiuos •• PaíTaram de trezentos. Fora m.
feridos dguns dos noííos , entre qs quais hum foldado por
nome António da Laoea > querendo iiurar huma Miftiça
de S. Vicente , que emre os inimigos eftaua catiua , hcou
cercado do incendiou &: fahio delle tam mal tratado que
que fendo kuado ao arraiai , em breues dias acabou fua
vida.
CAPITVLOXIL
Pane lofeph pêra a Cidade da Bahia ; vi fitando'
de caminho a refidencia do Ejpirno fanto ipèr-
fáadeao Gouernador^raldo neceífariopera
hem deouena y ordenajede Ordens facras y &
^%o)xacom ò mefmo Gomrnadorem [ocorro do
Rio, \^ comafehum fuccep marauilhfojo
.vmdm:f^tode^enB^^^ áH ..
peta a Bahia,
viíita deca
minhoo Ef-
pirito fanto.
oôivfi
S T AN r»Q a$ couzas no edado atras rcfc-^
rido , partio lofeph , chamado dos Supe-
riores peraa Cidadeda Bahia, aífia orde-|^
mm^wmm- narfe de Ordens facras -, como a d^t cont^^
ao cSador geral dos fucceífos da guerra , & do que/^
„.„neceííltâuat«os combates pei^a perfeito comprimento do
fim que dezejauam Leuaua ordem pêra que de cammho..
yiíitaííe a Caía , & Aldeãs do Eípirico fanto , Sc defpuftír..
,íe ndlas.> pque melhor julgaííe a fim de maior perfa^m.^^
'7 ' . ;
! r
tAirJ Li Vro 1 1. Cap^XIL /' mt
E bem fe deixa ver defta ordem o grande conceito , qlie
tinham os Superiores , da virtude , prudência , ôc autho*-
ridade defte feruo fiel , pois fendo ainda Irmaõ fem Or^
dcnsfacraSílhe cncommendam ofíicio de tanto porte na
Reli^iam E prouou o effeito a confiança , que delle fize-
ram íeus Maiores: Porque foy hum ahuio geral de toda
áquella Capitania 5 coníolou os Religioíos triftes ainda da
frefca morte de feu bom companheiro , &c Superior Dio*
go lacome , que coníumido de trabalhos , òc laftima,
norigor de huma grande pefte de bexigas , que fizera la-
ílimofo eftrago naquclla terra, paííara âmiíhorvida. Da
mcfma forte nas Aldeãs , chorou com os Índios , com
fua coílumada eloquência , em lingòa Birafilica, as pafía-
das miferias daquelle mefmo tempo , em que as molheres
ficam fem maridos i os filhos íem pais , Òc todos fem fub^
ílancia , quais homens naufragances , que efcaparam da
tormenta fo com a vidaí Animou-os âleuar com paciên-
cia aquellc açoute ■, que Deoslhes quis mandar , por feus ^
aluos mtentos j ôc por VcntUra por meio da faluacam de
muitos. Animados > Òcconfolados todos na Villa , & Al-
deãs , com feusfermoens, òc praticas, & difpoílas as cou-
fas que pareceram ordcnarfe a maior perfeiçam , profc-
guio a viagem.
2 Chegou a Bahia , ôc í^oy recebido de todos , chega a b»-
ÍD ' . . i hia informa
como mereciam fuás grandes partes , notórias ja emtodooGoufrna-
o Brafil. Aqui contou eííe hofpede ao Gouernador Mem p^',Vu7jtò ^
de Sà por cxtenfo ( como quem fora parte em tudo )oefta- q^e^<^"«ccf.
do da guerra do Rio , as marauilnas , que Deos tinna cabedal per»
obrado por meio do Capitam mor Eftâcio deSà , & {^v.s '°"^'|^j'*
foldados : Porem queeraelle de parecer , que viílo ferem
os inimigos innumcraueis , & nam poderem fer vencidos
todos , fenam muy de vagar , com tam limitido poder > co-
mo era onoíTo , que fua Senhoria ( fe he que dezejaua
que a guerra fe acabaííe por huma vez ) meteíTenouo ca-
bedal, ôc vitimo poder de feu braço, porque coní efleihe
parecia
líi Vida DO P. Tos ipH DE Anchieta,
parecia que eftaua certa a vidboria vitima .Epoderiairios
entam fundar a Cidade que fua Alteza , ôc todos preterir
diam , afugentar de veras os Tamoyos pêra os fertoens,
& preíidiar as praças marítimas. Toda efta pratica de io-
feph, agradou muito aoGouernador , por fer conforme
as verdadeiras noticias , que tinha , aífi da guerra , como
do relator. E propôs logo difpor as couzas , & prepararfe
pêra ir em peíToa a concluir tam grande emprefa , do fer-
uiço de Deos , &: feu Kcy 5 ordenou logo o Bifpo D. Pe- '|
Ordenafedt ^'^^ Lcitam , amigo , & conhecido fcu antigo da V niuer-
Ordeosftcrasíjdade , que hauia fete annos , tinha chegado ao Brafil, J
a lofeph de Anchieta de Ordens facras, com alegria dos
coraçoens de ambos 5 do Bifpo porque eílaua vendo os
feruiços de Deos , que delias hauiam de refukar 5 de lo-
feph , porque dezejaua empregarfe com maior fruito na
faluaçam das almas.
cheg*op.i- 3 Nefte mcfmo tempo chegou a Bahia o Padre
naciodeAzc ignaciode Azcucdo a vinte ôc quatro de Agofto de i^6f.
* * "■ com patente de noíTo Padre Geral Francifco de Borja , pê-
ra vifitar a Prouincia ,& com pronoílicosja da boa ventu-
ra j que depois hauia deter de confagrar os mares ,& todo
o Braíil, com feu fangue, ôc de feus companheiros , derra-
mado a maõs de lurejes pellaféde Chrifto. Daqui fe efti>
»í?ií.âj;íHj^ariam,& venerariam lofeph aelle,&elle a loieph, pello
que eram, & moftrauam auerde fer. Depois de três me-
fesque gaftou o Vifuador, em difpor as couzas do Colle-
gio^ Ôc Aldeãs 5 achauafe preparada a armada de Mem de
Sàdevergasd alto pêra partir ao Uio de Janeiro, na for-
VoiuLfeph ma do parecer de lofeph 5 nefta tam opportuna occaíiamfe
pera o Rio , i r^.i»-TA i T a
errrópínhi» cmbarcou O Padrc Ignaciode Azeuedo , a vilirar o reíto
deM^máe j^ Prouincia , ôc juntamente o Padre lofephdenouo or-
ba, que vai ^ f ^ • i i /-r
«nnac^a a fo dcuado pera OS úns , que depois veremos , ôc ajuda de noflos
corrello. t
combates.
4 Porem , em quanto vam nauegando , ( por-i
que nam fique innutil a hiíloria ) refínrei hum luc-
ceíío
' LiVRoII- Cà-pÍtVlõ Míiff 'ir^
«eíTodc guerra, que nefte meio témfò actàírcbcohoRiò f,''f^t\-
de laneiro , digno de memoria perpetua , íbeádòíiiHiò do i^uiihufode
anno de 1556. depois que experimeritaram^W Tàhibybk ò decaiíu&oi
como feriam noíTas armas, & qúeem tam varié'3 -òccaíioê^ itmai.rc
lhes nam hia bem de partido , determmararft ,'^ ( a tònfe- que vencemos
Ihados dos Francczes ) empenhar de humà^^èz ò poder:- po^""''?"'^*^
Meteram o reílo em cento & oitenta earioàs beni arma-
das , & guiadas pellosmais deftrOs Capitães tos , & dá nâ-
çam Franceza.Cemdeftas eápitàneauahum affaniado bár-
baro , por nome Guaixarà fenhor do Cabo frio. Partió
cfta grande chufma muito ttn fegiredo até cerra paragem
coufadehuma legoa , diftante do arraial dos Pòrtugue-
zes , & allí ficou efcondida em cilladâfto refacÓ de hU-
ma ponta, que fazia ò mar. Daqui defpediraba hum pe-
queno numero delias , iriduftriadas rleíla forma 5 que fof-
íem offerecer batalha aos Portu^uefes defronte de Teus
alojamentos ; & que faindolhes ( comoáquellés qufenarri
coílumamderprezardefafio algum ) fingifTerriquevínhani
rctirandore,& os trouxeíTem poucojôc pouco até metcllos
na cilladaidondc fairia o teílo das canoas, & irâtáriarri
áquella parte de (cús irlimi^o^ , qtje fenipre feriam os hiais
luftrofos, & esforçados 5 os quais díminuidos, acòrtiíiíete-
iriam o arraial, com menos reíiftencia. t
5 Tinha partido de noífo arraial , humâcánt)á, Tm que
hia hum Francifco Velho, mordomo do Mártir S. Scba- ^nfrelrbfíi:
íliamfeu Padroeiro , em bufea de madeira pêra hunra Cá- macànoL ""
pella do S. efta foy a primeira que encontrou as poucas
canoas, que a modo de negaça vinham ao interito jaditoj
poferamfeem cerco jbrigauam Com eUa com detença nba-
nhoza.Eraà vifta do arraial , entrou em zeloò Capitaml ^^^""jj^**^ "^'
mor , pretende focorrella, & bufcarido canoas , achou «noas
fomente quatro ( porque as mais, ou eram á pefca, ou íc
tinham acolhido enfadadas da g>jerra ) neftàs quãtvò fe
embarcou» com o milhordos Capitães , 6c foyácomme-
ter o inimigo: Porem clle , que eftaua benlinduftriado áoè
P prr.
'M
:l;:|||lí!
.-ti.ií
fauordeS.
Sebittiavii.
^.r . '' lo^ipoíf^ <jMi3í^iclQçiiidauamy que leuauam de vencida
tíi*íif.« ' > elfgs po^Qíis ,, deícpbriraEna pdnta,& delia viraõ quefahia
"4n3Ííívr« ^^^^^ 4^^açhkw.,íq«eiakaua pcrá cento , & oitenta
. ' cai^ÇJs ligeiras como vento, a vinte ôc trinta por banda*
igoalrí>en^feg,j:cmeiros , & frecheiros, açoutando as agoàs^
atroando os ares, enchendo as nuuEs de frechas > & como
celebrando ja a vidoria, que dauampor ganhada. Ena veri
,da4e aííi fora fem duuida , fco Geo com marauilha cbra^
& oi^ujdo Padroeiro S. Sebaftiam^nam acudiram corti
fauor feuprodigiofo 5 porque indo reíiftindolhc os noífôg
yaleroCamenteappellidando o S. Padroeiro, deimprouifò"
^o 4efparar dehuma roqueira * na fúria maior da peleija.
Incêndio, & tomou fogo a poluorada cauoa , ôc leUantou hum inccndio'
grande, a cuja viíta , como de portento mfohto , leuaniou
juntamente hum grande alarido amolher do Principal da;
Canoa contraria , que feguia os noíTos ( Ôc eftes coflumauaõ^
embarcar coníigo emfemdhantes ados) dizendo a vo^ss^
que via hum incêndio mortal , que hauia de confumir ôs
(eus, que fogiffemà preíTa E foj baílante oefpanto deftafc^
índia pêra meter tal terror emtodar/chufma, que nam fá
aquella , mas todas as outras canoas fizeram volta, Ôc fe-í
puferamem fogidadefordenada , quais fe viram vir fobrc
fio fogode hum monte Ethna , quando mais furiofo re-
benta, ficaram defaíTombrados os noíTos , & entam come-
çaram a contar de efpaço , & com mais aduertencia o
numçro exceííiuo das embarcaçoens, com que oauiamj
& nam acabauam de crer o perigo de que Deos os liurara
ppr meio do Santo Padroeiro.
. 6 Voltaram coma preza de muitas , & bem armadas
canoas 3 ôc em defembarcando em terra, foram a Igrejàj
gem álllT^^^^^^ acçam de graças por tam euidentc fauor , ôc daqui
rYoTi^cÍ " introdufida ncfta Cidade doRiode laneiroa fefta das
to. canoas que te o tempo prefente coftuma celebrarfe todos os
^i annos
-'M
ÍS .t.
L I V n õ IIC À p XIII/ ^^ ^ ^fiS
òntiòs y Ctrl dia do S. Padroeiro. Aqui fouberâm ihàis ehi
forma âs circunftanciastodasdòcàfoj pòirque os Tlatnbybs
prcguntauam depois aos noííos com grande cfpantb , ^^e
«ra aqueilc foldado geititilhomeih , x\uc àndaúa armado no
tempo do conflido i & faltalia intíTepidoem noíTas canoas»
porque â vifta defte , (diriam, ) nos mctco terror i
& foy a caufà de fogirmt)S5 igoal a dó inceildiò A cerca de-
fte milagrofo efpanto deixou efcritaso P. rofeph as pala-
ufas féguintes. A ma6 de Deos ândoii alli , & moftrou he-
íla occafiam fua mifèricòrdia , & prouidencia ; foy me-
do qué ô Senhor pòs aós IndíoS à vifta daquclle ineen- ^
dio,& particular fauordo marfcir Si Sebaftiam ^biriòrò
que ho conflito foy vifto dó^ Taíiioyos , qUe perguntàuaS
depois quem era hutn foldàdoque andáUá armado hiuitò
gentilhomem, faltando de tatioà enicahoa , & os efpari-
tara, ôè fizera fogir/» íám palaura^ deftegrahdê Padre, êc
teftemunho fora de tòdà á éxccpçam.
GAPITVLOXlíl.
Ci^âga a armada de Mem de 5a ao Rio , & &)§
tile o V. lofeph; aiómmete Ejlamâe Sâ a todo
rr poderá inirnigb 3 ér fica ferido mortaímeme 5 ;
profegue a guerra Sãltiador Corrêa de Sâ , até
renderdetoâò oscôntràHos :Ètorm^^^^^^^
S^^icentê^
iSi T kÁvÀ ò ántiode j$67.&ácbàuàrcEftá-èiicétíofcptl
cio de Sà , & fua gente toda i fe bem fauò- - ^;;^ 5°•;^«
recida de viíStorias , desfalecida de focorroàm.dàUcWcm
aiiendo ja quaíi dous annos i que faliam a
guerra , ehi fitio tâni incommodo , & falto
de fuftento : E quando ainda confiderauam ínuito que vé-
Pij ccf
^iM6 V I D Ap O: P.^ I OSE TH An C H l e t a ,
^(Ctr^fQrq^PfdS^m'm}gQscr^m fcfíiconto fâuorecidos de ftus
(er tQérçt>n3;itianfâíiiçoíGs, rÔc com gente. Porem V kaõ cm
3l^reu€;i| que ff uorecc Deos ânimos esforçados ^ porque aos
dezoito de latúóro ante veípora do Martit S. Sebaft iam 5
apparçceo na barra a armada do Gouernador JVIemde Sà
que da Bahia partira emNouembrodoannopaííado , jun-
tamente comlofeph de Anchieta , de todos efperado, Sa-
cerdote ja , & mais apto pêra podellos ajudar, conftaua.â
armada debom numero de nauios , (fupoftoquenamcon*
ílao certo ) & trazia Toldados de valor.
2 Lançado ferro da barra pêra dentro, confidcrando
MemdeSá, & feus adjuntos, a boa eftreia^ da coniunçani
lirigo, vnijJQfgfppQ^ refolueram que no próprio dia do Mártir S.
Scbaftiam acommeteíTem fem mais" demora as princi-
pais fortiíícaçoens do inimigo, que vinham a fer duas aU
deas de maior conta , abaílecidas de gente, foíTos , cauas*
ôc artelharia, que pareciam inexpugnaueisj porque era de
crer, f diziam^ que quem lhes dera boa fortuna do tê-
po, lhes daria também a do fucceííoprorpero; aprouou tu-
do Eftacio deSa, tomou a feu cargo a execuçam, & fí*
coufirmeoaíTento com voto feito aõ Santo Padroeiro. O
BifpoD. Pedro Leitam , oPadreJctnacio de Azcuedo, Io*
fcph , ôc os .mais religiofoSjqueaUí vinham , encommen^
daram ao Cèo o negocio , que aquell e dia ficou em íegredo.
íioúos.ikip-': j Dèícançou a foldadefca o dia da veCpora do Santo
lk"(*etviáo /T^^defcançar permitem grandes cuidados ) ôc ao romper
deiiaoOp. da menham.do feguinte dia , eftauam difpoílos a rompi-
mento dous batalhoens , tirados da flor da infantaria da
armada, Ôc arraial ,3 cargo do Capitam mor EílaciodeS^;
E feita primeiro huma breue fala , com o nome do Santo
Padroeiro nà boca, acommeteram iííualmenre a ferro , ôc
fogo a foirtificaçam principal. Era eíta a de Vrucumiri
maisdifficultofa porfitio, & numerode foldaJos Tamoyos
ôcFrancefcs 5 & depois de vários fucceíTos, & encontros ,
ÒL recontros( porque eílauapertinas, & forte ) foy entra-
da
TI LlVllôll.CÀP.Xllli ' ^fíj
^a, 6c vencida comcftragò laítiiHòfo, porque JosTáriiòyb^
nam ficou hu com vida: Dos Fracções mòffferátft alguns hO
conflidlo , & íitico que ouUetam âs niá5sos Pòrtugiiè-
zes , foram pendurados em hurti paò , perâ tfcarhnehtò
de outros 5 & com cíFcito a viftadetamcrifte cfpeitStâcuIò
ficaram tremendo as mais Aldeãs, dos hòííòs ti^orrerâni
onze, ou doze , & entre eftes hurti Capitam de màr , Ôé
guerra ,ôc Capitam juntamente de Pòrtòfegúrò i chamai
do Gíirpar Barbofâ 5 hohiciti de grande^ partes, 5c esfofço.
Fizeram vorode nâm virar jamais ascòftas na guerra cotrá
hereges, òu gentios, mas aceitar aiites as fétidas a peito def-
cuberto pella fédeChrifto. Porem o qiie nietco cm mof
fentimentO;,foy quefahio da briga nrial ferido o Câpibhi
mor Eftacio de Sà > de cujo fim , como ham mòrreò nâ em-
preza , diremos depois de álcaniçadai á fegunda Viétoriai
por nám miftutar triftezas ct>tn áfeígrids.
4: Concluidocom Vrufeumih , acoiiiíiieteòá iibíTá Ãômetr^eàj
íbldadefbá o Principal dâ íegUndá Aldeã i Pârátíàptrcby : ^^^a^g
Porem conioiiftauaeftaerti Ilha rafai chatiladà db Gatò,"°»pj?cuí*^í
foy rteceíTario cchdufir artelhãriá, te Baterlheísá^ éertas ,t«rTcom°vi-
qUe eram dobradas, & fòfciífímas .Masehi breuè teitipò^'"'^,'^'^'"^"
forarii poftás pór terra com toda^ fuás cafa^ , Ôc hibrros quã-
tidadedos bárbaros. FizeránimuirosdellesCbi^pòcíiihuthá
cafa forte,entt'iricheirada Ôc valada Poftm fòrio pòílos em
cerco , 6c aperrados de ítiaheirá i que fe èntregai^airí a pahi-
do da vida, mas namdahberdádejhiorreòdosiiôíróshuiò
PortUs^ueSjôc âlguni dosInd)òs. A Viíla c'cfíds dtíâ^ i^ifto-
íias , ficaram osTamòyos déférigííHadbs db liolTo poder ^
& defconfíadosdd dos t^rancezes , qde ò^ ajudâuám : fogi-
tam huíls are parar fio niais efcoíldldo dè fUas brenhas^ òU*
tros pediram pazes , que fóràííi toncedidasV^ cpttíttârt-
gidos ellesa guárdaliaà pôr íTredd. ,•• rn
5 Fizéramos PéyrttiorurâêS áéfcaiii de gfacás 'j^íiòáí^»"™»^^"*
ao inui(í^o Mahif S Sebáítidm ícu tefVòeil-b , Sciihítní' çaóde graç,é
penhâdo em feus fátíofes. "lémétúri poií(t (táqucftás fcí--
Piij mofas
tornam pjffc,
&c comt|4m
UwdM?'* njofas enfeadas , moradas cjue foram de ininiigo tam câii.
Çado , & pertinas,. Arraiaram as forças contrarias , òc co-
meçaram a traçar fortificaçoenspoderofai} de pedra, &
cal, com que por humavczícguraíTcm aterrai ôc podef-
femedificaraCidaderamdezejada. 'i.,..j^j
6 Porem no meio deftes noíTos applàufos cm qaantò
cauàmos alicerces >& fe Icuantam primeiras pedras , colâ^
nas de noflos vencimentos, fcguindoa varia condiçam da
fortuna , & a liçam da fagrada efcripf ura quando diz : ^*-
trema gaudijlíiãus occupaí^ he bem os celebremos junta-
mente com lagrimas, cauando repulturas,& entregando
a terra o corpo do esforçado,& magnânimo Capitam mòr
Eftacio de Sà , o qual depois de paíTado hum mes do pri-
Ç.íFaoãi.-.f ^^^^ conflito, paíTou á milhor vida da ferida morral dê
ft" ^dlístà ^^^ frechada , que reccbeo no roílro , no mefmo tem-
«cííTor vid. Po ^^ ^"^ alcançaua huma via-oria de tanta importância^
fíq^f^^^^^^^ 3 gozar dofruifo de feus
bconopri grandes trabalhos. DcueoRio de Janeiro a cíle Capitam
^ciroconfli.^eernasfaudadcs.por cujo fangue goza a liberdade . em
quehojefe vé. F07 varam merecedor da nobreza de k\is
antepaííados , luflre de íua decendencia , & exemplar de
conquiftadores valerofos. Sobrinho foy do Gouernador
Mem de Sà , mas foy herdeido de feu valor , ôc Chriftã-
dade, ôcfofredor de todos os trabalhos 3 & na pureza ^
inteireza de vida , & de feu officiocxadiíllmo, de quem
refere o Padre lofeph de Anchieta , que fendo depois tref-
ladadosfeus oííos , experimentara hum feruo de Deos de
nofla Companhia (atreuome a cuidar por conjeduras. que
% o mefmo P. Jofephjque fahia dellehum cheiro fuaue,
como final que gozaua fua alma da felicidade da gloria, fi-
izeramlhe exéquias triftes mihtares,com pranro,& fcntimé-
to de todos ; E tiueram os Padres oraçam fúnebre fabre
fuás virtudes. E peramimomais importante louuorhc o
queda deite Capitam o Padre lofeph de Anchieta, como a-
quelle que tanto o conhecia: E dizaífi de fua própria maó ,
^uíH virtu
L I V n o.II- C A i^TXnL' ' i V li^
& letra. Nefta conquiílaqae durou alguns ann©s; ajídâuani
oshoitncns como Relígioíos, cònfiaddscTnl)€GS^iiaíprden-
ça do Capitam mor Èílaciode Sà : o qcralakdxk (cu gra-
de esforço i ôc prudência , era a tôdos^eiiiplodevlirtuílCj!
& Religiarh Chriftam ; E bem moítrouo Padre Nofcjrega,
que foy regido nefta matéria peljo diísinb Erpiritdypellâá
mbitas, Ainfignes vi€^o^ias , que pcn? miícricor^ia fuá
ouueram tam poucos Portuguefes , de tánra multidam de
Tamoyos ferociííimos , coftumados por tantos annos a fer
vencedores 5 ôc dos Franceíes , que configo traziam ,
&c. Sam paláuras do veneraUel Padre , ôc falando dâ
morte cm particular diz ,que faleceo com grandes finais
de virtude, queem toda aquellaconquifta tinha hioftrado. .
Fov fubftituido no lugar defte Capitam Saluador Gorrea^^^^^^^^^^^^^
de sà confobrinho fcu , & fobrinbo do mcímo Gouerna- ao tapuam
dorMemde Saque prole o^uio à empreza , como TOgo ve- deSaifufo.
remos, ôc propagou a mui nobre familia dos S às nefta bnnhoSabs:
Capi[ania>a qual por fucceíTam coritinuaiquaí fe fora herã(^a, de sà.
pouoou , edificou. & defendeo o qiie humá vez conqui-
ílou por armas jfendo fempre terror do inimigo. Acaba- i^
dacomram felis fucceíío a guerra * partio lÒíeph |)erã fua^""^ c!|f.
amada CapitaniadcS. Vicente, em companhia do Padret"n>a de s,
Vificador Ignacio de Azeuedo , dò Padre Pròuincial
Luis da Gram , ôc mais companheiros que nlii afiftiam
& também do Biípo D. Pedro Leiram , que hiavifitar eftas
partes. Aqui fe viram entam juntos quatro homens de co-
ta, o milhor que tinha a Prouincia; Azeuedo ,Grarh , Nó-
brega, 6c lofeph, ôc aqui tomou o PVifirador cabal conhe-
ciméro dos trabalhos primeiros de lofeph, do grande efpiritd
defuas miftbens, &raras virtudes, cõ que tinha admirado a to-
dosiBanhauafe dealegria Tanta & fazia arãde conceito detãò
altas mercês do Senhor. Vifuadaaquella parte da Prouincia ,
refoluemm eftesvaroens entre fi fazer mudãçadòCollegiò de
S. Vicente, pêra o Rio de lane^ro , por rcíoens bem funda-
das , queaiftb forçaram , & pcra animar ao pouo vi(5i:ó-
riofa
•Gonhbcee-
VlIO V I D AK fcí! P> I Ò SÍE RHJ ANJCii I ET A ,
riofotque com maiszmwo fandaíTjsinra Cidade^ quei fuá
- Alteza; , & todo i D Brafil dezejaua : E, pêra o dito futuro
Gojlegio:detet'niiaou o Padre Vifidador, que toraaíífflofe-
.ph.,; juíicamente com ícu infeparauel amigo Nobregaú
dosqàais cohfíaua: o bom progreíTo, que nefta obra á
Cornpanhia podia dczejar. ,^jum^ £.1- '-pi ^ui anp
8 Porem em quanto nam partem pêra o Río de? .te
neiro , referirei algumas reuelaçoens decoufas ^•Qccultasj
que Dêos aqui communicou a Teu íeruo lofeph. Fixcra cUé
hm faida fora do CoUegio em cópanhiadefcu amigo No*
brega? & fuccedeo apofentaremíc huma noite em certa
caza , onde também fe agafalhaua hum Aires Fernandes
fecular :Qnando as dez horas da noite , ouuio o fecular
ftandoaufen-^^^f^^^^^^o^^ph^^"^ Nobrcga , & Ihc dizia as palauras
teoíucceíro feguíntcs 5 Padre meu demos eraças a Dcosque alcança-
fie hum» vi- *-^ ^. , .^"^ .* , . . r* *
ãm». ramos noílos agora huma vidbona dos mimigos. Notou
Aires Fernandesa pratica , & depois foy reftemunha delia
alem do Padre Nóbrega. Nam parece diííículdadá , que
reuelou Deosaqui a vidloria: Porque aquella marauiho-
fa das cento, & oitenta canoas da cillada dos Tamoyos nO
Rio , fuccedeo eftando lofeph na Bahia , Irma5 ainda*
& areuelaçam foy feita em S. Vicente, depois de Sacer^
dote. Nem também foy a iníigne viéloria , que alli alcan-
çou o Gouernador , ondemorrco Eftaciode Sà feu fobri^
nho , porque a efta foy prefente lofcph, ôc os mais Padres ,
quexinham vindo da Bahia ,logoem chegando: Somos lo-
go forçados a dizer, que foy de algum outro encontro
confiderauel ,qne fuccedeo no Rio, ou Cabo frio, eftando
auzente ; Qual efte foíTe , he incerto, ôc deuia fer impor-
" tante , pois o Ceo fc empenhou em communicarlhe o fuc*!.
ccíTo delle.
Segmiare- . 9 Mais cfpantofo foy ocafo feguintc. Na Villa de S.
!^!?o Ja *""■ Vicente , eftando huma índia Chriftam , & cafada , fazé-
quedtu a vu do ( com outra Irmam fua das mefmas qualidades ) certa
obra de cera /^officioemqueganhauafuavida^fcs entre
\ outras
da pellacan;
dade.
.AT^í LivkoIIvCaí. XIIÍ. V m
èiurasduas vellas da mcrma cera para fi , ôcfetídof pergú-
tadadairmamperaqueas fazia ? refpondeo ; FaçOas pêra
:^pndreIorcph, pêra que diga por mimhuiilaMiaâ quan-
do eu for fanta : Queria dizer marcir s Ôccomeffei-
itoleuou as vellas ao Padre , ôc lhe communiGou o fim de
ieu intento. O que mais paífaram 5 ou que conhecimcntQ
-fiuefíe deftareroluçam,nam nos confta , conftou porem
-que dando aflalto em S. Vicente os Tamoyós do Cabo
Prio , que ficaram rebeldes , enrre outras prezas que fize-
ram , Icuaram cila índia , a qual precendeo o Capitam da
'Cmpreza violar , refiftiovalerofamente , dizendo erti Im-
goa Brafilica : Eu fou Chriílam , & cafada , nam hei de fa-
zer trci cama Deos.ôc a meu marido: bem podes matar-
.me, & fazer de mim o que quizerdes Deufe por afronta-
do o bárbaro, ôc em vingança lhe acaboua vida com
grande crueldade , fazendoa íanta , tíu niiartir como ella dif-
\ fera. Eftaua lofeph em S. Vicente , difcante daquelle lu-
aar trinta legoas , ôc com tudo naquelle mefmo dia, illii-
ftrado doCeo, acendeo as duas vellas , que ella lhe dera,
ôc com cilas diííe miffade Mártir , comasoraçoená, ôc li*
^^^oens , que coftuma dizer a Igreja , ôc com o nome da
jnefma índia , nos lugares onde ordena o Cercmonial na
MiíTa de huma Santa Mártir. E preguntado por feu Siipe-
: liorNobrega, que Sanca era aquella por quem difleraMif-
r ia í' refpondeo: Por fulana ( nomeando a Índia, bem conhe-
cida emS Vicente) que eíle mefmodiafoyrhottaamaõs
de humTamoyo bárbaro ,por guarda fiel dàlei de Deos^juq 0.31.4
& da honeílidade , ôc íobiologo ao Ceo. E veio <iepois4^^^^f;i;'|-^J
noticia publica do cafo todo , como o diíTera , com to-
das fuás circunftancias. .n ;..;.,:.:. ■-::■: ^yi.,-
!o Heremelhanteaeíleoutíòeafo i quando dizcti- . .
do Miíía de hum defumo particular em dja de 0. loao tua- ihiiite.
gelifta>húadas outauas donaeimentodoSenhor,lhepregú- ^^^
tQuorn^rmoNobregifcu Superior , porque em dia feftiual " •J"-^^^*
diziaMiííatriílededefunto,fora das ceremonias doMilTal,
Q ref:
Wi Vidado P. í "oii: ph a-ncU i et a ,
rerpóndcòâífi: Porque eílanoicepraíTadamòrreono Goll%.
gio da Companhia de Noíía Penhora do Loreco , ;hum Sa^
cerdoce Góndifcipolo mea antigo em Goimbra /õc quis
ajudar aquella alma com eílaMiífa. Perguntou mais o i^a*-
dre Nóbrega pcllo eílado daquclla alma ? rcrpondeo ^ !quc
*depoiís d© oííertorio , quando chegou ás palauras; Omní)s
'honor r, ^fldrtay entrara no Ceo. Quem nam íe efpancífe-
tà da facilidade das profecias defte feruo de Deos , Ôc da c^-
dura j ôc fèrenidade com que as confeííaua a feu Superior *?
ou porque a iíTo o conftrangia ogrande refpeito da obediên-
cia . Oupovqueaííio obrigaua o mefmo eípirico diuino pa-
ra doutrirm noíía. ^ -^ tiR - ■■■ y^íi : í^jiiíiftiH ko^
'V. í
£ra£DfOt5.15S
#
CAPÍTVLOXIV.
3?aneIoféph deS. l^icente : //<? //^r^ hum Satèl
€mque hiade huMa bale a afanhada ^por fuç-
ceffo mâfauilhofo .• Chega ao Rio , ãfifie afun-
da çam do Colkgio : co72uerte ahl bum herege
JP rances^ ■
A RTio lofeph deS Vicente > no mes de
íulhodoanno de sys?. em companhia do
Padre Viíitador Ignacio de Azeuedo , Õc
^ do Padre Prouincial Luis daGram.ÔcMa-
vicencepêranoei da Nóbrega , pêra o Rio de laneiro, & nefta viagem
«•^^•' aconteceoaeíles companheiros hum cafo milagrofo da
protecçam dama5 diuina. Foy ancorara embarcaçam
de fronte do porto, a que chamamos com nome corru-
pto , Biritioga , por falta de ventos • Era vefpora do A po-
ílolo Santiago j quiferam os Padres hir dizer MiíTa a ter-
ra , meteramfeemhum batel, o Padre Ignacio , Gram ,
Nóbrega , ôc lofeph, com outros paífageirus : Eis qaeche-
Parte o Padre
gando
lílV ROlI- C APÍTVLÓX I YwM V
HJ
(tantlo ílo meio do caminho , leuanrafe huma grande ba ^*^o'^'^'-
lea-j ('íenam diíícrmos ferpentc infernal) âlíanhadaaó cjutíu.osiiuna
jKirecéó, de algumas frechadas i quclhe tiraram do nauioj-f,^^''^^;^^..
oíu dolorida de algumfilho , que perdera- Como quer que niitirosdo pc*
ít>ífe , ellalcuantando a cabeça medonha, & parce do cor- bfic»/
po fôbre a agoa,foy feguindo após ò batel i horrenda , ôci
tçmerofa , leuando diante dç.fi montes deagoa> & batendob
ísazas com tam disformes geftos, que todos fe deram por-
perdidos . E com maiseuidencia, quando chegando jaaò^
batel , meteoa cabeça de baixo * òc juntamente leuántotí).
a cauda íbbre elle j como pêra dcfcárrega^ a pancada. Aqui
ícproftraram todos de joelhos, .& comas mãos ao Ceo
lèuanradas emtermds de morrer >, alagado o batel /pedião
a Deosmiíericordia y õc junrò còmelles ò Birpò,6c os mais
quehiamnonauio,-&: os éíladarr? V'cndo. Nam permitió
porem o Ceo > queacabaiTènrdefeftradamétetam grandes,.
& importantes íeruosfeusjporquiwáèiuellemonílrò marine
nho 5 como mandado de algum :poderoccultó, ou quaí (é
obedecera as mãosleuantadas ao Ced,: pároticomo golpe;
dacauda , &: íe foy efcoarido por .proa ^ deixando o barel
fí&ra deafflicçoens,.pofto qbe aí:agadõí ogol iô è, Oíg'>ílo3
OÍ3--ílÍ2-'> ;:>
, i£ií^ - Efte íucccíTo tcue o Padre lofeph porlmUáèrê , c6^*^=
.5 Parecèf dó P
(3[ue Déos amançou aquelle monílro » peraque nam def-fo.
carregaíTe a pancada f 6l diz árfi j abalroou a balea. d baHi
tel , &paííandopor baixo delle, Jeíiantou á cauda fobríti
3 popa onde hiam os Padres como pêra dàr a pancada jí
rrías amançoua DeosNSenhordemaneira,qU£iaTotnou a
po>i-naagoajquietamente , fam- paíauras.fuas. Èacribuinq
ddíe^ommummente a milagmd]iníerceí3fam éeloíephi^Êic l^lbS/v
húH-)iíde (eruo ô-â rribue ao Padrioígnacití, Ss^mais èoiiipa^ -^^^ Mootn
nhe>i1:(>5, dizendo aííi; Eflaua-ò BiípOj &osHia,i&jdG.'nwíq .iois',^'^'^'
a líiiniira, eípcrando o fucceíTó; com -gr^andeTtemòr : niasi
ctínfíados que nam perigariam , por bir alli o Padíclgna-q
cio coífii fetís companheiros. Todos os quatro erára-h^raèítíi
íiúx&Sj. a caiaiqualdcUes fepoder atribuir o fáuotidD£eò:.S
rnsioS Q ij lo-
10175-3
.p.od)
iil' '
íz'4 V í D À D o P - i © s E p r A N C H y ettaT,
^.;*''.'^ lofepli o átíibue a todos, &.íoíloselk&x> atribuem a loféph ;>
"««'uiiVo (joíeph fuf peitou quco.monílro marinho viera aíTanhadoí
-^^.ii.y^s frechas ;de alguns dosnauios /Outros tiueram perafi,que|
isq obiojiriyjnj^a enibrauecido por perdido; filho , que cuidando ref)
'""'""á^u© batel , feforaa elle metendofe de baixo ; como coftu?t
mam , ao.filho , dándolh© as coftas pêra leuâllo j ou darlhcLi
d«e mamar : P orem o erpirito que inftigou b mbnftro, ( aoj
quefômoílra ) foy outro tirado das palauras de lofcph , ôçí
podemos cuidar que pretendia o dragam infernal , ác reue^i
ftidono monftro aífanhado * tirar do mundo , & igreja dd
Ekosoraais fíorido da Companhia do Brafil. Tornaíani;
os Padres pêra onauio , :ôc aofeguinte dia do bemactcnfurl
radd ApoEaló Saníiagoxantaram Miífa folemne em.acça6í
degraças^ êíâcram à vek; ^ , , . . n : ; o - e
che *rr a ^ Chegariam ao R io , 6c áchararfi o Gouernador pre«n
ii.o ací ica.r. fidindo Jis cdificaçam da noua Cidade. era lugar diílante doe
fo Coikgio^' ^rTãial hi3ma kgoã. Eíla mandou fortificar coxn algum as&
Éorças , ôc a barra com duas, de huma, & outra parte , fe-,
chando: aporta a inimigos. No Goraçam da Cidade deu fi-?
tia i, JDnde os Padres cícolhetani , pcra fundaçam de hun*
Collcgio 5 & logo em 'npibe de Sua Alteza , o fereniflimo^:
■ã ciíiàíi Key D Sebaíliam de faudofa memoria , Prinçipe liberal ,
'Jhe apphcou dote de renda neceiTaria pêra fuílento de âtc>
fincoentaReligiofos,. que aceitou, & agradecco em no-à
me de toda a Companhia , o Padre Ignacio de Azcuedov
Intitulotife a CidadedeS Sebaíliam, aífi do nome de íeur:
Rev, como:dx3 Santo ícu defenfor.OPadreVifitador , de-q
poisdèaiuer pofto em ordem as coufas importantes , dei-íi
vSL^/no' xadopor Caibeea V & Superior affi do Collcgio do Rio .^
Rioo p. No- eomí> daseasías de S. Vicente i Santos ,Piratininga , 6c Efrl
plno7,&op" pirito fantoi, com todas as Aldeãs annexas, ao Padre Np^n
lofeph per j^resa ; & poraiudante de fetl trabalho ao Padre lofeph ^j
dcfeuscraba- porquecoiíi eíles douscrpintos , principalmente íegouer-j
naífe"cr0ÍT5racerto aquella Prouincia ; cmbarcoufe peraa.>
Bahiávâíido vifitanda decaráinho as Capitapiâscntremeiasj
oí (I Ç> " Porem
Yio tneio (ia
Cidade.
lhos.
AT ijlV R O IL C API tVLOl V* * í' 125
-Porem cftaua ja Nóbrega muy debilitado do vigor corpo-
).ral, padecia grandes accidentes defangue, & malenconiá ,
.ôí'era força cairo trabalho às cortas de lofeph , em hum
sColleaioquecomeçaua aedificaríe,em Cidade, quecfca-
çamente tinha lançados fundamentos 5 acodia â infl:ruc<ja6
doslndios , que tinham vindo das Capitanias cm ajuda da
; guerra y ôc eftauam juntos em terras do Çollegío , em hua
.grande Aldca, que depois floreceo , ôc foy em augmento
rcm Chriílandade, ôc numero de gente.quefelhe aggregou,
- ôc foy fcmpre a defençam daquella Cidade.., r^n rIvc.!: ■ -
-i'.n-,j^> Entre os trabalhos de lofeph , foy fingular* Ôc di- ^^^^^^^^ ^^^
^enodehiftoriao cafo de loam Boles, Èr.a efte firio herege feph hum hs
de profiíTam , & fogira noanno deis59. do Capitam Villa- "S^'*°'»^°'
gailhon, ( com otitros três Hereges de alguns que tinham
vindo em íua armada , porque queria caftigalos por erros
gr-aaes) & fé retiraram do Rio de Janeiro pêra S. Vicen-
te. Foram ahi bem recebidosdosPortuguezes, com titulo
de eftrangeiros , & também de Catholicos , fegundo ao
- principio moftrauam. Porem elles começaram logoa vb-,
initar a peçonha que no peito traziam ercondida , dá doli-
,d:riría do pérfido Caluino , porque hum delles efpecialmeri-
ite por nome loam Boles , homem douto na lingoa; Lati-
na:, & Grega, & Hebrea , verfado na fagradâEferipná*
ra 4 (adulterada ao modo de fua falfa feita , falaua fini-
ítramcntc das Imagens íantas^, indulgências , Bulias , P5-
tifíce, & Igreja Romana , diante dos homens fimples ^.ao
-prihcipio em íccreto , depois em publico , ôc tudoifto jni-
.fíorado com tais graças, & ditos , que alegraua aos que
ò ouuiam,; & pareciam bemaos ignorantes 5 porque falaua
dextro Efpanhol , Ôc folgauam de ouuir fualabia,. v^ ,/! >
L5. ..Chegaram eftas noticias ao Padre Luis da Gilam, a
íí.-:
icoét
O^ue cftaua em Piratihino[a , ôc em continente fe partiopor'^''5'^*™
l •••inn J \ a>.ltapatre.
acudir ao principio deftapeíte, que quando )a chegou,
tinha inficionado as pouoaçoens marítimas, ôcleu^ido .$-
posÇa gente ignorante-j Soube. o herege defta. vinda br&
ir-n Qiij como
5jhÚ!Íú3
ii8 V^D^DX^P. losfepy Anchieta.
tõnio era aftuto , & manhofo , & conhecia por Famarocfè^
lo , & letras cio- P^adiíCy arreceoufe , & fez logo hUma
r inueítiua contra elle ,í cujo prineipio tinha eítas palaur^.
^Ueftç' rrnhí edites , affert-egladtos anctpnes aà fãcienâahi
ijjndiãàm tn LièâoMctim Dei úfor-em^c. Na quaio''íay-
í guhiâ gi*'âuetinciite, porque dei xàuà dédâr o pam da dou-
í trina da pãlaurade Deos aos Porttígqezes , pordalio aos
gentios contra a doudtrina ácS Paulo , que primeiro
.fmandà priricipiãr â douótrina Chriftam , pellos que fam
de noííâ naçam , ôc depoiipellosquéfameftraniios A^ih-
rtènçamdeôe herege era exaípèrar ò ânimo do pcuo[-con-
'?"riíniJiiíiqiií>trao PádrÈGram , por faltar a ruadoaârtiTiapélla dar^ags
.SÍ3Í- -' índios : E juntamente o animo do Padre ^ iporqLíe.fecfoá€
• tepr^heiídidOà ou accufado dclle , IhepodeOem teotar fuí-
peiçoens. Porem o eípifito deíleferuo de Deos •, Kjde ar-
dia em viuâs chamas por acudir por fuateiira 5 O ; mcímo
foy chegar , que decimara rfe nos >puípi tos ,ncrsprâças:,?nò pu-
cbH do & íeejíeto &ieorifutarasheregiasdí>homem'Tát^e^ai-
: do ideíengailaíido ao PoUo rudède fuás falfídadesi amof-
inando quefeguardaííédellé comO'daniefma peftei^ifrfí
n^uiú \^tx.ç\tív\úon O herege fagas de hÍTVifiranÍDÍ*adrê,
qud eílauâ noutra Villavefiriha , por Ter fe podrar-; ou
âbrándallo-j ou irritalò totalmente pêra feus incenros .\Pa'
reib nam fiiccedeo , porque chegou a' tempo ■ , bm que
Pegacontfàcftam pêra fubirao púlpito. &vendo-o;deulheraiíi«ig&
ohereg% ode.efpirito , quc defepente mudou a ptegaçam , B. acoVn-
modándoa aonouò ouuinte , como íe muito tempo danr-
tesiaiefíudara aò mcímo intento ,fíeou fufpenfoo iiferegll:,
Àt0ri^èuíe âs boas êc acabada a pt^egaiçami , foy praticar: cS
o Pregador familiarmente ^ fingindofe em qrúdo } G^
.4*1 ocho-i-, rhôticòi & dáudo^efcuras a feus ' iditos- friuDlàs. Porcai
ín,i.?3ío Grani ;qUe entendiãbetóíeus embwftcs^, &: íabjâ que .iÍ^-
UiraUa â peite ehi occulro i oc que )a o voigo ignora ntd ehê-
gauâfa dizer , que Boles era homeqTíiloucftiíIimoi qtifstio
íadfi Cram ^ narn oufaua difputani <íòm:|lle , que o iperfe-
rfíioo i 5.) gula
loi nj5 riq
I ih t .Joil
.■yiu::
.A 1 tL IT ROlI. Cap XIV. il?
oalapcllainuófliua que lhe fizera , & outras cogfas fcme.
Ibantes. Apertou coifl a juíliça Ecclefiartica j ôc depois de
muitas íexhortaçoen$|, & protCÍlos , acabou que feproce-
d^cíle conita elle , & foíTe prezo , &: remetido ao Bifpo da
Bahia. AíTi fe fes , & dous companheiros ínoços , 6c idio-
tas- foram com elle 5 o quarto redufioufe , Ôc ficou na ter-
Fa yoaàc viueopor muitos annos com moftras de fiel Câ-
tholico. Porém o prihcipal herege loamBole's, quefoy 0
que mais deu que entender ao P.Gram em atalhar feus falfos
dogmas ; Agòrànefteànno prcrentedei5$7. da que fa^cr
ao Padre loieph : Porque depois de fer mandado prefo à
Bahia, foy trazido f nam fedizâ cauza porque ) a cfte
Rio de ianeiro por ventura para que foíTe caílicrado
nolugar onde começara a femeárfuásheiregiasrou porque
alli teria cometido outro algum delidlograue; Como quer
quefeja, o Goucrnador ÍVlem de Sà mandou que foíTejufti- Faz fcjattíçài
cadoa maõs de hum alemos , Ôc a olhos dosmeímõs iriimi-f^l^^R^L
gos , ( que ainda reftaíãàm ) pêra àjudalo em tatn duro tra-
ce , foy chamado o Padre lofeph de Anchieta : Achou o
hcregepcrtinas em feus errados fundamentos , pedio que
fe detiueíTe mais tempo, a cxecuçam da juftiça, ôc entre
aquellas tregoas da vida, fallou o nouo Sacerdote ^ ao
reo antigo herege , com tam grande cfpmzo , &c eficácia de^rX' ^^1
rezoens , que conuerteo feu empedernido coraça6,Ôc veio a'^^*^*
reconciliar com a fánta Igreja , aqdella oudha perdida , &
tragada do lobo infernal , com applauío do Ceo , & dos
homens.
7 Porem acónteceo aqui hum câzo digno de fer fabi-
dot porque oalgós i quando foy a execuçam do eaflio-o,
como era pouco defironò officio,dêtinha o pcnitêténo tor-
meto demaíiadamcnte, c5 agonia, & iiripaciencia conhéd-
da lofeph que via efte erro tam grande , & arrcceáua , que
pof impicienciafcpcrdeííeaquella alrtíade hum homem
colérico por natural , ôc de tam pouco conuertido 5 entrou
crn zelo , repichendeo o algos , éí inítriíio-oelle meímo de
como
.iniuti
ti8 Vida dO PI IôsepiI A;nchíeta.
Gomóhauia dé fa^er feu oíficio eonxc;a breuidádc de»
ZGJada ; Aóto defina charkiade , rabia-muiro bem lofcpH
Ê^3c«rre lofe- ^ pena das kis EccíeíiaftiCà^:, que íurpendem de Teu officia
í^''m'ltu' a todo aquellc , que fendo íaccrdoteràccelerá a execuçarr»
dft?r!r"' da morte.tm qualquer ocGafiam que féja , ainda que piai
liur-rde pe- Porém prépondefaua comeliemaisacharidade, quedcuia
ri^aie peni ^^ pj-Q^i^iOj & TeípondeoaDS que Ibe preguntaramaGau-
fade talrefolu^am, defta maneira. í^orqucodáno ide mi-
nha Mpeníam, nambeofFenfa de Beos , ôc tem remédio
com a abfotuiçamdàlgreja iPoremodãnodaquellealmà,^
fe alii íc perdera , por impaciência, era péccaminof o ,.^ naã
podia remedearfe : E pelía faluaçam de buma alma .vjuera
eu ítiípenfo todaa minba vida, (refolu^am da Ingeniófa ca^
Parte o ridadc í^^jxD Gouemador Mcm dc Sà depois deíle caftigo
Merielr partioperaa Babia , contente dos fueceíTos que Deos lhe
fè^?.»í%i^i»- dera vdcixandocom o gouerno daquelias partes a Teu fo-
' Wf brinho Saluador Gorrea de Sà. ' .^ cuijd t)h lò-su
CAPITVLOXV.
Beabunscâíosdimos demembrlâ iop, Tófeph
que aconteceram por ejlemefmõ tempo .etÊqus
€jípue no Rio de íaneiro.
■M odoi
O tempo cm que efteue o Padre lofepb ac5r
panhado do Padre Nóbrega no Collegio do
Rio , acontcceo ocafo feguinre. Mandou o
Gouernador Saluador Corrêa de Sà doze
mancebos de alento ^a certa faccam contra alguns France-,
rias circunTfes, que eftauam no Cabo frio em trato com os índios? 5c,
íiaucias. como corria fama da fantidade de Jofeph , foram todos
Gonfeííarfe com elle , & pedir fua incerccííam pêra cora
Deqs.f elle lhes diíTe , quefoílemembqra , onde p« man-
daua
Preué hum
fuccf íTo au-
fectecom va
, aIiV ROÍICapI tVLoXV. .V 419.
dafaa feu Capitam, porque hauiam de obrar hnin feito
honrofo. Partiram os doze Toldados > chegaram ao Cabo
frio , porem aquife diuidiram finco delles , que foram a
cafo à Bahia fermofa , diftante duas legoas s onde quando
mais defcuidados de tal fucceíTo * fahiram de cmbofcada
fcte Francefesjmuy bem armados , quede improuiío ar-
remeteram aos finco/ Em perigo fc viram j porém anima-
dos com o que lofeph lhes tinha dito , pcleijaram honrada-
;mcntc,Ôc foy também o fim honrofo ^ porque dos fete
mataram féis * & hum prefionaram , 5c trouxeram viuoj
com morte de humfòfoldadadonoflb > por nome Eleodo-
ro Ébanos , cunhado de hum dos vencedores.
1 Vidoriofos voltaram logoíeín demora pêra a Ci-
dade , celebrando entre fi o feito , combinando-o com o
que lofcph lhes diííera & pretend ndo a toda a preíía letiaí
nouasa ícu Goucrnador. Eis que chegando a S- Louren-
ço Aidea dos Índios , ja perto à Cidade foram recebidos
com grande fefta , dandolhes os parabéns da vidloria, &
moftrandoJhes o Tadrc Gonçalo de Oliueiraque âíli afi-i^^ timinhò
ftia, hum efcrito do Padre loíeph, em que lhe pedia que^'"=."."»
os agafalhaííecom toda a charidade, recontando neile ro-miêírçàradé
do o fuccclío , que tinha paiTado daília vinte , & duas^'^^?*^*
legoaSjdondepareccoimpoífiueU ter vindo recado anres
delles , fegundo apreíla com que caminharam j& circun-
ftancias que concorreram» Porem chegados à Cidade fica-
ram períuadidos , da rcuelaçam com msis certeza ; Porquê
ouuiram, que pregando o Padre , dia de S. i^titonio> ò
mermo , em que no Cabo frio fuccêdera o cazo , diííera
ao pouo 5 hoje paíTaram defta vida fete homens , dos quais
fcisfc perderam , & hum fefaluou por mifericordia de
Deos : Foram os féis Francezes , & o fetimo Eliodoro Éba-
nos Todas eftas circunftancias correram logo pella Cida-
de , &: fetiucrampormilagrofas.
3 Ajais circunftancias tem o cafo fcgiiinte. Andauâ^f«^'*ç^^^«-
hum loam de Soufa Fercira em certa jornada do fertam , Trl^''Tr
K
trezcn-
Reuelaçam
do pcccado
alheio-
^^o V í D A O O P^ f O s t p • An c h ve í a ,
tas ílego^ -pella cerra denteo por teoipa iiotaue! 8e
maisdedous annos, 5 Vieram- nouasaiS. í auto , que era
niòrto , com tais cirGunílaíicias , que foy auiíada íua mo «
Iher ,& outros parentes , que aíriíliamno Rio de Janeiro
os quais tinham feito fuffragios, & poílo dópor elle. Po*
rcm mandando opay da dita molher, orde-^m ao Rio, qae
fe embarcaííe pêra S.Vicente, onde elle moraua ,<Sc que-
ria cafalla, indo a derpedirfe doPadreloféph, ellelhe dif-
fe que íenani foffe , que feu marido era vivo , ôc que antes-
demií.itosdias,ehegana àquella Cidade, bem difpofto.,
Ôc com cabedal Tudo fuccedeo como diífe,. porque o vio
cm íua cazadentroembreuesdias^bemdifpofío.ôcprof-
pero de bens de fortuna.
.4 Caiara certo homem com impedimento occuko
em feo^undograode aííinidade, que dirimia o matrimonio,
de feito íecreto , que nam quis defcobrir por vergonha.
Mas compadecido lofeph de feueftado, o foy vifiraf , ôc
2'w.^/.P4 depoisoleuouaoCoilegio, & lhe diíTc , fabia muy de
o^hmh. cerro de feu impedimento, &quenameftaUa cafado , que
""^'^""■^i'.' era neceílario remédio de confiílam , ôc diípeníaçam. Nam
pode negar o culpado. lançoufe a íeus pés, pedioperdam,
6z remédio. Abfolueo o oícruotdo Senhor &c por modo
prudente , diípeníando fezrenouaros confentimencos dos
xieípozados , ficando em feruico de Deos,
5 Fov hum dia leuadodo eípirito , a caza de Bertola*
Auifaa humfneu Pires 1 homem conhecido, tirou o aparte do compa-
Urgae3> nheiro. & diílelhe. fenhor Bertolamcu Pires , a molher
iherccmqiifQj^e tendesuam he voíía , & hcneceíTario largala. Ficou
viue porque i r> «/-r- ^-v i íI 1 r J
heviuoíeu perturbado O homem, ôcdiííe.Padrc eu eftou bem caiado,
'"*"'^°* na Ilha terceira me recebi em face de Igreja, fendo dado
Trcc.R.f, .38 juridicamente , o marido , que tinha fido de mnha mo-
lher , por defunto. O Padre lhe tornou alfi hs , porem que
faremos a Deos , que quis darlhe vida? elle he viuo , che-
gou da índia a Portugal , ôc ahí eftà , he neceílario man-
darlhefua molher. Era bõ homem temente a Deos.obedeceo
deu
L IV RO II. CàpitvloXV. íii
deu conta à hofpeda, que veiotambcm niíTo, porque era
conhecida a fantidade de lofeph, & tinham feus dicospof
do Ceo.Feita refoluí^am, & tomado nauio,eis que chega de
^_ Portufral precatório relatando o cafo, & pedindo ao Pre-
lado fizeííe embarcara molher pêra feu marido ; Conftou
a todos , que té entam nani tinha Virido rodeia femelhã-
te , nem podia ter vindo , porque tinha o homem chega-
do da índia a tempo , em que nani podia faberfe no Brafil
antes do precatório : Eíicouclaraareuelaçam de lofeph.
Rij
LIVRO
Primeír»
aduertencia
m
LÍVRO TÉ1.CEIRO-
:^s DA VIDA DO
PIOSEPHDE ANCHIETA
dâ companhia de lEsv
CONTEMOS ANNOS qVEGOVERÍSJOV
na Capitania deSoVicence, como Reitor daquelleCol-
lec^io , & das cazas de Santos , ôc S. Paulo annexas :
E ju n t^mtíite os que na - meíma Capitania, continuou
por í ubdito. E as couzas admiraueis , qúe ahi lhe fucce-
derain i até quaíi o anno de 1378-
«^' fô?- Kè 6^^^ íf*4^>3-&*3 &^- I^Í3»Í*«- **5' »*^ í^- í**í*^^
Intruàt^cíão^ ãiuertencias âòsliuros Je^lntes
S que oúúeretndè ler còrti curió-
fidade efta hiftoria , lie bem que
âduirtam daqui eríid^ntcjque no
preícnte, & íeguintç|,Jiuros ,onde
prcteíideiíios moftraras principais
obràsheroicas deíle grande VaraÕ,
fomos forçadois â mudar eftillo
commum , ôc o que leuamos na
vida que efcreuemos de feu difcipolo o vcnerauel Padre
loamde Almeida; A rezam vemaíer huma particular ex-
cellencia, porque na vida dos outros vafoens Tantos diílin-
guefeo efpeculaíiuo dâpraxi ; & por iííoemcada hum re-
duzem 0$ Autores a lugares communsíuas virtudes , cra-
can-
1
L IV R Olli. A DVE"RT ENCl AS liS
tando primeiro o efpeculatiuo dahuniildadcmortlfícaçaõ,
paciência, amor de Deos 6cc. t depois tratam da praxi da-
que!la3 que poferamem obra. jporem a vida de loíeph nao
dà lugar a eíta diílinçamj tudo lie prax,i , fem efpecuiação:
Cada virtude , nelle he hum prodigio pra<^ico moral , 6c
cada prodigiohúa virtude, Ôc talvezmtiitas : Veremos pois
primeiro a praxi de Tuas marauilhas , açõpanhando-o
íempre , por onde quer que for i que em toda aparte heo
melmo. ôc dalVi tiraremos depois a doutrina, que pretende-
mos, fem eípeculaçam, sò conl exemplo que he mais efficasj
nem reduziremos a lugares communs fuâ variedade j mo-)
ílralahaa ordem do tempo somente :6c eíle reduzimos
a cresprincipaes termos. Primeiro ao tempo em qud afiftio
na Capitania de S. Vicente- Segundo ao tempo cm que
principalmente eftaua na Bahia de iodos Os Santos í fendo
Prouincial ; ôc difcorreoa cofta do Brafil. Terceiro áo tem-
po em que refidio na Capitania do Eípirico Tanto > onde
(leu fim ditozo à peregrinaçam de Tua vida. ..tHi;.ií i
2 A fegunda aduertencia í cja , que âquelles fárttos qué
maisaíignalados foram no trato familiar com Deos, por,
meio de alta contemplaçam , coftuma o Senhor falar, por^^gUa^Jf*'*'
modos fobrenaturaes deíufados, nam entetididos dos ou-
tros homens jafaber , por viíoens , reueláçoens , profecias
cm prouadefua particular amifade; & todos eftes conheci-
mentos, 6c falas diuinasjfam mais claras scjue a mefmapa-
laura de boca , ôc vifta dos olhos , & mais certas que às meí^
mas fciencias j & irázem comíigo tal effícacia, que arre-
batam a vontade , Ôc appetite , nem he poífitiel , ou obrar
ou crcero contrario. Quem ler com arençam efta hifto-
ria , nam pode deixar de admirarfe da facilidade dos mo-
dos, fobrenaturaes, dcfurados, com que Deos interior-
mcntefalaua , Sc communicaua a feu feruo lofeph qual
amigo familiar a outro ; moílrandolhe as couzas occultas*
preientcs paííadas , ôc futuras , aind.a do mais interior do
coraçam dos homens, tam ordinária, Ôc facilmente, que
R iij fomos
Tcrceitra
»dutitcDcia
.$Í91';
i34 Vidado P. I oseph âncííí êYa!^;
fomos forçados a cuidar , que íempre eftaua com elle ;
em feus Collegios , tin km caminhos, onde querquefof-
fc ou eí^iticík 3 & que trazia €{le grande feruo feu , co-
mo auiiiculadaâ omnipotência diuina pêra obrar prodigios.
3 TcrceiíâaduertenGiâhe , que a Capitania de S. Vi-
tcmt , ondcagoratnírà âfêr fuperioro Padre lofeph , foy
das primeiras que nó Bfafil fé pouoaram : Eftâ em altura
de vinte ôc quatro grãos i correndo do trópico Auftral ao
Polo A regiam he faudautl Tem variedade deveram,
& mucrno , com os meímos frios * ôc calmas que as
dê Europa 5 trocado porém o rempo das ceíoens, porque
õ que nâ Europa he vcram.aqui he inuerno , & pello c5-
rrario , o que na Europa he inuerno j aqui he veram, O rer-
reno hefcrtil.nam íó dosfruitos do Brafil , mas dos de
Europa , que nelle fe plantam 3 efpecialmente defearas de
triCTo , vinhas/fruitas,&: flores j coma perfeiçam, & abun-
dância , que defcreuemos lios campos , ôc arredores de
Piratininga , que he parte deíla Capitania, Foy a primeira*
que teue plantas de canas de açuquar ; o gadoheémgran-
d^e numero, ôc toda ellahe mui grande parte da fartura do
Brafil; E tâmbem parte da riqueza , por ferem minadas
fuás entranhas de ouro , ôc outros muitos géneros de me-
tais: Do ouro fe bate moedas chamadas ( c5 o mefmo nome
da terra) S. Vicentes :ôc quando iílo efcreuo . fcdiz queap-
parecem minas de prata de grande rendimento. Efta Capi-
tânia começou a fundar Martim AfFonço de Souza fidalgo
illuílre, em muitas couzas venturofo , ôc entre ellas , em
leuar configo a Índia o fanto Padre Francifco Xauierj ti-
nha tio tempo > em que nella gouerncu lofeph , quatro
Villas priricipaes 3 S. Vicente , que era entam , ôc ainda
hoje he a cabeça : Santosque difta dua? legoas em huma
mefiTja Ilha pêra banda do norte ;N. Senhora da Conceição
ou Itanhaé,que difta outo legoas em ilha diftinta pêra o
fui, E S Paulo cm Piratininga , que difta deS. Vicente
quinze legoas de cerran a pella terra dencro.
CAP.
tlVUO III- C AP. I.
U5
«í í«4 ?« «5- 8ía«H «W <*? «*í fi«*E«»-?«<«í«**^ 9^-e^^^
CAPITVLO I.
He eleito o Padre lofeph em Reitor do CoUegio
deS. Vicente y & caXasa elle annexas : Sua
intelligenciaem Theologia ; efiripturas /agra-
das y & púlpito ; & algumas marauilhoJ!» den-
tro deu axa^
Vantõ tempo continuafle ÍQfephnô Rio^g^,ç.jQ ^
de laneiro , em ajuda de feu amigo Nóbrega Re^wr de s,
nam pudeaueriguár í O certo he que deíua
compan hia foy mandado , ( conjeturo que
noanno de 1569. ) â fer Reitor do Collegio , que inda
cntam tinha efte titulo de S. Vicente, & cazas a elle an-
nexas 5 & nefte Superiorado perfeuerouatéoannodeiS/S.
no qual anno acho nas lembranças do Collegio do Rio
que indo ahi vifitar o Padre ProUincial ígnacio de Tolofa,
deixou de meter neftc Collegio o Padre lofeph por Rei-
tor, eftando eleito pêra o dito cargo ,(por feafTentar que
era importante, ôc mais do feruiço de Deos fua aíTiílen-
cia em S. Vicente ) ôc que de nouo o confirmou no mefmo
carão em que cftaua , pondo cmfeu lugar no Rio ao Pa-
dre^Bras Lourenço ;E nefta confirmaçam do gouerno;f^^^';^7;2"
acho , que continuou mais tresannos , até o de 1576» a io-^^^cuf.vo.
ra o tempo queahi efteue, acabado o cargo .porfubdito j '*'""*• /'•^^«
& vem a fer até , pouco antes de fer eleito em Prouincial,
que foy noanno de 1578.
2 Aqui poisachandofe lofeph ja mais empenhado,
com obrigaçoensdo nouo Sacerdócio , púlpito, & Supe-
riorado , alem das ordinárias , foy admirauel o bem que
fe defempçnhou em todas cilas. Porque fendo aíÍ3> que de-
pois
1
nS Vida DbP,IosEPH Anchieta.
pois de fuás humanidades, Rethorica, 6c a parte da Philo-
íbphia , queeftcdara em Coimbra,, Ôc em que fahira
excellente , nenhumas outras efcholas curfou no Brafil , n as
refoluçoens nceeííariàs pêra hum perfeifb Sacerdote de
Scmquever- Theologia moral , & efpeculatiua i aíli era v^erfado , ôc c6
ías^no Brdii ^^"^^ ccrtcza , & facíHdade aquictaua , & defembaraçaua
admifsoeíruaajj^ascle cotifeííados , Ôc fubditos , como fe toda Tua vi-
da veríara as Vniueríidades. Na verdadeira cxpHcaçam,ôc
intelligcncia das fagradas Efcripturas , ôc púlpito , Tua fcien-
cia parecia mais que humana 5 conuencia os coraçoens
dos que o ouuiam , mais com cfpirito, ôc intelligencia das
palauras do diuino oráculo que trazia como coíido dca-
,. , tro émfeu peito , que de conceitos altos, Ôc applaufitíeis.
' - Todo feu falar recendia ao eílilo das fagradas hiftorias,
quâlo de outro S. Hieronimo , ouS. Bernado , dos quais
dizem alguns, que fempre falauam efcriptura. Acontecia-
Ihe fazer algumis cartas, compoftastodas de palauras
ôcfenceiK^asdas dminas letras , tam coherentes , Ôc enca-
deadas humas com outras , que fem que entremeteíl*e
palauraíua própria , faziam o effeito , qUe pretendia, ôc
conuenciamcoraçoens: huma porei no fim defta obra pêra
exeniplo. Na vida que compôs da V irgem Senhora NoíTa,
de quatro mil , ôc tantos verfos , que de efcripturas nam ex-
phca ? que depaíTos nam trata , com clareza , ôc facilidade,
deefcriturario perfeito/ nos diálogos celebres , quefe2 de
noíía fanta fé , ôc feruiam naqueile tempo em vfo do Pouo,
Ôc índios 5 que de qucftoens nam mete de Theologia, que
corriam , ôc correm hoje por certas , ôcfeguras , ôc tem
feruido de inftrucçam a tantas almas.
Cmdaraâigdi 3 Daqui Vieram algunsacuidat , que fua fabcdoria cra
iZ[^l,[^\l'. mús , que humana. O que eu tenho pêra mimhe, que podo
bretwcurai. que feu entendimento era mui hábil , ôc enCTcnhofo por ex-
cellencia, Ôc que por fi fem meftre teue vfo, & hc^am das
obras de muitos Autores ^ contudo a facilidade, ôc ciarei
za , ôc certeza de fuás repoftas , em cazos graues , & a va-
riedade
•it.%.
./. r 2 I L I V RÒ 1 1 í. C A P^l-T^ V L Ó is '^í í V f3.^
riedadedcobras que compôs líluftradas dófefto-^' vyèfíé'f0,
dcíabedoria , nam parece fomente liúmartâ'^; -ícíiáiTi c|ué
participa dadiuina. Era dito commum, queDeóspuíiha nâ
boca quando falaua ,on prégaua^a efte íeru(?;feu', o qué
bailia de dizer. E o Padre Gaípar Sampéres da 'Ctímpáníiia
de lefu , religiofo de virtude > & credito , deu juramento^
qitó.. prcgindo lofeph em ndíTo piilpito diâ do Efpiri-
to Santo, vio por feus olhosham paííaroa modo de Caná-
rio ^ que voou ao Pregador, & ic Ihepôs no'!iombroer-
qucrdo feftiual, ôc por mais qúecom as acçoens iiaturaes
dos meneos , o defpedia lofeph do hombro , tornauà
contudo a feu podo, pois aííi como parece veriílmil quecftà
acçam nam era natural deíle paíTaro , fenam indicaram
diuina : Alii fica teftcmunho virifnnil, que ade lofeph naô
era natural, fenam que o efpiritodiuinolhealíiftia cm o púl-
pito aoque hauia de pregar. Por onde coftumauaâ dizer ò
Bifpo D. Pedro Leitam varam de graíides Íetras,& authori-
dade,quemais goftauaddouuir efte (ô Canário, cantar enl
fcus fermoens , que todo o bando de Pregadores.
4. Entremos ja comefte noiio Superior dentro de feu
CoIIegio , vejamos ahi asniafauilhasinteriores , Ôc depois
veremos as de fora Comia lofeph no refeitório cerco dia
a hora extraordinária , & entraram nellehumas rolas cria- !^
das em caza , a colher as migalhas 5 páreceo ao refeitoreiro
que eram emfadonhas , òc enxotouas. Porém lofeph cha-^''^^--^-*^°
mou asaues,quetornaííem, &r trataíTemde fua comida ;
ao que cilas , como fe foram racionaes, obedeceram locro:
Boa entrada do Superior nono. Parecera a primeira face
menos fundado julgar eíle fucceíTo por marauilha ; po-
rem nam aíííaos que fouberema facilidade, com que lo-
feph dominaua os animais', depois hira moftrando a hifto-
ria: ôc aos que ja fabiamcafos maiores quotidianos ,í 'enl
que Iheobedeciam as aues 5 & fe lhe vinham a meter nas
mãos, & pôr fobre os braços, cantando ahilouuores do
Criador. O Padre Gafpar de Sampéres aííima referido, per-
S guiíi
Remedes á
diuint
Vate
B« VlDA DO P.IoStPH An CHiETA.
guntouhumdia a lofcph o fundamento da voz, que cor-
ria nefta matéria } & diz que refpondeo elle na forma fe-
guintes eu vos direi Gafpar o que ba > nauegaua cu huro^
vez, & hum paíTaro marinho andaua voando de hum , ôi
outro bordo j eu eílendi entam o braço , pêra que nelle dcf-
cançaífe , aífi o fez opaífaro , imaginai que nam ouue ou*
cro mifterio,quefc parara numa das vergas donauio Pre-»
tendeo eícufar o milagre , mas ficou claro de fua meíma
boca : Cafos veremos ao diante , que faram eíles mais eui-
dentes ; vamos a outros de diuerío género.
5 Faltou certo dio prouifam no Collegio , & o Ir-
mão António Ribeiro , que tinha cuidado do refeitório dos
pSencu Rcligiofos , auifou a loíeph, que nam hauíacoufa alguma
af.itade í^^ q^^q^^q laraujas , &c farinha que chamam de guerra , afpe-
ra,Ôcdura: Eramja horas de comer , mandou lofepb
^ater^. iiH, j. ^j^^jq jg coufíança em Deos que tocaííe a campa pêra o exa-
"^ "' me da conciencia, que na Companhiahecoílumefazer-
fe antes da meza , efpaço de hum quarto de hora ; Poz-fê
em oraçam,& paíTadoo quarto cornou o Refcitoreiro
a preguntarlhe , que faria F refpondeo , que tangeíTe à
mtza. Tocou,] untaramfe os RehgiofoSífcntaramfe àmeza,
começou a hçam ordinária ; & efcafameme hiam come-
do o antipaílo de laranjas , quando tocaram a campainha ,
acodio o Porteiro , òc achou hum cefto de mantimento
cofinhado , & concertado , mandado de efmola , por hu
lofeph Adorno Genoues nobre, muito deuoto da Com-
panhia. Tiueram todos boa porçam , louuaram a diuina
prouidencia , & tiueram por milagroía a confiança de
iofephí
í,'"";^''*, 6 Na caza de Santos, tinha lofeph acabado â Miífa
taica de vinho *■ t^ i r ii / j
peradusi a noite de Natal 3 quis outro Padre dizella porem , aduer-
^^^*' tiooSamchriftam , quenam hauia vinho ; Ouuio lofe-
ph que era Superior, èc diífe. Idelrmaõ , & trazei vinho
p^flc.^./ j 4. ^yg g^^ ^^ botija : Certificou o Irmaõ que tinha feito dili-
gencia, ôc nam tinha vinho algum j íegundou, ide que
haucis
• 1 f LiVROIILC Ai^. I. / nV i3jj
aueis de achar vinho •. obedeceo , &. achoat^hcia a JBotija>
veio com cila á famchriftia , fazéqdo patente a tnabuilha. •■
- ii: 7 . Temos outro cafo maior , Êalcaua ázeicé^-tta^ÍJâpí-^i^^jf" fit«
tania de S. Vicente , & juntamente cm noíTo.Goikgio, '=°""'^»""i-
auifou defta falta o Irmaõ derpenfeiro 5 ; diíTe que htiniTbar'- * ^^*° *'
rU que hauia em cafa,era acabado- porque prouiam delle tizm'Ped. r. Uu.^^
fó:0 Gollcgio,mas també as cazas íogc^cas, Igreja; & pobres. L!*!ír*ii
Rcípondeo loíeph, Irmaõ nas neceííidades nam deixeis
de acodirao volío barril , que Deos he Pay,Ôc fará que
não falte azeite. Replicou que ja o tinha erguido fobrcotor-
no, &que eíiaua feco de todo, Ôc. podiam bemvfar dellecm
outromifter. Tornou lofeph;, fazeirirmaó o quié vos te-
nho dito,'obedceeo odcípcnfciro, & em todas as^ neceííi-
dades :hiaconíultar a Teu barril, &: fóccedialhe.vqaô qual
á fdntefinha norigordo;v eram falta com agoaíiia )calmà
dà tarde ^ masempaífandoa noite torna a correr po|tôqué
piobremehce ,.aífio barril j que nos mai& tempos cílauafáí-
tòdç azeite , em vindo a neccííidadc dos pobres comc-
çauaa correr em piqueno deílillo.,hias baílante:perá re-
médio do prefente: 5c foy de maiieira. que de ne^ceffidadé
cm neceílidade , êc-de eílilloem eílillo, durott por dou s
annos o azeite ;que foy o tempo erri -que durbudaíterrâ a
fíjlta delle. Entrou hâuiò em quíemandauath os Eratmos fe-
nláojies do engenho dé S. lorge humà pipa de ; azeite pcrâ
os Padres de eímola , & ceifou lo^o no mefjmo diaò bar-
til do ColJegio. correo àfamà doímilagrc , & Coy^ ja}g4-
dcrcrmitor:ddíepor outrO; JEliíeo; : ■.■■■ ;^: 1: L£ , ^iv>;; -i
çih?: -Mas porquefique efte n:>ais 'rtforçado, fiiccédéòiogò
outr4> com maior eípanto , ( que meíp. aquirpdy remeltó- '^ ^
te. ) Achauafe lofeph na igreja da- Virgem da €,oíílbciçarti Milagre feífl^
deltanhae', cujo deuotiííímo era.(jueixaramfe!he os mor- ^^^^^^'
domos da Confraria ,que nam hauia azeite com que alit- „ , „.■
. ^ . , _ T rfOC. ao Rtt
íniar a Senhora , fehtio o deuotò teu a faká ^ mais que M 3^- '''/''í
a do Collegio, ôc diífe. Irmãos façam mais diligencia
& por ventura que acharam azeite, fizeramlíie certo os
^'^" Sij mor-
:.& ioi,,-:],
■■ oesrí\iii:ca
2£Lyg9Í .OÇ
■5.'0 oítfb
?! A»T .Si
a £9
i^.v\i\ .%
ReueUlhe
lapp VlDADbcP. lòSfl^H;A?N<fHI ETA,
jinor&jo^osí^câáhiini chegado a por a ismíjà em ^ç
elliúera boca ptrafa^xõj ôcpamlànçaaa còuza algumas
Toimoujchcio de fó. Granam tomem por trabalho fegun-
,dar a to , que poar ventura achem azeite. O márauilha f
vamíc a botija, , acbamna cheia de belb azeite até a boca $
piroJLteram as alampadas da Senhora , & Gomeçaramapris-
goai: o milagre , a cuja vòz acodioo reconcauo com fuás
;yaíilhasde azeite , a fazer troca com o milagrofo, ptera
f cmedio de fuás enfermidades. O conuèrter Chrifto a agoã
em vinho foy grande marauilha : mas multiplicar aqui o
azeite , parece nam foy menor. '
9 Êmoutra cazafogeitaao Collegio , mandou o P*
Dlos*'«ngu- Superior , que alli gouernaua , a hum Irmão que fe me-
eftluIThTm ^^^^ cm hum cubicub , & nam fahiCe delle fem licença
irtisão} andaíaa > ( parccc que com caufa menos prouada ) teuelofeph
3o."ieg""t*reueláçamdocafo , &racodio em continente aoaífligido
focortcio, íc jrmão , & paraiíTo andou a pé defcalço quinze legoas de
?hado me- caminhos afperrimòs , que hauia de diftancia : antes de
".°*"°^°^'^' meio dia entrou em caza , bateo aporta do encarce;»'
rado , mandou o fahir da reclufam , & que foífe preparar
patem.i.^.c de jântâY .* Dcpois dameza falou entam com o Superior *
^chZ1'de"por.^ com faudaueis confelhos , reconciliou hum com outro*
tttg.uTfi.if]^ fei(Q todo efte negocio , deípedioíe , & no mefmo diá
i'«<í.í./!3} tornou a entrar no feu Collegio, & fem que algum d<»
què nelle viuiam , reparaífe , ou dcffc fé da auzencia de fcu
Reitor. O amor daquella fó ouelha /obrigou a efte boift
Paftor , a deixar as outras , entrar por íiluas , & por mon-
tesa tirala da bocado lobo 5 que he de crecr , pretendia
fragala , & nam feniouera lofeph , fenam em cafo de pe-
rigo dahna, :io^i&
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O I feiii duuiJa exthoYdMâf i déf^^ínfe U fo-
feph cm conhece r couzas fecretas; ham fò ac- Conhece os
çoens , mas peníamentos do coráçam ííiaisde hum áfíiigi
occultos , lhe eftàuam jjátentes , como fé pin- ^H^^^l^
tadps os vira em algum painel. Vióquè ândaua perturbado bencam.
certo fubdito Teu com peníámctíí&íjbe lhe afligiarri à al-
ma, fem dtreuerfea defcobriios^áÊfeàtèiraélgâftfiá: {^atfòtí^/r mim.
a^c^rqpqr etlelofeph :, ÒL diííeltó fórn'erirè ettàá tólaíftas?
t^raila, tiraila 3 pêra qiié fâm eftèí pénrárnentos^;^&HíiáíO'v
j^tqp.aíHido, riam rtrpondeo pâl^ufá, nètó ò fêrOo Úq
Deos efperoií, porellà, bàftõu lançarlhè hurfiâ KéfeaM,
& ficou liure qual fe hunquatalcòuzá pádècerí. A'flj ácd-
dio à neceílidade , & nam deu lugar ao^ejò , qtíls áeçfáfã-
doft dejbrça hauja de fentir o mokftadò. 1 '^f ^í^ ^^^ "^'^ ^
- )? ^í;:iP«íro Irmão defeu Goliegiòandaúá túnj íiiíio câ'
pçíiíamenros de pedirão derpeníeiró Ihd àtnè álguftVa'
cpuzapera coníer 5 fem Tê atreúer a fafeí niífo ád Siípèriorj Conhece òâ
nem também ó derpenfeifofeacféuia áMIarlháí i feifí éi^demdc oucToTl!
fua por dizer ,qtle tudo íabia pót rríáís' OccúFfÒ , qtie fe ò-
braííe : Tado vio lofeph , & màtí cohcòf CótiV fdiféáo
defpeníeiro, diíTelhe, day a fularib dé éoméir, qiífe d íiá'
mifter , & ficou aneceíiltaddíòiédrildtíy ;, 6èoÓ defpénfei- a ^íí-^io^^:
roíemcícrupuld.orn3l.0 3ílíí^k^-í>hn!>£íivíoi> í^sjúiLd ui.i.
■T^ :'.
Tmh2tõbr^àoóuttòM\éMdeèm'éêiíi^^^
9ueíÒDeos,& íeuAnjorpodiâiár í^te^ íofóphfRíf^fôáíí^íF^-
aíÇv&da melhia
negalla , & ficou compun
mànrfà ,i^eêêlíeàfizeTá^ hâjT^^pbíéíiH^^^^
1 Gompunaidô! Lidaúâ hunf Sacerdote co
i jig^Pw. ^./i^í
outros penfa mentos'; (" detítaí|í féf efcrupúlòTós ) íôlfé á'
?.orIiirra S iij
igíílíi siiiid -
Mi, VlDAI?Q;,PvI-0iEP:H.2SNX«yB-E'k,
deér MiíTa , nam tendes que temer .■ Inftou o Sacerdote
que tinha matéria que neçeintauadeabfol«içam:.Aqaí
lhe diffe em efpeqial a.4uaià^.dcfua çonciêciaafli co mo nal-
maa concebia , affirmahdólhc queriam ouuera nella pec-
cado fcnam merecimento 5 tanto mais ,fieòu admirado o
bacerdote , quanto mais certo eftaua , fer impoffiael , po-
der conhecer a efpecie de culpa, ou merecimeíito , fem
''íi:'líPâ"''°P°'' Deos ,& foydizer MiíTa.
;^:,,4, Tinha o Colkgio de S. Vicente huiri mancebo
,deuoto,queallirecriaua ao bafo dos Padres, & muitas ve-
zcs fcrii.a de companheiroao P. lofeph em feus caminhos,
& miffoens; por nome loam Soares ; *fte tal che<*òui3or'
certa Gccafiam a hdar com fortes penfamentos de virigatt^^
ça,& caminhando jaa por emexecuçamo eíFeitò delia,-
encontrou a lofeph , quccomo felera fcusintentos nató
Iftedifle .; Filho meu que intentos fam eflês/nam cotóittt
tazer eíte caminho : Tornai a voltar pêra dõridevieftes* Sé'
mudai parecer fôbpena de diuino caftigd.Que diria o po-
bre raop yendofe defcuberto,& de quétinha tãto rerpeicò?-
nam deu maispaffo adiante, nem feus intentos tiueráih--
ma,s lugar ;& deu teftemunho depois que foram muitas as
rezes, que foy fabedor o Padre lofeph de penfamentoií
íeus occultqs , & o aui-fara do que deuia de fazer: era not<>^
na efta virtude de feu Superiora todos os fubditos ; naS"
oufaua algum delles commeterfalca , quedeueífefer èfti^a.
nhada; poftoqueellenamfeaproueitauadefta feiencia, fáà
nam em çafos neceífarios. ; -sb .arflsT)". .oTijinsqisb
Profecia g>u ^-5 ■ H^ galante o paffb que lhe aconteceo com ó -K-"-
mao Balthezar de Miranda. V ialhe o feruo de Deos o intc-
■:.ííii
Trcc. R.dr.f "°'''ConI»ecia fuás perturbaçoens , & que não hauía de per-
ieuerarpoi; caufa delias na Religiam ; todas as vezes cfuc"c»>
í'/
.\S.'
encontraua.olhana pêra elle com reflecção, & lhe dezia eftas -
palauras Balthezar de Miranda ? Miranda? eram pancl^-i
dasquedauamnaquelle coraçam. & Balthezar nara ignd;^
rauaimasdauafepornameníendido,;pellos mefmosca '
1'jSli
minhos
LlV ROÍMCaPI tVLO li. I43
hiinhos andaua fem emenda : ôc pellos mefmos foy derpedi-
do paliado pouco teropo.
6 Cotnrcmelliatite rrtarauilhâ acodioa outro Irmão ^^^"^l;^'*^-^^
ouetinhacuidadodehumaroíTa.Eftaua efta emhuma Uban^eihtmcv.i
* o - nrv-p a L' ccorolír ou-
cercada de mar , oc o Irmão nellalolitarialemcortipannei-troirrraó,&
ro , que oaliuiafle : Começou a einrar em f^nÇâ^cmoslf^^l^^^^]
triftes, que lhe cobriam a alma com tal exceíío , que ar-
rebentaua de malenconia , hauia ja cresdias , nam tê-'p«<:.D./.J7.
docomquem communicar a cauza. Eis que a desnoras,^ 7-,^/^, ^^^
vé , que vem paíTeando o campo o Padre lofeph também ^^^^"^•'•^•M
sò , acompanhado fomente de feu bordam , que vinha
pêra elle,' qual o enfermo de dores graues, que paíTa as noi-
tes em fentimentos , virandofe de hum , & outro lado fem
refrigério , em vendoafácc do dia alegre, &: fereno, co-
bra aliuio , ôc efperança de melhoria .• Tal ficovio Irmãd
àvifta dapréfénça de lofeph j entrou em eíperanças , ôc
abraçando-o , lhe diííe d Padre alegremente: Por vos, por
vos lomente venho. Bailaram fò eftas palauras , defcobrio-
Iheas couzas de feu mal , & penfamentosdefeu coraçam 5
ôc o Meftre prudente com rezoehs acertadas o cõnfolou,
& deixou quieto na roíla^qualfenunquapaííaram porfuâ
alma tais turbaçoens. Porém aqui entra outro portento
que nem a vinda, nem à tornada ,vió o Irmão , emqUé
podeíTe paliara Ilha, nem embarcaram, nêremeiros 3 por-
que fomente elle entrara , ôc roda a praia eftaua folitaria,
bc lofeph defâparecido de lua vifiâ fem ver em que ? ou
como tinha vindo ?namheo mòrefpanto, que quem faz
o mais faz o menos. O mefmo Anjoquereueíoua eftefer-
uo do Senhor os penfamentos daquelle afíligido , o podia
também paíTar fem barca ; cònlo pode tomar á Philípe , do
meio do caminho , & poUoem Azoto. AíTi que neíta sò
vemos juntas duasmarauilhas, humaqueconheccoos pen-
famentos do Irmaõ .• outra quepaííou a tile fem barca.
7 NaCazadeS. Paulo O anno de 1576.0 Padre
Adaoii Gonçalues homem vêlho i ôc Superior que entam
i4f Vida DO P. Ioseph ANcriíETA.
çatnT^rte cfa ^tcuea íeguinte vizam. Eílanddhuiii dia oÀnúó^cm
humavaranda"'os olhos em o Ceo, ao Tb^-pér d7alu^^^^^
vio que junto as riuuêshia voando hum domo efquadráo
de 1 ú Icmaó
d» Compa-
nhia.
^ ^e gente Jupofto que cllcnam ficou certo rree7am^^^
pos, ou íe eram fombras : Ouuio contudo huma-voz /que
dizias pav , pay , rogai a Deos por niim/que eu fòu^ pa*^
receolhe ao velho, que ouuia a vozdehum filho, qíie ti-
nha , também da Companhia, auidonomundode Icpiti-
mo matrimo nio , & eftudaua entam no Colleaio da Bahia
chamado Bertholameu GonçaIues3paírado o te^^mpo daora-
çam, eis que aparece o Padre loíeph, que tinha vindo de
S. Vicente, diftante quinze Icgoas , ( ôc o Ceo parece
trouxera nefta occafíam pêra íocegar o animo do pay na
fofpeita da morte do filho, ôccalandoo velho a vizam que
tiuera , perguntoulhe , porque íabia a fantídade de
lofeph: Padre vaj por ventura bem a Bertholameu
meu filho ^ lofeph por diuertir feu cuidado , reípondeo
fomente. Nam tendes rezam de eftar cu idadofo , & muda-
do pratica o diuertio prudentemente daquelle penfamcn ■
to. Porém o certo era , que lofeph teue alh reuelacam da
• morte do filho .- Porque paílado hum anno depo'"^^ >
achandofe ambos no Collegiodo Rio , entrou huma nao
& trouxe nouas certas da morte de Benholameu:& pe-
dindo o Padre Adama Jofeph^quediíTeííeMiíTaspor elle ,
entam lhe deu a entender, que quando eftiueram em s'
Paulo , & tiuera aquella vifam , foubera logo de fua mor-
te : Dizendolhe aífi. Eu ja tenho applicado o fanto facrifí-
cio da Miífa finco vezes por Bertholameu ,& nam tem
neceíTidade de mais. Se nam tem neceííídade de mais, claro
eftà , queteue reuelaçam do cílado daquella alma. ôí fe
IhasdiíTe antes de vir nauio, claro eftà que teue reuelacio
da morte. '
8
Prcuèqus ha « Hum anno antes de fer Prouincial, diíTe pormo-
de .rP.ouin- do dcgraçaa hCis amigos eftando ao fogo em S. Paul.
lo
deito em ora olhai vos outros , que dizem as velhas que hei de fer
Prouin-
^b-M
L I V R O I II. C APITVLOlI. I45
Pfoulncíâl , Vede qtjecòftaseftasminbàspera tal pczo:Di- ^^«ordaBa"^
zem mais, que Ih i de í cr Keiror da Bahia, vira pacence, "í5,.riiii
porem cu o nam hei de fer. Notaram ás paiauras os qúe
íabiam , que nam falàua a cazo £ ÍUccedeo tudo aííij
<quc veio eleito por Reitor da J^ahiâ , Ôc iiarn feruiGO oí-
ficio, ôc depois por Próuincial , offició que feruio : âc
bem entenderam os iloílbs , queouuiram feu dito, que ve-
lhas ey-ani as que prophetizaram ^ &: eram itjodos eftcsi
tom que dcsFarcaua ícus doeris. ^no cSovcn i ?,ob 2£;-
i^cn êOov £ iifiDâb cíI 3fíí o'
CAPÍTVLOIll. p^-
.Maramlhíti fora de cafa ^RémíàçòèTèí^ Vip^h
# Pf^ofedutS'.
A R E CE queàndíaua Deos de continuo em , ;
f-i,riii • - í^rofecia às
compannia deloteph, ihe mouià o coração, humfijhopé
;<Scabriaa boca. pêra oqúe hauia de dizer, "^"'^'i'v
,& fazer. Defpediarc na Villâ de Santos ^tti^rocef
outra parce de huma Matrona deuoca da Companhia , pc-
diolhe cila que foííe feruido leuarlhe em fua embarcáçani
humas conleruás pêra huin filho feu, qUe feftudauário lu-
gar pêra onde partia : Refpondeolhe lofeph , vòííá mercê
nãolecanfeem mandai-eííemimoá feu filho porque a me-
nhamohâde ter configo: Cuidou a Matrona qtie erarh ef-
cufas 5 tornou a pedir apertadamente. Éntanh lhe diíTc
eftas palauras 5 enfim Oliueira , ( que áffi fe chamaua o fi-
lho ) hâ de acrec>:ntar noíía matalotagehi. F07 áffi , que
nodia fcguinte chegou Oliueira, & amay admirada, dd
que paíTara , oífcrcceo as nleímas conferuâs pêra rriatalo-
tagcm de lofeph , fegundo elle tinha dito
i Entrou emcaza de hum Cidadam clomefmd íii-
gar por nome Manoel de Ohueira Gago , a vifitár huma
''1
;jn|
ir
te dos pais.
Trecíf.
Pree
.14.6 V í D A D O P.. I OS 1 pH A H'C ti I ET À i
pri^ecia dâ gj^a fua doentc ::Achou o pay , & may chorandoa poif dcf-
fiihlfôfmTt confiada da vida :Iofeph lhes diíTequenam cborâíTem ,
porque a moça hauia de viuer,& cafar: Porém que tiles trã-
taííemde ft-a alma/, porque hauião ambos de morrer antes
delIa,poíto que tam enferma:ôcqueamorte do payriam-ta^-;
43ria hum anno acabado. ^iTudo vio, òc fcntio a cáfa. "^
5 Queixauafe Aires Fernandes de hum pelourb
^^"cfrTa^ã de mofqúete , que trazia metido em humaperna , defdeás
hum pelouro, crucrras dos Tamoyos, onde militara.O fanto Padre Ihediílb
affi. Eííe pelouro lhe ha de cair a voíTa mercê , quando al-
guma horaeíliuer nalagea dabarra do Riodelaneiro ; de^
pois de muitos annos , quando menos tal coufa cuidaua,
fuccedeo hir paííahdo àquellà praia em huma canoa , coni
tam grandes cndas, quehnma delias , o fez darfobrca
lagea prophetiizada, tam furiofamente , que oppriinida a
perna leza , lançou de íi opilpurò nociuo. Entam fe lem-
brou , do que lofeph lhe tinha dito, computando o lugar,
ôc occaíiam •• :j5i tcue dous contentamentos , da faude- dâ
perna^i & cumprimento da prophecia.
4 , Na Viila de Santos fe hia fabricando hum forte,'
.MòTàcCoíC deuiade íer com vagares ) paííaoa hum dia lofeph , &
fados a Sacos 3J^jJ^Q^ 3 que ff ^balliaííem , porque logo veriam alli In-
grezes Coííarios a roubar fe podeííem a terra : Nenhuns
receios tinham de tal couzaaquelles moradores, nem fun-
damento diíTos porém notaram o dito do Padre , queti-r
nham por Santo 3 & viram oefFcito contra fua vontade 5
porque os Coííarios vieram, faltaram em terra , pretende*
ram fenhoreala , & pofto que venceram os da Villa ,não
foy fem perda de parte aparre.
5 Em S. Vicente achou lofeph fentido certo homerrt
TumrLtdeP^^ (nome Toam Bautiíla Malio ) feitor de hum engenha
vioi>o,qiie chamado dos Erafmos , quefam mercadores Flamengos;'
que no Brafil tinham tratogroíToj & era ofcnrimcnto do
^^^^. feitor ,( que também deuia de fer do norte J deque hauia
ja hum anno, que namvieranauio daquellas partes, que :
troU"
Profetiza a
Prvé.
r
L IV R ol 1 1.C AP. ÍII. "".; 147
tròuxeílehiim pouco de vinho &: bilrando éí^e; era o mef-
nio que fakarlhe ávida. Defabaíaiiâ commutiicíirido fua
defgraca ,& ja podefcrqueerperalíe, queconío fizera nii«
lacre no azeite o faria também no vinho. Ouuio lofeph
as queixasxonlolouo dizendo, ora Irmaõrrieii aihdánam hé
pafladoodia de S. Francifcoi^era o dia em que eftauám.)
íoy tám grande a fé dó Flamengo que logo créò que tinha
o vinho conrigo,& foyaííi,quenomermodiade S Frân-
cifco , entrou no porto huma nao carregada dá dezejada
droga, encarregada a elle mefmo E bem fe ve qual fica-
ria , com duas alfgriasj huma do vinho , outra da próphé-
cia^
reuc«
me-
í Tinhd partido de S. Vicefite gente de guerraíieuc'íçam
contra o gentio Tamojo a certo lugar do fertam 5 6c an-jj^j."' "
tesde hauernoua alguma do fucceílo delia , d\([c loícph
m Villa de Santos. Nefi.ã hora reridbraíH os noíToá à A\'^'"^'^-f"^p^,
deados inimigos , fem que ri-jorreííe homcili algtirh dcjy &^ujs
noíla parte: ôc acreeenròu que no dià feguintcteriam nouas"'^''"''
certas do que dezia. Velo o diá fec^uinte & com elle árela-
çam do caio, como lofeph ô tinha ditb.
7 Em tempo do Capifarh Híeronimo Léitam partiooucri
miiorforça de gente afazer outra cjuerraá mefmà naçacV*^"^^^
do gentio , mas a parte mais longe : Auia jà dous mezes,
& namhauianouasdellâ ,corn efpànto do pouo. FYé^yzn-^oír.f. 19?,.
do Tofephna Villa de Santos , parou ha prcgaçám por ef- í^ fX"j!"'^ •
paço de tempo, cobrindo o roftro com a mão , &c logo
cornando emfi , diííe. Rezeriios hum Padre noíTò , èc hu-
ma Aue Maria pella viéloria , que agora alcançaram os
noíTos , de feus inimigos Tamoyosi Vieraiii dá guerra os
Toldados , ôc certifica raín que fora alcançada a vistoria
nomeímo tempo , em quepedioò Padre noíTo , 5c Auc
Maria. ^'*" "'^^
8 Na mefma Capitania dé S. Viceiite , èítando hú
dia pêra dizer Miíía em certa Igreja ja como amito , &
alua , diíTelhe o ajudante delía,que hurh índio' doente que-
'> Tij íià
14S Vidado P. losEpH Anchieta,
ria confcíTarfecom elle , tirou o amito , & alua , confeC-
fou o enfermo , ôc tornou àMiíTa 5 & nella teuereuela-
çam , queem quanto a diíTe, paíTaradefte vida ;& diíTe lo-
go allí ao ajudante Pedro Fernandes, (que aíli fe cha*
maugjja o enfermo paíTou defta vida , rogai a Deos por
elle. ^
R ueLç.ode 9 A primeira vez quc cl-Rey D. Scbaftiam dc glo-
''/deit"" '^^^^ memoria, paíToua Africa , foubefe em S. Vicente
D. sebaftiampor rcucíaçam do Padre lofeph , que odiíTe a vários • &
e.-n Africa* Jf»„_' J J" i ^ . '
aepois do dito , a hum mez entrou nauio , que trouxe a
AWr. /. ioz. certeza , do que antes pareceoincriuel.
IO Na Villa de Santos , eftaua apalaurada perai
cazarcom lofeph Adorno, Felipa da Mota , moça donzel -
las desfez feo cafamento , ( nam fei porque occafiam)
Reueiaçaõ do com grande fentimentodos pais, ouue lofeph deir confo-
híirr^a^^^^^^^^ ' ^ ^^^^^Ihes , nam fe defconfolem voísas mercês ^
por fua filha nam cafar com fulano , porque nam era fua,
proc.sf. s.feu marido ha de vir de Liíhoa, & acapaque trouxer fo-
^^jm.i?./.|^j.ç OS hombros ha dcfer fua ( querendo dizer que
eftaua efte outro indiuidado , ) Sc acrecentou , &ha de
ter tantos filhos , que nam fabera quais fam as camizas
dehuns, & outros. Tudo fe vio com efpanxo dos que
notaram a profecia.
^^^^^^ _ g it Na mefma Villa andaua hum homem com pcn-
famertos^r^^osmaos de matar fua mefma molher , porfofpeitas queti-
^hZluL^^^ ' traçaua mododepollo emexecuçamaprefsada jen-
rauihei. controufe o feruo de Deos com elie , & lhe afeou os pen-
famentos , manifeílandolhos , aíli da mefma maneira com
iroc. D.f. 4. qu^ os fabricara coníigo fo ; & acrecentando que íua mo-
lher lhe nam deuia nada. Ficou admirado o homem, lan-
çoufe a feuspés , foy pêra cafa , & fe fez amigo com a
molher. Tam refpeitadaera a fantidade de lofeph : & era
pubhca voz , & fama, que conhecia os coraçoens dos ho-
mens,
.:ffr(J "^^"^^ ^"^^^ ^^^ dos campos , pafsou por caza
si 1 de
liií
M
Li V RotlíC APi TÍVLbTlt. Í49
de hurti Brás Gonçalues morador cm Iberapuera, ae quem
fabia andauam fogidos huns efcrauos , & ncccíTiiãua dá- áclnâTcC'^
crauos.
les por extremo , disfdhe, Bras Gonçalues andai comigo,'
qucimporta alfi : ôcnaíii vos haueisde arrepender; duui- ^^^^j^. >.
daua o homem, por nam entender o pêra que 5 cornoulhec; •^'^'^7^''?
a dizer que importaua aííi : Embarcaramfe cm huma ca^
noa rio abaixo , ôc remando até o por do foi , queria
Brás Gonçaluez parar em certo poftoiporém lofeph lhe dif-
fc, auante , auante, nam he efte o poílo que conuem : ôc
replicando , quC hia pondofe ofol, Ihediíle com emfazij
ora remay,remay> que eu vos darei foi , & mais vos im-
porta avosquca mim: & nam foy debaldejdousprodigios
vio aqui Brás Gôçalues , primeiro, porque remando, nam fal»
tqufoi , cm quanto chegaram âo fegundo pofto , òc era
tafwdiílantejque por via natural > nam podia dar luz.
Segu^ido , que toniando terra lhe diíse , ide âquella chou-
pana , que vedes, & dizei avoísaefcraua , que vos pre-
para fogo : ôc-et^â efta hum dos efcrauos, que Ide an-
dauam fogidos. Aqui ficou entam defenganado do que
priíjneiro mal entendia , & que eíla era a efficacia com
que o chamara, com que o mandaua remar , & lhe dizia
mais vos importa avo^jqueâínim.Eflefucceíío que acho ju-
f^doem varias parte^dos proceíTorjque contem cafo maior
que he o do foi, & fo fabemoá , que paraíTe efíe a voz dc^'^^^^°' ^-'^
lafué : A vozdeloíeph , Vemos aqui que continua á luz jí \^^«íà
o modo como, fabeo Senhor, a cuja potencia nada he .Í
impoiti
: 13
11
4^.
■g;
Èftauâ a tilórté í nnòceilciá í3oria MâfròWi da . .
Villa de Santos ,& molher de lacome Lopes , chorauamnamhtdc
jaô^rido , firybQs,:& parentes a eiiferína eoUio defunta ,Z%'mt7"àã
ôc xkfconfiâíla idos medicoí. Entroihâ vi fitai la lofeph , ôicona»da-
djn"e a todos , com palauras de fé & certeza ; nin^iiem fe
agafte , porque nam hademorfera enferma. Cterãíi-í to-
dos, & ficaram alegres, corno fe- Viram hum Anjo de
D^os^^ iSc correfpondeo â fé o eíFlito. jjí-^^í^.
oh
Tiij Ck?i
150 Vidado P.I o sep h An chie ta;
Profetiza a
m '-rte de hiís
que hiam a
roubar ludios
Vroci
!;• 'm\
CAPITVLOIV.
Cmtinuauam a$ marauilhat de fofa âe catai
reuelaçoens ,à' profecias
Regando na Villa de Santos , dlíTc da
púlpito aos do Goucrno , & Pouo, eu fou
caõ dacaza do Senhor , nam hei de deixaf
de ladrar 5 digo- vos da parte de Dcos , qud
nam deixeis fairdefte porto huns dous nauios,quecílamde
vergas dalto , pêra fazer viagem aos Patos , índios que e-
ílamde paz comnofco , ôc fam amigos noíTos, a catiua-
los com fuás coílumadas , & in juftas traças 5 alias ham de
ver os que forem, a ira do Ceo fobrc fi , & ham de morrer
miferauelmentc. Moílrou aíIiofucceíTo , porque elles par^?
tiram , & de ambos os dous nauios efcaparam fomente
dous homens , que trouxeram a nouatriíle ao pouo, ôcfo-
ramlançarfeaos pés de lofeph , confeííándo fuadeíobedie-^
cia , prometendo emenda»
2 Préuioa morte de Frutuofo da Cofta morador
em S. Paulo , & mandouihe dizer de fua parte, que nam
Preuéamor partiífe da Villa pêra Santos, como pretendia fazer, por-
dous ho^^e oauiam de matar. Deíprefouo auifo.foy morto com
crueldade, ôc com bem laftima de lofeph 5 ôc atribuiofe
a caftigo de nam dar credito a feus ditos. Auifou outro cha-
mado Balthezar Fernandes , queandauaem mao eftado,
com molhercafada, dizendo que oauiam de matar 5 refpõ-
deoohomem obílinadoeftaspalauras, morra gato, mor-'
ra farto.Poisaparelhaiuos,lhe diíTc, que daqui a finco dias
aueis de morrer, & fuccedeo aífi.
3 Prcgaua a fefta de NoíTa Senhora da Gonceiça5,nab
fua Igreja deltanhaécm prefençade grande concurfoi quã^^
te de
tnons
Troe.
í. i. \ :.y
LivroIIí-.Càp IV. V 151
do deYepentc foy vifto cncoaarfe ao púlpito, como. à^^- ^^'^!l^*^^^
ispiaiado com al<^uiii ac^identcj pertjurboufeopOuOi &ç de- d. Virgem da
zeiando íabera cauía r' tornou lofeph à contjnuar, & diííe. "''^''^''"'•
Quereis (aber as mercês da Virgem, poià inda agora />,,-. i?./. 24
veio de fora de acudir a huma deuota fua-v que. tuiha^^ ■^^•
chamado por ella . 6c por final Vereis que trás os veftrd os
molhados de orualho. Fizeramlogo experiência i-iSc; acha-
ram o manto , & faia molhados , como quem andara ca-
minhos patentes ao ar. He caufa digna de ponderar eftafá-
cihdade delofeph.ouhequcaforça de erpirituo obrigou
adeclarar a mercê fecreta da vizam : ou que julgou , que
era neceííària pêra intimara deuaí^am daVir.gcm, que
com palauras nani podia. ' r • • •< .
4 Muitos annos hauia^ que viuia como cafado nà
pouoaçam de Santos hurh honlem^ por tal corria em tò^ ,
da aterra , paíuua ja de quarenta anrios , fem qije peífoaJ^-j^í^^J^Í^J*
aleuma tiueííe fofpeitáde encano alí^um. Porém lofeph ti- h^ homem
nha certeza fobrenatural, que era calado em parte mui
diftanre j Òc era viuaa molher primeira. Auifou-d de ca-
foram feo , pedindo que foííe fazer vida com ella, &Íar-
gaíl^ aoccaíiam do peccado grauiílimo em qu<^ yiuia tam
arrifcado.- obítáua fortemenre.o habito feito de quarenta
annos,o airjor da prefente molher, & por vencuí-a os filhos ^
& fazenda. Masque remédio dezia lofeph ja vos mcfmd
vos haueis de negar perafaíuar voíTáalnla,, Chegou a amo-
eftalo em publico , té quepòrriíedo , ou vontade biifcod
remédio, deixou cafa, molher , filhos, & fazenda , ôcpar-
tio onde lofeph mandaua. Reconheceram todos à noticia
docàfo porreuelaçami &: a execliçam por milagre.
5 Nam menos notauel foiocazode outro » Câ-Cifo acjmi^.
ftelhanodenaçam.na Viíla da Coríceieam de ítanhae^^;"^^',^^^^^^^^
hauia três dias , que eílauaem paíTamento fem poder ef ihercs «fado
pirar. Correo a noua, chegou a lofeph, que eoíam áííiftiap^^^ ^
em Santos, ôc nam fofreram aquellas entranhas de cha-
ridade perderfe efta alma. Refolueofequeerampeccadosa
Caúí-
vezts.
'Proc. R f, Ã
'1i||l
Vroe.B^f.t^
i!
152 Vida DO P. losEPH Anchieta.
caufa, porque hauia trinta, & finco annos eftaua fingidíà-
mentecafado na terra com filhos , ôc netos ^ fendo aífi que
tinha molhcr nos Reinos deCaftella ,Ôcnam fe tinha c5-
feíTado de tal peccado. Poz-fea caminho dez leoroâsdedi*
ftancia, chegou ao enfermo agonifante , & declarou-
lhe a mercê grande que Deos tinha vfado com fua aímá >
que podendo juftiífimamenre lançalo no inferno , por pec-
cado tam graue , teue com.paixam delle , 3c o mandaúa
aili , pêra que arrependido, Ôc confeíTado foíTe abfohòjÔc
perdoado, tornou o peccador febre íi > reconheceoo be-
neficio , ôc confeíTado com lagrimas de dor , efpirou lo-
go, comofe por outra couza nenhuma eftiueííeté entam
efperando.Ê voltou íofeph afeu CoUegiocom nam menor
confolaçam dalma.
6 Notório foy o cafo de Francifco Corrêa 5 era eftç
traffeârcu"^ companheiro de Domingos Luis Grou , os quais com
de hum , & moíhercs ,Ôc famílias trouxera do fertam íofeph comper-
™c'*^'^'^' damdefeus crimes. Eftaua o dito Francifco Corrêa perá
partjr do porto de Santos em hum nauio , pedio hcençã
^roc.Rf. 35 a íorge Ferreira, que entam era Capitam da terra 5 ôcfo-
bre lha negar tiuerampalauraspeíadas , das quais refultou
que hu filho do Capitão Gregório Ferreira o matou ás fre-
chadas : Foy cazo fortuito, & encontinéte hum fobrinho do
matador feacolheo com toda a preíía pêra dahi a quatro k-
goas , onde entam eftaua íofeph , o qual em o vendo , Ôc
femque tiueíTe outra noticia;dilTe,bafta que he morto Fran-
cifco Corrêa /"refpondeo que fim ; tornou íofeph , nam o
matou aellevofsotio,mâtarãnofeus peccados. Duascoufas
fe tiuerão aqui por profecias , hiãafoy da noticia da morte,
^ porque conftou.que ningué viera diantcao fobrinho ao ma-
tador : Segundada noticia do peccado do morto, porque g5-
ftou , que em o nauio em que eftaua pcra partir , ôc febre
que fora a contenda , tinha metido molher , ôc filhes , 6c
determinauametertãbemamolher,ôc filhos do amigo Do-
mingos Luis Grou , ôc irfe fegunda vez ao fertam aentfc-
galas
via eftândo
Li VRO III. Capi-çvIí o IV, i$5
galas aos índios , a troco das mancebas que por Ia deixara.
7 Partio lofeph de Santos pêra o Rio, diíTe MiíTa 2'fíiTJ"
noportodeBerioga, & fez que todos foíTcm ouuila : nao R'odc i^nci.
* , I , 1 r I to dentro de 11
contentaua a alguns tanta detença, porem loleph toman- hor.spatiia-
do namaõ hum relosio , lhes moftrou que eram dez ho- j°'^° r/''*
o ' ^. de Pentioga
ras do dia , ôcamrmou , que quando foflem outras tantas & «utr» vez
da noite , hauiam de eftar dentro do porto do Rio de lâ- ^^^ "^^"°''^°
neiro, aíTimluccedeo/endoqueba de diflancia mais de qua-
renta ieeoas, & coftuma afer viagem de algrunsdias.Eftaua Prcc.jt.f.iíi
outra vez embarcado nomefmo porto pêra fazer viagem
ao Rio 5 eram ventos contrários , harti oufauadar à vellá
o Piloto Pediolhe lofeph que partiíTe , refpondeo , que erá
vefpora de Naral , & nam queria ter no mar a feftâ. Entaõ
lhe diíTe que foliem ertibora , porque lhe aíleguraila, que
nam teriam a fefta no mar: Foy marauilha graFtde, que
fendo andadas algumas horas da Vefpora do dia de Natal
quando partiram , chegaraai a dizer a MiíTa do Galo , deá-
tro da barra do Rio de Janeiro ; Com duas marauilhafíhiáâ
do tempo que de repente fe mudou fauorauel , outra dá
brcuidadecom que andaram caminho tam comprido-
8 Eftaua António deSáaucdra de partida de San-
tos pêra o Paraogoay , era deuoto de lofeph, querendo ácC-
pediríe,lhe difse o Padre, Afirorijode Saauedra peçouos
muito , que nam vades nefsenauio, que fe ha de perder; an-
tes vos digo, que vos aquieteis , & tomeis eílado ha ' ''^
terra. Refpondeo Saauedra que fim , mas que o caiar hauiá
defer com huma fílha de lorge Moreira : aíTi fera, lhe
tornou lofeph , porque haueis de cafar com Btatns Gon-
çalues, 5c morta ella haueis de cafár corri a filha èt Jorge
Moreira, nam amais velha » mas amais inoçá. AíTi foce-
deo tudo ' cafou com Beatris Gohçalues ; dentro em noue
mezes morreo efta,&: cafou entarri com a filha de lorgé
Moreira mais moça , pcrqueera cafadaa mais velha j &
o nauioemque eftaua pêra partir ^ veio noua depois quô
era perdido. Tudo foy publico, |<iudo traças de lofeph.
V Cori-
^i
•!i
íf4 VíDADO P. IoííepH Anchieta,
fe°ud»"ocai. ^ Confeírauafe hum homem com elle , com pentó
to. mento de encobrir certo peccado : Porém loíeph que co*
*proc. nodr.f. «hecia ós perifámenrospera bem dasalmasVlhe eílranhou à
Hs^. intençâm,dGfcobrindblheâíbrte de peccado^ que derer-
minaua calar. Ficou 'pafmado o penitente j coníeíTou fuá
culpa ^ ôc todos feuspcccados, com lagrimas, & arrepe-^
dimenro5 & partioconfolado.
pfofícis di ío Fazialhe grandes queixas Aluaro Neto morador
reamocâ.^"^^ Villa dc S. Paulo , que tinha huma filha ja de quinze
annos, Ôc nam tinha remédio pêra cafalla. Refpondeolhe
i»m./.a45. íofeph; nam vos de pena , nam vos de pena AluaroNe-
to , que voíTa filha ja eftà cafada , & nam ha miílef do-
te. Ficou duuidofo ^ mas logo entendeo o porque ? porque
a moça cahio em cama, & dentro cm breuesdiasdeua al-
ma à Deos 5 & eíleerao efpozo que tinha, & porque naõ
hauia miíler dote. Quem fe nam efpantara dos modos
defufados com que Deos Te entendia com lofeph , & elle'
com os homens ? maiores fam com tudo os que eftampor
ver.
II DeterminauapaíTaf da ViUa de Santos fecrefamê-
te pêra o porto dos Índios chamado dos Patos , Manoel
í]hlTnmt^^^^^^^^^ Efpinha; Eraa miííammuiarrircadaem conciê-
raéte nouucicia , & injufta , porque hiam tirar de fua liberdade, Ôc
de Mino ;1 n t^
VdofodeEf-Com extorçoens , genreque eltaua em paz comos Por-
pinha. tuguefes, & boa amífade. E por efta rezam nam oufaua
defpedirfe de lofeph , lendo amigo particular: Porém nam
fe encobrio efteintentofeuaoque lidaua em perpetuo zela
das almas. Bufcou-o , ôc diírelhe,fenhorami^onam conué
fazer a viagem, queandais traçando, porque nam ha de
ter bom fucccííb. Muito fentio Manoel Velofo o fer ácí-
cuberco feu penfamento ao Padre, mas como eílaua em-
penhado j éc pode mais o intereíTe do ganho , que a amea^
ca do perigo , refolueofe a partir as efcondidas ; Porém
fentio em breue fua contumácia, porque a poucas legoas
acommeteo hum fono ex*
Troe. B'f.A
da viagem , na hora do dia o
traor*
Li V R oIHC Api TYLo I V* 155
traordinario , ôc como entirefonhanclo tcue hllma ViTam
ttmerofa, de efpiritus infernais, que arremetiam a clle,
& pretendiam leualo a tormentos terriucisde fogo que al-
lí fc lhe moftraram, com tartta força qué efpertou gritan-
do j dizendo que logo,logo, o lançaííem em terra, poir-
que Deos lhe moílraua que hia caminho do Inferno,
éc era liure por meio de lofeph, com própoíico de deíiftir
da injufta Viagem. Faziafe difficulrofo áós que hiarri , auer
de desfazer feu caminho , & tornar à terra j mas eÍ!e que e-
ílaua entrado do horror da vifam, proteílóu que viíTem 6
que faziam , ôc fe contudo fe refoluiam a profeguiir , que
clle lhes daua tudo qiianto tinha metido no barco liberal-
mente, &í6 porque lançaíTèm em cerra fua peíToá : Áííi o
fizeram leuados do intereííe, aquellesmal aconfelhados
mareantes , & com o mefmo profegiiiram viagem , em
trifte hora , porque nem dellcs , nem da embareaçam
cm que hiam , ouue mais noticia alguma , até o dia de
hoje , hauendo todos aquelles pouos por couza certa fer
caftigó, que o Geo lhe dera, por fiiâ incredulidade, à viftà
da reíoluçam de íofeph , que tinham por Santo, do fuc-
cefTo de Manoel Velofo , & do diélame de fuás cohcien-
cias, contra o qual acommeciam intentos iam injiiílos dó
caiiueiiroda gente liure , queriam tinham commetido ag-
grauos.
V
ij CÁi^
15^ Vida do P. I o s e p h Am g h i e t aí
.k^i^D capitvlov.
Biflorid celebre de Diogo índio refufcitado ^ é' dê
omYos dous índios ^^que liurou da morte , efian-
doprefoí em cordas pefaferem comidos.
Cifo celebre,
adminuei de
Diogo reíuíci
tido.
/. 177.
V 1 A nã Villa de Santos hum índio pornd-
me Diogo, de profíífam ChriftaÕ , conhe-
cido, ôc auido por tal , muitos annos 5 en-
fermou eíle , & chegou a pagar o tribute*:
commum da morte , cm cafa de hum homem nobre daque^i
!Pfflc./?./i/9la Villa, chamado Domingos Dias , aquém feruia. Dc-í1
^/""«'^"^•/•y poisdefeparadaa alma do corpo , amortalhado , coíído,^
Tatern.p.t^9&c poíto em tcrmos deíerleuaaoaíepultura ,quejacltaaa
^J'J^^'^^^'"^^ aberta. Eis quede improuifo foy vifto mouerfe , & dar
portHgaip^í, ílnais, que queria falar : chegoufe aelle afenhorade ca-
za Gracia Rodrigues , aver acaufa de tanto efpanto. E
ouuio a Voz de Diogo , pouco antes frio , & defunto,
que pedia o defemuolueííem , & defaraííemda mortalha:
foy defatado » & começou a falar ^ & diíTe clara , & intel-
ligiuelmenre. Vamme chamar o Padre lofeph pêra me
bautizar. Pareceo fabula o dito , ôc refpondeorclhe, que o
Padre eftaua em S. Vicente , diftante duas legoas 5 tor-
nou a dizer que o foíTem chamar , que tinha ja che-
cado a Santos 5 porque elle viera em fua companhia
atétalribeiro,quecorrejuntoà Villa,&quedairi o manda-
ra que vieíTe diante 2 entrarem feu corpo pêra o bautizar.
1 Deufe o recado da parte de Diogo rerufcitado ,
com os finais do que paíTaram no caminho. Chegou lofe-
ph a fua prefença , & a primeira coufa que diííe Diogo,
foy preguntarlhe , fe trafia configo o reliquario que lhe
moílrara no caminho ? diíTe lofeph que fim, tirou-o do
peito
L I V RO III' CX p. V. 157
feito onde a linha , òc fícou alegre o índio. Pediolhe
lofcph cntam , pêra gloria de Deos , que concaíTe na pre-
fença dos qlie alli cftauam , o mifterio de fuá rcfurrciçam:
cujo teftemunhoadmiraucl, Ôc fidedigno dehum refufci-
tado , que logo hauia de tornar a morrer , foy defta for-
te. Eu parei defta vida (diíTeelle ) 6c à primeira entrada
daouc ra , ouui hua voz que dizia quenam caminhaua ao
Ceopello caminho real, &direito,porqúenam hauia entira-
do na Igreja de Deos, pella j)orcacommum doBàutifmb,
( o que reuera páííou ) aífi porque quando vieram os Por-
íuguefes a minha terra be eníinarama fé, & deram por
nome Diogo, mas nani o Bautirmo,que eu por erro nunquá
cuidei , quefoííeneceííarib, & fò trataua de guardar oi
mandamentos , como os mais Chriftãos. E eíla foy á
cauza , que tiue pêra tòrhâr ao «corpo, & fo)? tanibem
ordem do ícnhor > que eiicontraíle ao Padre lofepti no ca-
minho pêra me bautizar ; á quem peço in íla temente, què
pellodito meio do Bautifmo nie receba na igreja db Deos
pcra fer recebido em â do Ceo. Dado eíte ttftemuhho áè '^i-^vou
fi , cathequifou o feiruo do Senhor a Diogo jâ not3troté-.v.,íf4\'^
po enfinado 3 Ôc feito conceito do neceílario naqucllà ho- ' '"'^"•
ra , lhe adminiftrou o fagrado Bautifmo , banhado eile , ""*
i5c rodos os prefentes em lagrimas : & áfíírmou que de-
ira por bem empregada fua vinda ao Brafil , & todos os
trabalhos dellá, nam mâisquepciíaoccaíiam dòcaropre-
fente. Efte milagre he hum dos mais raros , que fe leerrá
nas hiílorias3& hiimdos mais autênticos de todos os da
vida de lofepli. Jurámnio juridicamente muitas teftemu-
nhas fidedignas nos proceflbs tirados por orderíi do fum-
mo Pontifice , em ordem â canònizaçam ãcííc feruo dei
Deos : Homa dás teíiemunhas hea mefma fenhora de Dio^-
■ §0 j Gracia Rodrigues, & he calbcèlebre par, toda^quei-
Ja parte , & como tal o trás Faiem, no lm.\4.cap. 2, àt
fua vida. ^ ^ j hvD é í!':v'oi íb<)i
3 Baucizado Diogo, pedio licença pefa partira outra
-3 V ii| yidâ*
mta 00
iliiliil 1
if/b
Peuoto fim
da 1. morte
Cafo f-me
llunce de
Traj no-
158 Vidado P. 1 ôseph anchíeta,
vida , pedindo juntamente à fenhora da caza , que deíTè
dcftercfufei. feus pobtcs veftidos ahumneceífitado , & lhe fizeíTe dizer
^* °' duas MiíTas em honra , ôc culto de Deos , Ôc lhe meteíTe
namaõ huma candeadc cera benta ;ôc vírándore alofeph,
lhe pedio aííiftiíTe com elle , ate dar a alma ao Criador,
cumpriramfe todas fuás mandas , & todos poftos em ora-
ram acompanharam aquella almaditoza, que breuemê-
te dcfemparou o corpo , òc voou ao Ceo.
4 Effeito grande foy efte da omnipotência diui-
na , &c prcdeftinaçam daquella alma. Da alma de hum
Trajano efcreuem alguns , que tornou a vnirfe ao corpo
por femelhante difpenfaçam diuina , pêra fer bautizado,
como he creiuel, por meio de S. Gregório Magno , de-
pois de julgada , òc fentenciada ao Inferno : por meio
de lofeph tornou ao corpo a de noíTo Diogo rerufcitado
pêra Ter bautizado. Nam podemos affirmar , quefoíTecõ-
denada primeiro como a de Trajano :& a rezam he, por-
que poííiuel era , que morreíTeaquellaalma em graça , 6c
Dauidtfe fe amor de Deos , Tupoíla a ignorância inculpauel do Bautif-
j pri^^eica vez mo , òc a boa fé da lei de Chriílo , cm que viuia, que-
que morreo fendo a boudadc diuina premiar feus merecimentos , com
cu Dsim t '
a graça daquclle Sacramento , que fem culpa fua faltara.
E inclinome à efte fentido, porque huma alma naquellc
tranfe, coíluma dizer o que paíToupor ella fem pejo , ne
receio 5 & fe na morte fora condenado ao Inferno, parece
queouuerade confeííalo; & vemos que diííe fomente que
ouuiraquenamhia por caminho real,ôc direito ^ porque
namhauia entrado na Igreja de Deos pella porta com-
mum do Bautifmo.
5 Se contudo morreo em defgraça , & foy con-
denada eíla alma, aqui auulta maisa mifericordia de nof-
fo grande Deos , que foy feruido , comtam eftranhoca-
zo fufpender a execuçam da fentença , 6c ainda trocala
por meio de lofeph 3 qual de S Gregório , a de Trajano-,
:6c dà fundamento a iiílo aquelle encontro que com ellc
teue
parece qu
n»ru.
Parece que
fi.
t iV' KollI. C APITVLOV. 15^
tcuc eíla alma ? fer elle o que a mandou tornar ao corpo;
Ôc que o bautizou : Nam lia duuida que rodas cilas cou-
zasdam lugar a fe creer , que reue eíle fcruo de ,Dco$
rèuclaçahi da morte deíle índio , que vio o cílado em que
cftaua , ôcrocrou por elle ao Ceo , donde fahio com ram
bom defpacho . nem iílo fa^ difficuldade alguma ao en-
tendimento a vifta de tam grandes prodígios, como cada
dia obràuá. ^ ^ , ,.
6 Norauel foi também ú fucceffo , com que aco- o^úocCo
dioa liurar da morte outro índio , que eítaua )a cm rer-indioquc
reiropcra fer niorto , ôc comido j Tahio loíeph noCol-H-uáa^^
Iceiode S. Vicente à janella de feu cubículo , ôc falando do )npe,.iec
com hum familiar decaza, que alli íe criaua- em boa---'^-
doutrina, ^ cortumáua acompanhalo em algumas mif-
íbcns , diíle , Pafcoal Leite(eíle eraícu nomejáçrcueiucs^^^vf^é
afazerthé companhia efla noite até Noíía Senhora , da""'
Gonceiçama íaluar huma alma ? rcrpondeoquefini: Par-
tiram a noite,ôc camiilharam nclla a péoutoiou noue legoas
até hum rio, que diuide a Aldca : heílc acharam como
depropofito canoa, & apveftos pêra poder paíTar -chega-
dos a Aldeã viram os índios occupados iodos no aclomaiá
celebre de fefta, que profeííam os ritos de fua cega gen-
tilidade. E vinha a fer hUm alegre triympho , com que
leuauama matarem terreiro , outio Jndiocontrarjo, pre-
fioneirofeu , catiuo em guerra -, ôc pêra ferem alli cofi-
das , repartidas, Ck comidas de totílos fuás carnes , coni
às ceremonias de enfeites j eftrondos , gricarias , bater de
pé, Ôc arcos , com que cõílumam intimidar a gente , &
atroar os montei , em femelhantes feílas em que aíGíle
commummcnte Bacho.
7 Que firialofcphctijo intento era tirar das vnhas,&
dentes deftes lobos famintos, a prcía que queriam^comer/Moáoáetn^.
como fera ouuldo? que caio faram de hú pobre híimilde/^^;;^^^""
os que triumphauam íoberbosqa hia^ntrando em terreiro
aquelle arrogante mancebo que fora vencedor , & hauia ^
intrcpidlí
.;'ill^
i«o Vida DoP. lõsEPH DE A ^ChUeí" a;
de íer matador 5 todo empcnnado , vcftido mais de vam
gloria , que de pcnnas 5 ja circonftauam as fete velhas , qué
quais fete Arpias , com fogo , alguidares , panelas pêra
cofer , cortar , repartir , fegundo íeu ofíicio , o corpo
do trifte padecente. Que arte , que potencia humana
feria baftante , acontvaílar tam cruéis Arpias, tamdeshu-
manos lobos do comer, que tem entre as vnhasrôcdaquel-^
la que tem por maior honra de fuás geraçoens , matar^ôí
Defetianimocomer hum vencido feu, em terreiro ? fò aquelle que fa-
be dos timbres defta gentilidade , em femeJhantes ca- .
fos , pode entender a diffículdade deíla acçam. Namdef-,
maiou íofeph , no meio de tantos aííombros > prcue-,f
nido vinha de maiores auxilies , entra no terreiro, lan-^
ça os olhos , a huns , & a outros^ fala , conuencc , tira^js
de poder tam foberbo o pobre padecente , & traio coníi-ji
go,femque algumfelhe atreuaa impedirlho : O como,,-
nam foube dizer o companheiro , que tudo via, mas nam 1
conhecia a efficacia , que prouinha da graça, interior do
efpirito. Sò foubc paímar, & dar tcílcmunho , que liura-
ra a hum índio ja leuado em cordas a terreiro ^ pêra fer,
morto , & comido. Eípantou o cafo a todos os Religiofos,
&feculares; inquiriram por onde tiucra noticia do peri-
go P como andara de noite tam grande eípaço de cami-
nho ? como deixaram os inrereííados dcfamarraro ín-
dio , huralo , &. trazello ? de nada acharam caufas hu-
manas, tudo atribuiram âsdiuinas; & confia tudo do ju-
ramento de varias tcftemunhas dosproceflos dacanonifa-
çam deftc feruo de Deos.
8 Nam he deííemelhante outro cafo, fe bem
fuccedido cm diueríaAldea , Ôccomdiuerfo companhei-
ro por nome Belchior. Foy também leuado parece do ef-
pirito , aefta Aldeã , achou que eftaua em prifoens ou*
tro índio ^ entre as velhas a engordar pêra fer morto , &
comido na forma fobredita de feuricogentilico ; foy falar
com elle , diííclhe o preío aííligido. O Tai, fe eu foubera
Semelhante
ctfo.
ago.
M
nã !
Livro III- Cap V. i6i
agora a lingoa dos Chriftãos , cuuera de pedir ao voíío
Vcos , que me liuraííc do eftado cm que cílou. Reípondeo-
Ihe lofeph , filho nam tomeis pena , pedi embora por
volía mefma lingoa , que o noíío Deos fabe todas ,
&: vos ajudara , ôc eu também rogarei por vos : dizendo
ifto poz-íeem oraçam , diíTe rambem a feu companheiro
Belchior, ponde vos também em oraçam , & ajudaime a
liurar efte pobre. Couzaprodigiofa / pouco depois en^j
trada a noite , quebraramfeporíi mtfmo ascordas, o ín-
dio fc achou liure , & pode fogir , como em efiPcito fogio
vindofc ao Padre darlheos agradecimentos, 6c pedindo-
lhe com grande inítancia o Bautifmofanto. Quem diíTca
lofeph que cftaua o índio em prifocns / quem deu licent.
ça pêra falar com elle ? 5c porque via lhe cahiramas cor-
das.'' nada Te foube , Ôc tudo fe entendcofermilagre, &
obrado AltilTimo.
í« «-*S'-8^í« £*?• 6*3 €** Eí* e^- é?^ íií* s^- «*^>*^^l^^
CAPITVLOVI.
Do grande ejpirito d-emiljoens de lofeph ,& dos
fauoresextraordnarios , que ne lias lhe faTjao
Ceo.-efpecialmente da canoa perdida", de que
> ef capou t0?n milagre • ^' dç outra virada de que
fahio femje molhar ^ nem feu Breuiario.
c.
-'írr
TR-, -;■
t:J eolnr.i
íssoÊNs das. almas no Bfafil verti a fer,,,,' jr^rcipíí
o aluo principal dos fííhos verdadeiros da í '"'"*' ^
A Ido dl s fi-
r^ \ ' n r<> • i li í.S d .
v-ompanliia, a cite cfteiío ídm . mandados panhú.
a efta vaíla regiam, quais caçadores do Sç»-r
nhor , a tirar das brenhas de fcus- fertoens , milhares de
milharesdch-;mcns , que fí-ndo em verda Jade racionais, ,
viucmccmo brutos, & feras.... ,... ... , ,. ■ _ ,"
X buâs
•l^.-i■
Duísfortfs
hàde miHó€S
lioac os In-
atos em fuás
'!!4
;'.i^';;
f
•m
f
i§i Vidado P. Iosái>k ANCBtETA.
õlia^ < Duas fortes ha deniiíToens^.HumâSfefâzeJriteôfi^
fBito às Aldeâs dos Ináios ja bautizâdos 5 òU Câthecu--
menós, rcdufidosdclks , &: doucrinâdõâ ahi pello$'
Padres . O^trasfefazcm caminhando ao interior das bre-
nhas cento /duzentas ,& rnais legoas, trazendo delias ba-
dós de bárbaros, peta tomalos exércitos de Chriftò, Hu*^
ma , Ôcóufra forte de miffocns he chea de trabalhos 3 po-^
réni* maiores os daquelles que penetram âs micas , hé hM
cmz fcca chea de perigos , fomes , fedes , canfaço , ingra-
íidoens , fem outro aliuio , que ò de bom obreiro.
3 O modo com que os primeiros miíTjonanos enfinatn
ús lndiC)siábauti^âdos,Dúoâthecumenos,&reduíidosà Al*.(
deasfugeitasà Republica. he o feguinte. Rompendo a ma^
nham tmfeouuindopellâ Aldeaofino.quetangeâ Miífa,
todos os meninos fe v?.m ajuntar na Capclla mor da Igreja
aonde poftos de joelhos, em coros iguais /entoam em voz
alta iouuorcs de lefii , & da Virgenv. dizendo os de hu
coro ; Bendito ,&louuadofeia o fantiffimonomede Ie(u,
èc reípondendo os do outro , &o dabemauenturada Vir-
crcm Mariamay fua pêra fempre.Amcn.Elogo todos juntos
dizem, Gloria Patri , ôc Filio, &: Spirituilandio. Amen.E
nifto continuam até chegar a Miffa: chegada cfta , ouuena
c6 filencio , ôc acabada cllaiidososmais Índios efperam elles
no mcfmo lugar o Religiofo , que tem cuidado delles o
qual lhes enfmaasoracoés dadoutrina Chriíla^em voz alta,
& apoz efta , da mef ma maneira os miílenos de nofla lan ^
tafé , em dialogo de preguntas , & repoílas ( compofk>
pêra eireeffcitoemlingoa doBrafil ) dafantiíhma Trmda-
k.!r^"'de creâçam do mundo, primeiro homem , Emcarnav
çaiíi, Morte, Paixam. Rcfurrei^am, ôc mais miftcnos
doFilhodeDeos , do luizo vniucrfal , Limbo, Purgató-
rio. Inferno, Igreja Catholica , &c. E ficam tam deftros
eftes meninos, que enfinam depois aos pais , que quanto
maiores , tanto mais rudes fam : ( fupofto que também os
pais tem íua doutrina particular . todos os dias fantos , õç
^ Dçmm*
•íií..
'acoiio
LlVROlII. CAp. VI. 163
'Domingos , na mcfina Igreja com praticas fobre cila, aca-
bada a doutrina tornam a dizer os meninos a coros ; louua*-
do i cja o fantiííimonome de 1 efu, refpondcm os oucros>ôc o
<Ja(dntifljma Virgem Maria may íua pêra fempre. Amcn.E
logo eiperam que os mandem , & vam todos juntosa fuás
cícclasaler,ercreuer,ou cantar: Outros áinftrumcnros mu-
licos , feoundo o talento de cada hum. E faem no cartco
Ôc inftromentos tam deftros , que ajudam a beneficiar
as MilTas , ôc procifloens deíuas Igrejas , coma mefma
pcifeiçom. que os Portuguezes. Neftas efcholas bailam
duas horas da menham 5 outras duas da tarde,
4 Tangendo as Aue Marias da noite , tornamfe y^j^ j^ ^^
ajuntar a portada Igreja , ôc daqui formam prociííam cotnmcndtr
com cruz kuantada diante , ôc poftosem ordem > vam PurgT" °
cantando pellas ruas em alta voz profas Tantas cm fua lin^
goa ate chegarem a híimacruz deflinada , a cujo pé po-
ftos de joelhos encommendam as almas do Purgarorio ,
na forma feguinte. Fieis Chriftãos amigos de lefu Chrifto
lembra iuosdas almas, que efíam penando no fogodoPur^
gatorio 5ajudaias com hum Padre noíío , & huma Aue
JVlana , paraque Deos as tire das penas que padecem. &
refpondcm rodos. Amen : Rezam em alta voz o Padre nof-
fo , & Aue Maria , & voltam com a mefma prociííam , &
canto até a portaria dos Padres, onde por fim entoam, Ôc
refpondem como aíTima 5 & efperam que os mandem , que
íemiíTonamvam E eíle hé o exercicio dos meninos.
5 O dos Padres alem doja dito , hebautizarin- ^j
nocentes , caihequizaradultos , adminiftrarlhes o Sacra- p"'^"p*''^°«
mento de inatrimonlo na lei da graça , & o da Euchariftia
aos que fam capazes, intimandolhesa boa intelhgencia ob-
fero^ncia , & perfeiçam detodaseftascouzasrdefenderali-
besdadc dos índios, curar fuás doenças, Ôc preparalos
pêra bem morrer. Sepultar em fuás igrejas os que morrem
com a folcmnidade de enterro dos Portuguezes mais pun-
n.ais 5 com tumba , prociífam, Cruzes, velas acezas, C5-
fíarias,&:c. Xij Hc
ixetcicio
oho3r
[164 Vidado P.JosEPH anchieta;
SamafFiçoa- g Hc muito pcfa louuar a Dcos , vcí neftagciite O
dosàr.ufic» ^^j|^^^Q,^oj„^ijc osja Cbriílaõs acodem a celebrar as
fcftas , & oííídos diuinos : Sam aífeiçoadiíTimos à mu-
fica , &osque fam efcolhidos dos Padres pêra cantores da
igreja > prefamfe muito do officio , Ô€ gaftam os dias, & as
noites tm aprender. Saem deftros em inftromentos mu*
ficQs., charamelas , frautas , trombetas , baixoes.cornetas ,
êc fagotes 5 com elles beneficiam cm canto deorgam
veíporas , completas , Miíías , prociííoens tam folemnes ,
Amigos do como entre os Portuguezes, Preíamíe de que andem benj
íukod.mnõ ^Jornadas íuas Igrejas de ornamentos» Cruzes,alampadaSi
caftiçais^' turibulos>Confrariâs, & tudo o maisque pertence
ao culto diuino das mefmas Cidades :ôc folgam de fer os
primeiros que contribuam pêra eftas peças, empenhando
pêra iffo fm fuor , & trabalho 5 ôc hé entre eiles falta no-
tada, p^ííiiir coufas de preço/em que repartão com a Igreja
nosdiasdefeílaarmáofuas Igrejas, com enramado^ apra-
ílueis de eraas , & flores , que tal vez excedem asfedas^ôc
nam ha algum por mais refpeiíado quefeja , que em fe-»
mclhantes occailocns , nam canfe , & fue.Sera tido co-
mo por lacriiego entre elles , deixar de acudir a huma das
feftas por mais diílantes que eftejam : os fabados à tarde
cantam na Igreja deuotâmentea falue da Virgem Senho-
ra Noíía . em canto deorgam com feusliuros nas mãos:
& todas as fegundas feiras pella menham os reíponfonos
dos defuntos , encommendando com o Sacerdote íuas al-
mas a Deos , no fim da MiíTa. Ka Quarefma fazem (eus
íepulchros , que eiles mefmos pioíâm: tornam difcipii-
nas de fan<^ue correndo os paiíos peliaíomana fanta. E
fobre tudo fam zelofos por ordinário de confeííar,
ôc comíBungar 5 6c. enuergonhandofe muito entre os ou-
tros aquellcs , que nam tem idade, ou capacidade para
iffo.
7 O modo dos fegundos miíFionarios, que rom-
pem as brenhas , hé o feguinte: caminham apé com íeas
bordocns
'Miili;!
L I V R o IH. C APÍ TVLOVI. "^ 16^,
bofdaens na5 maõs : kuamfeu breuiario, ornamentos fa- Sguudorae-
grados , ôguUias pêra rumos , & alguma companhia de ín-
dios maníos J3 bautizados , em cuja experiência liuram os
caminhos , 6c em cu)o arco a prouifam do fuftentoda vida.
Swas frechas fam as que caçam , & )tjníamente peícam
algumas vezes. As fruirás das aruores , as cruas dos
campos , a agoa dos Rios > o mel filueíire , & fobre tu-
do a prouidencia do Criador nam falta Defta maneira vaõ
cortando as macas , abrindo muitas vezes caminho huma'
no d fouce , nam fem perigo de feras , fcrpentes peçunhé^
tas , faluagens atreicoados. Depois de verem no cami-
nho as variedades ^dehuma ,duas', Ôc tal vez de três Luas,
dam tudo por bem empregado , quando começam a diui-
far os finais que leuam deítinados, dasferraSíOq bofques
onde habitam as gentes , a que fani cnuiados. Qual a
cfquadra de baixeis indianos , que de longa viagem, perigos
de mar, & de tempos chega àulítar a dezejada terra : rais
chegam noíTos miííionarios à prcfença de feus bufcâdos
Índios. Leuam bandeira de paz , entram íeuando diante
acruz, fazendo pratica, & dernonílraçoens de qué íarn. Che-
gam os quehaode hofpedar , commummenteos ma s an-
ciãos , olham as cabeças ^ reconhecem as coroas , final
fabibo entre todas âquellaá gentes , por onde conhecem Ter
Abares, que quer dizer Padres, & logo fatisfeitos de mini
poder auer enganojonde ral géte vai, poemfc cm plãto, que
he o modo de receber c5 bom animo os àmio-os mais finos.
8 Perahuma, 6c outra forre de miííocns referi - tj^^j^ ^^ ^^j..
das 5 teue lofeph efpirito dado do Ceo. E nam falando'^»"' V^'"^"^*^
agora da principal de codas ellas , quando em companhia icuanc.dasi
de Nóbrega fe foy meter entre os Tamovos , como cm ''^^'^'[^ %**"
n .' , ^ noa , cc eica-
rctens, por fazer pazes entre nos , & elles. Huma de grade ^-imiUgrofa-
fruito , perigo, & trabalho, fcy celebre nam fò cm $, v'^!^'^ '^°""
Vicente , mas em todo o Brafil , & referida em gran-
de numero de certemunhasnosprcccííos de Tua canoni!a-pIf,^„;^/.'*
çam, & foy aííí. No anno deis 7 o. na Vil {a deS Paulo ^'^ •"''" ^ f-
A lij auia
jjjJiSI'
lil/''4''i'll
^km
?i«fi
i6$ Vidado P. Ioseph Anchieta^
&fr»c.A.f. 3^5^ dous homens , bum delles nobre, & conhecido , porí
^'o^Ff.io. nome Domingos L«is Grom , ambos Gafados , & ambosj
fa t^/zf coí^ família .éíles depois de mararem hum íeucont^ario^
7i' òc eoníeterem outros infultos , porque temiam Ter caíliga-»
dosgraaementc , tomaram fefoluçam prejudicial , fogin-'
do com fuás famílias pcra o fertam , &: mctcndofe de^
companhia com os bárbaros, que eftauam com os noífos^
em^^uerrâ /eftimulando-os àque acommeceííem , & p5-4:j
doemaííombro , & medo toda a Capitania. A eíte pc-.^
mo acodio o zelo (anro de íofeph , que encam era fupe-i
ríor j tratou com os oficiais da Camará , que confiderado
o perigo, trataíTem de dar íaluo conduííio , 6c perdam
àquelles delinquentes ^ porque com efte íe atreuiaair emi)
buica dellcs , & onde quer que eftiueíTem , abalalos, &
traz elos coníigo. -*í^
9 Auido ofaluoconduéVo > parte íofeph , aonde
o guiaua o erpirito. acompanhado do Padre Vicente Ko-
drifTues , Manoel Velofo fecular!% §c alguns poucos in-
di(rs í hum dosquais fiel fobre lodos linha por nome Ara-
guaçíi ) fiado mm tanto em fua eloquência dalingoaBra-
íilica , como na força da diuinagraça acoufas tam incer-
tas aos olhos humanos , como perfuadira homens dcfal-
mados, & Índios fobcrbos , poílos em guerra , ôc ãão
de vincrança ; Embarcaramfe pello rio a baixo em huma
canoa dccafca de aruorc ligeira , mas menos forte 5 cisque
depois de paflado tempo, indo chegandofe ao lugar deftma-
do, ambos os Padres com os breuiariosnas mãos , cum-
prindo a obrigaram da reza , fem que aduertiíTe alguém
caea canoa òz repente doaltode huma cachoeira.queti-
Cafoefti^iiV.oj^l^à o rio , fazendofe em pedaços , & fepaltandoa todos
^nir/epÔuno profundo das agoasfurgiram c^rudoanTimaoscompan-
UKU hora f«^i^^ij.Qç ^^ fahiramanado em terrajporém lofcph ignoran-
das ígoas do ' . ' r
fiofcrT^iczin te daquelle exercício nam aparecia: entra eai lentimento
«!g«m«. Aragu^çu fiel amigo, 5c lançado de margulho . que era
profundo o rio, foy em bufca delle por largo efpaço , ôc
nam
OOI
•rH'
' LtV ròIIíCapi YVLO Ví. ' xfif
fiíírVí ô achando , tornou aíTiitia á tornar alento t ttiâS íogo
como impaciente detam grande perda , tornou a margu"
Ihar , ôc guiado ( ao que parece de Deos * ou da Virgem
(anta May Tua, Patrona da niifíâm, ) vioâ lofcph i quô
clbua aílénrado nó fundo do rio i 5c fazendo prc^âná
foupa , ( como era valente , ôí tobufto o Indio^ & gra*
de nadador ) o trouxe aíTimâ liure, & bom , 6c com feu
breuiano enxuto ^ depois de áuef eftadopoftnais de meia
hora no fundo das agoas (em quejamaispefdeíTe o íenti-»
do , cuidadoío de três couzas ( como elle difia J de lefu *
Maria , & de nam beber agoa. Depõem o Pádfé Pedrd
Icitam contemporâneo . bc amigo rcu,quc perguntando *^5*^'"°^^
a lofcph, que fazia fua Keuerencia, quando cílaua no fun+^^-^^s'
do da agoa- Rcrpondeo eu nam aduerti quando a canoâ (c
virou, porque eftauareíando as horas de NòíTa Senhora dâ
Concei(^am, Ôc aíTiaífentadocomó eftaua me fui ao fun*
do , & continuei com a mcíma reza , fcm que à agoa me fí-
Zcfòe mal.
«^ fo Depois deliure de tâm grande perigo milagrofâ^lSfôfègae de-
mente lofeph 5 com as mefmas roupas molhadas com qiicS^^K^''^^*"
fahiodorio, foy profeguindo o caminho com feusconi-'
panheiros Ôcdefta forte os tomou a noite que veio efcura,
& chuuofa , fem fogo , ceia, oU caza alguma , em que
podeííem recoiherfe , por matas fechadas, & deefpinhos
que acommetiamos olhos .forçando asmaós a ir fempre
Vc guarda rpaííados todos cfles ttabalhos .alca rtoite guia*
dos da pvouidcncia de quê os infpirara, deraiíi numaschou-
panas.quc acharão ler as moradas daquélles^quebufcauao
lí Aqui fe vio encam lofeph em iidahoríiuel , de
que fomente a protecçam diuina podia liufal o. - Porque ôs
'1ndiô.<, quecílauamem ouerra; fcntindo em fuás Aldeas,^'"^^"*?******
geníecdranha, tocaram a rebate, &c armados ianirâm ao
encontro : Porem ouuindo entre aquella éonfuzam de
efcundade , o nomede loícph, que conheciam porhomS
fanto , 6c amigo de Dcos , Óc a Voz Je fua eloquência : que
arreba
ífí ViBADo P.Ioseph A^GHíE ta:
arrebataua , lançaram por cerra os arcos, horpcdaramnõ cõ
humanidade, ncmoufaram impedir fcus intentos Os Por-
tiiguezes que bufcauanijpafmados da rcfoluçam dos índios,
,^ àvifta daquelk cfpedaculo , & eftado penofo, cm que
yiaisi os Padres padecido fomente por culpas dellcs , foy
fácil o renderemfc , mormente com perdam da Republi-
ca mefma , que oííenderam. Entrou o dia , poferamíe a
caminho, aquelle Moyfes , 5c aquellas famílias liberta-
das dentre o pouo bárbaro, dando ao Altiííímo graças por
beneficio tam pouco eíperado . Chegaram a pouoado , ôc
foram recebidos com alegria fua ,& do pouo
Deoutra «^ ■.,,.j,2tf?^-'-'Ainda Quc foramtídas por cotiza nouaascircu-
no» qui fc VI. _"■■". "^^ - * ' . ,
rou fem femo ítancias dcfte fucccíTo , nam roy contudo nouo aos nomes
^*^"/^^^^'' ficar iofeph illefo no naufrágio, ja outro tempo tinha
nauegado o Rio chamado Beritioga junto a Santos era
companhia de Aires Fernandes , & outros palTageiros ,
onde virandofelhe a canoa , ( quedeuiadefer cafqui-
leue ) caíram ao rio , & molhandofe todos , elle fòme-
€e fahioaterra enxuto , & comfeu breuiario na mão illcfo
louvando os homens a potencia de Deos , que obrara cais
marauilhas, i
Oefcripçam
delcanhté-
«5» ^èii^íM-í^-i&Vfi -i^t»^ Ç*» í*3 -SaR ?*? 8*3 'Ç?»?- e*3S*3 i*5- S^ S^3 «*3 6i>S- »3 Í*J-8«>Í -6^
CAPITVLO VII.
Continuam as mar auilhcu de ftiiU mijjbens^efpâ'
áalmente de S.Vicemepera Itanhaè.
T A N H A E he huma das quatro Villas prin-
cipaes de S.Vicente , que diíl'emos, hauia no
tempo , cmquealli gouernaua lofeph, pel-
_ la hngoa dos Índios, valo mefmo Itanhaé
que prato de prata , porque fcu fitio tem com elle al-
guma femelhança : DefteapcUido fe denomina todo aquel-
Lrv RoIII. C APiTVL o VII. U>
\c trato da cofia , que corre defta Villa de S. Vicente , que
he efpaço de outo Icgoas. Chamam também à mefma Vil-
la dcltanhaé, a Conceiçam, nometomadodehumTem-
plo.dedicadoà pureza da Virgem Senhora N. que airife ve-
nera. Pouco auante defta Villa de Itanhaé, ou Conceiçani',
hauia quantidade de índios , hunsque viuiam em Aldea,
& outros em diuerfas fazendas dos Portuguezes , & efte
era o maior numero ; huns , Ôc outros neceflitados do paftó
daverdeira doucflrina de Chrifto:, porque viuiam á lei de
natureza, ôc fegundo os ritos de fua gentilidade >diftantes
entre fi em diuerfos lufares.
2 Todo eftè trato de Itanhaè , & Conceicam erão ^n.
os empregos de lofeph ,& íiias particulares miíroens,aga- ss pnnciiais
nharpera Deos as almas dâquelles bárbaros ,& a cultiuar le^h.^"^'^ ^'"
na pureza dos preceitos diuinos os Portuguezes , que de
niiftura com feus índios viuiam rnuy defcuidados dasobri-
gaçoensde Chriftaos.Hé apraya deftã cofta , por onde ^^
•I ^ oi 1 1 Noticis ãis
caminnaua , tam aípera , oc dura , que hum carro bem prai-sd=ica-
carregado nam deixa final nella , & commummente emba- "* '*
raçadacomarmaçoens desfeitas <lè corpos deBaleas, que
allifedamâ cofta, cõjôsoííos perturbam , impedem a
praya , & fazem o caminho mais afpêro ; contudo efte
meímo caminho era arécreàçàmdelofèph, a pé, commCí-
méte defcaiçojcoftumè feu em todas ás niáis peregrinações :
A eftelugar chamauaèlle ófeu peru pêllafs riquezas que ncl-
le achaua : defte caminho direi osfrúifos de feus trabalhos,
3 Por cftas prayas caminhaua, quando hum dia c*í° notauei
retirado , entrou pêra o mato fem outro fim , quèpodeírc
mouelo, mais que o deftihódo Géo,qutCoiíiGpellamaõ
o guiaua, ôc no efcondido áchtm bófque , achou hum^"/-^/**-
índio , decrépito cm idade , que cft auâ aftentado aopédev-' iT/».*^
huma aruore ,oqual no ponto que vio á lofeph , come-^*''"-^^-^ '*
çou a dizer, chega , chega , com pfeíTa grande, que mui-
to hà, que aqui te erpèi^o; pergiintoulhe quem era ? de
que terra , ôc donde viera ter allí ? refpondco , que fua pa-
r tria
do índio cha
mado Adam.
í"!;!
"m
170 VlDÀ DOP. lk)SEPH DE ÍInCHTETA;
tria eftauaiobre o mar. & diííe delia tais outras circuílancias
que fícoLi entendendo íofeph , nam era natural de Itanhaé,
nem d^S. Vicente, nem ainda de todo o BrafiUôc que fora
trafido a aquelle lugar, por virtude diuina, nam por for-
ças humanas , que nam podiam confiderarle empeífoa de
tanta idadeTornouapregunrarlhequefimomouera nefta
íua vinda .^ que era õ que vinha buícar por caminhos tão
longos ? refpondeoque vinha embuíca do caminho direi-
to da vida boa , aíTim exphcam o caminho da faluaçam,
Entam ficou certo íofeph , que vinha trafido de força da
predeftinaçam : &: muito mais quando depois de exami^
Bado , tirou dellc , que nam tiuera nunqua maisde húa
molhcr , nem fizera guerra fenam fomente em jufta de-
fenfa ,&: outras couzas tais que ficou perfuadido , que
aquelle homem nam tinha commetido em fua vida cul-
pa grauc , contra a lei natural , ôc que vfaua Deos cora-
clle daquelle principio Theologico : Facienti quid tnfe
eíi , D em non denegat gmttam. Que ao que faz , o que em
fi hé, nam nega Deos fuà diuina graça , dandolhe meios ,
ôc caminhos milagrofos , & extraordinários , com que
alcancem o meio da fc^ôc amor de Deos , & entre na
bemauenturança. Tirou mais defte ditofo índio , que c5
feu diclamennaturaí da rezam alcançaua , fe bem con-:
fufamente , hauer hum Autor da natiireza , que criou as
couzas vifiueis, &: juígaua do bem , & do mal : &: penetraua
alguns dos principiosmoraes ,que pertencem àdiftinção
do vicio , & virtude 5 explicandolhe algumas verdades
dosmlfterios de noíTafagrada Religiai;n , dezia , que aííi
o fentia elle dentro em fua alma , mas nam fabia explicalo.
4 Feitooexamefobredito, ôcinftruido oquefoyi
«^Tmn &baílante, tirando asoa de huns cardos filueílres, recolhií
morce de da da chuua , por nam hauer outra naquelles areais, bauti-,
zou íofeph o feu índio ,& lhe poz por nome Adam. Cou-j
za marauilhofa /'porque Adam , depois de recebidO; aqueb
^!;'f{5u)9np .Oíbaíqhi : ilín . : cniv ú^ix^h :ò , sn-^j -Á^
^dam.
V
LiVRôIÍL Cãp. VIT. 171
le diulno Sacrcimemo, cheio de tfiPeiros da graça , leuanta-
doaoCco as maõs , & os olhos dando as graças ao Se-
nhor de tudo ,èc depois a loíeph como aqucllequehsuia
cócluidocom o que tanto dezejara, peraoquefora trafido
àqucUe lugar, quanda apenas lograua os principies do cami-
nho da vida , íe entregou à morte, dando aalmaao Cria-
dor, que por tais meios o predeftinou : tnterrou lofeph o
corpo do nouo Adam naquellasareaes defertos , comas
ceremonias poííiueis, dondealgia dia fera leuado a aparecei
no extremo juizoaquelle portento da graça5 poftoquehoje
nam atinam os homens com kigar certo aondejaz , por
fer enrrcmafasconfufas, & areais defertos A quem nam
admirara prodigio tam nouo ? Que pafíTe lofeph como á
cafo , aos olhos dos homens , ache tal efpeciede índios,
com tais , & tantas circunftancias ? Q^e durem nel-
le as acçoens da vida , fomente em quanto recebe as dá
graça ? ôc que recebidas eftas morra com finais certos dá
bemauenturança ? Que ríiôr exemplo , que mo^r fermao
podem ter » tantos quantos vemos , que cftandÒ tam per-
to nam fabem aproueitarfe. .
5 N am hé deíTemelhánte à éí^e y Dtf tfòcáfo referi- índio
doem feusproceffos , pofto que nãm declarem o lu^ar f pj""^''^»-
^ *■ .. *■ * ondeio com ■
mas lomente dizem , que encontrou o tiPtro Ihaib hò ca-^-agado
minho de fuás miíToens igdalmentétheiò de lepra, Sc ^Je''*""^"''-
gentilidade, & que compadecido dehi^tíi , & ^tto' eíla-p^íc.
do , deu remédio â alma , & eorpò dtpors de ' íníit^àido ,
lauando-o qual Naamaõemàgoa fagradà^do t>atitifmò \E
namfamfingulares cftes fuccèííos, óDitros veremos com^o'
fauor diuino íemelhantes ,; por toda eftá lenda ^^fuahi-
ftoria. -li ni ::!•■]:) (vf}-:! r c^n o r;crr//:,£i\.'S..t>«<?
íj.v^íi Outro diacaminháua íofeph' efl^as pVâí;y^sr,' aíbm- j^,,,^j,i^„
panhado de Efteuam Ribeiro.nrjoço ainda de pouca idade, domefa ocai
PerguntoulheoPadrc , fe tinha agiu ma cóuza deconiár,'""'^"'
em hum certinho queleuaua ? Refpondeo que nada ^ pois 7^4 uíj^!|
tende efperança ( lhe diíTe ) que Deos miniftra de còmcr
Yij a
prâ
1 ,1
ifi Vidado P.IosHPH ANCHIETA,
afeusTeruos: E foy prophetizando na maneira fegulnte:
Tende tento que fedo vereis na praia hum peixe , porem
cite nam fera de comer. Logo depois achareis outro peixe ,
&c eíleferade comer, metello- eis na ceftinha,&: nella meí-
Hio ocofereis , pêra comermos. Ficou turbado o moço ,
erpecialmentcde ohauerde cozer naceíla , nam via como
podeíTe cozer peixe na ceíla / Porém o efFeito moftrou
tudo. Andando humpedaço , viram hum baleato , eftira-
do na praia, lançado do mar , ôc defemparado da agoa $
peixe hé efte ■, mas nam de comer , diria o moço. A pou-
co efpaço acharam outro peixe , a que chamam tainha,
bomde comer. Mcteo na ceíla , & caminhando cuidaria
como o coferia , ôc como poderia Terna ceita? Senam que
continuado feu caminho, encontrarão húalndiavelha, que
feruia em huaglrande caldeira agoa falgada, afim de fazer fal:
entaô entendeo Efteuam ,quc podia fer,cofer o peixe dentro
nafua cefta, porque metendoa dentro da caldeira feruente
iicou coíidos & elle eníinado a creer as palauras do Pa-
dre ; Comeram , & deram graças aDeos, ôc contaua de-
pois Efteuam o cafo com efpanto dos que o ouuiam. ^
7 Semelhante foy o cafo feguinte nas mefmas pravas
vindo deS. Vicente , trazia configo hum moço com hu
cefto de peixe , que lhe deram de efmola ^fícoufe eíle
atras em companhia de huns índios , os quais lhe come-
ram o peixe .• foyfe confufo ao Padre lofeph, defculpan-
dofe qucaquella companhia nam fora fiel , porque lhe co-
mera o peixe , moftrandolhe o ceílo vafio , diíTelhe a paz
de lofeph , pois diíTo vos agaftais ? Andai , Deos que deu
eíTe , dará outro. Foyaífi que a poucos paífos andados,
3>m.-?./.u. achou o moço o cefto cheio de peixes femelhantes , fcm
faber o como , nem donde .'=' tornou ao Padre, moftrou-
Ihe a bençam de Deos , muito efpantado , & elle lhe dif-
fe,Irma5 algum deuotovos meteo a hl eíTe peixe.
8 Outro cafo nam menos admirauel. Partio de
S. Vicente em companhia de hum Irmão de caza, &: de
ou-
Setnelhinte
cafo.
Mllagte do
breuiAiio.
L I V Ko III CapttvloVII. 173
outro moço fecular por nome Damiã. depois de andadas ou-
ro kgoas, pedíooPadre ao Irmãoobreuiario pêra rezar as
horas canónicas 5 ficou o Irmão perturbado , & diííelhc
íua Culpa, que o hauia deixado cm caza por defcuido. Prc-
ícndco Damiam defandar as outolegoas , 6c hir bufcar o
breuiario , porem lofeph compadecido do caminhante,
cnnfado já , namconfentio em Teu defaííocego , confiado
na prouidencia do Senhor , que tudo ve, & detudoproué
aosfeus j Acabada a jornada , entrou na Igreja, ôc feita
breue oraçam,fo7VÍftocom o breuiario fem verem don-
de lhe vieííe , & fabendo que lhe ficara em caza , depois
da reza , deu lofeph o breuiario ao Irmão , & diffelhe:
Irmão , namfe defcuide outra vez .- Vio mui bem o com-
panheiro 5 Ôc confacceo que era omcfmo que tinha deixa-
do em caza
>.\.íi..4*"<*l
Milagre dai
hoftiísqus
n
9 Semelhantes marauilhas eram tam ordinárias jefqulcaatii"*
quejanam efpantauam Vinham outra vez caminhando .suô^ícíl':;!
a mefma praia a dizer MiíTa emcerta fefta de NoíTa Se- ■'■ '
nhora da Conceiçamj Ôccomo caminhaua veloz, ôcfoife _a-^^.^.,*^
adiante com feu companheiro, Sacerdote também , ôc algus ••¥
feculares , deixando atras alguns oufos, que vinham em
hum carro à mefma fefta 5 Eis que chegando junto ao
lugar , em que hauia de celebrar a Miíía , bufcando as ho.
ftias ^ que mandara trazer , achou que fícauam no carro,
que fegundoo vagar com que vinha , nam podia chegac '
a horas conuenientes ; ficou perplexo o companheiro , ôc
enuergonhado , porque asnam trouxera configo , cuidaua ^•*''^"*"'*f^
o que fariaj porém lofeph o tirou defta anciã jdííTe, ide an-
dando atéa Villaque ja efta perto , eu tornarei a bufca- .^.-j* "^
las , & virei logo : ôc foy a ida , Ôc volta com tal preíTa qu e
quando olharam pêra traz, o viram configo jaGomas'ho-
ílias , dentro em breuiífimo tempo ôc com euidente mi-
lagre , porque o carro diftaua entam duas legoas, que de
ida , ôc volta faziam quatro, caminho impoíliuel por via
natural 5 ôc o que mais he , que certificáramos qucvinhão
Yiij nells
mm
■>■ í !'i
Milagre
profeciti
t74. VíDADO P. lõsÉPH Anchieta,
nellequenam deram fé de lofeph , nem viram que abrlD
fe obaul em que vinham ashoftias, nam me viftes , lhe
diíTe lofeph , pois eu bem vos vi a vos. que eftauesbem
de vagar .matando gahnhas pêra comer , &c fazendo tais , &
tais acçoens5 ôc confeíTaram que tudo fora aíH, & mo-
ílraramno bem , porque o carro nam chegou fenam junto
à noite
10 ISfa mefma praia diííe a Luis Malio,vede como ides
& que haueis de encontrar huma cobra , olhai nam vos
juacamente morda , que Hc peçonhenta •. a poucos paííos deu com
de hií» cobra dja ^ prepara uafe pêra matala com grandes receios, im-
pedio o Padre , dizendolhc >deixaimecom elía yôc logo
j^c.z.f.^z ^[^gg^j^^Qfg tocoulhe com o bordam > & ficou morra fem
pancada alguma , 6c reconheceo Maiio aqui j untamente
bumaflaito 11 Na mcfms ptaia outra vez acompanhado de
inditcTtuíEfteuam Ribeiro , derepente fc virou pêra elle ,ôc diíTc
"^los. a modo de turbado , & como quem vira algum fucceíTo;
p^^^^ . ^ Efteuam que horas fam agora ? Refpondeo que podiam
v/o. fer onze , viroufe , ôc caminhou fuípenfo , fem dizer mais,
mas dando a entender que hauia couza noua : & foy aíli
que notando a hora , quando voltoii , achou Efteuam Ri-
beiro, que na mefma dera affalto o getio brauo na Beritioga,
& leuara catiua a certa molher > que alll moraua^ & de
obrigaçam íua. giWwv-
11 Em huma deftas fuás miffoensaTmâuafè em íta-
Martuiihadenhaé a Igreja de NoíTa Senhora pêra certa fefta,&: vinha
caindo a efcada fobre queandaua hum homem trabalhã-
■^'''"^•^/•/4. do, de altura grande :achauafeprerente lofeph, diífe à ef-
cada,tente,tente,algumas vezes, ôcaíTicomo hia dizendo,
hia parando , & andando com pauz as moderadas, como
obedecendo , até por o homem em terra fem queda ou le^
fam alguma, como fe decendo viera por feusefcaloeas,
& com admiraram dos prefentes.
13 yoltou hum dia de Itanhaç por hum rio abai-
xo
Proc. R.f. 5.7.
Li V R O III. Caíp iTVLO VIL' 175
xo , rezando íuas horas Canónicas , quando huma pom-^^'^P''^'^*^^
ba íe lhe poz íobreo i rcuiario.àviftade muitos , que vi- fcu lui.o ^
nham na canoa , ôcfoy viílo clle tomalla com a mão, a-bJ"^^^'"
fagala,&c depois deixala, & mandala hir feu caminho. Ou- brcuurio, ^^
tra vez vindo por terra da mefma Villa em companhia
de Efteuam Ribeiro , voando hum bando de paíTaros
brauos , hum dcUes fe veio por em feu bordam , o qual
lofeph depois de afagado da meíma maneira , deipedio
embora. Nam ha duuida , que efta , & outras acçoens
femelhantes , que cada paíTo viam os índios , ôc Portu-
guezes rudes , que acompanhauam a lofeph , por mar , &
por terra, pofto que apareceram a alguém efcufadas , fa5
contudo a melhor pratica , que por eííes caminhos podia
fazera eíle género de gente , que mais conceito faz das
obras, que de palauras , & por eílas aprendiam o de
que nam eram capazes por palaura, a grande potencia do
Criador , os priuilegios que faz aquém o ama , ôc <1ogu-
mentos femelhantes. 'niínfibiU^zofiSfo obnjGL'*
14 Caminhaua outra vez a pé eftemefmo caminho
deS. Vicente pêra Itanhaé , praya mui eílendida de outo
legoas defabridas , ôc hauia èntam grande calma: come-
çaram a fentirfe com demaíia os companheiros , que eram
treshomés feculares , & hum Irmão Religiofo , pedindo
ao Padre algum remédio. lofeph os animou dizendo:^ tê-,
de animo que logo haueisde ter fombra. Efcaçaraenteti-àucsLnibra
nha acabado de dizer , quando vé que vinha voando hua
nuuem de aues, que fizeram pauza fobre eUes 5 pararam
gozaram da fombra efpaço de meia hora 5 ôc depois def-
cncalmados continuaram feu caminho , femmáis fenciré
calma alguma , poílo que outra vez ao foi defcuberco j de;
maneira que nam fó teue a efficacia a ríuuem de paííaros:
pêra mitigar a calma prefente, mas também a futura,:
porque viíTem aquelles caminhantes , que as mercês do
Çeo namfamde meias. :;í\yji abnofi u\p>únh msa oíJp
r-L(p -; ^ Çeleberrimafoya vifamtcmerofa , extraordina. ■
ohá-i ria
Proc. R. f.zS
176
Vida do P. Ioseph Anchieta.
y^^"™.^®'' riaqueneftasmefmas praias apareceo anno de Í57Í5. por
horceadft da» .*.. .„*_*• "^i
prayas de
Icachac.
Rtdr.f. iju
t^Atos qde
cftuzou nos
catniohiinces.
íccreros juizos de Deos , & por ventura pêra terror , &
emendados homens, queencam viuiam naquellas Villâs.
Faziam miíTam de S. Vicente a Noíía Senhora da Concei-^
çam de Itanhaé três Padres noííos , o Padre lofeph , Ma-
noel de Viegas , & o Padre lofeph Morinello Italiano ,
poílo que outros nam contam entre elles lofeph de An-
chieta , fenamosdous mandados por elle, que depois ce«
lebraua a hiftoria , & trazia por exemplo aos peccadores.
Como quer que foíTe , a vifam foy cerra , & notória na
forma feguinte. Indo fazendo feu caminho eftes Reli-
giofos , fechoufe a noite , & começaram a verão longe,
como diílancia de três, ou quatro legoas pella mefma pf aia,
hum fogo grande 5 6c afaftados delles outros menores ,
que deziam fer outo , outros, doze , a modo de figuras hu-
manas 5 cuja vifta começou a metellos em medo , & cf-
pant0 5 mas apagoufe preílo , & defapareceo. Porem
quando menos cuidauam, tornaram a vero mefmoportê-i
to mais temeroíbíôc pello mefmo modo,& tam perto de íi,
que claramête cnxergauam fer a maneira de hum corpo ho^'
mano, o qual lançaua da cabeça grandes chamas de fogo
como fe cada qual dos cabellos delia fora a luz de huma.
grade tocha,mas de diuerfa cor ; ficaram atónitos os Padres?
à vifta de couza tam horrenda . mas com mais exeeíTo ,.
qu ando viram queabrindo as coftas,defpedia de dentro da^^
entranhas huma labareda de fogo , nem mais nem meno^
que a de fornalha dos engenhos de açuquar , quaníloí
mais acefa, ôcriguroza^ ; & da mefmamaneira apareciaô'
os fogos das outo, ou doze figuras humanas, pofto que do
cftatura menor , que reprefentauam moços dír quinze^
annosde idade : efte&hiam como bailando , ôc fa^endcí^
fefta , à figura maior cm circuito.
i(S Gom efta vifam continuaram feu caminho, por-
que nem tinham aonde retirarfe , por efpaçode três hofas>
ja mais perto , ja mais diftante. Do Padre V iegas fediz que
cheio
Èu\tl Vi , A
•^v-«\
. A^ :tíVRÒIIT. Cap. Vil 177
cJTeiodepauor hia cfcondendo o roftò nas coílas do Pa-
dre Manncllo , & que efte mais oufado hia notando,
& dizia depois , que cliegauam xam perro à vezes , que
Ihep-irecia , que ouuia vozes de hoinês fallando pella lin-
goa dos Índios , quenam podia entender, ôc ficou eíle
Fadre tam alíombrado deftasvifoens ,& entrado delias , s^''*^" ^*
que quando depois por muitos annos , que viueo Ihefal-
lauam nelas , logo ficaua como homem pafmado^,
tremia , 6c perdia as cores. Diuulgoufe o cazo , & ouue
no> pouos diuerfos pareceres j huns diziamque deuia
de fer certas peílbas.de quem fc dizia que morrj£Fâ,ô^em mao
cftado 5 outros que eram auizos de Deos, ôc outras cou-
fas fcmelhantes. O certo hé quecom eftas figuras coftu-
ma o Senhor moílrarnos as penas do inferno . pêra hor-
ror , ôc freio de peccadores, quando as vêem , ou emfi,
ou pintadas , quais eftas logo andaram em painel pella
terra , ôc foram mandadas a Portugal coni -erpanío de
todos. , mví: fiohtirAti ,ioi.í
17 Nam fei que tinha com efta praya^o inimigo
infernal 5 parece pretendia com feus rigores fazer difíícul-cipantftía
tozo o caminho da romaria da Senhora. Por huma
parte delia caminhaua lofeph outra noite ,^em companhia
de a guns Romeiros , quando a deshoras ihê' aparece ou-
tra vizam também efpantofa ; huma figura de hum home
armado em fogos , metido em prifoens decadeas , & gri-
Ihoens de fogo. A vifta defta vizam horrenda , nam po-
deram fofterfe em pc os companheiros depuro horror,
òc pegados às veftiduras de lofeph , gritauam que lhe acu- ?w. 3^/.ig
diíTe j aíTi ofezoPadre, & dizendo certos exorciímos
da fanta Igreja , defapareceo a vizam , Ôc fç meteo nô
mar. ^' rn-.dí.:;! í.a
^bffJncrrfílODÊ
ibc ff' ' s
'G^ibíio^'fjrnrviQ^i^p[,
Outra vifaní
'"' 1 i I
178 VíDADO P. MSEPH ANCHtETA,
CAPITVLO VIII.
■/i
Outras Mijbens por varias partes. ^èfpáêlmmh
O^nr;
Preiíè huma
grande tem-
peílade , aui>
Ta > & falua
hús homens
da perigo da
morte.
P^ttrn. /.?.
;0
'ih'
A E tioiofepb do GoUégio de S. VieenI'
te » pefá S Paulo , cm companhia do Pa-
dre Vicente Rodrigues fiel companheiro
deftas miíTocns, colheio osa noite no meio
do caminho daquellas ferranias , fizeram
alli fua pobre choupana pêra agazalharfe. Teue noticia
por reuelaçam , ( ao que depois fe moftrou ) que certos
homens vinham ao contrario da Villa de S. Paulo peraS.
«/, u.;w, Vicente , êc que tinham parado como meia legoa diftan-
te,, & feito alli feu abrigo ; entrou em zelo o feruo do Sôí».
nhor, mandou hum índio , que fiaíTe a tal parte > que al-
li acharia fauns brancos , ( affi chamamos Brafis aos Por-
..;„ tuguezes , ) & lhe dizeíFe de fua parte que nam fizcíTeni
noite no lugar efcolhido , fe nam queriam, que as aruo-
res grandes , & altas , que eftauam fobre fua pouzada ,
caindo opprimiíTem a todos j antes pedia fe recolheíTem
ao lugar onde elle eílaua. A primeira âdmiraçam dos
Portuguezes foy,que podeíTefaber íofephde fua chega^
da, & onde eftauam,porque vinham caminho encontrado,
huns de S. Paulo , outros de S. Vicente , & diftauam
, ^. meia legoa de matas , & caminhos afperrimos , qtae ne-
nhuma peíToa dos dous ranchos antes andara ; Ôc feito
conceito, que quem lhe defcobrio o lugar , lhe dcfcohriv
ria também o fucceíTo da defgraça > quclHe arreceaua^
acompanhados do índio que os chamara * vieram ter à
pouzada dos Padres.
2 Foram admitidos os hofpedes com cortezia ;
mas com tal condiçam , que antes de entrar hauiam de c5^
fe0ar-
Li V RoIII CãpitvlòVIITj 179
fcííarfecomo Pad e Vicente Rodrigues ,aííi o fizeram 5 ^^^^^^^^^J*^^
porém hum entre elles entrou fem comprimento da c5-adtx-»cidos. ,k
diçam : mas logoouuio de lofeph, que fahiíTe , porque '^
ram era juílo que pella culpa de hum, pereceííem todos. ■ « :pf
F orça era que entendeíTem eíles homens , que algum defa- EíFcito quc^í*
ílrepréuia. £isque alta noite defcarrega huma tremenda^o""**
tempcílade.defuriofos ventos^ôc raios que parecia fearrui-
nauamaqucllas penedias, &voauam defpedaçadasasaruo-
res mais fortes •• Paííou a noite , proíeguiram os hofpedes
íeu caminho , & entam fe vio claramente o de que fe ar-
receaua lofeph 5 porque chegando elle , ôc. os compa-
nheiros ao lugar onde queriam agazalharfe aquelles ho-
mens a noite paííada , acharam que tinham caido com a
fúria dos ventos, grandes aruores , & feito em pedaços a
choça ,cm quepretendiam dormir.
3 Acompanhado do mefmo Padre V icente Rodri- ^-i^,^ j^
guês , ÔcoutroSj caminhaua de S; Vicente pêra a mefma humMiiiai
Villa deS. Paulo .-quando depoi^de andadas. fete legoas
daqucUes montes, chegando a huma hcrmida , que- ^^^^^^^ ^ ^;
riam dizer MiíTa, por ferdiade fefta ; & fendo que hauiaitT-w./^;./.
todo o neceíTario pêra dizella, falcaua contudo o MiíTal
Ficaram fentidos vendo que perdiam occafíam daquelle
fanto facrificio , por refpeito de huma fò peça Porem
lofeph, que nam fofria defconfolaçoens em.feus c5^
panheiros , fe oíFereceo ahir bufcar a S. Vicente o MiíTal*
dizendo que tiueíTem bom animo , que Deòs queria que
difeíTem Miíía. Foy , & dentro em meia hora de ittmpo í
tornoucom elle de baixo dobraço tôc o que maishcyqtie
nem lofeph foyvifto em S Vicente, nem fe achou me-
nos oMiííalda fanchriftia daquelle 'CoUegioy^donde o
tirou. Ou héque algum Anjo foy por elle, ou nò caminho,
lhe adminiftrou o Miífal , como la noutro cafo jardrçoi,o
breuiario. d rríí r^^^ o{câ o nusfiÍÊlc; n
'icnfja Efte caminho de S. Paulo era outra ^im de
fcus aueres 3 como dizia do Itanhaé , & tanto mais ; qua-
■j ^ . Z ij to
l6i,c«1- I,
ílg<5 Vi b À 15 o P. I os E P H A N C H I E T A.
TdaiTfcdcit' totTâiilars afpcro , & Fragofo 5 feria infinicofequiferamos
ârcdráí^^I^* aqui defcreyer rodas as Miííocns defta parte .fcntio hum
vai compotas ,jjg intpulfo diuino , quc lhe batia ao cora çam, & obrigaua
iego»snoraef hir a S. Paulo , âcoufaque muito importaua. Tomou por
^**íípÔ3iT compaaiheixo aquelle que o tempo lhe daua, ( ôc era hú
jÇí></r. y; '^254, anoço pequeno do gentio da terra , domeftico decaza)
•& atoda àpreíTafe pez a caminho. O fim â que hia eílc
feruode Deos > fe teue commummente que fora rcuda-
dò 5 porque encontrando o certos homens , Ôc vendo a
preíTa com que hia , foram obrigados a preguntarlhe 5
pêra cTide , Òc a que caminhaua .^ Refpohdeo elle a Pi-
ratininga , que anda foko alli o diabo ■, & abraza em ódio
dous homens principais 5 foy certo que nam tiuera nouas
por cartas , ou palaura deftas inimiíidades, nem algum as
fabiana terra , coníeíTado por boca do mefmo padre, dõ-
de tiraram confequencia que fora auifado por Deos : Mo-
ílrou o modo milagrofo porque naquelle mefmo dia ca-
minhando apc , fraco j Sc achacofo^ôc acompanhado
dehumrapasÈ pouco forre* andou quinzie legoas que hà
dediílancia por caminhos tam afperos , chegou duas ho-
ras antes depoftoofor^ buCcou os homens , compoz
fuás brigas , reprimio o demónio , tornou â Teu Collegio,
ôctudo em hum dia. Era tala velocidade defte Anjo em
corpo ligeito,quc era fama publica, que foTaTiflomuiras ve-
zesnomefmo dia jútamente na Villa de S.Paulo,Ôc S. Vice-
te em femelhãtes occafioens do feruiço de Deos , & das al-
mas íaffioconiirma sJem demuitos * feu ordinário compa-
nheiro © l^adre VScénte Rodrigues. - ^ - ' ; . j
Mii.gre áà -5 Outra miflam j ôc maiof tfíâratiitíiâ.'^ami*
agorcm vi/ *^hatia Idfqf^ aquelks íerranias aíperrimas ^ chamaílas
nho. Paranampiacaba , pêra os campos de S, Paulo , hiam de
proc. r. companhia com elle -mais íincoreculares,( que a todos
f.iy.Tei.tcM. agafalhaua o bojo de fua charidade , ) era fragofo d
f/. jo8,/í. 8 caminho , andauam amodo mais humano , que na mif-
íàm antecedente , & poferam três dias na jornada5 leuauao
configo
LivroIIICapitvloVTII. i8í
coníicTO pêra matalotagem hum cabaço de vinho , que por
efmola lhe hauia dado humNicolao Grillo, defte bebe-
ram todos eíles trcs dias ao jantar , ôc a cea , cada qual
dos companheiros , & acabado de beber em cada meza,
mandaua lofeph tornara encher o dito cabaço dagoa, ôc
fe achaua melhor vinho , que antes : pubHcoufe o cafo i
& era celebre naquelle tempo a conuerfam de agoa em
vinho do Padre lofeph , nam huma como la a de Chrifto,
cm Cana de Galiléa , mas muitas vezes feita;
6 Vinha decendo jade volta da mefmà ferra -
nia , ou foíTe dcfta , ou de outra miíTani , acompanha-
do de muita gente : He õ caminho , alem de fragofo i
cheio de precipicios profundos , donde be necèlfario
andar com grande tento , porque ham refualemos
pés. Eis que nó meio deíle cuidado veftefe o Orifon- i^,,,iiihacâ
K de tam efcurà ferraçam dencuoás, quenám fe viaÓ m-j;-];^'^^
os companheiros , neín acertauam como caminho , antes r.gò por mão
desfeitas as nouoàs em huhia horrenda tcmpcâáde ^araiea*'^* ''&'^*
caua total ruina dáquelks picos altos. íicaram todos cheios^ ..s.f.?-
de pauor : porém lofeph pofto ernoraçam , pedio à Vir- &F.c.r.f:
gem Senhora NoíTâ , que-foíTe fuá gaia eni tapca confu-
lamj aíTi lho concedeó 3 porque de imptonífo fofpcnfa
àtempeíladeviram^^uenO arfe hiâ abrindo huinár como
via de luz, quelhe moftrauá O èamihho.pèilo qual andando
chegaram íeguroá áo pede fef râ/>í ^ ''^ijnaoj £ffnrjpni..^j
7 Vindo por hum rio aabai^O dos canapíD^.de 5.^^^^.^^^^^^
Paulo 3 corria ellé ápreíTado , '& â ícanoa ensaie ^inhá Cano. que
* ^ í. . t ' ■'í ' ■ . n ao podei ao
era fraca > feita de cafqua de huéii âruore , Encontrou r^i^ender
humpao duro, que cftaua fixo nõ íundo dá lagoa ^ ^mui^^sindos
comohiá efquipadacom força , p^nétrowaTfiroa^Ôc Ihc^^^^^^^^
fc^hu grande buraco cõperigo de fealàgaír''Q»iiferaõos ín-procF.f. iii
dios fufpendcr a canoa^pofto qué muitos >; Sc 'tobi^Gs^imm
pòderam : Porém lofeph ch€goii,pd^lheas iiiaÕj;<6cco-
ftas , ficou fufpenfafem fazer hámá gota dagoa iCoannaf-
fomibro de todos , efpecialm^en^e ift^s Índios , íque tem
i j: Z iij pêra
Cbedecélhe
as Cl bras.
182 Vida. doP. Iosiph de x^nchieta.
perafi , que fam os Hercules das for<^3s de braço, nam fò
às partes íobreditas , a outras muitas fazia miOoens , acõ-
panhado femprcjora de Padres ,ora de Domefticos , ora de
Braíís , tcftemunhas todos de feus prodígios maiores , quã-
to era maior a miíTam , & quanto mais interior das bre-
nhas.
8 Noutra miíTam encontraram os índios que o acõ-
paniiauam , com huma cobra , laracaca por nome, peço-
nhenta a maneira de bibora j lançaram a correr fogindo,
que andam nus, ôc facilmente fam mal tratados de fua pe-
çonha maligna. Porém lofephenfínouíhes a confiança que
deuem ter os qucferuem a Deos, chamou a cobra, obe-
deo efta , veio à fua mão, & viram , ( couza efpantoza)
queafagaua , & regalaua aquelle bicho fero 5 6c juntamé-
te tomou occafiam de fazer pratica aos Brafis ^ que nam
pode hauer criatura tam fera , que nam obedeça á pote-
cia do Creador. Acabando a pratica , lançou huma ben-
çam fobre a cobra ^ & a defpedip com finais de amigo;
Outra occaíiamouue, em que omefmo companheiro vio
outra cobra 5 fogio delia menos contente , mas o Padre
deteuefua preíía, & chegando â cobra lhe poz o pé em
íima , como zombando delia, conuidandoa a quemordeíTe,
& vingaííe aííi os aggrauos de feu Criador, torceofe, virou
a cabeça, a huma , ôc a outra parte, mas nam oufou mor-
der a quem a conciencia namremordia ; ôc ficou enfina do
com iílo o companheiro 5 ôcamoeftando a cobra , que
a nenhuma criatura racional impeceííe , leuantqu o pé,[
deixoair embora ;Da obediência que tinham os animais
aefteferuo do Senhor, noutros lugares veremos raros ca-
zos , que eftes Vem aqui fegundo a occafiam ào têmpo;,
9 Ainda em coufas mui pequenas fazia Deos ma- 1
rauilh as grandes por feu feruoloíeph, vinha hu diade S. Vi-j >
cête em huma canoa,ôc defembarcando co,ntinuou,a jorna-
da por terra algumas legoas,em companhia de hú Aníonio^
de Souza , indo fempre diante, fegundo feu coílun)epprt
fua
m:;ían-
1 1 V R O I TI. Ç^A p I T V L Q y 1 1 T; ;r i^t.
fuallgerciza; chegado à certo poílo ^ efperou porc]Ic,quc
vinha mais de elp.Ko, & nefte lugar achou Soura , que ^'^^'^'/•^»
1 V r r n ■ '^* perdida.
lhe faltaaua huroa faca ^quc contigo . trafii , & eítimaua,
moftrouíe íentido , & rerolueole lorYíar em bufca dcUa tPm.B.f.^i:
dizendo , que era de preço , & que fua Keuerencia fpíTç
embora íeu caminho .- porem lofepb^ lhe diíTe , ja que"
ides , nar^i vos canfeis muito chegai at^ tal parte, dan-
dolhe o final , que ahi a achareis , & voltai logo, que ef-
pero por vos.Foy,& no mefmo lugar aííinalado achou fua
faca, com erpantógvande, porque íoftph viera diante r,
òc era impoíliuel fabcr por vianaçiaral:Qnde cairá. Pare-
cem milagres eftes efçufados , mas eram acertados os fins
porqqe Deos os fazia , ^ ficam fendo líiaioresas rnaraiii-
Ihas , onde hé a matéria menor.
IO là mais neftas tam frequeiitçs mifens, , ar^doUj^
a caualo , nem ainda em rede, coftume dp Braíi! íi^^ou* 'aj^o>
femprq apê, com feu bordam na, mão 5 §c: pofto^Víçr"^'"'"^''
começaua os caminhos, calçado , çm^ paffaadp lugarfSiPm.
públicos de gente , fc defealçaua logo, ôc hia a pç défçal-
ço Seu caminho era com tanta prçífa , quer por praia,
quer por defertos, por mais fragofós 5 de afpçros que fof-?
fem, que os mefmos índios criados çm exerçicio, perpetuo
fe admirauam , dizendo que parecia quç voaua 5 & era
publica fama entre elles , quç ficandofe muitas vçzes ajras
regando , ou orando , dizia aos companheiros , quç fof^
íem andando 5 ôc quando cuidauarw que tinham andado
muito efpaço , & queriam efperar por ellç, râcbauam
que hia adiante. Por eíla C3uza,de feus grandes; eaFpifího-^
trafia os pés cheios de callosafperos. A môir parte da noi^
te , quando defcançauam os outros .gaftaua emítiatocõ
peo5 , enchendode ais amorofos aquelles campos, moní es.
5ç bofques, Eratam grande fua charidade comos compa-
nheiros, qqe em tempos frios de geadas , ôc neuesi. quenê-
ílas partes de S. Vicente fam ri^orofos , andaua acfildêdo
fogo , fazêdo brazas , & metendoas de baixo das r^des dos
Indios,porque dormiffem aliuiados. C A ?l
Li 9^l4)~í-3<.
l8|? Vl^A ácP P. loSE PH A N CHI E T Â.
5fjp t sIÍ31f)jq 0oi3qb , ofioq on^S e
uIk
;£APiTV,í.pix.
Defcripçírn
dos Moí-:.mo
mis.
BacmUerfamloíMaramomn Vicente; &
hnm Ç^M^ÂÍi^^^ ^^^^^^^"^^^^^ ejlageme lhe
lá 3íip ; Ggk mloiacomeceõ a lõfepb.
á rioàtras partes deftahlíloria temos dito ,
Corno alem daquelles índios mais dóceis ^
que tem lingoa commua , Ôc habitam junto
ao mar em toda a cofta do Brafil , há no
interior do fertam , grande multidam de
naçoens , ou efpecies de gente mais faluagem , a que cha-
mam Tapuyas , 5c quer dizer faluagens : Faliam diuerfas
iingoas , ôc andam pellos campos , brenhas , & ferras ,
como a bandos à maneira de animaes filueílres. Entre e-
íleshàhumanaçama que chamam Maramomis, que ha-
bitam especialmente a Capitania de S. Vicente, ôc fe efté-
dem por huma parte duzentas legoas pêra o fertam , &:
pêra outra chegam à Capitania do Efpirito fanto , quaíi
outro tanto. Tem lingoa fácil de aprender , aos que fabe
a geral da terra ; Andam nus , como todos os outros ;
tem fuás Aldeãs , ôc roçarias de legumes , milho , abo-
baras , mandioca, pofto que dellacuram menos ^ pre-
famfe de nam comer carne humana , tendo aos quca co-
mem por mãos : nam furam os beiços , ôccommummen-
te tem humafó molher.Foram íempre amigos dos Portu-
guezes, chamamfe feus parentes 3 & ha experiência que
podendo matalos a feu íaluo , o nam fazem: nam trata
cila gente decriaçoens, porque tem feguraem feu arco
a caça do mato , ainda mais fagaz , ôc ligeira 5 & vem a
fer cila amor diííículdade deíua conuerfam o andar fem-
pre pellos matos feitos caçadores do que ham de comer:
Ht."Cí ' ■ ■ ■ . -r^^^i^ A
LivkoIII-Caí.IIC.
185
A conuerfam deíla forte de gente, teue o principio ^yjhíòt
queaqui direi , porque mais realcem as traças de Deos.
No tempo em que loíeph andaua no meio de feus traba- Proc.
Ihosde Firatininga , fendo Irmão ainda , caciuaram alli|jj^
os índios hum deftes Maramomis, ôc quizeramcomeilo
cm terreiro , com fuás fedas , & ceremonias , que o gcn-
tilifmolhes enfina .acudiram os Padres , aplacaramnos ,
& fizeram com o principal delles , que o vendeíTe a hum
Portuguez , que o trataua bem 5 achou contudo occa-
fiam , fogio pêra os feus , onde efteue vinte annos*
fem maishauer memoria clelle, EisquepaíTado todo cfte
tempo, infpirado parece de Deos eíle Maramomi, par-
tiofecom outros mancebos a prouar trato com os Por tu -
guezes : Appareceramhuma hora na praia da fortaleza
de Beritioga , quatro legoaá da Villa de Santos * entra-
ram pella porta delia , foram leuados ao Capitam ^ Ôc logo
aos Padres do Collegio : Aqui conheceoentam lofepli o
feu libertado, & eíle conheceo aos Padres por defcnfo-
res de fua vida Foram bemi traçados, & amigauelmen-
te fe def pediram pouco depois para fuás terras 5 porém
cm breues dias voltaram com boa copia de gente, ho-
mens, molheres, & menino^ , fem medo algum, ptllo
grande dezejo que tinham de comercear cotn os Portuguc-
fes : Trabalhando com finai-S , & geitos por fe darem a
entender com ellcs, té que Deós lhe reparou hum efcrauo
que tinha fidocatiuo em fuá terra i ôc pode fer interpre-
te de fua lingoa com grande pfazer de huns , & outros :
ficaram daqui tam familiares , que deixauam em cáza dos
Portuguezes, filhos, òc filhas, aprendendo a lingoa dos
Chriftãos , que dezejauam muitos delles fer >.& com ef-
feito foram. j:9£ uobnemsurjzairís-j
3 Eíla gente leuou os olhos a lofcph ; foy junta-
mente com o Capitam mor , ôcò Padre Manoel Viegas
ao lugar da Beritioga, a repartirlhes terras emque viueíTcms
Efteue entre aquelles bárbaros quinze dias com grade go -
Aa fto
Entreg
ilado dos Mà
i'"!i
!8^- Vidado P* Ios|pH ANCHi ETAí
íio dalriia compondo íuas çouzas , edifícandolhes Igreja ;
& cnfinando-os j.í^gundo pedia por entaipfua ruftica ca-
pacidade; & jynfamente entre tantas pçcupaçoens , por
meio de hum ifitçrprete fez boa parte de hiini vocabulá-
rio, & arte dalingea iM^rampipi , porem cpi^o fo0e for-r
çado tOFiiar a íeu Cqllegio ^ & pbrigaçoeiís de Reitor ,
encpmmendou o cargo de correr com efías noijas plantas
ao Padre JVÍanoel V iegas.Tompu V iegas a entregarei coni
tal feruor>§ç erpirito,que nenhuma outra couza cuidaua que
mais goftp lhe deífe. Andaua ein bufca deíía gente ppr rna-
ramomis 20R tas , por campos,p9r ftrraniaSjpadeçia c5 ellcs,compadecia-
Manoei Vie- fg ^g feijs ttabalhos , ciirajJaps em fuás enfermidades,
criaualheç os filhos ep npífa rmÇjotiz caza , iprinauar
Ihes juntamente a fié , §^ a li|?go^ portugiieza , porque
foíTem interpretes dps pais , ^etal maneira , que vieram a
cobraríhe amor entranhauel,& nãoCabiam apartarfe delie.
4 Mas como o qgtural d^fta Racarn , he andar
fernpre de ttiato em mato a ç^a. , fr,ui:ta5 , §c mel íiluer
ílrc,(de qtie abundam aquçllis par;?gçns)aiui4 menos efp^e*
Contradições ranças de fu^i conuerrai|i>^ çbcgau^tii aífi feculares » çoxnQ
da conueiíaó r» \- ' r 1- P r » tx 1
defta gente. ■Reugpíps a contrapiz^ep c^i^ ,dGnaaii|i^s,acçpiens^dp Padre
Viegasj dizendo quefe^ai^fa^a de b^}d,£ : que ppdja com os
meímpsAipres trabalhar çop$ ppíros íuÍíqs dpceís , êc ga-
nhar muitas almas : qu,e, aquillp era deitai* a caça , qne Ce
vinha às mãos , Òc andar J>^(cando a que foge , & qy.eal:?
cançada he n^ceíTario metela erti prifarní.ra perder ganhos
feguros ppr çonfeguír ps duuidofos Pprem o yerdadeirjo
zelador das almas , na,i^ peT^ep anin?,Q , dizendo qu^ea car^
godeDeos eftaua a faluaçan^i de muitas , o^upp.yx:as, aci
fcu eâaua procuraja com to,(|as as íjorjç^s Bautizou mui-
tos innocentes que mandou à gloria , & alguns in extr.emis *
& pouco a pouco os redufio a fazer aíTento , & morada
em lugares certos, fem que ja mais fe enfadaíTc dellws
- ainda quando muito faltauam Aprendeo fua lingoacom
grande diligencia , ôc nella treíladou x^M a dou(í^rina
i. que
yA
■mtl
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LiVRoIII. CapitvloIX. i8r
queo Padre lofeph tinha comporta , pêra os dalincroa da
Coita , fez vocabulário copiofo , & com fua ajuda fc cõ-
pozarte da grammatica, por onde pode aprenderfe com
facilidade. Viofe que adiuinaprouidencia concorria mani-
fcftamente com os fuores , ôc zelo de Viegas ; porque
deciam bandos de gentio a incorporarfe c5 osjaChriftãos-
poftoqueleuados defcu modo brauio tornauam àfuafoli-
dam^ Ôc logo tornauam a vir ^ fofrendo fempre Viegas
fuás variedades, ate chegar com feus grandes trabalhos,
afundar muito grandes Aldeãs delles , nos termos deS.'
Vicente , crpecialmcnte nos campos fertis de Piratinín-
ga : Outras nos termos do Rio de laneiro , aonde ainda
hoje fe vem muitos debaixo da doutrina dos Padres da
Companhia , cultiuando, & laurando a terra a modo po-
litico , com os mais índios domefticos, tanto vem a
montar o coílume , & tanto montou a perfeuerançâ de-^
fte bom obreiro do Senhor : porém de tudo fo j prinm-,
pio o eípirito incanfauel de lofeph, que todas, as nações
abarcaua. 'íí1^ííííj(iíiLjuj ííuq , zmnumtifhs -íBnírjía
5 Aqui verh agora bem empiíegaJa a hiftoriâ cele-
bre, jurada de muitas teílemunhas nos proceíTosja ditos. lo^^Tcóin
Partio lofeph huma vez entre muitas a vifitara Aldcapri-'''^"^J^",^'"
meira deftes índios, íituada junto ao forte da barra ,'
por nome Beritioga iDeteuefe comelies dous dias, & Q^-Proc.Tei.tom,
gazalhoufe com o Capitam no mefmo furte. Auia de fr5-X'?r^4/í
te huma hermida deuota da Virgem /pcdio ao hofpede^^^'' 9-
que queria hir paífara noite naquelle oratório > veio de:
boa vontade niíTo , & foy acompanhando- o ellc , & lui
genro feu por nome Affonço Gonçalues com huma vela
aceza , & deixando-o fe tornaram a caza , com a mef-
ma tocha , ficando lofeph às efcuras. Eis quenofilencia
da noite, tempo em que dormiam os mais í-ja- molher
do genro do Capitam vio , & ouuio hum cfpedacuio
fobrenatural. Vio a Capella em que lofeph oraua , cheia
de luz marauilhofa , que lançaua feuj raios por janelas
Aaij Ôc
fani.
Uid'
jgí V iDÃ DO P.í £)SEPH An GHiE ta:
* 5c portas , alumiando toda acaza ;, Sc ouuio mufica dè
vo^es admiraueis , que pareciam Anjos. Defpertou ella
o marido , viram , & ouuiram , & queretido fair , & aue-i
riguarque feria acaufa detam grande contento , começa-
ram a entrar em pafmo , & tremor de membros , que
lhe impedia o mouerfe , & juntamente os detinha o go-
zo da do(jUra Celeftial , que fentiam, & durou nelíeè;
por muitos dias,todas as Vezes que refrefcaliam a niemOriá^
daquellâ Cclcfte armonia. Fizeram aueriguaçam o dia
fc:guintc , fe deixara Queila noite alguém luz na Câpéllá |
òc acharam que namvâffentandorercouza milâgrofà-.-'^^*^
é Vendo loíeph que eílauâ defcuberto o fiiidir*
wndc^^^.V^què o Ceo lhe fizera, & nam podendo encobrir coai^
rezocns > como pretendeo Itio principio ^ pediõ aos dou^;
marido, & molher, com grande inílancia, & mandou com
obediência^ ( por fer confeíTor fcu , & pay efpiíitual ^quc
em quanto dle viuetfe •, hani defcubriffem a vizam , què
tiuefam. luraram tudo o fobredi to, depois de morro , as
mefmas teftemunhas , que foram juntamene de vifía, &
ouuidaj acrecentando , qae tiueram íêmpre por certo fer
aquella armonia do Ceo , porque lhe enchera a altàa de
humgoílo íòberano ; &por aquelle occuíoo modo, ôc
força de ficarem fufpenfos , porque nam foííem aiie-
riguar a cauza. Nem foyefte fauorcouzanouaem lofcph;]
eftam cheios os proceííos de fua vida de vifoens , & rag
ptos do Geo , por mais de vinte ve^es achei juradas cou^*
zas prodigiofas neíh matéria , em feu lugar íe vcramaí^'
gumas. A efte pretence fomente o preíente , & era celef
brenoColIegiode S^ Vicente , fer vifto efteferuodo SeV-
nhor arrebatado diuerfas vezes entre luzes do Ceo , do Ir-
mão Porteiro > &: outros Padres , que de repente hiam a
fcu cubículo»
GAP.
Livro III. C apítvloX:
1S9
CAPITVLO X. •'•''
Varias Reuel^òèm ; '& Tfoftiiàs do niéfmh
tempo.
;;L'iii;(no
ladio-ntúri
I s SÊ lofeph a hum Paulo Rodrigtíes íft^- p^ofctizí «
rador na Villa de Santos , aparélhaiuos morte dei ú
Paulo, & quando ôuuires que Luis Caf úoei °
ro hè ínof tOjfabei que haueis dehir aposel- proe.zf. lo.
le breucmente. Trazia eni- lembrança Paulo Rodrigues ''■^'- ;.';
cfta profecia , quando dahí a aniios lhe diíTe a cafo hurá
fobrinho feu , que Luis Caruoeiro eira píaííado defta vi-
da 5 ficou fufpenío, certificoufe de hum Religiofo , Ôc á- : .t
chando fer aííi , prepâi^oufe, fècebeó Sacramentos, &: ^v^j^
defpediofe da familia , que admii^adòs pr^guncauam a cáti-'
fa , & refpondeo que aífi lhe diíTera léfòph > ôc dencw
cm dous dias morreõ. - - - ^^^ -^ . : ; ■'
1 Decendode S/PâUloVeTfkS. Vícéttt^^^^t^^ ^,
I ^ I rsueo aliai*
caminho fora do ordinário , & veio por càza de hUmtodogentio .
Francifco Velho 5 a efte pedio , que vieííe com elle, & oiiúrrhúhoni
acompanhaíle 5 nam via o homeni motiúo algum de- ^^^^us t>g»
íla mudança , faziafeihe dífíicil largaír fua caza , & cui-
dados delia , & virfe fem fim algum por camitihòs Í2iVú'proc. z f.v»
afperos ; porém lofeph nam defiílio , dando fomeritè'^^'*
a entender , que aííi conuinha em todo o cafo. Moílròd-b^
oefFeito , porque em chegando ao pédà ferra , lugar cha-
mado o Caboatam , paíTou hum índio, que deu pòr nòuas-
que os índios brauos decidos do fercam deram erh fua
caza de repente , & aíTaltaram tudo , matando huns;&
leuando outros caiiuos : O feruo de Dcos lhe dfííè eíi^*
tam , que por iíTo o trouxera configo , porque eftapaíTe
Aa iij de
Profetiza a
morte dontro
homím
Trct Z.f. IO.
:.T>>.
« íSí?
Profeiizique
nô he morto
o marido de
húa nrolher.
^roc Z. IO.
v/tf , & f.li'
Pro/etÍ7a â
morte da duas
criatn^aSé
rof) V I D 4; P o P- í o s E PH b E An c h j e t a:
de aíTalcotam grande, a que na m hauia de poder refiftir
m-^ã^-^:^^^^^^ "^ ^^^^^ ^^ S. Miguel da Villa de S.
Paulo , a tempo que chegou 3a mefma x^ldea hum ho-
mem por nome Ffutuofoda Cofta : Trataua eíle de leuar
huma índia , nam deuia fer do feruiço de Deos 3 diíTe-
Ihe lofeph , deixai a índia Frutuofo da Cofta , ôc tratai
de ver os caminhos por onde andais , que vos ha deacõ-
tecer hum defaftre : A repofta foy de valentam , que
nam tinha medo de ameaças , nem aueria querii ouraííe a
fazerlhe mal ; mas prefto vio > que fe enganaua , porque
na mefma noitefçy morto com morte cruel, & violenta.
4 Paula Fernandes moradora íia mefma Villa de S.
Paulo , cliaua em planto por feu marido , que hauia án-
nos andaua auzente , ôc tiuera nouasqueera falecido em
Flandres j ouuio lofeph as laftimâs da pobre molher ,
confolou a , & diíTelhe ,nam choreis filha , que yoíTo ma-
rido nam he morto , antes em hum tal dia como eíle o
o tereis com vorço : notou odia , & no mefmoteue
^ttj íu^ caza o anno íeguinte omarido viuo , & iam.
5 Caminhaua hum dia pêra S. Vicente, encon-
trou no caminho Catarina Gonçalues com huma criança
ao peito , que elle tinha bautizado 5 DiíTelhe a molher ^
Padre meu nam havofía Reuerencia de lançar huma ben-
.çam aeftâ fua afilhada? Refpondeo nam , antes elpcro
queellama lance a mim daqui a poucos dias,porqueja nao
he voífa , fenam de Deos : ficou a may mui perplexa do que
feria , mas muito breuemente foube a cauza, porque a cria-
ça entrou cm doença mortal , ôc eípirou , confolou-a o
Padre lofeph , & deulhe nouas que eftaua no Ceo , em
companhia da Virgem Senhora Noífa. Semelhante foy o
cazode Breatis Pinta moradora de S. Vicente. Efta mo*
Iher tinha outra criança, pedio ao Padre lofeph , lhe
lançaífc abençam , diíTelhe o mefmo , que ella lha po-
dia lançar a eíle , que ja era de Deos, foj couzamais ef-
tj[) n; pantoza
''rec.Z^f.^l,
L IV RoIII. Cap. X. Í9I
pantofa, porque eftando boa , & iam , naquelle mefmo
dia morrco , deixando atoniros os pais. ^
6 Nam vades à roça , diííe por vezes a hum Si- ^
mam lorge porque no rio vos ha de acontecer hum defa- ^'^^^1^1^^
ftre , & como lhe rcpedííe , huma , & outra vez o dito, qu^fe afogou
moftrou o homepi que íecnfadaiia , dizendo, boa canoa '' ^
tci^bq , nam haja medo que me afogue j nam defiftia p J/^l "**'
feruo do Senhor , que preuiafeudeíaftrado fírp , riem Si-
mam lorge de fuás idas, que nam deui^m de fer do ferui-r
^o de Dços , tp que paflando em fua canoas virançjofe
cila , pereçieo ejle afogado. ^ c :;
7 Nam choreis por voíTo niarido, diíTe à Ca* Profcti7a<?a
lerina Monteira n:^olher de Jofeph MQmo ido ^ofertaó, "'í*'^^ '"""^
. , * - i- 1 • • tido por mor
de quem npha nouas , que era fíjprtp , pc pplan^e^ua cpr to.
rnp a tal 5 nam chpreis qup (rpíTo mando i^arnhe ^líorto,
verdade he , que tiue eu hum (o^\\p , que f^rai frechado <vf""
em hum braço, porem nam he ferida de perigo. Veio lo-
feph Adprno , §c contpii \ .mpj-heí p ,G()iif^p:fpra frecha- rrs^tí x^H
dQ^o braço , no meímo t,empp pm que p fadíç diíTera , -^^^^^
jÔc facilpienrefe curara 5 nias ficaram çrçente?^iíe pfpnho
de Anchieta nam fora n^ti^ral^ pois, a díft^nçi?|Êra de "'^^"^ '\v'
inais 4e cem legoas , ôç ^an? fii}^^ y}^ pgJÍça^qH? i^our
xeffe a i)oua. .o^eI f^^o ^flbTlih lò , ?,oine?> -b r>í!i"'T
3 Çonfeírarahu.mSacierdo,t|e3€pr,çohpj^ê^ilç tyjh^^. „...^^
yindp?S. yicen.tp , fò pprgaiíihar -p lujDÍlep>, jq^^^Q .f;5j d. deho con
dia fetiohapubh,ca,dp .pp,F,€gip,$^a.çpf^^^^
^izendolhe as palaiiras fcguitgtes ,, J^rjaiãp , fâ^i :^jii)ida *'^"^'''^°'
as feridas mui frefcas ; partiafe o homem defconfoJ^p ,p^^^^,jr^^
çhaippuo Ipfeph , & lh,e diíjre^; jquefp^^q? ^c^f^ar ,; por-
que as feridas frefcas aíTife.c.uria.'!?) \Alh^f^dlÍR,'^Pi^ Iht to^r^-^^nc:^
diífera p Sacerdote, fendp in^poííi^u^ir^jD.eijp.pprf^yíanatu,^'"'"'-!^^^^
irai. Ficou o homem marai?i)ha(Jp , ^ çc>moch^m^jip4^ ^a.*!,;!
P,eps, ppz feareuspés,.cp.n?feírpufe cpm ^mn4f> pkgriaVrnoíVmri
de fua alma , ganhou o lubiJep , ^ f>:regoou,p, m&-mih''''^^'''" *^ -^
aOil OJí:?U }h(£l^ú ííiEíUfcu M.Yl^í^«^
Vida DÕ P. Toseph A nchieta.
profetizj que g ^ QUtra molhcf defconfolada por carecer de fí.
hum* tijolher t .^ ,*- • » f i • H l r\\
h* de parir lú lhos , diíTc aífi^ Mana Alurcs, haueis de ter num filho ma-
dko'htdT cho' &: eu volo hei de baatizar. Ficou conts^nte a mo-
bàotizií. Iher^ po2 em lembrança as palauras , do Padre, & a íeu
Preejcf ^^"^P^ P^'^^^ huma criança , & vioque era macho , como
IhediíTera: mas como tanro tempo fe tinha metido de por-
meio , & íc tinham mudado as eílancias , porque elía fe
achaua entam na VilladeS. Paulo , & o Padre na de
S. Vicente , diílantc quinze legoas, nam tratou de pro-
curar o comprimento da fegunda parte da profecia , co-
mo couza tam impoííiucl , Ôc menos importante. Porem
quando mais defcuidada eflaua deíle intento , lhe entrou
pcllas portas lofeph a dar comprimento a fua palaura Ve-
nho a bautizara voífo íilho^ IhediíTe jfoy recebido como
. portento, fez feu oíficio, poznome ao bautizado lofe-
ph , & voltou logo a S. Vicente , caminho de outras 15.
íegoas. '■ , ' ■ '"' íf^^"^^1 *^v"
Rcueiaçam 15 PartlraTòâm Soafcs à guerfa^âos Tamo/os fo-
hllm homem bfe õ Càbíò frio em companhia de muita gente , corriam
nouas comio certas , que foram vecidos/Ôc mortos todos os
que tinham ido a ellà .• Ouuio o Padre lofeph queamo-
Iher eftaua planteando feu marido , foyfe a fua caza na
Villa de Santos, & diífelhe que fazeis .«'íoam Soares vof-
róman<ío-nam he morto , antes vos digo que nenhum
dosqíie foram , & daqui á tresdias tereis nouas certas do
que vosaffitmo. O eíFêito moftfou a verdade de tudo;
porque veio o marido * Ôc foúbefe que nenhum fora
11 Indo paíTandò pellá ruà -Viõ^elotis homens , que
eftauam falando a fecrctas entre fi ,leuadodo efpiriro fòi-^
fc a cllcs 5 pozlhc os olhos , & com efíicacia lhe diííe.
Proc .X/./7
'U
ConKfce O!
penftmento»
t«u..r c^ & bem que fegredos fam eftes ? Lançai , lançai fora eíles
Í£gredo matar TO .» ' _
hnmhom-ni.maos penfamentos , & ide ter comigo a caza. hram os
^^'"*"'*''^"-penfamentos . que eftauam aííentando o modo com que
;pr<,cx/.j8.hauiam de matar certo homem da Villa de Santos , &
juntame-
Aiiifj'. piof?ti
Livro III. C apitvlo Xí lo?
juntamente a niolher de hum deíles dous por mas fuf-
peitas que delia tinha. Ficaram admirados por verfe
delcubertos empeníamentos, que íò Deos , 6c íeus Anjos
podiam faberrÔc comprometidos entre fi, vieram ouuir
asrefoens ^ que o Padre lhes daua , & foram ellas tais,
que hum , &: outro defiílio do intento, viuendo da hi
cm diante amigauelmente , ôc íem defconfíança , marido,
& molher.
12 Foy celebre o milagre , & juntamente pro
fecia delzabelda Coftajmoraua eíla molher no porto came.ts? ha»
de Bcritioga , & tinha feu marido no Kiode laneiro j^^'^''/:'^^*^,,^'
quando a deshoras manda lofeph huma canoa erquipada,rido,&pfeii-
com o auifo feguinte ,• que feu marido o Capitam Ma-^aua^r
noel de Soufa era morto , no Rio de laneiro 5 & que
conuinha I020 , I020, embarcarfe naquella canoa, & naõ ^'°''^f' ^^'
dormir na Beritioga. Reconheceo eíia molher , o que
todos diziam do grande efpirito de lofeph, obedeceo à
rifca , cmbarcouíe de noite , ôc vindo a menham conhe-
ceo o acerto de fua retirada, porque junto com a alua do
dia , rompeo huma chufma de gentio Tamoyo fobre a-
quellas praias, ôc leuaram catiuas todas as pcflbasque nel-
las morauam. Foycafo pubhco , & nororio , donde ti-
raram duas marauilhas , huma foy auifo da morte do ma*
rido deíla molher , que era impofíiuel faber.por aconte-
cer no mefmo dia , no Rio de Janeiro^ diftancia de qua-
renta legoas , donde nam veio, nem podia vir tal noticia.
Outra da vinda do inimigo totalmente oculta , como
cntam fe aueriguou. He força que digamos , que foram
também merecimentos particulares daquella viuua , &
quis o Ceo liurala a ella, deixando a todos por feus altos ,
juiZOS. _Ã;,J jiJ i.Jil^í
13 Duas vezes tratou António de SaauedraJf^f^.P"*^*
fazer viagem do porto de Santos pêra a Bahia , em n
ambas reíliftio o Padre lofeph , a feus intentos , cujoami
goera particular , dizendo da primeira vez em fegredo ,
Bb da'"''^^- Víí?.
de duiis ,^
aiiioSjLuç»,
hú borr.t ido
ÍUCvjtío.
m
Preuéaaten
çam occulta
de hfi homé>
&cafo no-
tauelfobre
dia.
Proc. Bf.}^
Conhece os
penfamentos
de cettos
ho més que
preCendianti
matar aoatro,
õc liura-o
do perigo
•Proc Bf.áfO.
1^4 V I DA t> c5> P.I õ si PH An chiê ta:
dáfeíTúndá em publico , queaquellesnauiosnaírrí hauiam
de ir a íaluaineíito , fentiâ Saauedra fruftrarfe feti dezejo,
mas arrèceaua o fuGceíTo pronoíliGado por hum Varam
que tinham por fàfíto. Efperotí o effeito dos dousnauios,
Íl fov bmi defeftfadõ , porque ambos hum apoz outro
íe perdèrãfti corri ádfliiíaçám de Saanedra^ôc dos que
fouberám a profecia. t
14 Com efte mefmo António Saauedra aconteceo ou-
' tro cazò nótáuel Trazia traçada em feu pêramento hãa fai-
da em gf auê offefa de Deds, & tendo pêra fi queíè o mefmo
Senhora fabia. ouuiohô recado deíokpb,q.ue írtuportaua
fe viffe com elle jaíTiò fez,& diíTelhe conso amigo , mas
feueramenre i que narn conuinha aqtielk faida , que tra^
çaua fazer fora da Villa j confufô ficou Saauedra Ven-
doredefcuberto^nam pode por enram refiílir, deu finais de
que obedeceria- porém nam foy aífi , por qtiíe aquellamef-*
ma noite feguinte poz em e^íecuçaM a ida, naas nam o ef*
feito , queeftaua à conta de loíèphj chegou à porta da
OGcafianidò peccado ^ fobio a huma jàneík : lis que indcí
perà entrar nâcazâ véâdous homens extraordinários c5
duas alabardas , medonhos » ^fíiô poftos em guarda , a
cuja prefença trcmeo de pés> & maÕs^ lembrado bem
do dito de íofeph , inuocoit fuâ ajudâj lançoufe fobre híi
telhado , donde pode efcapârdò perigo aíTas confuzo , 6c
arrependido de fua contumácia, Aodia fêguincd mandoa
íofeph chamar o amigo , Ôclhô cofifou ttídoôfaccedidoí
embora Saauedra , ja fabereis qué hd bom íempf e guardai
os confêlhos dos amigos.
15 Por outra vez Uurou da morte o meífno amiga^'
nâ Villa de Santos , por modo nam menos mílâgrofo^
Eftauà elle pêra partir de caza ao jogo da bola : conhe-^
ceo loféph a tràiçam, que alii lhe tinham armado feus
cunhados pêra matalo , mandou-o chamará toda a preííâ
ôc diíTelhe, Saauedra conuem que namfaiasdaqui : no mef-
mo tempo foy bufcaros cunhados, &coiifandio-os, pon-
dolhcí
mm
Liv rÕIITCapitvlò X: Í9f
dolhes diante os olhos as traças, com que pretendiam ma-
tar a hum parente íeu tam chegado , com tam fea nódoa
de todos; & conuencidostrouxeos^ao Collcgio, & fem
que declaraíTe alli os intentos , os fez amigos cem
Saauedra , ôcfairam juntos paíTeandoas ruas, com paf-
mo dos que fabiam de fuás inimifidades.
í*3 «áf^tíí Ê^í*!' ÍW êí>J£^ £<3>3 í*3 ííí tíí- €«M
CAPITVLOXI.
De outras Profecias , & Reuelaçoens do mefmo
tempo.
Ndavam nofertamdeS.PautohumAO-
cenfo Ribeiro ,ôc outro Irma6reu,& X2Cí-Vilàl^^s\à^
dauam por tempo confiderauel.-eram o pay , '^'^''a"', ^nun
& maydos ditos dous Irmãos deuotos ded^ramorte
lofeph , pediramlhe que os encommendaíTe aDeos,&: '^''''''°'
lhe dizeííe , fe eram mortos, ou viuos ? Tiueram rcpofta , -pr^c.F.fiu
que íeu filho Afcenfo Ribeiro viuia , & dentro de breue
tempo, que deílinou ,fe veria com elles: dooutro Irmão
que era caiado , & mais neceíTario na caza , nam diíTc
nada : nam pareceo bem aos pays eíla furpenfam ; Tor-
naram huma , & outra vez a preguntarque ja fabiam de
Afcenfo , que lhe dizeííe do írmaõ cazado : nam fofreo
o animo do Santo , meter em laftima a feus deuotos , fe-
gundo aquillode S.Paulo , fkj^cít dm malma fua , que
bafta que a pena fe finta no dia em que vem.Porem nam foy
poíTiuel euitala de todo , porque os pays, fixaram em feus
coraçoens aquelle argumento, da fufpenfam de hum >
quando dizia claramente do outro 5 & pofto que nam
magoaua o cazocomo certo , magoaua como duuidofo.
Tudo moftrou o prazo do tempo aííinado 5 porque den-
tro delle chegou Afcenfo viuo 3 ôc trouxe a noua dooutro
Irmaõ morto. 3b ij Os
Tinham os
gentios 'A lafe
ph por
Profeta,
r 96 Vi DADO P. I G SE P H A^N C « 1 E T A ,
1 Os mermos Gejitios veíiçrauàm o cipirito de
profecia de lofeph. Quando eftaua entre elles, tinharn
pêra fi que era Paycgoaçu , que vai o mefmo que Profe-
Troc Ff.i,6 ta grande, que fala com Deosjôc pode tudo , êc tudo fabe 3 a
&s6.proc.x £(^^ conta meteorelhcs acertos e«í cabeça, que mãJaraío-
feph aos laços que aímauam às feras qut; não tiueílé dita, ôc
Profetiza a c a ^^ mefmas feras que nam caiíTem nelles. Entrados deílaopi-
ça que haõ de , 1 ^ rr q ' n • i
tomar. nlão^ ôc da fome que deu iam paílar, & inítigaa mal, vendo
feus laços fruftrados todos bufcaramno pêra o matar porém
o Santo, que a tudo fabia dar remédio, òc fabia quea Vir-
gem Senhora Nofla nam era contente que morr-eíTe, até
nam acabar fua vida ,que compunha em verfo : Foifea
clles . ôclhesdiíTc como fe indo vira 5 ide vofoutros correr
VoíTosIjçosíÔc achareis nelles a caç a que dezejais : aííi o fize-
ram , 6c vieram carregados a mais nam poder , das efi-
pecicsdeanimacs que queriam ipafmaram , & mudaram
conceito , que era profeta do bem, & nam do mal.
3 Na Villa de Santos, fe encontrou lofeph com An-
tónio Proença > perguntoulhe onde hia ? Difife que hia ti-
rar do nauio o fato que nelle tinha embarcado ; porque
eílaua a ponto de fazer viagem , & poílo que muito lhe
importaua a ida , nam era bempartirfe deixando fua mo-
Iheràmorce , ( como fua Reiíerencia fabia ) com a can-
Troc.Ffs^. jg^ j^ ^^ j^-Q^ Ide embora, ide embora, António deProE-
'Vj9, J '
ça,/^ lhe diffe o Padre ) acudi ao que vos he neceíTario ,
quevoíTa molher nam ha de morrer deíla j & quando
vieres a aueis de achar fam , ôc falua Nam quis mais Proê-
ça , femduuidanem replica , fez fua viagem , certo n&
dito de lofeph , & quando veio celebraram osdous , ma-
rido, & molher, a profecia verdadeira que a ambos to-
caua.
4 Decendo hum dia das ferras de S. Paulo , achou
hum índio , gentio ainda, ao parecer valente , & bem dif-
pofto 5 porem emo vendo mouido do efpirito,que lhe af-
fiília^diíTepera o rrmão,c5pânheiro"eíle índio ha de mor-
rer
Affiriua que
nam ha de
morrer htía
molher
que eftiua
Gom a can
dei na mó
Bsutiza lú
gentio, pot
leu. laçara
que ha àç
morrer Ioga
L r V RO 1 1 1. C Àp iT V L o XL igf
rercedcheneceííarío bautizalo : Aírcntoufecom e]le,ca-
tcquifou-o, ôcbautizouo: & dentro em breue morreo :
nam {cm prendas de fcr predeí^inado > pois merecco ter
entrada no numero dos fillios de Decs , 6cfua Igreja por
modo tam extraordinário.
s A outro morador da VilladeS. Paulo, auifou o feruòPreué o inccQ
de Deos, que fe mudaííe de certas cazas , em quemoraua,^^"^/^"™"
porque fe hauiam de queimar : Pareceo duro ao homem
deixar as cafas , 6c com ellas fuascommodidades , namfe^^''*'^/"^
quis dar por entendido , & experimentou o rigor de hum
duro incêndio , que comas cazas lhe queimou quanto ti-
nha ; ôc foy auido na terra por caíligo do pouco cafo
do auifo do Padre, tido por fanto A outro na mefma Villa,
chamado Fruâ:uofodaCoftamãdouchamar,&auirou:que
nam dormiíTe aquella noite emínâ caza , porque lhe auia .í'
de foceder hum cazo grande : nam fe deliberou o pobre
homem , aquella mefma noite morreo de hum cazo defe-
ftrado , com efpanto da Villa , 6c exemplos dé ourrosa
6 Pedialhe certo amigo feu que lhe lançaíTehúa ben-
zam afuacaza j diííelhe,a efta nam , amigo, desfazeia , !„ Jndto.
fazei outra de nouo, que eu a benzerei 5 porque a em que
eftais , hadefer abrafada,faiuos delia, faiucs delia; ficou '^*'''^-
fufpenío o amigo , vio o efFeito , que foy abrafada a caza
no mefmo tempo que tinha dito,
7 Sete annos hauia , que tinha partido grande nu-profed, no
mero dos moradores de S. Paulo , & das mais Villasem ''"'^'^^ y^^^
forma de exercito a fazer guerra a naçoens barbaras j em ^umexcreito''
partes remotiífimas de feus fertoens , fem que dentro f'^?^''^'"
* . _ ^ ' T íc tinham por
de todo eíte tempo, ouuefle noua alguma deíla gcn-niortos.
te 5 ôc comoasoccafioens de guerra fam Varias , 6c na-
qucllas partes perigofiííimas , por remotas , faltas do necef- ''°^' ^'^^'
fario, & os inimigos eram entam fem conto /chegaram os
intereííados a ter por mortos eftes conquiftadores,- em
tal maneira , que acabados os fete annos , acabou nelles a
cfperança de hauer de tornalos , a Ver , & começauam ja
Bb iij como
Pr^uèántrO
19$ Vidado P. losiF^H ANCHiETAí
como de mortos a fazer inuentarios jurídicos dos bens, que
deixauamj &asmolheres , a tratar de cazarfe ,porviuuas
dos primeiros mandos. Doeufelofephdaconfufam , ôc re-
foluçamdeíla gente , porque a proua, em que fundauam
feuscaramentos,&íeus inuentarios, metia em enredos Vil-
las inteiras , nam fendo verdadeira : Recorreo ao Ceo co-
mo coílumaua , & teue por reuelaçam , que aquela
!a gente era viua , ôc que hauia de chegar cedo a S Pauloí
& pêra que coníle claramente a certeza defta infigne reue-
laçam , quefoy celeberrima naquellas partes^ contarei as
prouas particulares que ncUa oupe , referidas por grande
numero de teílemunlias.
Profética 8 No meio da dita incerteza , & defconfíança, dtf-
húi Qioçâi confolada iiuma pobre moça , & canfada ja de efperar , fe
pai. foy lançar aos pés de lofcph , cuberta de lagrimas , &
lhe propor o cílado da miferia em que fe achaua > orfam
'^límÁ'^ de páy , que tinha ido na jornada dita , ôc também de may ,
defemparadà fem remédio algum. Moueram as lagrimas
da moça aquelle bojo decharidade, Ôc diíTelhe as palauras
de Chrifto , í*í?;7^í:/í' ///íí , tende confiança filha , porque
heviuo voíTopay^ôc nam paíTaràm muitos dias, que o na5
vejais com voííbs olhos- Quafí refufcitou a pobre moça ,
deu credito às palauras do Padre , que tinha por fanto ,
certa do fucceíTo futuro que depois vio No mefmo tempo
achauafe lofeph em huma Aldeã de índios chamada dos
Pinheiros, ouuioque huma Índia eftaua em planto lafti-
mofo, ôc prolongado, fegundocoít ume defta gente, ma-
doua chamar, Ôc preguntoulhe a caufa de leu plantos
refpondeo , que por feu marido , que hauia fete annos ,
que fora naquella expediçam , Ôc lhe diziam os brancos
que eram mortos todos. Confoloua lofeph, ôc lhe diííc,
vai por te diante da Senhora May de Deos , que alli tens,
ôi dalhe muitas graças , porque teu marido heviuo, ôc ce-
do oteras contigo nefta Aldeã Nam foi ncceíTario mais, cei-
fou o planto, ôc ficou contente , porque todos.aíli Portugue-
Li vil o III- C AP XT. hç
ks , como índios , fabiam de crpirito de fua profecia, Ôc
a íeu tempo vio o etfeico
9 Na mefma occaííam tinha tratado de cazarhõa
molhcr com o meímo pretexto , qu.: era feu marido mor- iL^queTe'
to na guerra j foubc o íofcph , foya fuacaza. auiíou-a da ^'"^ leuma-
parte de Deo'5 , que tal nani fízeííe . que feu marido erá " "'
viuo , & cedo eftaria com ella em fua cafa : Parou , eC- Proe.F.f.6^.
perou o prazo aíTmalado , & logo veremos o eíFeito. Era
contudo a terra grande , & muitos os intereíTados nos qué
tinham ido ao fertam , & nam podia chegar a fama da
profecia de lofeph a todos : Hiam fazendo inuentarios , & prec. f^f.si.
tratando cafamentos por muitas partes , na conformidade ^■^'"
referida : Foi neceflTario fubirfe o feruo do Senhor , como
Profeta deDeos ao púlpito , à prégarlhés, ôcamoeftalos
de fua parte , que paraíTem com tais inuentarios ^ & com
tais cafamentos , porque eram nullos , que feus mari-
dos, & parentes eftauamviuos no fertam , ôcataltem*
po chegariam áqaella Villa , mas que era neceíTario coti-^
tudo encommendalos muito a Deos, porque reftaua hu
grande perigo de paíTar. Pararam todos corrt a voz do
oráculo do Ceo , chegou o termo do tempo deftinado,
viram todos com commum applaufo â niércé de Deos
profetizada , entrando na Villa viu0s, & sãos os que e-
ram tidos por morros 3 & fouberam deite k- certeza dá
circunftancia do perigo , porquê diíTeramqUciío cami-
nho foram acommetidos por graíidenunierodé bárbaros
que cmbofcados os eíperaram , Sc ffiafarama maitos.
Cafo foi efte notório em S* Vicenoe , & fazerá dclle me- "
<^am tãtas teílemunhas,que nam podddeixaf rezáo de dtiai-
dar , & he muito digna de notar aqui a fegurança, ôc
coherencia , com que poYUmss^v^m\ âcxróún tanta rc-
íoluçamdiíTefempreo meímo na fubftâficía, iÔ£ nas citcã-
ftancias do fucceíTo , & como aquelk /qite; em to-
das ellas era aíliftidodo mefmo, & Vniforme efpn-itD, qtre
nam pode faltar. Porém refta aiiida huma: ciicirnftancia
notauel
hvnSÍ
aL 2'73lujO
/[.'LSif
ifi
É
?roc X.f. 69
Tem reualj-
çara que eftè
há íadio pêra
morrer, vai
coafeíTiloct"
minho de 18
legoas*
Pm. F.f, 30
200 Vida do P. Iõseph Anchieta.
notaiiel/do efpirito de fua profecia : porque andando fa-
zendo certos aquelles moradores , de que nam eram
mortos íeus miffionarios , achou duas matronas choran-
do, & veftidasdedo ;& todauiaconfoloua eftasdediuer-
fa maneira , porque lhes diííc , Senhora Maria da Pena .
& Guiomar Kodriguez , cedo vos enlutafles , ainda nam
be tempo ; Ficaram perplexas as matronas , porque nam
diíTe , que nam fe enlutalíem , fe nam que ofizeram cedo.-
ôcfoy ocazo que os maridos , quando ifto dizia , nam
eram mortos , fe nam que morreram pouco depois no
encontro da filiada. A íTi que foram duas profecias, huma
que nam eram mortos os maridos , outra que hauiam
contudo de morrer.
10 DiíTé MiíTa hum dia muito de madrugada,
chamou hum companheiro , & a toda à preíía fe poz a ca-
minho de dezouto legoas a huma Aldeã , que naquella
paragem cílaua ; Reparou o companheiro na prerfa , &
neceííidade do caminho tam longo .6^ tam violento. Vio
que chegando à Aidea fefoy a hum índio de conta , &
muito feu deuoto , que eftaua em vitimo da morte , fa-
lou com elle,ôc lhe diíTejVezme aqui, que venho fomenre a
confeífarte, ôc acabado cftc Sacramento 5 comofe nem o
Padre , nem o índio efperaíTe outra couza , deu a alma a
Deos , confolado ,& com finais de fua faluaçam : O de-
•ílinoqueleuou a lofeph a efta Aldeã, aueriguoufe fer reue-
laçam do Ceo , porque depois de feita diligencia , nenhuns
indicies fe acharam pellos qu ais naturalmente fe podeííe
faber do eftado do índio , & como , auifo de Deos o
tiueram , ôc juraram as teílemunhas que depõem do
eazo.
Corria fama , que ate os coraçoens dos homens
II
Rcudaçíô
doS incécos
ocultos de
hã moço>
conhecia.Quis fazer experiência em fi hum moço , & diííe
a outros 5 eu hei de ver fe cíle Padre he tam Profeta co-
mo dizem , heime de hir confeífar com elle , & heilhe
de encobrir hum peccado , a ver fe mo defcobre, Che-
LivRoIII. C apítVl òXT: 201
o-oii à confiííam o moço ouíado , porem elle foy reprelien-'''''*'^ ^'^' ^^'
á\do,6í arrcpcnéi<la, porque a primeira coufa que lhe diííe o
Tanto Padre, foy liitimarlhe o mal que fizera , em querer en-
cobrir tal peccado , pondolhe o nome , & dizer aos ou-
tros, que o hauia de fazer, com cfcandalo delles. Os inten-
tos do moço conuerteo Deos em bem de fua alma , por
meio de lofeph, porque fegundo feentendeo, fahiodefeus
pés trocado , & arrependido , & com con6ííam verda-
deira.
12 Encontroufe hu dia com Brás Gonçalues morador
em S Paulo, olhou pêra elle,& diífe , Brás Gonçalues. ide , Amoeft» 0»-
idelogoa confeíTaruos do peccado em que cftais Ficou f7r<!^j7pfcí.
atónito eíle homem , porque entendia que era fecreto reu^iooccuko.
peccado, & fez tanta impreíTam nelle o dita , & autho.
ridade com que IhodiíTe , que mudou devida, ôcaffir-
maua que todas as vezes que fe lembrauado modo dã-T^rçcF.f.ji,
quella rcprehenfam , lhe tremiam as carnes A outro dií*
fe , que defiíliííe do intento que tinha de matar fua própria
molher , fe nam queria que Deosocâíligaífe. A outro que vtrio$ cafo
commetera tal acçam graue, que era neceííarioçonfeííar- ícn>eih»iues.
fe logo. E eramauifoseftesfeus,muy ordinários K&rabidos
entre oshomês.Mas fobre todas foy celebre o cazoí^uin-p^^^ pf
te , que aconteceona VilladcS. Vicente: Eftaua certo ho-^À^e^ 80.
niem à morte em huma cama , hauia muitos tempos > pot
muitas vezes tinha feito termo, cuidando todos que mor*
ria , & nam acabauà í veio a fer caufade efpànto emrea ge^
te. Foy â noticia de lofeph ieftecâzo í feioraçam , foy vi-
fitar o doente, & Iheprotcílou, quefizeíTehuma coritóam
bem feita , & verdadeira , peraque Deos o deípàiaíTe da-
quella cama , porque eftaua em peccado mor raL Conueni- -^
eido o enfermo da verdade, & atemorifado da ameaça.'
refolueo confcíTarfe com elle. E era o peccado em que e-
ílaua, grauiíTimo , que hauia quantidade de annos , que
eftaua cafado nas partes do Brafil ^ fendo cafado legitima-
mente em Portugal , ôc eílepeccado encobrira fempre nas
Ce con-
'ai
™í!ilí
fdí V I I>A D o P; I o S t PH AN C H I ET A ,
^' confiíroewsíefte foy g peecado . & a contriçam com que
o confeííou , foy tam grande , que pedindo licença, o diíTe
cm publico , pcra mais merecimento fcu , & horror dos
ouuinrcs 5 & foy coufa notada , queomefmofoy , acabar
cfte aâ:o tam neceííario , que cfpirar aquellaalma , com
pronoftico de fua faluaçam , que dependia de ponto tam
breue, uiii,o:juii^Ui:j:A:Obiio;,2'i 'jí^/í:'^ ■.íu
' li D8 tudo o atéqtii dito , fe deixa ver o modo al-|
to, & extraordinário , com que Deos coftuma falar > 6c
brenrturi^es ° trataf com cfle grande feruo feu , por modos fobrena-
cor» que Deos juj-aej Ôc nam cntendidos , defufados dos outros ho-
tiuua CO lofe o r • r il
ph. mens , por rcuelaçoens , oc profecias , nguras , que cllc
fomente conhecia, & por meio dos quais punhaemcíFei-
to , o que o mefmo Senhor lhe mandaua em bem das
almas, afim de fer mais conhecido, ôc louuado dos ho-
i mens. Onde quer que eílaua: por onde quer que hia em fuás
miííoens , em feus caminhos , parece trazia auinculada a
Omnipotência diuina , à fua prefença , à fuaboca , à íuas
maõs , a feu fato , & aqualquer coufa fua pêra obrar
«r:i3« : procligios Emcfpecial fe ve , que tinha Deos communi-
cadoá Iorephaquélledom,queconcedeo a feus Apofto-
los , ôc a poucosioutro&íaotos , de curar enfermos ,
^ o... como toque defuasma6s,comfua palaura , oubençam,
( aindacom aintençamdefeunome Ioréph,)aque cha-
mou S Paulo, gratmm cmafwnsím*Dcãç dom milagro-
fo era tam conftanie a fama entre a gente, que andaua apoz
cllecom fécomodehumVice Chrifto,^ou Apoftolo pêra
remédio deíeus males ; vimoloem muitas partes defta
lei tura » lemolo a cada paflb em feus píoceffos , ôc veloemos
ainda nos cazos feguintes o que tocar a S. Vicente»
. ':■^^:.■r:.■:n•..;..^-.^.,..^.,v,■^.-
CAP.
mm
É
L IV RoIII. Cap.XÍÍ; 103
CAPITVLO XII.
De outros milagres qrdefeX^em S. Vicente.
o 1 tido por aíías milaarofo o cafo das agu- ,. ,
II I »# II I "jagw MIagre daí
Inas de Manoel Alures Chaues : Viera efte»g"ihasquê
homem em companhia do Padreloíejh da[om'ul'bcn-
da Villade S. Paulo, & agafalharamíe am-í'
bos em cafa de hum parente feu , por nome Balthezar
Gonçalues , chegou o tempo de tomar rereiçam , & Ten-
tados ámcza^ coube por forte ao dito Manoel Alures hã
prato, em o qual de miftura com o enfopado hiam humas
agulhas , que a dona de cafa tinha no feio quando coíi-'
nhaua em hum papelinho, & lhe caíram na panella feni
que aduertiíTe 5 engoliohum bocado , ôc junto com elle
as agulhas , Ôc fentiofelogo engafgado , Òc entrado em
anfia , viroufe ao Padre iofeph,o qual lançandolhe hua
bençam , lhe diííè fomente eftas palauras , efcarre,ôc
bote fora ; efcarrou, 6c lançou fora as agulhas juntas, 5c
o papelinho em que hiam , desfeito em pedaços. Tiueram
todos o fucceíTo por milagrofo , ôc como de tal, correo
logo a fama. n úhi. ■)
i A mefma terra obedecia ao feruõ ãt Déos. Indo
deS. Vicente pêra a Villade Santos , paíTou pellos en^^"^'""'^^
genhos deS. lorge, que chamam dos Erafmos, aqui foyt irade ha
mnportunado de muitos , (^que ja noutro tempo pediram o ''"^'"^°'
mefmo repugnando o Padre)querogaííea Deos que a terra '^''^'^•
doscanaueaes daquelIcengenho^namcorreíTemais, como
fazia todos os annos em occaíioens de agoas, com perda no-
tauel das plantas, ôcfícaíTe fixa & firme. Ouuede condecer
com a piedade daquella gente,poz-fe em oraçam,dcu aen*
tender que tinha feito fuaobrigaçam ;, ôc daUi em diante ,
nam correo mais a dita terra.
3 Eftaua cõ a cãdea na mão pêra morrer na ViUa de SS.hu
Ce ij Nico-
l:gr<if;méte
con fui ben
Obed
ccem os
2tD4 Vida DO P. ipsiPH Anchieta.
BUaude mi ]s[icolao Grilo Gomes , de huma chaga jacorrupta.que lhe
tomaua toda a ilharga direita , & quafi fe lhe enxergauam
por ella as entranhas, ôc fò mediana a teagem da banda de
dentro dos olTos. Chegou lofeph avifuar eftc enfermo,
como coílumaua a todos ,violhe a chaga , mandou-o ter
fé ,lançoulhehuniabénçalbbre ella ,ôc ficou tam fami
que fendo iftode noiíeiâ manhamfeguintcfccrgueo, Ôc
andou por íeii pé,comô fe nunqua tal doença tiuera. Tor-
nou lofeph. a velo , dizendolhe , deíTc graças aDeospel-
la faude , ôc alguma efmola a Nofía Senhora, feio aíTi,
mandou logoofPerecerà Virgem hum ornamento inteiro
defitim carmefim, & humalampadariodeprata.Foy publi-
co o cazo,& todos os moradores deram graças a Deos por
tam grande milagre. \ sfíolj í .
4 Nauegaua em liuma canoa lofeph , feu com-
paíT^ros^fuIpanheiro Leonardo do Valle , Ôc fetc, ou outo índios da
paiaurafax^n. geritioga pcfa a Villa de Santos 5 queixauamfe os compa-
decidos °'nheiros da grande calpa?que:ent fazia , ôc compadeci- -
do delles chamou hum bando de paíTaros por nome Goa-
r^jo!^' ^' rafes, ôc falando com o Capitam delles, quevinha adian-
te, lhe diífepellalingoa Brafilica 5 Eropita de Boyaimo-
rebo. Que quer dizer >fazc parar teus companheiros aqui
fobre nos. Feio aíli o bom Capitam , poz todos em ordê
concertada, ôc foram andando fobre a canoa hum grande
efpaço , em forma de hum pauilham : té que cobrindo o
foi huma nuuem > os defpedio lofeph , pella mefma lin*
goa. Foy pubhco o milagre , juraramno muitos , efpe-
cialmcnte hum Belchior Ferreira como teftemunha de vi-
fta , ou porque foífe também na canoa , ou porque de
terra oviífe , ôc nam fera efte o derradeiro , ôc fó feme-
Ihante. O elegantiíTimo Poeta lacobo Bidermano fobre o
fucceíTo dito no epigrama 120. diz aíli.
Lív hoIII.Capitvlò XII.
iò5
HEfpertjpeterent cum barbara Ittora mjflíti.
Et focijs àgcrfíurtbus Hjnuserat.
llie juum extinão, thuLbecjma. la.mpadís afiu ;
OccuUoque njrítquejiusab ignecaput,
QuaJijF inprora ,/í c^uam dar et angulus vmbra j
JSuLlafed inpro ya partibns ^mbrafuit,
QjiAjíjt tnpuppt , níhil njmbr^ puppts habebat^ .
Sumrni íed njrebant folis , GT tma faces,
His Cíipiens Anchieta malts fuccurrere^Çolami
Aeraper medmm tendere ^idit auem ?
Vtdit etfoctas , att , i , quare cohortes ,
A 111 gera que redux cum legione njeni, o s f j p
Diãa probaiiít auis^ celenque ciiatior Euro-; ^ '
Cognatum properat , quArerejvp^a gregem,
Aítllecjue mox focíjs comttata rtuertitur aits ,
Adtlle fequi njipi^ mlli freire ducem.^ < '
AlUle fuprai^ totide,jpixtaque^i^fraque\^olabU^^
Omnís ad AnchíeíAtuifbajv.qcata preces.
Et ftmul expan/ts faãaJ^eftudine pe,ms^ ;;-r
í) efuper in toftas incubuer^ r^Us^r - í r b í r -^ '
Mtproculmde d tem > ^Ipicem pepulere diet»
Debile dum mçlts conderet 'vmhra caput^
Sctlicethufièrent, ^tcanopea repente
Anchieta artíjices yejfe caegftaii,es>
5 Fallauâ com certas molheres deuotasdío CoUe-
eio na Villa de S. Vicente , & cnleuadaseftasna pratica, *^^. ^"* ^'
r ri * I r 'i^^ torna
cíqueceramíe do pam quetinharn a cozer no forno , ôcpamqueimi;-
quando acudiram acharam que eftaua queimado. Eram pOb";^?'""^"'^
bres ficaram laftimadas da perda , recorreram ao feruo
de Deos , como aobrador de milagres , propurcramlhe^p"^-^/-3í-
feu defcuido , & o cíFeito delle tam cruel nam ouue mi-
fter mais 5 entrou na cafa , onde eftaua o forno , ôc che-
gandofe aporta delle lançou a bençam febre o pam quei»
Ce i]j mado
én-
9
2bS V I D Â dV P. los É P H A N C H I E^f A,
mado , ^ loCTofe tornou moUe , ôc bom , ôc como de
qualquer outra fornada.
Sar» húa en ^ Eftaus cm cama Izabel Rodrigues moradora da
re2™rVhVo ™ íiieíma Villa de grandes febres , que a moleftauam 5 foy vi-
Euangdho,&^ j^ a charidadc<le lofeph , que de todos cuidaua, & fò
roíofobre a com rczar hum Euangelho, ôc porlhe a mao na cabeça,
*'*^'^*" a deixou de rcpentefem febre , nem mais lhe tornou por
Troe. S/.68. krgos annos , com admiraçam dos prefentes.
7 Em hum dos proceííos tirado cm S. Paulo por
íen/rfl!rc«cniaíidado dofummo ponrifice em ordem à canonifaçam
. hotteiht». ^iepoem com juramento hum Matheus Luis Grou , que
ai figueiras,& vira com fcus olhos , lendo moçoelle , oc outros muitos,
vu«aspr- ^^^ ^ p^j^^ lofeph, indo vifitara caza de S. Paulo, ôc
chegando fno termo da Villa) a hum lugar que chama5
prccFf.jS. ibirapuera^ahortellã, que cftaua nofitio , onde foy rece-
42.jkfso.&hi(ào, & pizara com feus pes, florecerà em lua preíença a
^^* viftade todos. Eíle milagre que de poucos Santos felé ,
foy celebre em todo S. Vicente > confírmaramno em vá-
rios proceííos muitas teílemunhas á margem eiradas , que
foram prefentes , &c o viram. De huma Princeza fanta
chamada loanna , naVilla de Aueiro fe conta , que feca-
ram as flores, Ôc aruores à vifta de feu corpo defunto ;
Porém que floreceíTem , he milagre maior , & poucas
vezes viílo. -^^^w- ^-
8 He celebre hèftàs Villas o cazo do anzol pregueiro
.0 qual cngolio hum menino , andandando folgando com
'%*íc"ergo"' outros , que queriam tomarlho , metendo^o na boca , pe-
^'7 ^oTfu"* ^^ efcondelo,incautamente o leuou pêra baixo /& íe ihe
btnçam. atraueíTou ua garganta , ficaudo quaíi afogado. Nefíe e-
ftadoo leuou fuamay affligida ao Padre lofeph , o-qual
^7^;c.x/.* mandou que o aprefentaffe ao Senhor na Capela da Igreja
>4. que alli tinha o Collegio , aonde foy com alguns outros
Relicriofos,& vendo o menino quafi morto, diíTe fobreelle
certas oraçoens , depois das quais lhe lançou huma ben-
çam , ôc fem mais outro algum remédio , o leuou a may
fam
manctrbo '\n
nuocaÇím.
LiVRolII CapitvloXIH lõr
fnm , fcm impedimento algum, louuadoreja o Senhor em
feu íanto : ella , & toda a Villa de S. Paulo , & Icgoas cir-
cumucfinhas o viram 5 ôc o juraram em feus proceííos
muitas teftemunhas.
9 Creceo omenino chamado depois Toam Gago ^Difauicíhú
juntamente naidadade,& deuaçam do Padre lofeph, a '
<]uem tinha por fanto. C hegouaíer homem, ôctcue hum
genro por nome Hieronimo da Veiga 5 Gontrahio c([c vroc.r.f it.
(indo ao fertam hum , &c outro) huma doença grauif- ^'^ '^*
fima, & no lugar em quefe achauam irremediauel 5 por-
que huma tripa fc lhevoJtara>& deranôcomeuidenterifco
da vida , durando o impedimento ja noue, ou dez dias,
òc checando ja a nam poder falar , nem comer ^. com os
olhos , & dentes denegridos 5 aqui onde faltaua todo o hu-
mano , aconfelhou o fogro aogenro , que tiueííe fé viua,
& inuocaíTe remédio do Ceo, por meio , & interceíTam dos
merecimentos do Padre lofeph de Anchieta , noutro tem-
po , ôc em femelhante aperto feu bemfeitor. FeUo aífi
o mancebo atribulado , ôc com tam bom fuc ceifo ,
que por meio de huma pequena vntura, qe lhe applicou em
nome do Santo , de repente fe achou fam, ôc bom de todo.
CAPITVLO XIH. 7«oíÍ3d^
Outros milagres fsnrelhantèi,v, cscfsSfi,
■'■\
;/ :.: f ;
»;.i
:-(.
CHAVAsÈem grande aíflicçam Anna Ri- ^*'» lú^cni
beira , chorando ja ahum filho feu de dousa^^st/J"!"
annnos , que daua por morto , & de cuio ^"?^''^°'^
enterro trataua. Neíte eftado recorre ao P.profc^z^ que
Iofeph,pedelhe a may triíle que lance humâ bençam,& di- t^tl^
ga hum Euangelho fobre ellej fez-fe diííícultozo, dizendo^
daixai , deixai hir pcra a gloria efta criança. Porem' ''''''^•^^;- '
eram
VièÁú<y P. lòsEÍH Anchieta.
ttitíí pttíhòt€s é€ mM , tomou a pedir com inftanda ;
cornpádeceofc lofeph , chegoufe ao leito , falou com o-
íncniíiotorttócotii home grande , & pcrguntoulhe como*
cftaua ^ Riofe a criança pêra elle, como fazendo fcíla ; en-
tâíTifeViròdo fertrodò ísenhor peraamay,&: IbediíTcvos
de2ejais que vrua, pois Vede que nam vos de qtiando m^aior^
álrgumdefgofto gíandé: re2!ouihÊ o Euangêlho,lançoulheí
fuabençam , & logo no fhèfmo tempo moílrou qut queriáè
mamar , & fícoufam. Andáramos tempos. & chegando
a idade , fòy recebido ná Companhia , porém nam per-^
feuerou nèlla , & tornou defpedido a cazade feus pais cõí
defgoílosgtandêsiqúédàhircrultafatti, por ferem dcno^
bregeraçam, Ôc téremo ca^òpor déàhonra , em comp ri<
mento do que diíTe lofeph. ^
2 Ho mcfmdèfíadodé doença grauc tinha em ca-í
Alcança f.udé^à Ji^^i^j fjç(afua[(yarti Sòarts morador da Villa àc S.
"õça"p« *' Paulo , hâuendo finco dias xpt nam podia kuar fuftento
í:«^t^í^"al2um5animouá oÀitò ctre tiueffe fé , & tezaííc fmcò
fuis Padre noíTòs, Ôt útitò Áút Marias por humas contas que o
Padíe lòfdph lhe tirihá dadt), pedindo ftii âiixiiio 5 feio aP
fi , & déffeptíite atâbâíido a vitima Âuti Maria , íe achòtí
fam ,pedio de comer , & pouco depois feleuantou da ca*
maj a imitâçam deftâ, òUtfamolher tia fua por nome Iza.*
bel Soares,vehdôfètmopi)f ^'íTâhi íèmelhante, pedio as c5-
tas,ôc refando os mefmos finco Padre noíTos.ôc i\ue Marias
rccebeo peífeità faudl. €afbs àríibos que auíuaraõ a deua-
çam do feruo deDeos naquclla caza , & parentella toda.
Sirahum. 3 Em mais cuideute perigo da vida fe achaua na
ih7iher de hflri,ermâ¥illa Maria Cáftàfihái ^ôiti h&ma criança mbrta
dep^rríomde trcs diasi & ja malch^it^òíá > átiTautíràíla fem pódefpa-
fa. ptefcnça ^-^.^ ^^^ ^^^^^^ ja Mttir^KSs íf^cf à iflb j íièíté eftado quando
pm. f.f. Ti. cftaua cheia a caza dê pàrénfcèís á défpeditíè delia , chegou
^roc.zf.9. lofeph , cuja deuota 'èfà à ^tfeíhia , diífê a todos qde fè
afâftaiTem , p05£-feÈmbr€ttb ôi^àçàift, diái^tèdehum Cru-:
eifi^o i ôc bgõ ert<íòhtife^fité latiçbti a ctiaáçá morta , ôt^
ficou
Li V R o Iir- C A P X TTT. 209
ficou cila viu a j&boa bradando a todos os prefcntes ti es
vezes , milagre , milagre , milagre. . ^ ^^ ^ ^^^^
4 Corria fama que reluícitaua mortosfo cem fua ^ò ó^u ^^
prefença. Diziam que na Villa de Santos chegara a caza^*^'''^^** *-
de hum Teu conhecido Manoel de Oliueira Gago, a tem-
po que eftaua chorando , & amortalhando huma filha p^oe F./.gs.
fua, que fizera parar o planto , & ofScio trifte, arefuf-^^'^"^*'"''^*'
citara com fua prefença,deixando a família cheia de alegria,
6c que o mefmo fizera com outra moça de Diogo Mo-
rim Soares em femelhante adOjôc com íemeihante cfpanto.
Parecemfe eftas acçoens com asde ChrifloSenhorNof-
fo , nam efta morta cíTa moça , mas dorme 5 & moftram
a arande facilidade , que communícara a eíle fcruofeu, cm
prodigios tam grandes :, como íe o mefmo fora defpertar
do fomnoâ vigilia,que da morte a vida.
5 PaíTou por certa rua de Santos 5 foy chamado s 5*^"'^,*
a c^zade outro conhecido , a tempo que chorauaa mor- come toque
te de huma criança de peito , que eftaua cfpirando , por*^^ " ""* '
nam poder mamar , hauia muitos dias 5 confolaua-o o i,õ-Tr»c.zf. a$
panheiro do Padre , dizendo quehiapcra o Ceo, & nam
hauia que chorar , Porem lofeph compadecido , tocou
com o dedo os beiços a criança, a cujo toque dcimproui-
fo , abrio os olhos , tomou o peito , & ficou fam.
6 Indo paíTando por outra rua , ouuio o planto ^'J^tn^tho
de huma familia , que a altas vozes chorauam como de- ^^^' )» «^ ^^•
funta numa matrona , chamada Innocencia Dona , en-n.aó-
trou na caza , mandou que nam choraíTcm , porque nam ^"^^^^^
hauia de morrer j tocou a com a maõ , lançoulhe huma
bençam , & deixou a liure do mal. s noutr*
7 Eftaua outra molher de parto hauia quinze dias, "^°'^^"*^^
apertada de dores, ôc com graue perigo 5 foy chamado p^cfiçi"^ «^é
lofeph , aplicoulhe a mão , Õ<: de repente lançou a crian- ^'^" "'*°''
ca , ôc ficou liure do perigo. E era tal a fc neftes cazos * ^ r^ t
que quando nam podiam hauer a prefença, & mãos de
lofeph , baftaua fò o toque de qualquer couza fua pêra
TT j D á-u p^ r .grandes
í; ^
!Íi
ifiii
m
m
Com hú bar
rcte feu dà
íaudeamuí -
tos de dotss
de cab.aa.
J'oc.
froc
lio V l DA^D O 'P.I O SEP H An (ÍH lE TA.
i^s^^òcóoToB^^"^*^^ tfípcitos. Sam Vários OS fucceííos emfeus proceíTos
que de hum^ cm os quais fc moílra quc í6 com huma carta efcrira de
""* í'*- fua lécfà vtiueraiti pavtÒs felidííimos molhere^ diíFerentes
Troczfi^. que^eílauaniern perigo :ltiliana de Sòufa, Maria Ma-í
^^^^'^'^^chàda y ^ Vidoriá Pthtâ- na Vílla de Santos , ôc outras
muitas^ias ^demais Víllas. - '/-r
8 Era couza tãbtm mny ordinária faz eremfc furtos fa-
tos de couzá de Tuas aífàiás , que applicauam com eííeitos
marauilhofos Còmltàiíi barrete feudcfte modo hauido,
x/u ^«foramliures de dorès^^de cabaça muitas pcíToas , que as pa-
•^'t>;;^^^c^2í^/fô^^omo pèr'coín fé.
9 Paífandò cíertó dia por caza de Maria da Gofta
Dà faude* ou moíadofa cm S.Paulo.pèrèuntou quê he de voíío marido?'
Uo hor>« cõ n r J n i o 11
fu* prefcnçi Keípondeo quc eítaua doente em cama , oc ella , & toda
rarhúEaigc^^.^^^^ ^^'S^^^ com feu perigo. Ora nam vos agafteis^
ihaporf.u diíreIofeJ)h , que nam teáreis hoje fèm elle àmezaj ficou
companheifo^j^g^^^ molhef , porcm Çcrplexado cíFeito , ôc efperan-
do que foiíe c!Ié vifítaló , vio que fomente chamou o
companheiro ,íjue era oiítro Sacerdote , por nome loão
Bautifta, & Ihs ^liíTeVà voíTa Bcuerencia ao enfermo em
nome de Deos, Sc rèzefobre elle hum Euangelhò de S,
loam 5 nam fedaua por eátendido o companheiro, mo-
ílrando que feria de liiais efficacia , f e elle mefmo foíTe,
& rezaífe .- Porém lòfeph tòrhou á fegúndar , que foílc ,
ôc rczaíTe oEuangelho 5 ttam podia deixar de entender
que haíiia mifterio , mórhiente áuendolhe ouuido , que
a molher nam cearia à noite fcm feu marido 5 viofe em
graue empenho , obedécéoi Sc foyj & cm rezando o Euan*-
gelho fanto, de repente Icdantou o doente as mãos » êc
deu graças a Deos , dizendo a vozes, que ja cílaua fanij
pedio vertido , leuantoufe , Sc aífiítio à cea com os Padres
^ comfua molher emcumprimento do que prometera^
atribuia lofeph o milagre ao companheiro , dizendo na
meza , olhai Senhores , quam gram couza he obediência,
que executou efte Padre ; mas entenderam elles , que a
virtude fora do que mandara. Mais
fnc.F.f 75.
^- ' iifRó III. caí.xiii: • ^1 V «if
ío Mais clpantofo foy o cazo da mefma molher jj^/"^';*^*"^!
Maria daCofta , cheearaa termos cm que ficara como mdhcr por ''
defunta forade feusTcntidos demouito de huma criança, p^'j|'q^,^„3^.4fi
que lhe apodrecera nas entranhas , era vefinha , ouuio o
íeruo de Deos tanger os finos de defuntos, & o planto da^''!"^'
caza , foy a ella , mandou afaftar os que a planteauam ,■
òc pofto em forma de oraçam , lançoulhe ao pefcoço
hum rehquario que trazia , & diíTe ninguém chore aqui
cm quanto eu vou fora , fahiofe a humaíala por brcue ef-
paço , & logo lançou a molher a criança morta 3 abrio
lo^o os olhos , cobrou calor , Sc efpirito, ficou fani , cei-
faram os finos, 6c planto, &: conuerteramfe em alegres
viuas os enojados. - íí-uíOíJííu -0 c zoíjíí::'ií^ zo í;.^::
,1 Felippa Viceiitceftáiíâ^ntrd^ffádk'êm:cãn1^'tresAicH
, ^ dea ouir
annos auia , ôc crecendp o mal , chegaua a elrar aetco' ponteio de
fiada , de huma ferida de que padecia graues dores, &fi^'„"'^ar
lançaua copia de fanguc , que a enfraquecia .- Vifitou-aNçíUs^ .-!
lofeph, tirou de hum Crucifixopequeno , que tràfíaV be-
zeolhe a ferida comelle ^ & ficou fam. Ergueofe da cama
emqueeftaua , ôc ouuio humas palauras do feruo de
Deos, que IhediíTe , filha minha vos eílaueis perto dá
terra, porém ainda viuereis muitos annos.
1 L paíTado algum tempo tornou a molhei âõ ■■ ^^^^/ç^^^^f"^^
bemfeitor , com outra ferida , nam de perigo , mas de niefmama-
dores , Ôc moleftia grande, pedindo remédio a efte mal, '^^
como lhe dera pêra o primeiro.: A repofta foy , idsí^epoi^íp^.c. x/í4
de confeíTada a NoíTa Senhora da Conceiçam , mandai-
Ihe dizer huma MifTa , que eu a direi , ôc logofereisliure
defte trabalho ; tudo paííou aífi , porque a molher foy
dia aííinalado,leuando configo muitas amigas por tefte-
munhas do que lofeph lhe prometera , Ôc hauiamde verj
& dita a Miffa fe achou de repente com a ferida feca ,
ôc ella fam de todo com admiraçam dos prefentes.
13 PaíTeaua huma hora na praia de Beritioga , re-
zando , ôc efperando por embarcaçam, em que determi-
D d ij naua
1
1
1
1
l'l
naópetiga.
C6 o toque
deíeu buid^õ
212 Vida do P. Joseph de Anchieta,
^a*dehòt"òr "3ua partif áo Riode laneiro Caio do alto da torre da-
re, & p, r fua qucllc pofto huiTia criaiiça de {q\s , ou fet e mezcs , ven-
doa lofeph hir pello ar , diííc eílas palauras romente,
doutea Deos criatura. Acudiram os pays cheios de afflic-
çam , dandoa por morta , porque era a altura cxceíliua 5
acharam porém a criança viua , & iam brincando com
as ondas do mar quealh chega , .& leconheceram a virta-j
de daspalauras do Santo Padre* ':^;r: :v-
14 Até ao toque de feu bordam communicaua
láçouaomar lofcph fu? virtudç / lançauafe huma naô ao mar, era
mõ podirjui §^^"^^ ' ^ ^^^ ^^^Ç3 de gente nam fe podia abalar 5 viaõ.
ugencc. íeem perigo osdonosdcperderfeustrabalhos, depois de
applicar os artifícios , & inftromentos coftumados , fcm
froc. zf.^-j. eíFeito, recorreram ao Padre , chegoufe ao coftado , to-
cou com o bordam , $c começou a nao a correr com
niarauilha grande.
15 Nam sò linha agilidade de Anjo, com que fa-
zia grandes viagens em breuiffimo tempo, como con^
fta de fuasmiffoens ; Mas chegou a ter dom maior, de
fer viílo em diuerfe partes cm huma mefma hora. Na
mefma hora da Doit^ de Natal foy viílo celebrar
a Miíía dameia noiteaa VíKii de Santos, & dizella tam-
e^.Bcretp.Uô [)cm na dç S.Vieente: Ehévozcommua daquellespouos.
que diuerfas vezes fora achado no mefmo tempo em S.
Vicente , & cmS. Paulo, diftante quinze legoas, & o de-
põem muitas teftemuahas*;
Foy viftono
mefngo tem-
po etn dous
.usares.
Trec Cf. }7.
&Proc.Zf.
LIV.
sr./-;i.T.!,i-i,r,r-,T.,r.T;i~i-i,irfj^T-j-i-j^i-,r;Fm;
LIVRO QVARTO
DAVIDADO
PIOSEPHDE ANCHIETA
da Companhia de Íes v.
CONTEM OS ANNOS Q.VECORRERAM
dcfde 1578. ate o de 1585. emquefoy chamado à Bahia,
& eleito em Prouincial, & vifitou os Colkgios , &
partes da Prouincia, com as virtudes, & obras maraui-
, Ihofas, que entam obrou.
CAPITVLO I.
Vem chamado o Padre lofeph perao Colkgioda
Bahia y^ obra nelle caxps marauiihojos.
Vendo empregado também co-H,tr,f,aoao
mo temos contado os annos deCoUcgiod
1569. até ode 15;». iia fua amada
Capitania de S. Vicenie , no fim
do mefmo anno de r^7&. foy trafi-
do lofeph pcllo Padre Prouincial
Ignacio de Tolo^a , qiue alli aca-
bauâ de vifitar, ao Con€gi<i da Ba-
hia , onde refide a cabeça , ôc gouerno primeiro defta
Prouincia ; porque hiadifpondo o Cco ^que andaíTe vo-
lante por toda eila , aquella luz, que cntam fe limitara a
certos Pouos , ôc como tinha alumiado , ôc aferuorado
D d iij aquelles.
ri
A primeít*
entrada co-
xame
Seret.p. \l
P^tcrnr.p,
3.(>í.& in
proc. multis
in heis.
iil Vi DADO P. Io SE PH 'Anchieta,
aquelles , iliuftíaííe > & aferuoraííeos mais f qual outro '
foi, correndo por oííicio a circumferencia doOrbeBra-j
íilico ) lendo Prouincial.
2 Obedeceo lofeph à voz de feu Superior , qual"'
nheceo pen- fe fora dc Dcos j chcg'' u â Bahia , tntrou no Collceio ,
lamétode hú , i i i ■ n o
irmáoquíjui porem antes que ponha o bordam , tire a veíte , òc tome
gou deiícbà aff^nto , aíTi de caminho , he bem que notemos o primei-
roprodigto. Entre os outros Rehgiofos que acudiram a^
rccebello , & abraçalo , fegundo a regra de charidade da
Companhia,foyhum Irmaõ> que nunqua tinha vifto a lo-
feph;efte leuado fó da informaram exterior dos olhos, ven-^
do feu írefto menos aprafmel ^humilde, roto, quebrado de
coílas , formou conceito, que íleuia fer hofpede inútil,
& diíFe entre fi , aqúé Vem efte agora aqui ? nam pronú-
ciou palaura alguma , mas quando lhe coube o lugar do
abraço,orecebeo lofeph com difFerenteroílro,Ôc beneuo-
lencia , quèatodososoutros , & diíTe 5 aííi he, aíTi he Ir-
mão meu , que entre tantos fò vos me conheceftes 5 a que
venho aquii' Homem inútil ^ & de nenhum proueito^.
ficou confuzo o Irmão , confeífou feu juizo defacertado,^
5c entendeo dâlli em diante , que tinham tncre fihum ho-
mem Angélico.
Aciii mih- 3 Trouxera à fuá conta quando partira de S. Vi-
laÍTaTmeícente , mandar fazer na Bahia certos ornamentos do pro-
didasdosfrô-ceJiJo dehuma efmola , deixada por legado â Igreja da
caza de S. Paulo; ôc achouíe cà fem as medidas neceíía-
rias. Eftas medidas tinha elle tomado por fua mio ^ Ôc
entregandoas ao Irmaõ António de Leam que fícaua , por-
que lhas deíTe quando fe cmbarcaífe; mas efqueccofe o ir-
mão , & partido o nauio fefoy acuzar ao Superior, mo-
flrandolhe as medidas , chorando feu defcuido, ôc nam
fem moleftia de arnbòs , por hauerem de efperar mais
tempo os ornamentos,de que muito neceííitauam : Porém
tirou-oso Ceoem breue deíla pena, porque íofeph preuen-
doa , recorreo ao commiÁ thezouro das mercês do Senhor,
tais que fi.a
ram eoi S.Vi
cente.
Pw. Z./. 8
& alibi.
Livro IV. Cãp. T. íis
Sc foy aueriguado , que certa hora fe achou com as medi-
das na maõ , ôc mandou chamar ao alfayate, cortou por
ellas os ornamentos, Sc os mandou na primeira occafiam ,-
fendo aflfi , que no mefmotempojcftauam cmS Paulo eftas
medidas, hftc fucceflafe aueriguou com diligencia, aífi
na Bahia, como em S. Paulo. E foy tido por huma das
grandes marauilhas de lofeph , ou foíTe elle , ou al^um
Anjo, ou a mão de Deos , a que foy bufealas ^ ôc as paílou
a tam longa diftancia.
4 PaíTaua hum dia pclla cofinha ^ ou com intento
de ajudarnofcruiço delia, enl que era deftro, Ôc fácil, ou ^'-*^""'^r
perao que logo veremos. Succedeo que tinha o coíinhei-u^i dac^uz.
ro ao fogo huma tigella com peixe a cozer pêra a Com-
munidade 5 quando foy a tirala do fogo *eftauaferuendo, w^'{y^^°
& aeícuma , & caldo da feruura , IheefGaldou amaóef-
querda com dores grandes. Mas compadecido lofeph,
acodio , tomoulhe amâòcom à fuâ, cfquerda , ôc com a
direita lhe fez huma cruz ,.Ôc diíre,*õra bafta nam vos doa
mais ; foy aífi , porque ficou logo fam I ôc fem dor 3 ôc
continuou feu oííicio fem impedimento Foy femelhante
a efte cazo o do padre loam úc Almeida difdipolo feu,
quando encontrandofe no caminho de S. Paulo com hu
aííligido , quehiacurarfedehum braço ,^ em que padecia
grauesdores, tocandolhe fomente com a mão ,ofarou,di-
zendolhe, amigo , ide embora , &nám digais mais,
efte braço me doe. Diuerfos foram Méítre, ôc difcipôlo»
mas a arte decurar foy a meímâ.^n - f :? -r^rn, ; n
5 Era grande íua charidàde pêra com os enfer-Côuertehnm
mos , vifitaua-os , ôcconfolaua-osna enfermam frequê.P*'^''""''?'
i pe X' ern u-
temente , cayoemcama efte mefmo Írma5 cozinheiro, "Sp^r^cófo-
& eftaua ao que parece com faftio ; prtgiintoulhe que'"^"^^''""*
comereis vos agora ? Refpondeoquehum piqueno de h-vrocxf. si.
cam , mandouaderpençaem bufcadellè, nam fe achou , ''•^'•
porem namfofrc faltas a charidade , foy dle, empe ífoa,
& vendo que onamhauia,tirou hum pedaço d^ peixe af-
fado.
2i6 Vida DO P. loSÍPH A NCHIETA.
fado, que em fuás maõsfeconuerteo em perfeito lacam ^
Icuou-o ao enfermo ,quecomeo parte delle, &: ficou fa--
tisfeito , guardando outra paice Quis o Ceo mofírar a
niarauilha , atéqui' encuberta , tida fomente por fineza de
charidade, porque mandandoocnfcimotrliamarodefpen-
feiro lhe perguntou a caufa porque nam lhe dera o lacam ,
que Ibc mãdara pedir o Padre Iofeph,obring5do-o a ir buf->
callocín peíroa/DeucUcfatisfaçaôde fi,foj àdefpêça, ôc
trouxe a parte do peixe que ficara & cotejado hú com outros:
lhe moftrou como oquecomera,& guarda^raeradomeímo,
aífirmando que diante de íeus olhos o tifara o Padre , 5c
conuertera tm lacam 5 correoa marauilha pello Collegio
òc hiam vendoo hofpedeqiie tinham entre fi , os que dá-.
tes nam conheciam feu grande efpirito 5 ôc valor,
6 Nam pararam aqui asmarauilhas de fua charída-
de.Eftaua outra hora comédoefte mcfmo enfermo, & que--
nhTbmdo, rendo beber hum pequeno de vinho, achou- o afpero ,ôc
&ra.ue.o áefiftio delle : Pcrsuntoulhe o Padre porque o nam be-
mo. bia ? Reípondeo que era muito duro : Tomou entam o
copo » prouou , & diíTe , ora bebei que he vinho mui
^^' bom ; Bebeo o enfermo, achou que era brando ,&fuaue
com admiraçam fua > òc dos que fouberam o cazo , Ôc
era no Collegio falada â marauilha do vinho de lofeph.
Tir*ofa(tio y Jtftaua cnfcrmo o mefmo lofcph , leuaramlhe
wtriílgíofãpera comer hum frango concertado j tomou o prato na
maõ , & aífi como cílaua> o mandou leuar a hum doen^
te , que eftaua na enfermaria , com grande faftio 5 dizen-
do, ide , dizei ao enfermo, que coma efte frangam ^&
nam tenha maisfaftio AíTiofez , comeo logo o frangam,
nam teue mais faílio , & achoufe logo bom-
8 Era o primeiro em andar volante , acudindo
a neceílitados, pobres, ôc enfermos, onde quer que fe
achaua. Partio hum dia a confeífar hum Angola enfer-
mo em Tapagipé , huma legoa diílante defta Cidade da
Bahia, quando voltou era ia alta noite, òc vindo chega-
do
mente.
Jíodrf. i6o,
^
LiVROlV. Cap. I. 2ir
do a hum pequeno lago no meio do caminho , onde cha-
niamauam o lugar da mineira, começaram afear grandes
plantos , como de almas metidas em penas , & que pa-
deciam tormentos. Arrepiaramfe os cabellos de medo ao
companheiro, que era o Irmam Pedro Leitam, diíTelhe
lofephjuam tenhais medo , & parando hum pouco com os
olhos no Ceo , pronunciou eftas palauras 5 6 eterno Deos
quam grande he voíTo poder / &: chegando junto ao lago ,
diíTe , rezemos de joelhos cinco Padre noííos , & cinco Aue
Marias pellas almas do Purgatório , &namouuireismais
eftas vozes,ainda que paííeis muitas vezes 5 Ôc com efFeito
foy aíTi, porque nem entaÕ.né depois em outros caminhos
que fez o dito Irmaõ , nem outro algum , oupio mais
ostaes plãtos. Pareceque os juizes profundos da mifericor-
dia diuina, tinham deftinado o tempo do aliuio daquel-
las almas , pêra o em que paíTaíFe o lago efte feruo feu, .
9 Foy confeííar outra molher por efte mefmo
tempo fora da Cidade , antes que chegaífe a fua caza ;, AíTguraàhe
faiolhe ao encontro o marido, dizendo que eftaua }àTnT^l£
efperando que chegaífe, pcra ajudala a bem morrer: Com- ^^ ^J ^^
padeceofelofeph das lagrimas , ôc laftimas dohomem, ôc a°eíhdcfcT
logoalU antes de chegar â enferma, diíTc^confoIaíuos bom ^"^*'
velho, que tendes molher pêra toda voíTa vida , & clhBeret.p. ,po
vos ha de plantearavos ,&nam vos aella , & entran-r '^'''"•^'^- ^*
dona caza com hum púcaro de agoa , que lhe deu a be- ^^'^"'^^''^
ber , Cm que lançou a bençam , ficou fam , ôc viueò quare-
taannos defpois, falecendo o marido primeiro.
10 Eftaua enferma Andf eza Dia;s molher deOi^go f^ofh' r& hu
Moreno de hum parto violento defete 'mezes , procedi- '«afiiha-
do da huma defgraça de huma queda ,: de que ficou dlaZ/f^"^^'''*
perigofa, ôc a criança que pario hiuicp mais. Ne%s^èr-
mos foy a vifitaracazao Padre Iofeph,^> ô^ pediratn os
pays com inftancia bautizaííe logo,.aj c^'iança ,, porque
eftaua pêra dar o efpirito ; refpondeo 1 que melhptíiferia
JDautizala na Igreja principal da Cidade com 9 deuidp ,a-!
ín'-:) E e pararo
■A
iiiíll,l
2T8 Vi DADO P. IosEÍ^RAncHIETA,
parato, & cércmonias da Igreja , porque ella, diz , nam
ha de morrer 5 ponhamlhe por ncme iVIaria, vifto naf-
cer em dia da Seilhora , criemnâ Chriftam , & reli-
giofamente , porque fera alegria defla caza ,- chegara a
idade de onze anhos , òc morrerá no meímo dia de Nofí-
fa Senhora , em que naceo , pofto que nam nâ mefma Ci-
dade. Tudo eftá cheio deprofecias , & todas eftas viram
ospays cumpridas , porque nam itiorréo cntam a filhàiV
foy bautizada no templo com folemnidade ; chamarani^
lhe Maria -, foy criada em virtudes religiofas , ôc foy ale-
gria de caza , por fuás boas partes ; mudaram morada òà
pays da Bahia pêra allhadeS. Sébaftiam, ^ alli paffa-
dos onze annos , no mefmo dia da Senhora deuaalma
à Deos , com cfpanto dos que fouberam defta grande lê-^
da de profecias , ôc efperàuamocumpriríiento delias, aí!i
como hiam fuccedeiído humas ati-as de outras 5 ôc à vi-
fta de fucceíTos tam raros èílauâm ja bem informados os
do Collegío dohòffedéi què tinham em caza , efpCcial-i
jncnte aquelle Itiilao,;ciuc ht> prineipib diiuidolii
Abatimento
próprio.
^ii J
**3' ^■^■■mmmm-mm- m «swkm-
Cl APltttÚ ti
Do mio com que foy èMto ffòúlMal, '^do ej^
pimocom q^e oóu^qij^^gi^^bditps^;^
^^ O S ¥V M f Ifeác Dd©¥ifciíatít^f huftlildcs ,
J^^ <ltís lugares^ mdè CtécmÚétíí, & fõbiltò^
1^^ aos alcbs , dcínde pOiíafiíi com a te de fúáíà
í^^ virtude^' áliíííii'at a mm^r'AfCiíé oúéémm
hum loféph antigé'í,tifiridè-ò do b*kè;dfô4itíiíiá ciftêíííâf
pêra o por no alto gòiíérBb ló Egijitá (Erk taníi-rafâí; â
humildade do ripíTò íòfèphi tití^haf0 p^ííb cm lúg^rSl
tam baixos> porféiis píojpfíosdlípí-^z^áyôc âbatÍMentí^s
com
H V no I V. C APITVIO II. iW
Gom que íe rcputaua, por nada entre o$ hcpiicns , qucaic
acreuo a dizer com fundamento , que foy tfta acaw-
za , porque chegaram alguns ,ou leuados das apparen-
cias exteriores, ou mal informadosdas cxcellcncias interio-
res de lofeph , a fazer reparo na Patente, quede Rema
mandara noíTo Padre Geral perafer Reitor da Bahia , re-
plicando que feria menos repiuaçam de hum Collcgio
tam authorifado , meter por Superior delle , RcligiOr
fo tam defprefiuel , quebrado de coftas , & de menos r^fr
peito aos olhos dos homens. Porém noflb Reuerêdo Padre
Geral informado bem da peflba, & allumiado poraqueU
le , que a todos conhece de veras , defpedio pêra elle pa-
tente de Prouincial , como dizendo/que pêra lugar mais
alto , que de Reitor , era digna fua humildade y confun^
dindo com iílo a prudência humana., , . .^. ^^ o, . .^
, _ -^V,-^ ..n £/r;'r fno^;r'^t-lPfeu^oasdc-
2 Nam eram occultos a lolepheites rcquerimen^ cúftanci»s.
tos em que andauam como homen$ os Cçnfultores çom^^^í^';^^''"^^
o Tadre Geral. Tudo íignincou muitp antes ;, quando
eílando ao fogo em S. Vicente , comòppi: graç?i referio ,
que diziam as velhas , que hauia d'efer Prouincial 5 qvie
viria patente de Reitor , porem que náíp chesaria ao fer ,
mas que viria a de Prouincial ,.& diziam as velhas que o
hauia de fer 5 acrecentando ,páreccm-vòscftas boas cpílas
pêra Prouincial /^ via fem duuidao como lhas hauiam de
imputar a defprerojvèren^õs nos contudo, o como Deos
pode fazer que coftas quebrados lèíicmtaín grande pe-
zo.
Yol yò :
'o'jíiT rn3
3 Do baixo lugar daquella df^iecna ,. okwIc ^^"«prp^etl^^q^e
Irmãos o meteram , tirou Deosaí loíçph Patriárcha pecahadefbrçh»
ogoucrno dos Pouos ; de huma choupana, & de aíTcnto^ÔuíncU*
de hum tiçam tira Deos ao nouo lofcphjquequeraleuantar
fobrefeus ColLcgios. E foy aííi , andaúa lofeph em mifiTam ^^^'^-P-^s »•
Apoftohca , correndo a Ilha deTapafica fronteira , &
diílantetrcs Icgoas da CidadedaBahia , acbau^fe aíbud-
>i E e ij men-
"•3"?s ;
Ít20 VlI>Al5 O P. lÒSEPH ANCHIETA ,
mente OU uindo ide cônfííTam huma liídia en ferina Jança^'
da em rede por eama junro ao fogo , fegundo feu coftu-
me , & lofepb pêra poder ouuila aíTentado fobre hutn
madeiro, que ficaiia feruindo de tiçam Quis o dono da ca-^
za meihorarlhe o aíTento na forma que fua pobreza per-:
mitia; porém lofeplinameonfentio dizendo 5 outro af-:
íento meefíàerperando -queferei chamado antes que da-J
qui meleuante , muito de menos goílo pêra mim. E fuc-
ccdcoaííí, porque antes de acabar a confííTam, rccebeo
carta do Padre Prouincial , que lhe ordenaua , tanto que,
aquella viíTe , Fe recolheíTe à Cidade , porque imporraua.
Nam ignorauao feruo do Senhor a importância v,Ôca^
carga a que eram chamadas coílas tam fracas , ôco àíTenta;
que tinha profetizado ; porque na mefma hora que ché*;
gou ao Collegio , junta/a Communidade fez o Padre^
Prouincial huma pratica , & leo huma patente de noíío
Reuerendo Padre Geral Èuerardo Mercuriano , em que
fí« declarado declaraua ao Paárjíorèph d^ por fucceíTpr na-
por '^°"*"'^^çJ|g officicio. tançoufe o noup Prouincial aos pes de
feus fub ditos , jiffl como cfíauam , beijandolhos de joe-
lhos, banhado^ emlasrimas; ôc o meímo tornou a fa-
zer o feguinte qià, com grande eípirito , pedindo ajuda
de fuás oraçoens , perâ faBerlcuara carga, que aobediehi
çia lhe impozera. , ^ . .
','4' " Entrou ho cargo da Prouincia no anno do Se^
nhor de 1578. Succedeo ao Padre Ignacio de Tolofa, va-
ram de grande virtude, & letras , graduado del>oufor
em Theologia : ôc foy em ordem o quinto dos Prouin-
. . ciaes ,' porque o primeiro foy o Padre feu grande amigo
fll^***^' Manoel da Nóbrega voíícguhdo o Padre Luis da Gram,
oterceiroo Padre Jghacio de Azeuedo aqúelle que: con-
fogrou os mares com feu fangue , dando ávida juntamê-í
te com quatro Rehgiofos da Companhia de lefu, vindd
agouernar a Prouincia( depois de haueríidonella Vifira-
-dor geral ) o quarto fò/ o Padre Ignacio de Tolofa , &
p
Entra no car
go anno de
IJ78
Js.;:
■t 1 '•<
LíVRoIV. CÃ:p.lí:riTV tiabi
lofcph o quinto. Seu modo de gouernofoy o. rnçfmoqiie
femprc , porque foyclle fempre o. meímo. Duas,- parccs
tem o gouerno de communidades de homens racionais,
cada qual delias mais difficukoza A primeira hé goucrnaríe
bem a fi mefmo , quem ouuer de gouernar a outros^ &.efta ,^^^
•tem mais difficuldade, quanto hc mais vencerfea íi que
vencer a oucros A fegunda. He conqulftaríem violência
as vontades dosfubditos, tamvariaudisnasinclinaçoens >
comofam varias as naturezas. No gouerno de fi vimos em
todaefta hiíloria ocomofoy raro, ôcadmirauel parecia íua
peííoa hum relógio bem concertado , & fempre- certo ,
de cujamaõ , ôc index exterior ,.dirigidos os íubditps ^ cõ-
punham com acerto , & ordem íua&acçoens. Viam àquelr
la vniformidade de vida, tam apontada , aquella obíer-
uancia das regras tamajuftada^jOírlgor de íeu corpo tam
apertado , a conformidade comofol diuino , tjanicoherér
te , ôc todas as outras virtudçstaim ?em; feu p^nto, que^^y^^z.
podia dizer aos fubditos com S.Paulo ,qM^dtatcífíSi-acceT
ptftís , aiidr/iís, çf qjídíftíF ín me , huagífe.Q qupapté*
deíles , tomaftes , ouuiíles , & viftesemmim, itío fazei.
De todis era conhecida nelle huma cQnftancia grande de
animo no que huma vez emprcndia 5 hum império forte ,
fuperior, no dominar fuás paixoens^ huma confiança em
Deos cficaciííima » nàsmaiores , &^n^aisapereâcJMJPCce^-
fldades. De toda^ eftas c.ouzas?vimos ja ç^zilj rparticula-
res , & veremos portada eftáiJen<la>iiE n^íleexernplo,
mais , que em regras , Ôc preceitos confifte a principal par-
te do bom gouerno de hum Superior , por efte quis Chri-
fto Senhor Noíro,moftrar,que-cra fuperior a todos^
quando diíle , rí-^íí/^f/^/i^ loannt yf^-io-mdífiís, ^ ^idí-
jiís, CACi n)ident y eíaudi amhtilant , leprefi mundantur^^
è^c. nam ha pêra que dar preceitos , como fe diíTera>
-contai o que viftes, que dou vifta aoscegos, pés açp-
xos , & íaude a leprofos í Que de marauilhas nam viam os
fubditos nefíe Superior femelhantes áeftas.iB^aílauayello
éi2 V ! D A Í> ô P. I O S E P H A N C H I E T A.
^ fíôtâr fcas €jtemplos»& deílc? apontemos alguns.
5 ^ £ftaua 4ôentc cm cama , leuoulhe oenfer-
iáébo heróico j^g|j,^p^j. iJíef^ ^umapouca de abobara cozida
dehui
iamor>
comc-
tiâciçtm. çôuâ comer, & íirlfioque era amargofa ( cfpecie parti-
fm,Cif.iiS^^^^ ^ quehâíiôBraril , òc mm he de comer, porque a-
marga comofcl) olhou pêra o enfermeiro , ôc nam diíTc
|jalãura 4( cuidou ôlrmâÕ que erafaftio, rogoulheque co-
meíTe, fezloâíTi o obediente Superior,bebeo o caldo, & co-
ineo á abobara cohílantcmente yòc acabando de o fazer 5
preguncou Cõtti a boca cheia de rizo 5 tendes outro doen-
te > â quem hajais de dar cfta dieta ? refpondeo que íim j
pois nam lha deis fedi que primeiro a proueis. Sufpeitou
o enfermeiro o que podia fer , prouou logo alliofobejo,
òc achando fer refinado o amargor da abóbora , nam po-
de fufterfe que iiani dtí[e hum grito , dizendo, ah Padre
« meu que mateiavofla rcuercnciá com meudcfcuido. Po-
rém lofeph com^rõílro alegre lhe tornou , Irnião nam
me mataftes > antes túc quer o Senhor dar faude por meio
dafemdhança do fel » que por mim , 6c vos goftou em a
Cruz 5 ôt eòm e^èit^ pouco depois feleuantoufam.Ede-
ftes exemplósdauâí muiios ábsfubditos , iaqueile íeu nouo
Superior* : /
8 QUâílté aos fôbdicos foy admirauel o fenho-
Pericóosfub^^^* ftáfti violefito > liiá-sdôCe , & faauc. Todas foas or-
ditos » dtús èf âíH de ámôt , 6£ fcf^ifidara j «linquá di ziá fazei i ft d,
liiàs podeis fazer iílO/Serà bêqueiaçamos iftoi 6c defte mo-
do rèíidiaiíèíâçoeh^ G5 eáubrqd^ra «aturai fua,ado^aaa o
tigor dais f egras^ ÔC obíetuãcia H eligiòfa, aliás neceííària. fo-
gindofetóprede acr^centar rigoí^ aTigores. Ouuiòiiã dia o
di<5tamen de hum Padre, que quem gouerna outros , nam
deue diffimular faka alguma, que nam ca (ligue, reprenda,
ou auize 5 á eíle dito acr€<ientou Jofeph 5 òc também ne-
nhuma falta ha de faber o Superior de íeus fubditos , que
primeiro que chega aitii^íâós huma vez, nam tenha <:hora.
do duas , outres>diânitedàditóa mííèricordia. Vão outano
dia.
Btret^. ií,j.
Outro.
ldf.\$6'
13
Li V RO IV- Ca p II. 223
dia , que hum Padre que fcruia entam de Miniftro , íe^^""°*
ouue aíperamcnte com humfubditofeu^ ôccomo Prouin-
cial que era , lhe perguntou a cauza daquella afpereza ?
Refpondeo o Miniftro com íinceridade j o Superior que
me encommendouefteofficio , me encarregou , que nam
deixaííe paíTar occafiam ,em que podeíTe exertitar a pa-
ciência a qualquer dosfubditos. Acodiolofeph , Ô^diílcáf-
fi jpois eu em nome de Deoslhc ordeno Padre méú,què
fedirpa deíTe afiPedlo , & fe vifta do da manfidam , Òc era
quanto puder , procure narh dar occaíiam dé dcfgdílp a
lubdito algum. Tomou bem o coníèího o JViihiftrò'; &c
procurou dalPi em diante fazelloaííl.Ouío dizer, a óu'ftboutro.
Padre aquella douótrina tam próuadâ ^ que o que puiièr . >,
de fer perfeito fiibditó na Religlaíii í, & quizef gbzrir dè^^'
íbííegò, &paz de fiia alma, Yãláç-^túrâzrk íèWX^
porfe todo nas mãos dòs Sujieritírfeís,/'cbt]itthi'éetò' qiiú
oíficio em que for ocòiitjàdõ. A ífiVtòoti' lóféjili' çki' frmà
da doutrina 5 pois de nifrri vos di|Ò^V'cjíifc jimMi\hWéài'.
dado deoccupaçamálgtimà /quà'b'^Stíl|)èrlc^/^'títíyé^
de dar^nem quandoírmãoim^giiíeí-n^uriqíía 'què^jjotjia férSá-
cerdote, ne quã do Sâceídbte qílè f/offlá íti^'pÍrcíftBíSi^l^qíiã-
do profeffoquc podia fet^SàjíreriÒfi^pòi^e' rltínqfàafèiiH ehi^^
mimas partes neceíTarias pêra fello.lfíodiíredefi,ôc iíti^èra
naquelle tempoofentir firme daquelles varoens ; queira
o Ceo , que o curfo dosannos , naràdélugar a variedade
nefta tam importante douótrina. :
7 Dezia qúé o Superior nani Jb^ feu , fcnam dos
fubditos , & do Pouo : & moílròu efta doudtrina com ex-
emplo, porque aqualquerhora,& tempo eftauaprompro
pêra ouuir fuás neceíjfidades, em qualqufer aâ:o que eftiuef-
fe : Succedia eftando^.ja, reucílido pefa dizer MiíTa , fer
chamado , ou de algur# fiáidÍÊQ , ou de algum do Pouo
affligido ^ largaua as veftiduras , ôc hia confolallo , dizen-
do que mais aceito hc a Deos a mifericordia , que o fa-
crificio.
Tinha
''li
Zt4. V l DA DO P. I OS E PH A. N QH I E T A.
s Tinha conhecido dom de Deos , pêra farar com fuaui-
dade qualquer enfermidade dalma , confolar triftes , &
aííocegar corações alterados 5 nam he neceíTario repetir
05 exemplos , eftam cheios os liuros antecedentes de cazos
femclhantes ; Coftumaua dizer que nenhuma coufa hauia
hum Superior de trazer mais arreigada em feu coraçam ,
que efte ahuio , & amor dos fubditos. Defta maneira fe
hauia configo,& com fubditos.
9 Aqui hebem ponhamos hum exemplo de comofe
hauia com Deos jdizia MilTanaCapelladoCollcgiointe-
terior , quando chegando ao primeiro Memento^ foy vifto
arrebatarfeno ar ,& ficar em extafi , por tanto efpaço,
y^^^ ^ ^^ que foy forçado o ajudante leuantarfe , & hir dar conta
'*°'ao Padre Ignaciode Tolofa , que com fua authoridade o
defpertaíf e : nam fe deu preíTa Tolofa , que fabia quam be
empregado eftaua lofeph, & que eram aquellas fuás delicias.5
mas vendo que jaera paíFado efpaço grande , foy ao altar ,
pegou nelle , & tornando em filhe diíTe , que era tempo
de continuar fua^ReucrenciaaMiíTa , porque hauia muito
que fe detinha : Afli o fez , mas nam faziam ja efpanto
feus arrebatamentos entre os Rehgiozps , por ordinários
naMiíra,&: oracam,? edificauam a fi , &: coofundiam
tibios^;
íbpfh.oll;3l-£i5q 8EÍis]}3:>orr-^:7n?
, ;°(C^? £
TH ífíÊl -Ú\\
ZQllOíIi
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o!r fjijpioiq tOlqm:)
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I :.ç#p^^íbiO3Íiâ]íaim^£03CI s Díl oimr* zÍBra aopcb
sám
Livro IV. Capitvl o IIT.
225
CAPITVLOIII.
Béfeumodo de vluer ordinário depois de feito
Prouincial^ em quanto ejleue na Bahia ^to do
marauilhofo.
Este Varam , como ja aduerti noutro lu-
gar , nam ha peraque redufir a erpecicsfuas
obras heróicas, porque todas fuás intenções,
traças, caminhos ,& dirpoíiçoensfam mi-
fterioias , enuoltas cm milagres, reuelaçoens, profecias,
adosdeamor de Deos , & do próximo. Farfe ha delias
mais conceito , feguindo fomente feus paííos , por onde
quer que for , & defcrcuendo com aduertencias,atc os mí-
nimos mouimentos, porque fam todos marauilhoíos , ôc
dignos de hiftoria : Ouxala fenam perderam tantos por
incúria , & condiçamdos tempos , que tudo põem emef- ■
quecimento.
-L Começou a difporas couzas do Colleo:'o & en- R"«'*5'"*
tre cilas tratou de por cm execuçam huma ordem vinda^o p Reitor. ;
de Roma de noíío Padre Geral peraque o Padre Greao- '^^ *
rio Serram, entam Reitor do mermoCollcgiofizeííe pTo--/''"'^-^'*^'
fiíTam folêne. vitima cm noííaCompanhia, òc quecoftuma
cõcederfe íó àquellas peííoas , quedepoisde prouadas em
annos , letras , & virtude , fouberam merecer honra feme-
Ihante , a maior que tem efta fagrada Keligiam, Pêra efta
folemnidade tinhimdeílinado os Padres Confultoresodia
de Pafcoa feguinte , maisapropofito a aa:3 feftiual . que
qualquer da Quarefma , em que fe achauam : Porém o
Padre Prouincial , nam obftante efta dcílinaçamda Paf-
coa, o primeiro domingo da Quarefma que amanheceo
de repente , ôc fem coníuita alguma , no fim da oraçam or-
ff dina-
Iftxtd CJictt
vndiefi dt of.
ddegAtitSã. h.
ac D D. de
matrimoH.l. %
difpMt.ii n }0
& l.^.dífp.ii.
»^6.& etiam
jttxta S»ar. dt
reiigftn t.^J-
6,c.f, «.4.
Reueltçtm
«lobrada
Troc.Cf 11
tPxífr»j».}45)
216 Vida do P. Ioseph de Anchieta,
dinaria da manham , a tempo que o Padre Reitor hia pêra
a Igreja ( fegundocoílumedos Superiores) a dizer Miíla
aos Irmaôs, ôcdarthea çommunham, mandou recado que
nam dizcííeMiíTa , porque hauiafua Reuerencia de fazer
profííTam , & commungar áMiíía do dia. Ficou fufpenfo
o Reitor , com a nouidade ,mandouIhe dizer, que aduer-
tiííe fua Reuerencia , que eftaua aíTentado que fua profiííam
fma em dia de Pafcoa. Refpondeo confiante , dizei ao P.
Reitor , que leue bem o que lhe digo , porque fe hoje
nam fizer profiííam , nam a ha de fazer depois. Caufou
cfta refolu^am vários juizos no Collegio , nem lofeph
quis declarar o feu , mas declarou- o logo o tempo, por-
que naquelle rqefmo dia chegou nauio com cartas de Ro-
ma.quc era falecido noílo R. Padre Geral Euerardo Mercu-
riano , com cuja morte ficaua ceifando o mandado da pro-
fiííam , çafo que a nam tiuera feito 5 por feraéfodejurirdi-
çam , que efpira com a morte do que a concedera, f Su-
poftoque nefte mefmocafo depois explicou outra couza a
Companhia na congregaram quarta , decreto terceiro ,
anno J5«i. ^^Eifto craoque preuira, & porque apertara
que fízeífe logo profííTam no mefmodia pelía manham;
porque da tarde pordianteja nam podia, nem o negocio
era pêra por em confulra , porque as rafoens eram fupe-^
riores y Ôc quandaonam foram , nam hauia lugar de con-
fuita > porque a reuelaçam que teue, foy na oraçam da
menham , & no fim delia foy neceífarro preuenír , qué
nam dizeíTeMlíTa , porque dita ella, ficaua impoííibilitado
aprofeíTarno mefmodia , fupoílo que no a do de forçaÈ
âuiade commungar. Reconheceoo-Padre Reitora graça;
&l.ceílaram juizos particulares. ^b^^i'M'T^b£b!a:n \^.\
-■:úv ;3!c'!Í> Eílaua xloenre na enfermaria do mofmo Colv
legioo Padre Pedro André , o enfermeiro foy vifitalo
huma menham ,' & achou pello pulfo que desfalecia, ôc
eílaua perto a efpirar , fucccíío repentino de que ningueni
fabia i foyfe ao Padre Prouincial com intento de contar-
^i.a.=> . lhe
•n
íi^ \..
rcâocer-
t» o que vera
nu roa cai ta
LlV RO IV. CÃp.IIL 227
lhe o eftado do enfermo, & pedir mandaíTc cõnfeííalo :
Porém nam foy ncceííario rclaçam alguma , porque antes
que abriííe aboca o enfermeiro , lhe diííe, ide , ide, com
preíía .dizei ao Padre IgnaciodeTolofa, que deixe a c5-
filfanique cftà fazendo na portaria , & và ouuir de con-
filTam ao Padre Pedro André em nome meu, que eu nam
polTo hir : Aíli fe fez, ôc no ponto que recebeo a abfolui-
çam , pcrdeo o enfermo o juizo , até a hora em que efpi-
roii,quefoy aodiafeguintcE fez conceito entam o Padre
Ignacio de Tolofa domifterioda preíTacom que o manda-
ra, porque fardando mais hum pouco , o acharia ja fem
juizo , ôc incapas deabfoluiçam. Sam duas aqui as ma-
rauilhas , a primeira qvieteue noticia do eftado do Padre
cnfermo,a feguda que preuio,que lhe hauia de faltar o juizo^
como fedeixacrerda preíía com que preuenio o remédio.
4 Por efte tempo chegou huma carta das Ilhas RcC;
Canárias pêra o Padre Prouincial , cntregoulha o Ir
maõ Pedro Leitam , depois elle conhecendo ^ que era de ^chad?.astcs
huma Irmam fua 5 a tornou a dar ao raefmo, relatandolhe
tudo o que nella vinhaefcrito, dizendo, contem que eftà Prcc.f 29
doente de huma enfermidade graue , mas muy conforme ^'*^^^*^'^^*'
coma vontadediuina 5 muito me alegro com iífo , eu a en-
commendarei à Deos: E aberta depois a carta ^fc achou,
que nenhuma outra couza continha.
5 Omefmo Irma5 Pedro Leitam /eftaua ou-d^;,"teT.
tro dia em feu cubículo , efcreuendo pêra Liíboa ; En-i^"*'''°'**^f'^
trou lofeph.&diíTe, Irmão que eftais agora fazendo,gaftã-^,^^ ..^^ ^
doo tempo , & papel ? Refpondeo jCÍcrcuo huma carta ^"«^«-p 3 j 4.
pêra minha Irmam , que tenho em Liíboa. Tornoulhe Io-
feph , fazei vosagora , o que haueisde fazer & a voíía Ir-
mam , mandailhe recados ao Ceo. Nam cahio no cham ao
Irmaõ o dito , mas quis contudo efcreuer a carta , & en-
uialla por hum nauio que partia , & teue recado do cunha-
do viuuo , que era morta íua Irmam , computados
os tempos , três dias antes que o Padre lofeph dizeííe
Ffij man-
u
^28 Vidado P. T ostph anchi eta ,
mandailhc recado à outra vida. Recebida a carta foife ter
com <lle , & lhe pedio MiíTas por alma da defunta 5 aqui
confirmou tudo , porque reípondeo , ja tenho dito três,
I020 quando vos diífe que lhe mandaíses recados ao Ceo, &
nam hamifterm ais. Nam ha duuida ficaria contente o Ir-
mão, quando ihe ouuioquenam hauia miíler mais , mo*
ílrando claramente que eftaua na gloria.
6 Por eftes calos fobreditos , ôc outros femelhantes
Profecia de i.çra commum entre os Religiofos do Colkgio da Bahia ob-
baSr' feruarem íuas palauras todas , como mifterioías , & que
fe.d2rpcdiJos^Qj^jj„^3^ profecias, & como a tais lhe dauam fentidos
fw.ie./i8 <iue oeffeito depois moftraua.Succedeo que vindo , ou in-
do pêra fora certo dia, fe ajuntáramos nouiçosa abraçai-
lo, ( como coílumauam com os Superiores hiam com a
aduertencia ja dita, 5c obferuaram, que abraçando a hum >
difse cftas palauras^ Fagundes(era feu fobrenome ) wulttfunt
'vocatt.pauà ^erofleãi. E a outro diíTe, qm perfenerauent
yfqmin fin^m » ^c. Deram os ouuintes fentido , que
hauiam de fer defpedidos aquelles dous 3 ôc foy aíTi > p orquc
ambos hum a poz outro foram lançados da Companhia.
7 Preparauamfe os Padres ,ôc Irmaõs pêra hir cele-
brar huma fefta de Noífa Senhora da Apreíentaçam
^f/rmoqrem vinte hum deNoucmbro , na Igreja de Tapagipé,
íeicuáte,và» gj^g(^çjgjj,pQ pertencia ao Collegio da Bahia. Eftaua
^enhlfemfe em cama doente de febres , o Irmão Francifco Fernandes ,
S.íioL^^^foyavifítalo lofephsôc perguntoulhe porque nam hia
também celebrar a feda da Senhora ? reípondeo que por
doente , & principalmente porque naquelle dia era o em
que coftumaua a virlhe a maior fezam. Eníam lhe diíle ,
ide, ide Irmão a feílejar a Virgem , 5c deixai là a febre ,
de tal maneira que nam torne mais. Nam ouue replica, que
conhecia béfeu Proainciallcuátoufe, cuprio a obediência
&eftandolàlhefobreveioa mais forte fezam que tiuera,
com ella entrou na Igreja , & proftrado dianteo altar da
Senhora , lhe propoz ocomo viera mãdado da obediécia
de
ÍAtern.f
■■■
«H
Livro IV C apitvlo TTT. 129
de Teu ^uperior , ôc que lhe ordenara , que nam tor-
naííe a caza com febre 5 ouue per bem a Virgem tudo o
que mandara loíeph , ôc tornou fam o enfermo , pêra o
Collegio com alegria , ôc efpanro dos mais.
X Acabara o Padre Gregório Serram de fer Rei-Pf^f
tor doColleaio da Bahia ; partia permudado pêra o Kiobreoiugard»
o * 11 1 ' r '«otteclu P.
deíaneiro, a veríe a mudança daqucUccítma era maisrauo-Gicg*noiec
rauela huma doença que padecia de graues delíquios, que'
o chcgauam a perigo. Defpediofe do Padre P>^ouincial,p^^^crjg^
òc diíleihe como amigo , he poífiuel que me aparta vofla
Reuerenciade fi r* Refpondeo lançandolhc os braços ao
pefco ço. I íío nam , njade modo tater , ojuia fojiea locus nos
conjunget. líío nam, và voíía Reuerencia por agora, por-
que depois hum mefmo lugar nos ha de ajuntar. Cuidaua
o Padre Gregório Serram , qual íeria o Jugar , que os
hauia de ajuntar , & como hiapera o Rio, facil era julgar
que feria cfte 3 porém nam foy aííi , porque o nauio co-
rnou o porto do Efpirito Santo , & foy forçado o Padre
Gregório por fua doêça ficar alli,ôc ahí morreo,& foy enter*
rado juto à coua.onde tábem depois foy depofitado o corpo
de lofcph fea amigo , que foy morrer à mefma Capitania 5
podendo entenderfe deíle paíTo aquelle dito ,/tcut in njí-
ta dílex^runt fe , ttatn morte non funt feparatij^ na ver-
dade a profecia de lofeph a meu ver, nam fó dcmoílra o
lugar, mas a morte.
9 Vieram à portaria Manoel Francifco , & António
Nunes homens conhecidos , a defpedirfe do Padre lofeph,
que hiam pêra Portugal , pedindo ajuda fua porque te-
miam os CoíTarios, que entam eram mui ordinários cm to- „ {,. .
do o mar : Pergantoulhe em que nao hiam das duas , quequehade hir
eílauam de verga dalto pêra partir juntas í Responderam fJJ^^"*^'^*
que na mais pequena 5 leuou-os a huma janella donde fe
viam , lançou huma bençam à piquena , ôc diííe , ide em- '^'^"^ -sr./ioi.
boraque haueisdehir á faluamentoj porem da grande
nam difse nada, ficando logo os dous com fufpeita de feu
Ff iij mao
!■!' :l.i
'm
i3o ViDÃDo P.IosEpH Anchieta:
mao fiíccerso Partiram, & tanto auante como altura dós
llhcos, tiueram viíla de três nãos inimigas, que pondo-os
€m cerco , osacomm€teram,ôcquandofedauampor ren-
didosjnuocando o nome de lofeph com grande confian-
ça fem faber comofe viram liures , ôc profeguiram íua
viagem, ficando a nao grande à Tuas auenturas 5 chegan-
do auiftar depois de tempo , as Ilhas de Baiona , aqui foi
ram acommetidos de inimigos por quatro vezes , ôc ou-
tras tantas ihe acalmou o vento junto a ellas , de repente
no ponto em que inuocauam o nome de lofeph, que to-
dos ouuerão por milagre:ôc finalmeteforaõ entrar o porto
de Vjana , pêra onde era fua defcarga , a faluamento , Ôc c5
cfpanto dos Vianezes , que hauia tempos, nam tinham vi-
ilotal fortuna , de que entrafse nauio fua barra 5 & aííír-
mauamque dentro em quatro mezes foram tomados dos
Cofsarios quarenta nauios ^ ôc o que mais he de notar que
anão grande , quecomefta partira em companhia , foy to-
mada dos mefmos inimigos, cumprindofeà rifca,nam fò
o que lofeph difser a claramente , mas o que quis iníinuar ,
lan^çando a bençâHJ àpequen^ embarcaçam , ôc deixando ■
de a lançar à grande.
D hua pefca. IO Eílaua O Collcgio falto de peixe dependia das
m mi agrofí. j,g jç^ ^ quetinhauí mandado lançar ao mar, porém eílas
/r^í.c/ 57. tornaram fem eff eito algum , dizendo os lançadores o
que là os Apoílolos a Chriílo , per totamnoãem laboran-
tes nihil ce pi mus. VioCc a Communidade com aperto, deufe
auifoao Padre Tofeph , que o refeitório nam tinha que
comer aquelledia .■ Nam vosagaílcis diíse, chamaime cà
olançador dasredes 3 ôcouuindoasefcufas que daua ,que
nam era maré , nem conjunçam de pefca, oleuou a huma
janella , 5c lhe moílrou certo lugar da Bahia , que de íà
apparecc, dizendo , ide, lançai alli as redes, & nam boteis
alli mais que hum lanço , enchei o barquo de peixe , &
vinde logo , que tem neceííldade a Communidade. Obede-
ceo o pefcador , Ôc íendo maré cheia , & contra regra de
pefcaria
LiVroIV-Cap. Iir. 231
pefcaria, qual outro S Pedro , in njerbotuo Uxaho rete ,
lucccdeo , que foy tanto peixede hum fò lanço , que fe
rompia a redcencheram u barquoAtornaram breuemente
à cizacom aquella bençam do Senhor ,prouendoo refei-
tório ,& juniamenteadefpcnçaj&nam feraefta avhimaj
outras marauilhas maiores veremos no género de pefca.
II Mas jaque aquivema propoíito, contarei Io-
go outra pefcaria. nam menos efpantofa , & celebre da .^r"' ^'^',*Í
Aldeado Elpirito íanto. Achauafe lofeph nefta Aldeágtofa.
diftante do Collegiofeislegoas , afim de vifitalla 5 notou^
que eftauam em grande filencio os índios delia, fora de
feu coftume , ociofos , & triftes j perguntoulhe â cau^
za , refpondefeolhe , porque nam tinham que comer ,
que o tempo aducrfo lhes impedia as pefcarias, de que
viuiam. Quis alegrar aquella pobre gente , mandoulhes
recado, quefc apreftaíTem, ôco feguiíTemaomar; ellesque
eram experimentados na arte, & cuidam que nella leuaó
ventagema todos os mais homens, zombaram do dito*
replicando que iriam de balde a trabalhar , porque nam
era conjunçam, & tempo 5 ôcfentecíla gente muito, an-
tes tem por afronta , tornarem da pefca, ou caça de Panc-
ma . como elles dizem , que quer dizer fruftrados. Porem
era mais altooefpiritodelofeph, aíTeguroucsque nenhum
delles viria peracafa defcontente , & tráriaiè o peixe que
dezejâíTem, foramíiados emfua palaura, porém chegan-
do ao mar viram que hia emfclrauecendofe cada vez mais;
& com defconfiançadiííeram, nam vés agora Padre com
teus olhos* que he impoífiucl , o qúé nos dizes ? Entam
com maior confiança lhe pef gui^cdu , qiífe peixes dezejais
vos outros? Refponderam coriíb' por 2íoiVíbaria , quere-
mos xareos, (que era o peixé^mais éj^qt^ifíto , & que não
foe naquelle tempo apparece?F ) moítroulhes tóiim poíío >-
ôcmandouquenelk lançafTem fuás redes peqti^rtas. Fize-
ram olanço, & foy tanta a mulfidamdepeixres , que^iiám ^x^ilãZ
fo com redes, mas com as mçfrhás mãos apaiòtóram á^-'^'^^'*"^*^
quantidade
232
II ' 1
Vi DADO P. losEPH Anchieta,
quanticjadeque cada hum quis. ate fatisfazerfe 5 & ficarão
com iftp enfiíi dos a reconhecerem lofeph arte mais al-
ta depefcar, que a fua 3 6c admirados , celebraram fem-
pre a pefcariadeJoíephcomo de homem a quem obedecia
a natureza.
Profedz* o ,2 M^odaua defte Collegio da Bahia ao Rio de la-
d?hâ'\rí.6* neiro hu kma5 chamado Manoel de Coutojperguntoulhe o
no Collegio j^j„2ÍQ ( jj^m fci com quc efpirito) o tempo que hauia de
moraria ? Olhando loíeph pêra outro Padre , que eftaua
Rtdr. p 114. prcfence , lhe perguntou também , quanto tempo tinha
!^gf'*""'' '' c^ado naquelle Collegio, refpondeo que três annos , &
meio 5 pois outro tanto tempo haueis vos de eftar , lhe dif-
íe. Efta profecia nam via o Irmão , como poderia fair
ao certo , pois dependia deram varias circunftancias, co-
mo trazem configo os tempos , poz em lembrança o
dia , & hora , ôc achou que fe cumpriram à rifca os
três annos , Ôc meio de fua cilada , & reconheceo o dom
de efpirito de feu Superior,
CÁPITVLOIV.
, - KfiJti :, ) ^--j i X I ^ .-ii
:t-.-.
Deomras maramlhas mais notaueis que obrou
rb fíiòio ^ ^Q fji^fmQ Colleno.
AssAVA a cafo lofeph ipor huma varanda/
olhou pcra o alto do campanário , que dalli
fe defcobria, & vio que eftaua pendurando
nçlle hum fino, loam Fernandes homem
Mmihof"i™' pedreiro , que porfeu jornal trabalhaua nas obras do Col-
legio. A efte diífe em altas vozes , que muitos ouuiram j
T>4fír»./». 1^7 loam Fernarídesfegurai-obé, fegurai-o be , que vos haueis
fé^&li^ipif.àc fero primeiro da Companhia em cujo enterro eííe fino
Profetlra que
ha de morcec
na Compa-
nhia loaõFec
Daadescõ cir
LiVROlV. Cap.IV. 23Í
ha de dobrar. Notaram as palaurasos prefentes , que fa-
biam as namlançaua ao vento , &: difcurfauam como po-
dia fer ? porque o homem era cazado , & tinha fua fno-
Iherem Portugal 3 &c quando foííe , que por morte del-
ia ouueíl^e dei er Religiofo, difficultofo parecia que nam
morrelíe neíTe meio tempo algum outro noíTo, ôc ouueííe
cUe de Ter o primeiro , por quem rangeíTe o fino. Porém:
cm quanto elles difcurfam , & efperam o cumprimento
do eííeito, lancemos em lembrança outras palauras fuás,
que tem nam menos que difcorrer , 6c adiuinhar. Inftaua
o tempo de hir vifitar , ( como coftumam os Prouinciais )
a Capitania de Pernambuco , apertauam os Padres que
partiíYe , porque era là neceíTariafuaprefençaj ouue depre-
pararfe por condefcendercomos votos, mas nam pell o feu^
antes rompeo nas palauras feguinteá, Os Padres me daõ pref-
fa que parta a Pernambuco, porém namfabemquehe voa^
tadede Deos, que eu me ache na Bahia dia de Noíía Se-
nhora da Conceiçam. Vencido enfim do parecer huma-
no partio aembarcarfe, & defpedindofc dos Rtligiofos ,
quando chegou ao Padre Luis da Fonfcqua > lhe diíTe , fí- ÈqueU.
r l_ r> J U • r .ter feu cõpi-
quefe embora Padre meu companheiro, eípereme aquinheiroop.
em quanto volto, porque voíTa Reuerencia ha de hir eo-ír"'"** '^°'^*
micro a Pernambuco, eu hei de tornar a buícalo oc leual*
lo comigo. Eis outra matéria de diícurío , porque o Padre
Luis da Fonfequa , nem era companheiro feu , nem o fc-
ria íem ordem de Roma , donde emanam femelhantes of-
ficios ; elle embarcauafe , nam viam o como hauia de vol*
tar, ôc leualo por companheiro configo.
2 Ora tudo viram os Padres , aífi como lofeph í>EíFitoda pto
diírera5 partio o nauio, mas foram tais os tempos que im-^°*^"
pediram fua viagem , quemoítraram , obedeciam ao de^
fíino fuperior, & aos intentos profetizados , porque ckpois
de contraftados mares , ôc ventos , quarenta & dous
dias , nam foy baftante toda a fcieneia , & trabalho dos
mareantes,a paíTar do meio do caminho, 6c tornou a arribar
Gg â
:ãt
scia.
iii Vida DO P. loSEPH A NCHIETA.
à Bahia, donde partira. lavam começando a ver os diC-
curíos humanos , quão d ííerentesfam os diuinosjfoyre*
cebido no Collegio j & depois de vifitar primeiro o fantif-
íímo Sacramento, quando tratauam os Padres de hir a-
companhalo a feu cubículo , diuirtio elleo camidio , &
fe foy ter com loam Fernandes , aquelle homem da pri-
meira profecia do fino , que nefte tempo eftaua em cama
grauemente enfermo , ôc auifado juntamente da morte
de íua molher , (^oque tudo fabia lofeph por reuela-
çam ) entrou no apofento , & depois de o confolarda
doença , & falecimento da molher : IhediíTe affi. A Virgê
bemdita Maynoíía, memandaca peraque vosadmita na
Companhia , & peraque comnofco eftejais entre os mais
Irmaõs , até ofim de voífa vida ; O agradecimento que cu
vos peço defte beneficio ,qu€ por amor da Senhora vos fa-
ço , he que tenhais lembrança de mim, quando daqui a
fets dias vo% vejais a(íiíí:ir na prefença da mefma Vir-
gem. Paímaram os Padres que o acompanhauam, & co-
nheceram cntam o effeito de fua promeíTa , òc o porque
voltara , ôc o que tinha câ que fazer no dia da Concciçam
da Senhora. Mandou logo lofeph leuar o enfermo , ja co-
mo Irmão noííb , à enfermaria dos Religiofos do Collegio,
& que como a tal , atendeíTem a fua cura. Dahi arresdias
tornou a vifitallo,& diííe.lrmaõ loam, hua noua vos trago
muy alegre j voíTa boa molher vos efpera diante da prefen-
, ça de Deos:& viradofe pêra os outros acrecétou molher de
tam bom home não podia perderfe. Ao termo dos fctedias
profetizados , aíTiftindoo Padre Prouincial . & outros Pa-
dres, & Jrmaos; que com fuás oraçocns ajudauáo aquella
almaditofaem fua partida, voou ao Ceo contente, õc
Prítka deio.fegura.
^7ofe^^ "*"" ^ ^ ^^"^ temos que ver agora hum efpedaculo tre-
mendo; porque no ponto em que acabou de efpirar loão
Fernãdes,fe Icuãtou em pé íofephcomoajuizo & cô gran-
de fentimento da alma.prefente o corpo , & grande parte da
• Commu-
L I V R o I V. C A Pi T V L o I V. 13S
Ccmmunidade, fez a pratica ícguinte Padres ,ôc Irmãos
chariíljmos , efte homem queavoíTos olhos acaba de dat
aalmaaDeos, oficial toda lua vida, & gram parte delia
cazado , dentro em fete dias tem alcançado o premio de
Religiofo, porque fez entrega de fi ao Senhor de todo o
coraçam , peraque no vitimo dia de juizo vniuerfal juíli-
fique a cauza domefmo Deos , & juntamente a conde-
naçam de muitos Religiofos , defcuidados cm fuapro-
fiOam : & alguns defteseftamaqui, que tendo muitos an*
nos gaftadosnclla , jamais chegaram a entregarfea Deos
de todo 3 eítes juftiflimamente ham de perder o premio da
Religiam. E dito iíTo fahioda enfermaria, deixando a to-
dos enuoltos em lagrimas , atónitos , & pallidos , mais que
o defunto. O como agora difcurfariam nouamente à vifta
defta pratica , cada hum configo , quais feriam aquelles
dos que fe acharam prefentes^ que tendo muitos annos
de Religiam , nam chegauam a entregarfe a Deos detodoj
Ôc hauiam de perder o premio delia .^O como cemeriam
aquelles , a quem acufaíle a confciencia í' O certo he que
também neftapartefoy profeta verdadeiro lofeph , por-
que andando o tempo , dous dos que allife acharam,
faltaram na graça de Religiam , Sc foram lançados fora
delia : Nam fem prefagio infauílo de muitos. O fe entraf-
fc bem efte exemplo nos coraçoensdos que hoje viucmos
nefte mefmo CoUegio r* Se entendeíTemos de veras aquel-
le dito de S, Hieronimo , non lerofiUmis nJixife^feâ lero-
foltmís hene njixtfe laudandum r/?. Nam he louuauel
viuer em Hierufalem , mas viuer nella bem. Nam padece
duuida , que foy traça da ProuidenciadeDeos miíericor-
diofa, que hum homem idiota , trabalhador, foíTe chama-
do afua vinha na vitima hora do diá de fua vida, ôc hdfla
foííe também premiado ,pera com iíTo confundira mui-
tos Religiofos , que fendo letrados de maiores partes , en-
traram a trabalhar nas primeiras horas do dia, mas menos
follicitos de fua perfeiçam , nam chegaram a merecer fe-
Gg ij me-
tuQoar a
.Cl
il':3-l'í!lii
iiiil
Rtfumodt
dt profecia
principal.
X. Profeil»
docõpaohei
todòx d»
conuerfanfidé
Loi$ Fernan-
des.
riiH
13(5 VlDADp P. IpSFPH ANCHI ETA ,
melhante premio. Premiou Deos aquella alma bendi-
ta , n.amà medida de feus trabalhos, fenam à medida do
dczejo <^ue tinha de trabalhar ; nam porque viueo na ca*
za de Deos , fnzs porque nella viueo bem por tempo de fe-
íç dias nam mais.
4 pe tudo o dito fica agora a profecia primeira
de Ipreph» quando diíTeíegurai bem o fino , porque vos
baueis defiçro primeiro da Companhia, em cujo enterro
ha de dobrar. Recebido o viram todos na Companhia, Ôc
inorço nella , & que em feu enterro dobrou o fino ,
primeiro que por outro algum / & que fe achou íofeph
na Bahia no dia da Cpnçeiçam da Virgem, acabando
negocio taríibem alTombrado , trafidopella mefma Senho^
ra.
5 Vamos agora âó comprimento da fegunda pro-
fecia, erji que affirmou ao Padre Luis da Fonícqua , que
hauia d^ tornar a burcalo , & leuallo confígo por compa-
pheirp à Pernambuco, g foy ^ífi, porque tornando de ar-
ífibada j achou cartas de noflb Reuèrcndo Padre Geral»
em que faziaaoPa^re Luis da Foníequa feu companhei^
ro , ô<: feof etarip ; & logo cm Confirmaram total de toda
a prpfeçi^ , çtp abpn^çandp o tempo , partiram ambos ,
Prouii|cj?il , & fompa;tiheiro pcra Pernambuco. E temos
yifto o eazp celebre de loaíii Fernandes pedreiro, comcir-
cunftaneií^s iam marauilhpra^ » que cada hqma , he huma
profecia ' Ôç por tal deuemos ter também â foppofiçam quç
aUi fez, de qOe a molher de loam Fernandes eftaua gozando
da diuina prefctiçâ i & que efperaiJa allipor elle, que he o
mefmoque hauer de fer participe de fua gloria.
6 Aqi|ivem logo em confequencia outra maraui-
lha bem notauel. Quando mandou ò Padre íofeph , que
o Irmão loam Fernandes fpíTe Jeuado pêra a enfermaria,
alú cntam lhe lançou fo*jpeta , Ôc raparam a barba em final
deReligiofp. Eis quçnp tempo, emqueaífiefiauadefbar-
bado>cftand(Oiprrçfet:§ Iprçpb^eatra o porteiro, & dizj
eílá
"1
L IV R o IV. Cã p. IV. 257
crtà alPi Luís Fernandes , amigo particular, & difcipulo
de loam rernandes , pede a voíTa Reuerencia pêra poder
entrar , ôc defpediríe dclle. Concedida licença , entrou
Luís Fernandes , & vendo o amigo com barba rapada^
eft ranhou a mudança .• Porém lofcph aquém nada paf-
faua por alto , IhediíTe as palauras feguintes. E vos eftra-
nhais ? pois deitai as voíías de remolho , qucpellomefmo
efquamel hamdcpaíTar: parece zombaria, &he hum orá-
culo grande ,como logo veremos. Entendeo o remoque
Luis Fernandes , & que queria dizerlhe , que femelhante-
mente hauia também de entrarna Companhia, ôcrefpõ-
deo : Ah Padre dous impedimentos grandes ha pêra iflo;
entendia o da molher, porque era cazado, & o de huma
filha que tinha chamada Maria, tornoulhc o Padre , olhai,
c^cs ddus impedimentos fe ham de tirar, quando Maria
for pêra a praia , & o diabo vos quizer leuar. Aqui nam
foube refponder Luis Fernandes, nem entender o como
feria tal cazo .Porém o tempo manifeftou o como,
porque Maria pouco depois foy pêra a praia defta Ci-
dade , acompanhando a feu marido, comquem cafara,ôc
allí tinha Tua morada , & vai o primeiro impedimei^to. O
fegundo impedimento tiroufe , reprcfent^ndQ Luis Fer-
nandes em huma comedia figura de hoííiem efcandolofo
peccador, aquém arre me teo o diabo ííg theatro para ó
leuar ; porque nefte mefmo tempo 0uufodobfai?í>s finos
por fua molher , que tinha deixado enferma , ôí eínlbreué
tempo entrara em artigo de morte. Foy peia caza o còmc-
diãte, Sc vendo a molher liiorta,tifâdòjáopriineirò,6£ fe-
gundo impedimento, cahioem íi y qwe Deoso chamauâ
por meio de lofeph , pêra ferofegUndo cxempfó após feu
Meftre 5 lançoufea feus pés , & peâiolhècom lagrimas p
habito da Religiam 5 Vofla Reuerencia , dizia ;tem trefpaf-
fado meu coraçam ^comas palauras que mediííe; o Ceo
me tem moílrado o fentido delias , porque Maria he ida pê-
ra a praia , ôc o diabo me quis leuar por burlas, nam que-
Gg iij rô
m
zli V I DA D o P.I o SEPH AnCHiE TA.
ro que òfaça de veras ,• rccebame, recebame vofla Reue-
rencia nafanta Companhia delefu , acompanharei na vi-
da a meu bom Meftre , ( que de Fernandes , a Fernandes
vai) & merecerei com ofauor diuino , acompanhallo tã-
bemna gloria , pêra onde partio. Aííiofez oPadreProuin-
cial , & foy na Companhia hum IrmaÕ cabal em virtude,
Òc de grande preftimo nos CoUegios, por muitas obras que
fezdefeu officio , comgrandeperfeiçam,& acabou o cur-
íb da vida^ com efperanças de íuafaluaçam eterna.
CAPITVLOV.
Jl/fílagre celebre da faude do Padfe Franáfcô
Pinto ^ & profecia dos trabalhos, & martírio que
hauia de padecer.
-. i'
Via mezes, queo Padre Francifco Pinto
eftaua na enfermaria doente, & tanronovl-
■wf/f^v^:ynfyj ti^io ^^ vida , quc tinha ja o enfermeiro
brèí/faude" -^^^^^ prcíles O neceííario pêra receber o Sacra-
doP.Frscifco mento da fanta Vnçam. Ncííes termos
íeciad'efew° cHcgou 3 vlfitalp O Padre. Prouincial , òc Icuado da
líSo!'^ efiScacia) de fca cfpirito, dandolhe hum .n braço, diílb
cftas palauras : "VoíTa Reuerencia queria fe hir ao Ceo a
prec.c.f i6. mãõs lauadas /* pois nam ha de fer aííi , lonp-a i ihi reãat via.
P*ttr»p. 207, . ^ ^ . . , ,^ '
losSN^drjíp, tem muito que paflar primeiro, nam ha de morrer morte
8 R,dr.p. Z90 folgada , & antes delia ha de padecer muitos trabalhos,
i?./io3. razcr muitos ícruiços a Pcos^ íaluar muitas almasjleuatc-j'
fe voíTa Reuerencia , & và dar ao choro graças ao fantif^
fimo Sacramento , que elle lhe concede laude : & pêra o
enfermeiro diííc, Irma5 dailheofeu veftido , 5c nam tor^í
nc mais eftc Padre à enfermaria. Ditas eftas palauras o
doente fe achou de repente fam , foy dar as graças ao
choro
n
Li V RO I V- C A p. V. 239
choro, nem mais tornou 3 enfermaria, com admlraçam do
Colltgio, E cílehe o milagre celebre do Padre Francifco
Pinco 5 mas como eílà prenhe de profecias , que o tempo
nos tem ja deícubcrto , he força que defemrolemos del-
ias aquillo que faz a noíío intento.
2 Quanto ao tempo que viueo depois defte mila-
gre o Padre Pinto , íignifícadonaquella parte da profe-ful™ida.
azjonga íibi rí^/Z^/^-y/íí, coníla que forão trinta annosjdefde
aquelle em que cobrou faude , até o de 1608. onze de lanei-
ro, em que deu a vida por Deos amaõs de bárbaros. Por
todos cftes annos foram mui dignos de hiftoriafeus traba-
lhos em feruiço domefmoDcoSj&faluaçam das almas. Di-
remos delles, ôc de fua morte nam folgada , quanto bafte
peradefempenhara lofeph, deixando o mais pêra quem
compuzer a vida deíleiníignc mártir.
í Pêra cuja intelligencia he de faber , que ao te- ^ .
n 1 T r 1 r • n Defcrípcocns
po em que o Padre loíeph protetizaua citas couzas , re- das terras poc
ílaua ainda por conquiftar huma parte defta America , ^\l^l^'''^^'
mais horriuel, & difficultofa, ôc em que todos os Mif-
fionarios zclozos da Companhia traíiam os olhos Era eíla
hum trato de terra , de comprimento mais de trezentas
legoas jdefdc a Villade Olinda em Pernambuco, ate o
rio GramParà , ou das Amazonas ,por coíla^Ôc dallipe*
ra o ferram. Toda efta Regiamhabitauam nações eftranhas
em fereza, & ritos mais que bárbaros ; parece,que ou a na-
tureza brabia , ou o autor de todas as defordens contra
a meíma leidarazam , ajuntou alli , afez efcoria deto-
daa America. Naçam hauia entre eftas , que fobre toda
a barbaria das mais , acrecentaua as fepuintes;queas mo- ^
. . . . o ^1 Carta aufína
Ihercs tinham por timbre , òc coílume, comeremos cor-pioj.
pos dos parentes , quando morriam 5 com efta diíFerença,
que os dos Principais, & mais chegados, comiam cofidos,
os outros aífados 5 5c quando nam podiam comcllos to-
dos, queimauam as reliquias que fícauam de tam execra^,
dos manjares, dando por razamdeíle ado brutal^ que era;
in-
240 ViDADoP. Io SE PHDE Anchieta,
indicio de maior piedade dar fepulrura aos que mais amao,
em feus mefmos ventres, que entregallos às entranhas da
ttrra Ôc bichos que os coma5. Nemefteerao mais bár-
baro dwfeus coílumes, Asmefmas máys , quando adoe-
ciam os maridos, hiam matando os próprios filhos que del-
les ouueram , & com as carnes deftes , quais de carneiro ,
ou galinha, alimentauam o enfermo, em quanto duraua
o mal 5 eram ditozos os que defte facrificio eícapauam ,
morrendo, ou eonualecendoo pay, em quanto nam che-
gaua a elles a vez do cutelo. E fe a cazo no cafal nam
hauia filhos , era força hir matando rapazes à ponta de
frecha,pera fuft entallo.porque o pafto da carne humana jhe
tinha metido o diabo em cabeça , que era fò o que po-
dia reftaurarlhe o alento, & forças , nam fòquando doen-
tes , mas ainda quando eftauam faõs 3 porefta cauza feu
viuer era fempre em guerra, à caça de homens > mais que
de feras , ou foííem contrários , ou ainda amigos , com
qualquer occâfiam que âímauam , por ferem em extremo
atreiçoados , desleais , & brutos fobre todos, & nefta ma-
taria tam deílrasfe moftrauam as fêmeas, como os varoens ,
fenam que eram maismontanhezas,horriueis ellas,que elles,
decião em bandos de fuás m5tanhas,& dêtro as penedias,
onde maisa feufaluo morauam 5 corriam os campos , ca-
minhos, ê£ praias, & nam efeapaua paííageiro algum
que nam fi^eíTempaílo de feu ventre, cm feus banquetes,
& demoftraçoens feftiuais de terreiro 3 tinham por no-
me eftes Tapuyas , lucuriju j & eftaera a caufa porque na-
quelle tempo raros eram os Portuguefes , que queriam
habitar eftas partes , fogindo delias como de morte pró-
pria. Eftas, & outras femelhàntes eram as gentes habita-
doras defta regiam : ôc elfam os caminhos , que guiauam a
ellas nam merlos feros , ôc horriueis.
4 Aqui pois foram os trabalhos a que alludia íofeph ,
profetizando ao Padre Pinto 3 efte foyo theatro de fuás
acçoens , eftas as gentes que hauia de conuercer , & os ca-
mi-
Liv RO IV. CapttvloV.
«41
minhos que hauia de penetrar. Diuerfas vezes rompeoeítes'^"'''"'°*
íertoenshornucisa cuítade grandes fuores, fomes ,& fe-
des 3 &:dcllcs abalou muitas leuas de bárbaros, que trouxe
aos campos faudaueis da doudrina euangelica> com mo-
fíras da íaluaçam de muitos , ficando feu nome entre eftas
gentes eternizado , & tido clle por pay , & amigo de to-
dos , por cujo meio aííbntaram pazes , ou confirmaram as
ja feitas com os Portuguczcs. Porém cu deixando todas
eílas cmprezas, davliima delias fomente direi, quanto
por hora pertence áminhapenna> pêra moílrar a vitima
parte da profecia,
5 JEra o Padre Francifco Pinto Varam Igoalmenté
prudente,Religiofo demuita oraçam , & trato com Deos,Q:'gír. oi».
zelofo por extremo da faluaçam dos índios , deftro cmj|,;^"^"^'"
íeus ritos , & lingoas 5 & fobre tudo dotado de hum co-
raçam grande > ôc animofopera emprezas difficultofas, a
cu)o bo]o pareciam poucas as naçocns todas do Brafil.
Leuado defte zelo, ôcanimo, & nam efquecidoao que
parece da profecia de lofeph , pediò vltimamente com
inílancia a miííam prefcnte , que contarei ^ quanto mais
em fumma poder Partio de Pernambuco ^ com ordem
do Padre JFernamCardim Prouincial. que entam cra,ôc
com ajuda do Gouernador Diogo Botelho,em idade Varo^
nil de fincoenta & quatro annos , no mez de Janeiro de
160;». leuando por companheiro o Padre Luis Figueira ,§uipartidà,&
Religiofo também deílro iiã lingoa firafilica , bom theo-^'^"^"'
logo , & de grandes partes. Foy o principio de fua Viagem
pormar,correndo a coita cento ôc vinte legoas , & dei- ^Xb
zembarcaram na paragem, que chamam lagoaribé : de-
fta partiram por terra pcra o fcrtam , a pc , eftribàdos fo-
mente em feusbordoens , acompanhados de pouco nume-
ro de Brafis naturaes, alguns delles dos mefmos, a quem
hiam pregar. Os caminhos eram infuporcaueis , por hu-
ma parte cheios de alagoas, & charcos > por outra demon-
tes, ôc penedia inacceíTiuel, que íubiaàs nuuês. As matas
Hh tam
2o.-'
I
S erras áaibi
paba,5c feus
veíiahos.
242 Vi DADO P. lósEPH Anchieta,
tam efpeíTas , que era neceífario hir abrindo à força de
ferro veredahumana j o fuftento eram cobras , lagartos ,
& algumas eruasfilueílres, qu€ raramente fe acham por
alli as feras, ôcaues de outras partes, o maior fentimento
dos índios , que fiquem fuás frechas frufíradas ; Dcíla for-
te tendo feito caminho de humanno inteiro , chegaram às
ferras que tem por nome Ibiapaba-. ôc de crer heque lem-
brariam muitas vezes ao Padre Pinto neftes apertos aquel-
laspalauras de lofeph , que hauia de padecer grandes tra-
balhos.
6 Eftas ferras fuppofto que também feras , Sc eíle-
reis, eram habitadas de gente mais humana , da lingoa
commua doBrafil, diftam cem legoas de Maranham,
Òc eftam perto das naçoens, que principalmente bufcâuam
peraprégarlhealuzdo Euangelho Porém pêra chegara
eftas , entrararam os Miífionarios da fé, em maiores traba-
balhosi porque acharam que occupauam as terras entre-
meias três na^oens de Tapuy as bárbaros, cruéis, & íem
rafto de humanidade.dos que atras pintei 5 inimigos nam fò
do nome de Çhriftaos^ mas ainda de homens quaifquer ,
decuja caça viuiam mais que das feras, fempre em guerra
ôcencamifadosno pafto vil da carne humana , ainda de
feus mefnios veíinhos , & naturaes. Tentaram contudo os
Padres os meios humanos por ver fe podiam abrandar a-
-i .. : quelles coraçoens feriáo^ ,a que admitirem fomente paíTa-
<yem por fúas certas , as gentes que bufcâuam 5 mandaram
Mattrtm os pcra eâecíFcito índios embaxadores , com dadiaas , & pre-
nien tgeiros ç^^^^^ ^ ^^^ ^^^^^ g^^^^g ruftica foc a fcr a melhor pratica,;
& mais bem entendida ? porém nem efta quizeram admi^
tirosfaluagésdaprimeira,ôcfegudanação,&: muito menos
os da terceira^antes contra toda a lei da rezam mais feros que
todos deram à morte aos Embaxadores da vida 5 & refol ge-
ram tiralla também aos que os mandauam. Pcra efte intento
deixaram viuo hum moço de dezoito annos de idade , que
íoíTe por guia do caminho, à paragem em que deixara aos
Padres. Eítauam
LiVROlV. Cap. V.
24?
7 Eftauamelles fora de tam grande maldade, cfperando í^p^^^íc^fc^"
reporta deíuaembaxada, ôc traçando modos como podei- í^mto.
ícm confeguir os finsdezejados, cafo dado que tiueflera
repulía daquelles bárbaros. Eis que fubitamente quando
mais deícuidados , ao romper do dia de onze do mes de
Janeiro de 1608. em que fechauam cabalmente hum anno
de íua pcrcgrinaçam , appareceram decendo dos montes
vefmhos, bandos de bárbaros a fom deguerra.atroando os
ares, com alaridos, & gritarias tofcas , próprias de fua
íaluagés 5 acometem primeiro os pobres , & incautos In^
dios companheiros dos Padres^que comoChriftãos, & leaes
feoppoieramcmdefenfa , em quanto a vida lhes durou,
chamando, 6c proteflando que eram filhos do Senhor , 6c
que nammataíTem os Padres, que vinham a enfinarlheso
caminho doCeo,eram innocentes , 6c nam faziam mai
a peííoa alguma. Porem cUes refpondiam ^ que a cí^^cs buf^
cauam , ôcque hauiam de morrer logo a fuás mãos. Ao
eftrondo da peleijafahioo Padre Francifco Pinto da pobre
choupana , cm que rezaua fuás horas canónicas , 6c pro-
curando redufir com palauras brandas, 6c amorofas, os
coraçoensdaquella gente fera , elles com furor , 6c braue-
fa , acommeteram ao feruo do Senhor, & defcarregaram
íobrc fua cabeça , com hum pao groíTo , òc pezado,
cruéis pancadas repetidas ate fazerlha cm pedaços , que-
brandolhe os queixos ,tirandolhe os olhos, ôcpartindolhe
o cafco em diuerfas partes , final entre elles do maior ado
de vingança contra feus inimigos^ & defta maneira ficou
o corpo defte grande Varam , & mártir do Senhor, lan-
çado em terra, cnuolto emfeu fangue,cxpoíloaaues, 6c
feras. ..; sfíi
8 Nefte tempo eftaua o Padre Luís Pigueira feu com- DoT». luís
panheiro noutra choupana pouco afaftada , em fcruico ^^sue»»-
dos índios, quando ouuindo a voz de hum moço da com-
panhia dos mefmos Padres , que dizia, guardate Padre,
guardate Padre , que querem matarte ,. entendeo o Padre
Hhij oque
li!.
Compendio
<}t hiílocia.
144 VidàSo P. Íõseph Anchieta;
o que erâ , meteofenoefpeíTo das matas , 6c por mais que
o bufcaram os bárbaros , nam quis o Ceo por fua proui-
dencia , que o achaíTem. Fruílradosnefta parte voltaram
à choupana do defunto , fizeram preza nas pobres alfaias,
que alli tinha pêra o fanto Sacrifício da MiíTa , ôc pêra
fazer doens graciofos aos índios , ôc contentes com viélo-
ria tam pérfida , & preza tam pobre , largaram o lugar ,
& fc meteram pellas brenhas pêra Tuas terras. J dos os
inimigos , fahio o Padre Luís Figueira de íuas matas,
juntou as reliquias dos poucos índios companheiros que
reftaram com vida, ôc chegando ao lugar terriuel do
facrificio do companheiro, ficou como atónito , atrauef-
íado o coraçam de dor , ôc banhado em lagrimas. lazia
cm terra o corpo fem alma , quebrada a cabeça , desfigu-
rada a cara , chea de Tangue , ôc de lodo : Limparamno
laiiaramno, Ôc metido em humarede,em vezde tumba,
lhe deram fepulcura ao pé de hum monte , qual o tempo
& occafiam permitia , no meio daquella folidam filueftre ,
ôc barbara. Alli fe defpedio Figueira , dando vitimo vale
defta vida a feu bom, ôc fiel companheiro , fentindode o
nam poder fernomanirio , ôc applicando por fua alma os
derradeiros fuífragios de mortosjpoftoque cria quegozaua
da vida na terra dos viiaentes , Ôc izenta de todos os traba-
lhos.
9 Affi acabou neftes defertos , ôc Regiam eftranha,
aquellc combatente forte , zelofo , animofo , em tantas
emprezas inuenciuel ; quanto ao corpo defprezado ,
rendido , defpojado, pizado a pés de bárbaros : mas feu
«fpirito goza de triumphos , entre applaufos dos CortezÕes
celcftiais , que lhe cantam a gala , ôc vira tempo em que
o fanguc agora derramado defte Mártir fortiífimo , ôc
fcus companheiros, faça brotar entre eílas mefmas bre-
nhas , o fruito dezejadoda conuerfamde feusnaturaes. E
temos vifto a morte nam folgada , profetizada por lofeph
famo dantes , a cíle Varam fanto, alcancandolht. de Deos
LiVRõlV. Cap. V: 24^
a faude, & pêra com dia padecer trabalhes, faluar almas,
6í merecer por cfíe meio , a gloriofa coica do martírio. O
paô, com que foy quebrada a fagrada cabeça dtftc ditofo
Mártir , tinto emfeu íangue, achoualií o Padre luis Fi-
gueira, ôc a trouxe a cíleCoIIegio da Bahia , cm que ifto
efcreuo , ôc nelkfe guardou cem vencraçam , atéo anno
de 1624. em que os Ollandezes fizeram cftrago das Relí-
quias Tantas , que poderam hauer ncfta Cidade.
10 O mais que pertence à vida defíe valerofo Ca p^^^-jq^^
pitam da milicia doCeo , & de como andando o tempo ^"c^<í^°^=- ^
treíladaram fcusoíTos pêra fuás terras os índios feus amí-f^?**°""^^
gos de lagoaribé , & ospoferam em lugar mais decente ,
venerando os como de homem fanto , por cujo meio al-
cançam milagrofamentechuuajou foi quando o ham liii-
fter j & como em prefença dos mefmos , qual de huma
diuindade, celebram, & ratificam feus cazamentosiôc ou-
tras coufas muitas dignas de hiftoria deixo de propoíito
pêra quem continuar a Chronica das emprezas,& varoês
infignes do Brafil, que fora bem fahiíTea luz , & nam
tiueíTemos furpenfosos dezejos de todaEuropa cm coufâs
taò efperadas. Fazem mençam defte infigne Mártir o Padre
PedroRodrigues na vida do Padre lofepk/^-soó.Patcrnina
na mefma p. 307. Beretario > ibidem L 4. Felippe Alegam-
bé de noíTa Companhia f. 26$, loam Nadefi dos Varoens
illuftres da Companhia, pag. 8. As cartasannuas do Col-
legio da Bahia ^<sf^. 103. Varies proceíTos dasobras he-
róicas de lofeph. Pedro larric, rerum Indicaram A 3. /. i. c,
56. Pedro Oultreman in íabnlis njirorum illufirium Societa^
tts lefu. Menologtum Societatis hfu impe f um tn apperi"
dtce. Telles , ^ífioria Societatis p i./.s.r. 10. Luis Bigerio,
lacobo Damiam in jlnopft Soctetatis lefuL 5, c. 30. §. 1. E
Hilariam da Coda hfiona cath* Li»
Hh
^
CAP,
:i
Parte I vi fitar
as paiCes do
Sul.
54(j Vidado P. Ioseph de Anchieta,
CAPITVLOVI.
Parte lafeph a vijitaro Rio de laneiro , & Capi-
uéas do Sul, & ohm dmeffas mar anilhas.
Ep 01 s áeliauer vifitado Pernambuco ( de
cuja vifita faltam rela(^oens , nam deuendo
faltar matéria peraellas, pois o fugeito he
fempreo fnefmof^partioo Padre Prouin-
frj:^;;;f/cialavifitar o Rio de laneiro, ^ mais partes do Sul. Por
117.
Tempo dl
paitHa.
Ssumodode
-paíTaco mar
eftas partes o iremos íeguindo , & notando fuás obras he^
roicas 5 aduertindo porém que por falta de relaçoens , na6
poderemos daqui cm diante notar os annos de cada huma
delias ao certo ^ como dezejauamos , nem tambeai cm
qual das vifitas íe obraram , que foram mais que huma ,
porque continuou feu gouerno por outo annos , baftara
dizer qu:e foram obradas fendo Prouincial, vifitandotaL
parte, qtie pêra o intentoimportam pouco eílas circunftã-
cia^ dotencipo tam ajuftado
. ,; 2 Fartio lofeph à fua vifita 5 ^ fe bei de conjeturar ,
foy logo noprimeiro anno defeu Prouincialado de 1578.
porque em quatro de Agoftodo mefmo fe achou vifitan-
do em S. Vicente. Eneíle mefmo diaprofetizou ahí a lamen-
taiKl tragedia da perda del-Rey D. Sebaílíam ( fegundo o
depoimento de muitos) Porém no principio defta viagem
emquanto namfe ofFerece occafiam de fuás marauilhas ,
qiienamferapormuitotempo,hebem que faibamos as
preparaçoens,& apreftosdefte Prouincial do Brafil. Em to-
das as jornadas , que foram muitas , & differentes, feu cui-
dado era fomente, que nam faltaíTc prouizam neceíiaria
pêra os companheiros. Pêra fua peííoa , alem do Breuiario
^papeis importantes a fuás vifitas , de nenhuma outra
couzâ
Livro IV. C apitVlò VK 147
couza cLiraiia , fiado f fegundo feu coftumc ) na prouidé-
ciado Senhor, aquém íeruia. O camarote que fe lhe a-
prcílaLia era do primeiro neceíhtado 5 fuapercnne aíTiften-
cia era no conués , ou ouueíTe chuua, ou foi , abrigado c5
qualquer roupam velho , vigiando, & acudindo às obras
do nauio, como qualquer dos marinheiros, Ôc tam. defiro
nellas que os admiraua. PaíTaua as noites em vigia , & a
mor parte em contemplaçam do Autor dos elementos,
dos Ceos, ôceílrellas , que dalli lhe fícauam^ patentes , ôc
nefta profunda confideraçam , depõem muitos , que foy
viílo por varias vezes arrebatado , Ôc fora dos fentidos 5al-
aum cTpaço que gofaua do Tono , era encoftado ao bordo,
ou caixa de algum paííageiro. Nam trataua de meza , ou-
apparato , que cheiraííe a regalo, qualquer pedaço de
biícouto, de carne , ou peixe falgado, era o feu manjar fa-
borofo 3 feu principal aliuio era cuidar dos outros 5 efpecial-
mente pobres, doentes, & neceííitadosj eíleso achauam
prompto configo, acudindolhes fegundo tempcôc occa-
fiam, aíTi aos corpos , como às almas. Parecia collegio
reformado a naò em que hia. Todos os dias praticaua ,
& fazia doutrina , metendo cm efpirito a todos , Ôc trazé-.
do-os à verdadeira confííTam : nas tormentas , ôc perigos ,
do mar , era intrépido , metia animo aos mais ver^
fados mareantes, ôc daua nas occaíiocns de apertos c5-
felhos tam acertados , que parecia deftrona arte , ou fof-
fe experiência , ou luz de efpirito ; fazia, pafçjar .05 Eibi
tos. -17ÍV r mR'?rnr!ol[ iô , zw
3 Porem he ja tempo que vejàiiios marauilhas parti- Alcança fau*
culares. Foy de caminho vifitar a Capitania do Porto fegu- '^%"'''!^'°^!
, •'. . 1 1- • ^ aolrmao Ira
ro , onde viuiam fomente dous Rehgiofos noíTos com to- ciixo.Dias^.-^
do o cuidado efpiritual de Portuguezés, ôc deindiosna- -Ai-mití
quelles primeiros princípios de fua funda çam. Chegou proc.g.p 20',
doente a efta paragem hum dos companheiros fexis , do^*''"'^'^'*^'
nauio > de mais importância, porque era o Piloto del-
k , Irmaõ noífo infigne em virtude igoalmente que na ar-
te
'MiMl
248 Vida do P. Ioseph Anchieta.
te do mar, chamauafecíleFrancifco Dias. A cazados Fa-
lires era paupérrima, a terra deftituida de tcdo o género
de medecina , & a doença perigoía que alguns chamam de
S. Antam /outros cobrello , ôc vcmafer huma inflama-
•çam,quenace da parte do lado direito, & vai iaurando
pêra os lombos 3 ôcdahi em circuito do corpo , com tor-
mento grauiífimo, & de tal natureza , que fe chega a cin •
gir todo o homem , ficam menos efperanças de vida Li-
<laua o affligiído Irmão com as dores, nam hauia confoia-
^am de remédio, recorreo a loíeph , pediolhe foííe com
clle , dizerlhe huma MiíTa a menhamíeguinteaNoíTa Se-
nhora da ajuda > famuario famofo em milagres , diftante,
meia legoa da Villa» Deulhe palaura o Padre que hiria ;
porem acreccntou , olhai Irmão FrancifcOipcra remédio
defta noite , vntaia parte kza com o azeite íanto da alam-
pada do fantiíTimo Sacramento , que nam deue fentirfe a
May , querecorrais primeiro ao filho Fello aífi o Irmão
Francifco, & mitigou coma vnturaas dores grandes que
padecia, porém fem mudança no mal, como fe ficara re-
feruada a cura deíle pêra a interceíTam da Senhora, & Io-
feph, fèru© fcu ; porque vindo a menham foram à her^
mida , diíTe Miíía , como prometera , mandou o Ir-
mão que foííe lauarfeeom a agoada fonte mllagrofa , que
alli eftà 3 ^ acabado de lâuarfe , couza marauilhofa ? De
improuiíb , ficou nam forem dor , masfem final , ou ra-
te do ma, que o moíe^aua^ o que viram todos com feus o-
Ihos , ôc Uouuaram à Virgem , & feu feruo lofeph. E
depôs cftc venerauel IrnaãiO o cazo com folcmne jura-
mento.
CabeiudcN 4 HeeftaCapella da Senhora fantuarlo celeber-
Senhora. ' rímocm toda a CoftadoBraíil , porque nella Tc ajuntam as
mafauilhasda Virgem , comas de hum Santo prodigiofo
^''' '"''•^'^^ que alli fe venera, &hcS. Amaro/As marauilhas da Vir-
gem tem feu fuodamenco na terra, &agoa, que daquelle co»
mo íàcrariofainkiiato por diuerfas partes a fins diuerfos, &:
prouei-
LiVkoIVCap Vi. V i^^
proucito grande dos corpos, & diiias : as àc S. Amafõ
tcmfundamêto ordinariahicnte em hú caj^dinho 5 qtíelht
Hiecemna mão, & logo he leuadoda fé ,ê>c deuaçam dos
fieis a vários intentos de enfermos , & íae eom outf os fé^
melhantcs prodigios.de huns , & outros podcMiti encherfc
líuros, fe fora nos homens tam engenhofa a curiofidadê ,
como o he a ncccífidade. Deftas marauilhâs tinha grande
conceito o Padre lofcph , ôc tfcrcue delias grandes cx-E^t»^ *^^i^
cedências , emfeus cfcritos. Aqui poisneftefantuario , oUpr'*^'^'^*'
íofí'c naqucllemefmo dia, em qutí alcançou a faude refe-
rida doírmio Francifco Dias, ou noutro, dizendo MiíTa^'''*'
o feruo do Senhor , foy vifto , & leuado em extafis , 6c
arrebatado do cham por grande efpaço fem tornai* èm íi ,
cm prcfençadoconcurfo degente, que prcfente eftaua^
& com efpanco de todo o lugar, que ainda nani tiriha
experimentado femelbantes portentos de lofeph , que a
outros era ordinário j dcuia ajudar aquelle rapto, a con-
íideraçamdas grandes marauilhâs alli obradas.
5 Outro milagre obrou nefta meíma Villa , òuZfl^^íu,
doutra vés , que vicííealli vificar * mas hc certo que éra p"^«'^Ç«-
Prouincial. Tanto que chegou ao Porto diftante quatro^ ^^ j.
Icgoas , teue nouas que eftaua na caza enfermo hum ír-^ *'* ^^
mão noíTo de muito preftimo, & que era tal o aperto da
doença , que o tinha no artigo da morte. Nam fofreo
demora a charidade , tomou logo o caminho que he
trabalhofo , a pé , & defcalço em breuiíTimo tempo , Ôc
nam foy neceííaria outra mcfinha , que apparecerlhe , ôc
a fua prefença depõem o Irmão que ficara de repente bom,
& eomo homem que tornara da morte á vida. Prcnato
6 Obradas eílas couzas , defpedido de reUsreligio.**^^^
20S continuou fua nauegaçam. Eis que chegando â atíi^ 'dctnt^tJl
ítar a barrada Villa doEfpirito fanto , prcparauam ás
vellas pêra a entrada , & com a alegria ordinatia , que '^'^'•^^•*°-
foe haucr em femelhantes cazos , largaram mão à pipa ác
agoa , que leuauam, & ja nam era muita , como aquel-
1 i le$
dUe . ^ -
Jhíl
feii
g,5t> V l D A Í5 o P.J OS^V H À íí tH I ET À.
Ic&j x^jae fe faziam ja com te^tra : Porem Mephclamoujtâi
ta / pam àoícmi^ztcin SLch^uc dl agoa ,>^ que ainda bar de
fer neceííarià. Nam fe^i mtiita impreífam lios óuuíntes,p]Or^
que namvV.iam rezam de dpuidar , 'que hiam peito ja da
barra ,; ôç : o tempo Tereno : mas him fe lembraram do
prouerbio , que nam põem Deos tempo ehi mudaií
tempa, &; virartí que de repente íeniudou efte com
imf.« amHhumpède vento furiofo , que os obrigou a voltarão
' " ■ mar i& andaram nelle tantos dias , quantos foram ba-
ftantes a conhecer, que dizia bem quem osauizara^ Sc que
poderiam perecer à fede, fenamouiiicracautcllanáagoa.
Porém nam fe acaba aqui a marauilha de lofeph , nem o
efpantG dos mareantes 3 porque voltando á barra outra vez
tornou a embrauecerfe o tempo , & laiK^allos com rigor
ao mar, & namíemperigo: Aquife foy aomeiodocort-
ucs ,& chamandoa todosdiíTe cm publico 5 ncftê nauio
vem hum homem cxcommungado , por cuja càuzà iiain
entra , nem ha de entrar na barra , Ôc venhafeamim.que
l^^í.,^ quer qfciehe ,que eu tenho poderes, Ôc o abíbluerei. Ma-
' ""*' rauilha grande , â força defte pregam do Ceo , apparé^
ceo loco alli hum homem.a quem o medo , õu a força dà
graçaobrigou a declararfe em publico * dizendo , que ná
bahiatomaràhumliurodemilagresdacazade NoíTa Se-
nhora de Monferrate , ôc que lançandofe huma carta de
cxcommunham, por meio de D. Fraocifcode Souza , ío-
bre quem o tomara , fe nam reftitUiíTe , ellc o trazia cònfi-
go, encorrendoaditaexcommunham 3 entregou o huro
emprefença de todos, foy abíolto pellò Padre Prouin-
cial , ceifou o temporal , & entraram a barra.
7 Depois de alguma demora feita em terra , na
vifita , & refidencias dos Religiofos , que ahi aíTiacm
( do que nam acho relaçam ) profeguio viagem ao Rio de
laneiro , & do que naquelle CoUegio obrou , diran? os Ca-
pitules íeguintes.
CÁP.
.£S-;.:Í
t»ror'gueá
i L IV R o I Vj C A p. VI L V . 2ii
'jjh~ ily:\:jhr/j'il:f:)f.jfVoiipí:'[:n:i.
tf
<.J 3L'D . OMl£
CAPITVLO VII.
/?<$■ fecebido 'no Collegio com apiãufo de todos ^'Õ*
.cp^d:;.;: còmeçáaobrar matauUhd^/^^^ • *;"*
■i'L
. :>
.1 J-
■Vtf^ -rr-;
A M fera neceíTario defcrèuer aqui àconi- c l l ^
1 _ bara num no«*
mum alegria , com quefoy recebido hof-né qucan.
pede ram grande, tam conhecido, 6t|^'j'^5,'o!n"íeu
tam- dezejadò : Baftarà fazerfe reflexam i^^^^^iâm*
do riiuico, que toda efta terra eílaua obrigada a correfpon-
der alofe|lh , oque nellapadecco companheiro erri todos
feus tfabalhôS , & ahuioem todos perigos , de tam. pro-
hxásgúerràS Entre outros que foram vifitalo ^o Collô-
aio , & dárlhe os parabéns da chegada, foyhúmFrancirco
Domingues morador da Cidade , & hia em muletas , por
andar aleijado, notou lofeph a fealdade ,& trabalho do
homem, que deuia Ter conhecido , ôcdiflelhe, nám nn- p^^^^âUI
deis mais íieíTas muletas 5 reípondeo õ aleijado , que era ,4^.'^^'^
impofliuel , porque fem ellas nám dáiiapaíío, ora troque-
mos , lhe tornou o Padre , dai cà as muletas , 6c tomai èíle
meu bordam 5 fez de boa vontade a íroqua» com confiança
& n^m fe engánoii , porque andoii com elle foltamenté , ^'^\
& em brede íem elle, & de todòfam , ôc jurou depois a . '•
maráuilha , guardando por todafua vida òbordam.da Pa-
dre , por reliquia grande, & ttopheodè vidVòria.;^ r'^:-'
2 Deciã do chorodo Collegio da mefma Cidade í^^^»"^,^*
òndetiLlêra óraçam. Encontrou com o Irmaò enrermei- yngida.
ro , & diííèlhc ; tamaiomaiiteò depreíía , vamos a ca-
za de izibcl Aifonço , que efta vngida , muito mal ^^'''^^Z^®»
applicaiidòlhe la alguixi remédio , 5c íàrara logo : íá co-
nhecia o Irrháo o eipiritò ác Padre , mas indo cámirthá-
do, pêra mais proua preguntou , que mefinha queria fua
íi 1} Rcue-
tSl V ih^Ab o KV^itvn AíNtHI etá >
rencia que lhe applicaíTe ^ refpõdeo qualquer que vos quifc^
res; poque cô ella ha de faiçar Chegou a caza, & achou os
pareces em forma de pratear a enferraaj porem lofeph depois
defaudara todos, viroufe pêra o marido , que tinha jâ
carapuça dedo , ôc IhediíTe , tire dahi iíro,nam ferue ago-
ra , ôc chegandofe ao leito, tocou com a maõ a cabeçada
doente » rezandolhehum Euangelho , ôc diíTe ao Irmão
enfermeiro, dailhe a mefinha que vos diíTe, & como no
caminho o certificara que nsm hauia de morrer , dculhe
afoutamente hum vafo de agoa com açuquar : o qual
bebido , diífeo Padre à enferma > bebeíles ja ? Refpon-
deo que fim , pois leuantaiuos que ja eílais fam j & cha-
mando as filhas diííequedeflemdeveftir a fuamayperafe
leuantar , aíTi o fizeram , ôc fez Deos aqui hum dos grã*
des milagres, que obrou por feuferuo, ficando a caza ad-
mirada , & logo a Cidade 5 jurou o mefmo enfermeiro o
cazo , Ôc referio pòr feus nomes os parentes todos que
foram prefentes à marauilha , & a publicauam depois.
I Recorreoáefte bemfeitor Maria de. Oliueira
moradora do Rio de laneiro , propôs quéandaua pejada dê
huma criatura > &: coftumaua a ter partos perigofos /qUe
^ ^„_pedia , encommendaíTe a Deos o fucceíTo. Refpondeolhè,
de huma mo fereis alumiada do Senhor , ôc tereis bom parto. Dito iílo
partio pêra foradiftancia defeislegoas em companhia de
^ri^;^o^°- Aires Fernandes,&omarido da meíma Maria deOhueira:
vjo. Sabia efte da promeíTa , òc logo ao dia fegumte , quer^ír^o
o Padre dizer MiíTa , lhe lembrou que encommendaffe a
Deos aquelle fucceíTo, Refpondeo com roftro alegre, ja
nam heneceíTario , que Deos tem ja alumiado em bem
voíTa molher : notou a hora , ôc na mefma achou ( tor-
nou pêra caza J que tinha fido o parto com fucceíTo felix
como pronoílicàra. E foy certo que nam tiucra auifo da
Cidade , nem fegundoo lugar , & tempo , era poíliuel
tello , & que fô do Ceo lhe podia fer reuelada a hora do
fucceíTo do parto. " • •
Tinha
Tem reuéla-
|im do parte
^
tiVRoIV. CapitVlòVÍT. ^ %\ .,j„.fc..^
ocT' > Tinha€m fuà cíâza hum lorge Ferreira' morador ^•"*^"* ''*'^-"
da mcfma Cidade, huma molherquehâuiâdous dias in-ír''""
tciros , cftâua fcm fala , ou íínais de vida , & fò lhe palpi-
tauaocoraçam: Foy lofeph virualla^& no ponto que ''''"^^ ^'
chegou afua prefença , dcrepentc falou 3 & lançando ro-
brcellahumabençam , ficou de todo fam, Òc M loao fe
Icuantoucomerpanto dctodos; ^-j- í'* ^-'i - mj;^, ;.»
5 Hum Balthezar Martins PÍofèíiçri^oradorí^
Rio de laneiro , era muj enfermo deaíma , hauía muitos s»"»'""' '^-
ánnos, apertado de f^usrigbrcs, foy buícar o Padre autZol^ft
íc achaua em humafazenda , chamada de Ma^é oedio-""' ^°"'''^
Iheremcdio :diírelhe,idea talfonte, moftrandolh/junto^^TAreMÍ
ao engenho, bebei daquellâ agoa . & rezei áhi finco Pa-'^"'
drenotíos,& finco Aue Manas à honra das finco chaaàsi,/. , ..s,
do benhor , & logo fereís fam. fey ^ bebeò , rezo^ Z^"^- ^ •^•^^•
ôc tornou perâ cafa iam. fem nGquà iiiàis fentir talioença
brauo. Uezejauam os cjiie cuídauam delIâ , metello ta^imif.U^
moenda do engenho, peraa'cuftumallo a trabalhar, más de"" ' ^'"""
balde , porq^je mmtos homens juntos , nain fe átreuiam a «.*? .76.
pegar nelle ; porem lofeph 'lhe dillè, efperai , éfperai fijT^.-s/.si.
chegando ao curral , ondeeftauâ . lançou huma bençam
aoboy ficou mãnfo, & %tomaf acanga rôc-hum fó
negrinho o amarrou ncHá,' o-" .9i.íí, ,■!, ,.
7 Vinha de S Lourenço ferí rfeáidl;^ com'a]aás
companheiros acharam no meio datraueífado mar, queCôr.v.ç.é
he diítanciade huma Icgoá , carduhies de Baieis que'^"^^'**'^*'
alIi coílumamencrara parir 5 em tanta quán^icíáde quc'"'
osrcmeiros dacanoa , riam fabiam pêra que parte hautamP-^--^/-^^
deremar , porque detodas (cmúí tercadoi com perigo
euidente de encontrar algumaâ delias ,ôè feelia no furi-
do. Porem Tofeph ,como jaoiitrá ve2>: vindo JeS. Vicen-
te, leuantoufe donde vinha aíTcnrado , lançou huma bê
çam aos peixes indómitos, & foram viílos Wo enconti-
ncnte margulhar», & iremfe ao fundo.
254- V í b AO o P. i o S E P H A N C H 1 ET A,
Acode miit. : r^ Era tamzelofo de toda-a,pureza;de '^afti<áadc conió
bú.Rtiigiofò viitíiòs cm tantas paricjsdeftahiíl^^^^^ p!?rmo tíéo^jS^?
rSídidt'"íÍ<^5òsqueoc.on rporprpteí^oTdefta virtude:. 3uç-
- ~T. cedeõneíle tempo que hum Religipíp denpíTa GQpipa?
■^rocD.f. ís- nfiia , chamado Eíleuam da Gram/efiandoría Aldeã de
Ihdiois da inuocaçam de, S Bernabé í^ete legoas da Çida-
de/ehtròu por tehtaiçam dopay da.luxuria, em huma lida
perjgofa , em que fentia abrararíe , fora de todo o ordiná-
rio de hum fcruò de Deos i que procura fua perfeiçam:
Deuiàíem duuida lembrarfe dos fauorès tam conhecido^ de
Iofeph,quèentam eftaua no Ccllegio, difíante fete kgoas;i
' põtqiie quando mais àpertadofe vio , achou que fe lhe fazia
préícntede imprpui^ò^, ôc fem noticias donde, ouporonr;
de vieííé, ífie falòuV, & mofírou , que fabia defeu traba-
lho, ôc que por amordeíle vinha; confolou o , animou d
déixoii ó fora daquella oppreííam , ôc defpedioíe deU
le 3 tudo Gom tanta breuidade que ficpuatonitoo Pa-
rr ín- dre Grarn ; te quando quis fazer diligenGiã , doncjc: , òil
por Onde viérá , achou que hárp chegara canoa ao porte
dà Aídeá' âquelle d i a , $í como fo .eni embarcaçani pq]-
dia VÍr,còníièceo claramente a maraUilba de fuavinda ^ ô^
quefóo trouxera a ocafiaqi de CeutrabaUiOyaroearrelIoíC^-
mo áníigoque era feu • ôc o ^ue he m^a^ior efpanto , qu;€
carteado còín o Collegio, achou quenaquelle mefmo tem-
po , nam faltara nelle lofeph, ficando multiplicada a ma-
rauiíhà, atem da rçueíaçam ,, çomqueíêue da tentaçaiB
aU2enté,queaffirtiono'mermo tempo em lugares diftantesf|
U 6c liurovi b Padre amigo de tam euidente perigo. Efte n^jc
lagfe feftificíòú entre outros em feú foíemne juramentp;:^
venérauel Irmão Francifco de Éfealance, ceilemunha aíTàs
cònhecida.Ôc abonada por fua fantidadejooue deíle publicai
Voz , 5c fama , Ôc he ícmelhaníe ao que obrou o mcfaio
Padre íò(eph em S. Vicente como Irmão que eílaua na
1 lha,paííandò a ell^i km\mc2^,pc acuíjindq a fua tenta ça in ,
■"^'"•■'''"'^""" ' ' ■•' ■'"' GAP.
I.'' ' '
LlV RO IV. C APITVLO YlUi ^1^5
:ín.'>obrfjN;;lj , íÍjOt;J •ji)lílítji,Z-'liÁUn'J ih OKVjííI
CAPITVLO VIII r..lo.£Uí ;
t^aivijííar as partes de S. Vicente ^ Ò.oM^ A^^
las algiimmm^i^amlhas. Jíà -, lAoh
■■■■. :; 1 > ,:• . [.-n "h r'^' '
E p o 1 s de pouco têpo de fua chegada áó Rio
de laneiro , & dentro do mefmo anno , em ^^^^^ ^^^'^
que partira da Bahia , feguhdo ás cònjeâ:a-n'aJoafacrt-
ras que leuo , fe embarcou a vifirar à fua ""■'í"^*"'
amada Capitania deS. Vicente , berço primeiro de fuafan-
tidade , & theatroque fora de fuás marauilhas. Aqui no ^í'"*^ ^f- 3^'-
rio embarcado , leuada ancora , & feito à vclla , chegou
abordohuma canoa , que deu por nouas em como htini
Índio de S. Lourenço -, Aldeã fronteira , diftantc humá '''
kgoa, eftaiia morrendo, & neceífitaua de Sacramentos 5
que faria o grande zelador das almás , diííimulariá corri Ò
perigo deíla / Iria auante , cm fua viagem ? Nam hfe pof-
fiucl , diz, que deixemos em rifqúo huma alma 4 tomemíe
as vellas y lancefe ancora, ôc batel aomair, vamos a S»
Lourenço , que nam perderemos por iíío viagem. Che-
gou , confòlou i confeíTou , adminiftròu os Sacràrheritos
ao índio ; & feito iíTo , fc tornou ao feu nauio contente
,<io fucceíío, & com grande prouadaboafortuiia daquel-
la alrha.
2 Porém antes que pariá , toquemos fitirha corte-
zia fánca i ^primorofa que teue com o Prelado Admi-
niílrador daquella Dioceíi por nome Bertholameu Simões - 1
^ • ^L nii ^ Coíícziasâca
Pereira < que também eítaua de caminho pcra ^s mefríias a«cteuer5<^
partes 5 offereceolhe, com humildade Religiora fua em- ^'''1f°/'^"
barcaçam, dizendo que era capas pêra todos , boa devel-
la(ôc por ventura dandolheaenrender, que nam reârrepéh -'"'"'• ^/-'^í
deria da efcolha.)Nam lançou maò o Prelado do òíFc^recí-
mentd
■•:m
■vílll
Teuereuela-
Afi
nct.
mento da embarcaram de lofeph , dizendo que também ã
fua tinha vella ,ôc remos, & fabcria caminhar :pore;ji^|§L9
cahio bem na conta , jguc era diuerfo o yento , que fo-
praua ao feruo de ]b^osv& -tnthia as^ellas^e feus dezejos j
partiram as ^uas embar^çpcns, como ,em çompetencia^ ,
i&comaduertenciados que fbuberam o que paííara entre
os dous 5&0 cíFeito foy , quea erribarcaçam de loíeph
voou de Áianeiraque chegou cm vinte , & quatro horas
ap pç>np dezejadp 5 chegando |i do Prcíado Adminifíra-
^pr , dçppis de finco dias, & nam muito contente de fuc-
i:e:0bs aduerfos do caminho. Foy celebrada efta contenda,
êf auida pormilagrofa a brcue viagem de lofeph com fuás
çifçmiílaneias.
3 Neíla vifita de lofeph em fua amada Capitania
çímda pVrdtdeternos-hemos pouco, porque nemarelaçam que delia te-
baftitmem^ "^^^ hc muita , Hcm o tempo que nella gaftou foy longo
fegundo conjeduro. Mas porque nam paíTemos do Porto
de Beritioga,onde defembarcou fem marauilha , conte-
mos Ipgo a profecia celebre, que aqui teue da triíle tragedia
daperdadel Rey D.Sebaftiaõem Africa^porquenêfe eÇcõ-
7-</.«<íjar#.diâoaeftcgrande feruo de Deos os fucceflbs do mundo
v\aZ"^t'^ majs remontados. Dous dias Te deteue nefte lugar, vifírã-
doa Aldeados Maramomis,& foy vifto , & notado do
Capitam , ôc Toldados da fortaleza , que alli eílaua , andar
furpenfOíôc triíle no primeiro delles , fem admitir co-
rnercio dos homens , como coftumaua , & fendo pregun*
tado de alguns pella cauza , refpondeo fomente as palauras
feguintes Nefte dia fe aparelham trabalhos grandes aomu-
do , & nam quis dizer mais , nem que alguém lho pergu-
caíTc. Notáramos prudentes o dia , tendo por certo , que
alaum cazo notauel fucccdera nelle. Pâífado algum
tempo, chegou nauio.ôc trouxe a trifte noua da rota
do fcneniíTimo Rey D. Sebaíliam , infaufla laftima , &
fentimento eterno dos Portuguezes 5 & aucriguado , foy
omefmo , emque foy viílo andar triíle ;, quatro de Ago-
fto
Poc.X.fio~.
lApenfe. \,
Stret.p. 200.
Tater». p i8u
■^T
Iate
XiVRo IV. CapitVlo Viii. iyr
fto eloannoder:)78. Eftamcfma defgraça contou nou-
tro tempo , quando ja eftaua por morador no Efpiritó
fantoa hum íeuamigoo Capitam Miguel de Azeredo jire^
latandolhe entam por extenfo o íucccíTo delia , aíTi , & dá
maneira que tinha acontecido, òc lhe fora rcuelado. E
pergunrandolhe o Capitam fe morrera elRey na batalha.?
Relpondco quenam.Einftando, fe era viuo/* Refpondeoj
iííolam os legredos, que o Senhor guarda pêra fi.Èftâ fc-
gundarclaçam feita a eftc Capitam , cuidou o Padre Bal-
thezar Telles acima citado , fora feita em quarto de Agd-
{\o nomefmo dia da batalha , o que foy engano da infor-
macam , porque loíeph naquelle dia , nam diíTemaií
que as palauras , que ahi a pontei , & fe auerigua , que ó
Capitam Miguel de Azeredo eftaua entarn em logaf
mui diftante na Capitania do Erpiritòrartto, Ôc he cdníe-
quencia , que depois indo lofeph àqUellâ parte , lhe referio
o que eíl adito.
4 No mefmo porto de Beritiogá , agafalhandofê em doTquçqVze
cafa de hum Parcoal Barruío, fuccedeo o cazo dos riiance- í*™^"f' ""
DOS mereduios, queapoftaram a experimentar fe era Io- fu» faiícidá-
feph lamfantocomo diziam/' A tempo de jantar traça- *^'°
ram , que fcruilTem à meza algumas índias moças defcóni- jproe. R./.4è,
poftas , & nuas ^ aprefentaramlhe de comer , ôc fiii-
giramfe elles idos a negócios de Importância fora dê tazâ;
recolhidos fecretamente cm huma camará. Hiam cõrfctí-
do os manjares pellas ftruentes , pore'm lofeph antes de
comer bocado , pêra honra , & gloria de Deos , que tudo
vé, & confuzam daquelles hoíricns atreuidos ^ pregun-
k-toua huma dclles , aonde eftam voíTosamos / Refpondeò
.inftruida , que eram idos fora. Entam lhe diíTe , nani
he aíTi , ide àquella camará , moftrandolha com o dedo , Ôc
chamai ca Pafcoal BarruFo , que era o principal do en-
redo 5 foi a índia deulhé o recado;qu ai ficaria o mancebo,
confiderando , ôc temendo que qtiem poderá conhccello ,
podia cafligallo / Appareceo enuergonhado diante de ío-
Kk feph
fii l!i|
V 1 K À CO ff I O SEP H t>E Anchieta,
feph > Ll^P^oufe a feuspcs , & pcdio perdam de feu atreui-
ni€ífitp;5[ reprçhendço amorofamente , mas com cfficacia^
meftr^dQlbe íeu erro , ôc cautelando-o pêra o futuro.
Té r utiâçío 5 5:^ ^ ííV iíitando a caza de Santos , chegou ao porto da-
tma^&^^dà" ^^^íl^ '^i^^^^ Rio da prata , vinha nefíe hu
feguro»hú HiéroniÉio Ortega homem nobre morador da terra
omeia o. qyç j-jj^j^^ commetído hum crime , ferindo grauemcnté
frotxf. 67. humfobrinho do Capitam, mu j aparentado na terra ; cftc
Hiçronimo Ortega fe veio meter homeziado em noíTa por-
tí^ria i antes de ancorar o nauio, ôc primeiro que outra
peflbâ alguma, porque quando chegaííe a noticia do cazo
aos parentes do ferido, cftiueíTe clle cm íaluo. Achou a
^az;Q ^ ou depropofito alofeph na portaria , queorecebeo
êc antes que elle lhe contaíTcfeu homezio,a cauza delle,ôc
de feu intento , tomou a maõ lofeph , & lhe relatou todo
efeito , aííi, & da maneira , quefuccedera , com circu-
ílancias, que fò elle, òc Deos fabia. E depois de narrado
o cazo , comoquem ja o tinha preuifto , ôc tratado com
Deos,lhe diífe , ora fenhor Ortega , VoíTa mercê lance fora
■ ibir^í r - o temor, porque por mais, que façamos agrauadosnam
ham de chegar a fazerlhedamnoalgum^ ande fegijroi &
trate feu negocio. Ficou efpantado o homem: porque fa-
_bia que nem tinha vindo nauio ourro,nemdo em que viera
podia ler noticias , & muito menos ãsis circunílanciasfe-
-cretas do cazo fuccedido em parte tam diftãte.Tcue o dito
•por oráculo, Ôc vio o cumprimento detudoíporqucpaííeoti
;2t Villafeguro , ôc fenhor de fi , fem que ja mais feus c5-
trarioã ouzaífem tomar delle vingança , fendo que eram to-
cdQ3 poderofos , ôc graues. Tudo depôs Ortega em feu
sjurarpento folemne, Ôc muitos outros que fouberamo
cazcb^íbo^'"'. - .■
C«oteíríuei ^ Terriucl foj ofucceíTo^quc acontecco eftãdo vifuãJo
hoa Fadirpor o Collegio de S. Vicente com huma índia chamada Luzia,
no^e Lu7,iB. £j.3 eftan^ui conhecida nefta terra , por fuás boas partes
. da natureza, ÔC nas da graça fangialeella aueatajada , con-
fef.
LirRoIV. CAp. Vlir.^ 259
ícíTando , &: commungarido cada ,outo dias , & trazendo
enganados os Padres Teus cor^ííores , dandolhes a enten-
der grandes coLizas de íua boa conrciencia,pelIas quais era
dellcs fauorecida , ík bem tratada. Succedea pois, que
veio Luzia à noíía Igreja pêra confeííaríe , & commun-
gar como coftumaua, & nam achando em caza feus con-
feílores ordinários, mandou chamar ao Padre lofeph /po-
rém enganoufe, fe pretendia enganallo também 5 Porque
odeftroMeftrede efpiritos , que conhecia feus embuftes
(podemos cuidar,que com ordem do GeoyTe mandou efcu-
zar,dizédo,que deixaíle porentamaquelleinrenco,&nani
d íTemais.Foyfeconfufaa fingida deuota , & nam deuia
fer íemjmpjlfos com que Deos tentaria feu eoraçam , Cui-
dou úo que qjcria dizer íofcphj masríam cooperou com
a gr.Tça. Chegando a caza , fingiofe ■doente, êc. como era
tida por virtao''a , os Padrerdo CoHegio mais grauês , â
mandaram viiltár comprèfentesácommòdados à-dóefícá,
ô: por ventura cftránhoii alguma íéueridade, que aO pa-
recer vfaracomella lofeph. ( que nem a todos da Deo^ a
mcíma graça de conhecer efpiricos.J. De Jium deftes pfe-
Teares, que os Padres mandaram , fabendo íoícph, foy
ouuido dizer aquemoleuou j eançam de balde ; cânçam
de balde os Padres , dito que meóeo em cuidado aos que
nam fabiam a cauza : Porém paf/òu muy pouco tempo >,
& viram huma tragedia trifte 5 porquea doente fingida ,
entrou de veras em anciãs de dores mkfâms,^ foram tkis,
qu^^arrcbcmoupcUas ilhargas Jançando juntamente das en-
tranhas huma criança morra,fmal de fuaincontincncia oc-
culta,aGabando a vida,com tam infeíix forte, & comipréfa-
gios tam vehementes de fua perdiçam 5 deixando confu-
los os Padres, & o efpirito da Padre lofeph mais refpeii
7 Outro cazo fuccedeo eíí ando neííe merm© Cof-^
Icgio f fe defta , ou doutra viíita nam determino , mis
hc certo que era Prouinciâl. J Entrou huma fúria diabo»
Kk ij lic^
li
Buitt por
téò Vidado P.IòSiptt ÀNCHlEtÀ»
liça cm hum morador defta Capitania fulano Pàncâj,
ckuiafer de poder , & fequito. Foifedc noite a caza áú
lítortê dT bú Capitam mòr daquellas Villas Hieronimo Leitam , com
*""* mão armada » a darlhe de punhadas pêra o matar : Acu-
i'f#r.i?./.,.5,dio gente a defender o Capitam, nam ouue eíFeito,ficou
&siijs paf. prezo o aoereíTor. Sabido do delito o Alcaide da fortaleza
da barra por nome Thomas Garro , julgando-opor atros*
& Je cabeça maior , Icuado de zelo de juftiça, tratou confi-
go íò de enforcar aquelk delinquente com toda a preíTa
aquclla mefma noite, porque quando foííe manham,ouuin-
do os homens cazotam fero, viíTem com elle o caftigo i
mas dcftc intento nam tinha dado parte a peíToa alguma:
Porem lofeph , que defcobria coraçoensitcue rcuelaçam
do fecreto : & de repente depois da meia noite, tomou cÕ<
|)anhciro,rem que algum doCollegiofoubeíTe, veioáca^
za do Capitam oíFettdido ^ po^ fe diante delle de joelhos*
com hum crucifixo na rtlâõ , êc lhe pcdio perdam pêra o
malfeitor. Bra elle , humano , pio * & mui íeuerente aos
ditamens de lofeph ^ concedeoltie o perdam, afíirmoulhe ,
que nam fabia da intetiçaírí do Alcaide tam ápfeffadaii
mas certificado de lofeph.que tinha âlli vindo à Villa , 6c
eftauâ nclla com cfte intento, fe foy hum, 6c outro àqucl-
las mefmas horas a fuâ caza , & lhe pediram ambos que
defiftiíTe, porque elle tinha perdoado, & fe daUa por fatis-
feito de fua offenfa Então ficou atónito o Alcaide, ôc
publicou á noticia de lofeph porreuelaçaõdo Ceoiporquã^
tt) affirmaua com graues juramentos , que a nenhuma pcf-
foa communicafa fua rcfoluçam , Ôc quefó intentauadef-
cobrilla , quando juntameíítepofeíTe na forca o delinquen-
te. Foy efte fucceííb notório é & dcUc fazem mcnçam os
proceíTos Êm diuerfas Vezes.
8 Acháuafe hum diavifitàndoâ cazadePiratinin-
ga , quis prcmiáf a certos meninos difcipolos da efcola ,
qucentam vifítâua , do Padre Vicente Rodrigues, man-
dou 9 hum delles , quc foíTeà horta, 3c colhcíTc féis li-
mas
Òo(réti(ó
I
LiVroÍV.Càp. Vilí. 2«f
mas, foy, mas fez como rapaz , porque cm vés de fcis , cò»
Iheo doze , & deixou a metade efcondidas em parte, dô-
de podeíTc arrecadalas , quando fâhiíTe da cfcola Eííela-
dramzinho nâm entendia a forte de vifta de lofcph , mas
logo afoubes porque tanto queelle lhe entregou âslimasi
madou outro menino,que foííeao lugar cm que occuhara
as outras feis,&: astrouxcíTciaífímofez.&dandoasaoque áâ
guardara , oreprendeo,& diíTc^ tomaj ahi, mas apren-
dei a nâm furtar. Correofe o pequeno ladram , Ôc propóá
emenda, em cujo penhor fe banhou em lagrimas de pejo.
8 Voltou loíeph dando fím a fua vifica , pcra o Riò
de laneiroi porem antes que o recolhamos á fcu CoUegio, Sacccffo r..,
he bem , celebremos o perigo mànifeflo de que Deos 0""''^°^° '^
liurouao entrar da barra, poià 6 celebram às rdaçocnsdeb."!""" *
feus feitos heróicos. He efta bárrá como ja defcreue-
mos . hotriuel aentrada Cm tempos áduerfos , cercada ae'"^'-^--^^"^
penedia . & Hhasdiuerfas qucmetemriiedoaosmareáhtes^
porque qucbratíi nellâs os mares, & he entrada iriuV c-
ílreita. A efta paragem chegou lòfôph , m occáfíãm teme-
jrofa, junto àiioite , no meiòdehumatempeílade,& fer-
taçamdeneuoasefcUrás , quando jaherii os ventos dauâni
lugar â amarrarfe , neni os marinheiros õufauam com-
meter entradà,[)oftos em confUÉaríi, & efpanto. Póíêôani-
modclofephnam defmaioií. poz-fe ao pc' do máftograndci
& feita huma breiíeorâçám animou a gente, rtjandòii a-^
commetet a barra, & deu palatíra que chegariam a fal-
uamento5 & foy o mcfmo obedecerem à voádc lofcph
&fufgir de dentro fem perigo algum ,- com efpantò doâ
mareanfes, que otluerani por milagre grande. Poííos fe-
bre amari-a , era noite ainda , & choííia muita agoa , pore
lofcph, manejando aos mais quefcrecolheflem, ficou trá
oraçam ao pe do mafto ; dandd gfacas ao Ceó por íâítí
grande mercéiÔc vindoa manham /quando todoá cui-^
dauamvello molhado, acharam que eftauá emxuto com
nouo eípamo, & foy leuádo a fed Collegio como cm tf iufo;
u$
Vi dado P^ IòsEph Anchieta,
■-•-<' t
, 1 / > ,í í
f :t
CAPiTVLO rx.
mi/agres do Rio de laneiro atèo anm
-m
Côo fins! da
CruzfarthCá I
foftetr,».
RiXr,' p.z6i
A D E c IA no Colleglo do Rio o Irmão Gon-
çalo Luishíãapoíleina debaixo de hú braço
com grande inchaçam , ôc dores. Tinha ap-
plicado os remédios da medicina todos ,feni
quê^podeíTe vir afuro, chegoufea elle lofeph. Bufcouo
íugarna poílema » pòdhe o dedo, lançoplhe hiima beni
çamem cruz, ôc logo arrebentou a matéria , & ficou sè
dores, & fam, com paCmo dos furgiões, que nam fe atreuiaõ
a porlhe alanceta.
t Corria fama publica nâ Cidade do Rio , como
^°^?»'=*'^*- em todas as partes do BrafiKdos effeitos marauilhofos^com
frnios de ào Q^Q curaua os enfermos Foy chamado pêra htim por nome
resdecabeç,.^^^^ p.^^^ , atormentajo de dores de cabeça annos
Froc. R.f Sc. haum, a quem ordinárias mefmhas nam approucitaram^lá
&iH.&ui^ preparado ^ílualmente pêra fer metido em banhos rigoro-v
fosi nam tomeis tais banhosihcdiííeíofeph, porque haueis
de morrer ndks, eu vos mandarei huma mefinha , que
logo r vos tirara o mal „ tende fé j foyfe pêra o Collegio j
mJndoulhe hum barrete feu, & no pomo , que o enfer^
mo o meteo na cabeça , de repente o largaram as dores , &c
palparias i que tinha , ôc ficou fam pêra toda fua vida , fem
que mais tiueíTe fombrá do mai paííado, 6c foy dar as
araçasa feu bem feitor. O mefíiio cfFeito experimentou o
Padre Gafpar de San^perés de noíTa Companhia com ou^
Tv...5/.5itro barrete, que lhe dera, & guardou íempre por reli-
quia, que todas as vezes, que fen tia dot de cabeça, f de que
foy moieílado ) era o meímo polo que ficar iam 5& nani
Li V RO IV- Ca p. IX. aèj
fò Gom feu barrete , mas com qualquer parcc de fua rou-?"q«iq«!
pa velha , obrauaa fé dos fieis caZos notaucis, como ia^«=''q"'» **«
noutros lugares vimos , ôc aquelle, quehauia àmãohuma *''* '"'
reliquiadeílas , tinha conceito que achara hum thczon- Troc.c.f. 7^
ío de mefinhasj ôc andaua demaõ cm mão , continua- '^'^*^'^*'^^'!^
mente em empreftimos.
3 Era também interceíTor de couzas perdidas 5 ja He interccfj
noutras partes moílramos alguns cazos deftes, &moílra-^°'^V°"^*^
remos outros ao diante : No Rio delaneiro foy celebre o'''"
dehuQi António Louíada 5 eftehomem fora medir certa ^'■"^•"^•^'^^^
data de terra do Collegio entre matas efpeíías , & perde-
ra nellas hum façam de eftima , que confígo trafia. Tor-
nando a recolherfe , achou menos a peça , ôc moftrauafe
graueniente fentido com tal extremo , qtié qderia tornat
tile mefmo a penetrar as matas , que diílauam legoas , em
bufca delle. Acodio lofephnamá valia , masà paixam do
homem demaíiada , diíTelhe , ora deixai , que eu o manda-
rei bufcar , ôc elle virá á vòíTa mão 5 defpedio hum Indioi
deuihe final quefoíFea tal parte entre tais aruorci , & eni
tal lugar , que ahi acharia o façam , & trouxe o , & com
cUe a alegria do homem , que celebrou o cazo em todo o .
Rio de laneiro , que nem fjor fer pequena a prenda , dei-
xa de fer milagre grande , femelhante a efte referimos jã
outro em S. Vicente.
4 Adoeceo no Colíegio o Padre Ferfiam Cardim ca-
panheirodo Padre Vifuador Chriftouam de Gouuca hó
ánnode 1583. Era tempo de partir a vifitar à Capitania de p^ín'^^ '^
S. Vicente, & fentia nalmao Padre namieuaro compa-^"^'
nheiro coníigo, porque confulíados os médicos deziam ,
quefeo leuaííe , o íepultaria nomar. Neftaneceíridadefe^T/^*^^
foy o Padíe lofeph ao choro , refugio commum de íuãs
duu^dasi Ôcfahindo delle,encontrou o Irmão enfermeiro i
chimou o , &: diíle; ideao Padre Vifitador, & dizeilhé
Gomo de vos. Padre dilate voíía Reuerencia fua partida
até amenham ,que eu lhe darei a feu companheiro fam,
1
rnacn
lim
V IDA^iy^â P.I ÒSEPH Alí CHiETA.
£;,p" ^ ide maneira que poífa hir fem perigo algum , & o torne
a trazer valente a efte CoUegio, ficou o Padre Chriílouam
de Gouuea fufpehfo com tal dito , olhou o Padre pêra elle,
& perguntoúlhe , quem diz iíTo r^ôc logo parando hum
*'" ' ' '; pouco, a)nítderandoíem duuida , queencraua loíeph na
promeíTa, pois fóclle podia fazella , aíTentou com o Irmão
queefperaria.Iuntoufe oenfcrmeiroentãocomo Padre Io-
' fçph.foram ao doente, ôc amefinhaque lhe deram,foy fo-
méte hum caldo , o qual bebido depois de alguns vómitos,
mandoujhe deííe de jantar, & acabando de comer ficou
perfeitamente fam: embarcoufeaofeguintc dia > profeguio
viagem , & voltou ao Collegio femraftro de doença, em
cumprimento da palaura dada :cazo celebre entre todos
os Religiofos.
5 Entre todas as extafisdelofeph ,foy muy notaUel
a que lhe aconteceonefte Collegio do Rio de laneiro. Saiaí
certa menham hum rapaz de dentro da Igreja pêra a ef-
cola , ôc diíTe aos outros , que foíTem ver que eftaua nel-í
Lufifno""la o Padre lofeph morto: A efta voz, & fentimcnto dÒ
buci. rapaz, acudiooMeftrepof home António Teixeira ^ fe*
TroeFf i € 2<^^àoàt muitos dos difcipolos , & chegando a hum re*
treie mais efcufo da Igreja velha , onde eftâua humá ima^
gem de Chriílov Viram todos o feruo do Senhor trefpor-
tado, os olhos pregados na fanta Imagem , os braços cai^
dos ,ÔCQ Corpo encoftadoa huma cadeira como defunto,
fem vfo algum dos fen tidos , depvois ainda de hum tropel
de gente, que falaua , Sc fe condoya : Gonconeram ahi
mais outros Padres do Collegio , os quais confiderando
defpaço aqucllc efpedaculo, fabendocomo experimenta-
dos, que nem era morte,nem acidente natural , pegando
nelle , & chamando a vozes altas , o defpertaram , &: re-
colheram. Foynotauel efte arrebatamento , ôc conftad©
teftemunhas que foram prefentes aoaéio.
'%&
GAP.
tiVRO IV, G APlTVtoXS
i<j
GAPITVLO X.
Profecias ^ ^ Reuelaçoensdõ me fmo tempo.
C H A V A s E ó Padre lofeph , vifitarido cer- ^'?f'J'" "y
ta Aldeã do Rio de Janeiro , quando che- umia
garam a cila , o Procurador do CoUe-
gio , com outro Irmão Teu companheiro, fj^rf[.^^.^'
mandados pello Padre Reitor a negócios»
Chamou os logo , & diíTe ao Procurador , tornai ao Col-
legio , deixai nelle o companheiro , que trazeis , Òí tomaj"
outro , Porque a eíle Irmaõ efperam aíTas de trabalhos ^
ôcincommodidades, quenam fam pcra caminhos. Succe-
deo tudo , como fe o eftiuera vendo com os olhos , por-
que o procurador foy ao Collegio ^mudoud companhei-
ro, ôc o que deixou , cahio em cama , de enfermidade
tani graue que chegou a ponto de morte .- & aífi liurou o
enfermo de inconueni entes maiores^ que era força paííaíTg
por caminhos , & em doença tal , ôc ao Procurador da
moleília , que comelle teria na expediçam dos negócios,
2 Partia no annode issj^^a mefma Cidade pêra õ Coí-
legio de Pernambuco outro Irmaò da Companhia. Fazia- ardb*d?d2
felhe matalotagem neceííariá preciramente pêra a tal Via- o""oirrnâo.
gem : Soube- o lofeph, ôc diíTc ao derpenfciro , Irmão fazei j^ |^ ^^ '
dobrada preuençam, porque tem dobrada viagem, que fá* Rodr.f.n^i.^^
zer do que elle, & vos cuidais * moftròu-o aífi oracceílb , ^'^'"^'^'^' ^^•
porque nam podendo tomar Pernambuco , por força de
ventos, foy Isuado a huma dásantilhas, parte muy diílan'-
te 5 & aqui entam conheceo que lhe erabem neccííari^
matalotagem dobrada. ^' •
3 Fingiafc hum homem viuuo, fendo na verdade
cazado em partes diftaníes , & determinaua dcfpozarfe de
I! tioud
.oiuau
tfiuá
ilM
266 Vida PO P. IpSETH ANÍí^MfETA.
Profetiza a nouocoma filha de hum morador da Cidade. Concer-
laa de numa
moihera An tauamíc ja OS deípczorios , quando fabendo lofeph do en-
^° * gano por meio diuino , fez remontar aquelle homem pe-
u u,. ra Angola, Aqui foram ás queixas contra lofeph fentindo-
^''^'^c f/l fe o Pay da moça , que eíloruaíTeo cazamento de fua
filha. Porém o confiante Selador , lhe defcobrio entam o
engano, com outra profecia maior 5 affirmandoque a-
queile homem era cazado em certa parte de Portugal ; &
tanto aífi que quando chegaíTe a Angola acharia naquella
terra fua molhcr , chegada de três dias > ôc alli faria vi-
da com ella-Efpanto grande. Nam corria ao cntendime-
ío do homem , que humá mólher que eftaua em Portu-
gal, ouueífe de fer achada em Angola , ou a que fim?
porém tudo lhe fez certo o tempo , porque ã molher dei*
xadado marido por largo tempo , refolueofe a vir buf-
callo ao Brafil , em tal occafiam > 6c temporais, que foy
forçado o nauio arribar a Angola 5 & ahi a achou o marido
com admiraçam , chegada de três dias na forma que dif-
fera lofeph? por efta via ficou impedindo hum dehélo ck
norme , com damno tam graue de duas molheres 5 & o
pay da moça que dantes fe queisaua , ficou depois danda
íouuores a lofeph. í q
4 Eftaua nos extremos da vida, hum Irmão ntífít^
chamado loam Marinho , trataua o enfermeiro daríhea
Vnçâm, diíTe lofeph que fe detiueíl^e hum pouco , for
âochoro diante do Santiííimo , & do que alFi fentio i4^
■pnc.c f. i3.óraçam , veio a elle , & lhe díífe , bem podeis efcuzafr a
,^ís.^ Vnçam » que nam ha de morrer o enfermo 5 nam ouue mi-
■^-: l'"^- j[|er j^ajg ^ parou o enfermeiro > & juntamente a docncap
farou , ôcviueo muitos annos cite Irmaõ.
Outra profeei. 5 Achandofc hum dia na fortaleza da barra , chá-
acera de Diada S. Cruz , cm prefença do Gouernador , & muitas
peíToas a tempo quefahia hum nauio de mar emfora , vi-
ram que duas vezes eítiueraaponco de perderfe,& perfiftia
nopçrigoj quei^auãreoGouernâdor doPiloto, dizendo.
vídadc hfi
hacn úAttioi
lue
^
Livro IV. CÀP. X. 26^
qiie era por falta de roim apparelho^rerpohdeo a iíTo lofcph,
ora nam hajam medo que fe perca , mas contudo nam ira a
Angola ondepretende hír 5 nam ouuiode balde o dito o
Gouernador , poz em lembrança , & foube dalli apouco
tempo quefora arribado a S. Vicente, & perdera viagem.
6 Deceoogentio brauo do fertam , fez hum outrtdehúá
aííalto cm huma paragem , chamada Macucii , Òc leuou ca- ^oiher ca-
tiuos muitos efcrauos, & huma rnolher por nome Marga- ""*"
rida da Corta ; laftimoufc hum Irmaõ defta rnolher Gafpar ncc Bf. €7.
MagclhiensaoP. lofeph do fucceílb trifte 5 diííelhe, man-
dai apoz elles os índios, & ide com elles, & naõ vos aga-
íleis, que quando voltares, haueis de acharem caza VoíTa
Irmam. Partio eõ bõ fucceíToA qiiãdo veio,achoU em caza
a Irmã fam) &raIuâ.comerpantográde,& jurou úfúccc(í'o
7 Era dia de S. Lourenço celebrauafc a fua fcfta eiii
huma x^ldeaj diftanre huma legoa da outra parte da Cida-
de i o Irmão iManoel do Couto tinha preparado hunbá
comedia, cm louuordoSanto , aquéacudiotodoopóuo^
masquantomais^eviaempenhâdo em hofpcdes.ranto ren-OutrM«rcá
tia mais o tempo , que cflaua metido de chuua fem ceifar 5
queixoufe a lofeph , que eftaua prefente , que nam pode- TrocB.f.èé.
ria fazer o aâ:o. Riofeo Padre de feú cuidado > ôc diííc ,
Irmão, mandai vos bufcar irjuitas patrrieirás , que fáçamí
fombra aos ouuintes y porque haueis de ter muita calma.
Nam quis mais ouuiro Irmão , mandou bufcar copia de
palmas , dequeabundauaoíitio, ôc todas nam foram ba-
ílantesa defender do foi , que feria , em quanto fe reprefen-
tou a comedia ; foycazo celebre em todo o Rio delanei»
ro , qual liafurpenfam da chuuá da outra comedia de S.
Vicente, mormente por fuás circunftancias, porque nâm
fó parou a chuua dentro em trcs , ou quatro horas que du-
rou o paífo^ fenamqueacabado elle continuou perenne ,
durando aquelle diâtodo , &o òutrofeguinte fem ceíTar.
E o que mais he, que afíirmouo auditdno , queetíi quan-
to eftí^uam à comedia embellapaz , viamchouerportodo
^A ' Li ij éi
bs»33C}
.í\ .^o-.'\
Prorioílica
qae ntm f;
perderam rer
Cosnauics.
'■:*l'Sfií' 4
, :í'!tíH/»,i:lil!'li'iriiili(
Preuia coe-
uerfiitii de hú
pec€»dot'
profecia d»
arribada de
hú honné à
Bahia.
Proc.R.f. U
im Vidado P. I osèpH anchi etá ,
o í-éeòh€iauò , como fesò pefaa comedia do Santo eftiueflé
referuado o lugar da reprefentaçam.
8 Narnelmá Aldeã de S. Lourenço eftaua , quan-
do no meio de huma tormenta hornuel^ foram viílos an-
dar os nauiosdcfamarrados do porto no braço do mar , en-
tre a Aldeã , ôc Cidade , Ôc com perigo cuidenrc , por-
que o vento impctnofo os leuaua à cofta com violência
grande , Ôc prometia fa2ellos cm pedaços nos penedos da
praya .compadecido lofcph do cazo , rtcolheofe à Igreja
emoraçam , 6c depois de algum breue tempo , tornou
aicCTre, ôc diííeaos PP.queaUi feachauam, Gonçalo de O-
liucira , Manoel Fagundes , ôc outros » nam ha que te-
mer , nam ha de hauer damno algum Efcaííamente aca-
bou de dizer , quando de improuiío parou o vento, ôc
ficáramos nauios em paz.
9 Auia naquella Cidade hum homem deuaço nâf
vida, ôc coflumes, conhecido por tal i ôc odiado dopouo
porfuas infolencias : Com efte tomou amifadelofeph, que
a todos ganhaua as vontades : Veioafazello Mòrdoríio dat
fanta Confraria das Virgens , nam fem reparo dos mais
coiífradcs , diíTclhehum Padre amigo ofencimento com-
mum dedes homens , porque fazia fua Reuerencia official
das Virgens hum defalmado ? Reípondeo, fabeis porque .<?
Porque tenha alma : ôc neftas palauras deu a entender , que
tinha promeíía de Deos j que hauia de trocar a vida : Ôc af-
Ç\ o vio a Cidade, porque foy conhecida nellefua nntidan-
ça, chamauamlheo conueriido do Padre lofeph, Ôc con-
tinuou com goílo de todos na fanta Confraria.
ló Determinaua hum homem partir do Rio a Per-
nambuco 5 tratando com o Padre, nam aprououaida : Po-
réch replicando que era neceííaria , deu à cabeça , como
pronofticando trabalhos 3 mas ja que aflíihe , lhe tornou,
que importa a ida i lembraiuos que indo à Bahia vos focor-
rais dos Padres da Companhia nas neceífidades que fe ofFe-
íecerem, porque pêra iífo lhes efcreuo que vosfauoreçam.
Re-
LtVRo IV. Cap.X.- 2è9'
Replicoulheo homem , que fua jornada nam era à Bahia ,.
nem tinha para quchir â ella,que fua dcrotaerá direito á
rcrnambucoj contudo, difl*e, vos nam fabeisosfucccíTos
que haueis de ter, fazei o que vosdigò:& com cíFei-
to efcreueo a carta que prometera , era occafíâm doutro
nauio. Seauio efte homem fua viagem :, & tiodifcurfo dellá
O roubaram Francezes, que o lançaram na Bahia , corhò
lofeph lhe fignificara , 6c com os trabalhos que lhe preuira,
mal tratado, defpido , & com íô humâcamifa rota. Á-
quiíelembrou cnt;im das palauras do Padre, bufcoú re-
médio à fuás neceíTidades , & veio achallo na Compa-
nhia , por modo nam cuidado , porque qiíercndo {)ro-
feguiríeu intento por terra â Pernarhbucò , poftoa cami-
nho achaua mil impoíTibilidades , alem de fei* entam diffi-
cultozo por rcfpeito de índios que ò alTãltauam 3porém che-
gando aííi defcorifolado a humá Aldeá dez legoas da Ci-
dade chamada S. António, àchoii alli hum Padre de ná-
çam Ingrez, ao qualrepreíentandò fdaneceííidadè.comd
era rouDadO;pobre,ôc riam tinha {JcíTe pêra pagar á ín-
dios , que o acompanhaíícm * & outras còuzas de feuâ
fucccílos, lhe perguntou como era Teu nome i ôc dizen-
do , quefc chamaua Miguel Aires , fe áíegroii , ide IHe fez
certo , quefolgaua de O ver, conhecello , & ter lugar de
a]udallo , porque liauia de faberque elle tinha humá carta
do Padre lofeph , em que lhe dizia , que hauia de hir alli
Miguel Aires , neceíTitado , que o fauòreceíte em tudo : &
que por feu rcfpeito lhe daria todo o aprefto , & Índios i
íua vicígem neceífafios ; o qUe fez com eff eito, ficando Ai-
res agradecido , & auizado perà outro dia dar mais credi-
to às palauras de lofeph Anchieta. E vemos ríeíle cazd
duas profecias rtoraueis , huma que hauia de arribar à Bá«
hia, outra que hauia de hir ter a Aldeã em queeftauao P,
amigo , pêra o ajudar.
II fabricauafe a fortaleza da barra da Cidade, cHa^
mada depois Santa Cruz, abriãofe fobre a firmeza de hua
Lí iij grán-
P! iiiiiall
.;i"ítíi'-li».l!Íl|l![l
ltó!-lPf|iilj
li
if-O V I D À D O P. Io S E P H A N C H I ÉT A.
ba fortaleza g-j-gi^^elg^ca OS alicerces aopicaai , ôchia a obra ao pare-
dí barra do O ^ . ^ , , ,*■ „ • ^ / ^ ^^ .
Rio que ccr f orxiííini3, dc pcclra , cal , & cantarias Porem lófcph
c^mÍda!io" chegando ao Capitam delia Gonçalo Corrêa de Sà^>i
w"' JhediíTepella lingoa da terra, amigo trabalhais de bal-
de, porque o mar ha de eomer efta fortaleza 5 o mefmo
& 97. diíTe em Português a todos os prefentes : Pareceo impoP'
fiuelo que dizia 5 porem dalli a poucos mczes , eftandoaca-'
badajVirama riíca ocfFeito 5 porque o mar kuou a forta-
leza , com artelharia, & cazasde íobrado , que nclla ja
eftauam , fem ficar delia huma fó pedra 3 o que mereo em*
pafmo a todos , & o juraram por profecia grande. i
|í*3- S^€»â m &^' e#3- Bíâ- -Sé^' ^3-*è3-t^-&i>3-6^-te>3 •?*? ^^ ^ ^ t<33-£<í3.-£í>3' í*í •íè? .fe*3 im- 1
CAPITVLO XI.
■■>ú':>
De huMa armada que ãpoftou ao S.io de lãâètrâ^
^ dí^maramíhd^quecom ellaohfou.
Õ R efte tempo, & principio do anno de
i58i..aporiouà Cidade do Rio de Janeiro a
^ertl)rblfe % ^fiE^^S armada de Diogo Flores Baldes , que c5-
ftfdfaitalda ^^S^^fe^^"^^^ dezafeis velas, foy efta armada
áqaella Cidade cauza degrande temor y mas a íofephcau-
za denouasmarauiihas. Appareceo de repente , nam eí pe-
rada j defronte da barra , huma legoa ao mar j lançando
ahi ferrro- Perturbaramfe os moradores , nam tinham no-
ticiai, que de Portugal, oU doutra parte alguma , ouuef-
fe de. vir áquelks mares numero de vellas tam exeeííiuo ao
ProfetÍ2í lofe , , * • . . * • ' /-• ' J
ph que he podcf da tcrra 5 julgaram que eram mimigas. Cuidaua ca-
anjg. «nms ^^ Qual dos Cidadoeus , dc como hauia de por em cobro
da,& que trás n > . .
hum grande fuQs couzas , tudo era Gontuzam, oc elpanto^ a imitaçam
pmcdío^^^quídosdemais coníeçauam também os Padres èo Collegio a
ha de pedir a p^^ cm faluo as couzas fagradas da Igreja. Porem lofeph
com feu alto cípiritofez foíTegar atodos, & diffc., ning.uem
■ ' . ' fe
Cõpanhi
LiVuoIV-Cap. XÍ. 27t
fe perturbe > aquella armada nam he inimiga : &t olhando '^'''"'■c.f. lè.
do alto dchuma ianellajdondefedercobriâ, acreccniou,ari- pJc^l-l^.pJã
tcs aquellas nãos nos trazem hum homem oííícial grande
carpinteiro , que ha de entrar enl noíTá Companhia , &:
nella ha de fazer grandes feruiços á Rehgiam , & grande
augmentonas virtudes. Ao dito de lofeph ficoiiem foíTe-
go a Cidade toda,- cfperáràm occaílam, Ôc fouberam que
era armada Caftclhena, de três mil Efpânhoes , com que el-
Kcy D. Phelipe I J, mandauâ aíTegUrar o eftreito deMa-
galhacns, & vinha por General delia Diogo Flores Baldéá
homem de grandes partes. Foy recebida com igual alegria
a grande pcrturbáçam paíTada , 6c veioa lançar ferro nd
porto ordinário com paz, & amigauel conformidade.
2 Aqui fe vio o grande eípirito da charidade de Io- Èrpíníode ca
feph. Trazia eíla armada muitos doentes , & neceífítádos ['^''^"A^T-
da demora , cc concraítes da larga viagem j deu traça c6
que fe Iheaffinalaííe caza de hofpital > qiie té entam nam
hauia naquella Cidade . a efta fez tráier os doentes, &
dcftinou Rcligiofos para feruillos , ôc áíTiftir a fuás curas , co
furgiam , medico, & todoò necèíTário com grande def- '
peza do Collegio : & pêra os íaõs , pobres, 5c ncceíiitados
mãdaua dar todos os dias na portaria hua arroba de carne ,
ou peixe, com toda á farinha heceííaria pêra qiiantosvieírem;
6candauao mefmo Padrevólaníepellascazasdosque ne-
ceíCtauam, & nam podiam vir aportaria , & lhes Icuauá
cfmolas particulares, confolando cora fuaspalauras a to-
dos em terra eílranha.
5 Porém vamos ja ao Carpiinteiro , grande oífíciaí ccprírasto
quepreuiodajanella , hauia de vir pedir a Companhia ; íras^ímtí-
Chamauare elle Francifco de Èfcalanre , de quem neíla í^**?^'™*"
nura taremos muitas vezes mençamsefle pois defembar Companhia,
Cando em terra , como fe daquella janella íe Cofntra-
trara com lofeph, a primeira couza que fez , foy bufcaf
a portaria dos Padres, & pedir que queria falar còm o Pa-
àíG Prouincial ; deulhe o' porteiro recado , ôc no mefmo
ponto
i^2 Vi DAbô P. Iosíeph Anchieta,
í'ré^.C'f-^7pont6 , lhe deu à entender lofeph , que fabia quem efa a
peífoa , queo chamâuâ , & o pêra que. Poucaspreueii-
ções foram neceíTariâs, lançoufe E fcalante aos pés de lofe-
ph , como couza ja fua,& íofeph o aceitou como tais
& lhe profetizou logo alli , que perfeueraria naReligiaiíx
confiante até a morte. O effeito da profecia , & confe-
quencias delia vio aProuiiicia, ôc vera o mundo quando
f<íir a luz a vida defte Irmão fanto , que contem couzas di-
gnas de memoria. O qual depõdo o cazofobredito, diz cm
feu juraméto,queíÍzerao grade impreíTam em fua alma,entre
as mais,aquellas palauras que lhe diíle, vos ja eftais recebido
na Companhia; ôcnâm entendera por cntamaoque allu-
dia, fendo aquella a primeira vez , que falauacomelle, Ôt
lhe pedia a Rcíigiam : porém fabendo depois o que diííera
da janella , a cerca de fuavinda , venerara as ditas palauras
como profecia^ & cauzaram huma^ grande alegria, & affe-
étoem fêu coraçara por toda a vida,
4 Entre as dèfafeis nãos da armada , vinham qua-
tro carregadas de baílimentos. Neftas fuccedeo hum pcri-
Por raeio de
fua oraçam
díhumg^iTdc §o notaiiel, porque recolhídasa huma- eftancia mal fegu-
perigo. Yã , ou obrigados os marinheiros da força das agoas , ou
Troe.
por pouco práticos do lugar , eíliueram a ponto de per-
pZr,.p.i%%. derfe com fentimento grande da Cidade. Lâftimadolofe^
ph recorreo a feu coftumado refugio da oraçam , & coni
defpacho efficas 5 porque o mefmo foy começar a orar que
fairemas nãos do perigo i dom appiaufo commum : ôs
porquefe viíTe , qUe foram eíFeitos de lofeph, permitioo
Senhor que o Padre EfteuamdaGrammouido do fuccef-
fo alegre , entraífe nocobiculode lofeph, como a darlheâ
noua? & achando ainda na oraçam arrebatado, & como
abrafâdoemfogo, defpertãdo-o, antes que ouuiíícpalaura
fua, diíTcEíleuaõ namha mal algum,romentefeperde6hu
batel , mas nam a gente delk. Ficou certificado Gram,qu6
fua oraçam fora acauza> pois era impoífiuel faberoque
por via natural , nem he em lofeph eouza noua;
Teus
rcucrencia
que o Gene-
" iiade
5 Teuc noticas o General de todas feftáè còuxas' Conceito, è
tratou familiarmente a lóCcph . 6c de Tuas palaiitàs , & ^ro"
prefença ficou tam a6Feiçoado, queo vifitauâ a cada paf- "' ''"^
ío , & aprendia delle diârámes corh mUico proueitò do ^"^'^^'
crpirlto. Siiccedeo que tihha prezo ènifuá haò hábonieih Frocc. /jz
Ingres de naçàm , que adiara rtóRio de tarteírò , por di-
zerem .que hauia paííadooeftreito de Mágalhaeiís , pêra
onde hia o dito General, parece pêra leualo por guia. Foi
vifirallo huiii Padre noíTo por nome loam Baurifta , ôc
pediulhe que o foIraíTe fobre fiança , afim de arreca-
dar diuidas dosqUè com elle contrataram naquella Cida-
de j fintio a petiçam o General , pella néceífidade que tinha
de guia, & começou àmoílratíè agaftâdò ; porem def-
culpandoreoPadre,quefeti Pronincial o Padre íoreph o
mandara fazer aquella petlçanl , deimprouiforeprimiolo^
go o rentimento,& diíTe, fe o Padre íofephomanda, fa-
çafe , nani queira Deòs , qub eu bbré contra ò que eiie se-
te: porque a primeira vci qué o vi , huHqua còuzà tiiais
deíprefiuelíeme reprefentou , niás budindo o, ôc tornan-
do a olhar pêra elle. niírtquáem prefençáde alguníá Ma-
geftade mefenti mais apoucado. & reúereníe. Tal èrà ò
refpeito . que cfte General concèbeo de lofeph , & he
bomexeniplòefle pêra defenganar abs Honiens , quò fõ
confideram o de fora , & por elle julgam 5 deuendo ver á
diíFerença que ha de còrpò a èrpirito , Sc de natureza a
graça. Qtiantos vimos por tdda efta lenda , que fé ériítatia^
rampello exterior de lofeph /a cuíía de feUs défpfefos3
& de fúascoftas quebradas; a efies todos íeprehtíidia fèríi-
preamtcirezade feu efpirlto , ôé íicárani éonfúzos, Sc
cnuergonhà.los.Aqudle menos confrderadoírmãòda Ba-
hia, auahoua lofeph por pouco digno de Prouinciãl ;
mas vendo depois fuás virtude^ , ficou confuzo 5 aquel-
les que em S Vicente antes de conhecclloodefpfefararti,
vifnosque ficaram arrependidos , & fè íançauárh a feu^
pcs, pedmdolhe perdam, Sc fam tudo auifos do Cèo 1
Mm que
•I
274 Vidado P. Iosèph e>e Anchieta,
que iulm3€moshomcns,iiampellaface, mas pello cora-
cam. Trazia lofeph oCeo na boca , baílaua sò otiml-
lo fallar , & viafe logo , que morauaDeos nelle, & aca-
bauaeffeitosniaraUÍlhoíos> que pareciam impoíTiucis 5 tal
fov a foltura daquellc Ingrez , que depois deliure tratou
fuás conuenienciasy & como temos por conjeduras,
acompanhou compofto honrado voluntariamente ao Ge-
neral , no intento que delle pretendia.
CAPITVLOXII.
Da P afearia celehre de Mafiâcaà , &das ma-
rauiíhas^ que nella obrou,
o i cekberrima â pefcaria da Maricaà áo
anno de i$h- parece quenella quis o Au-
tor da araça , repccfentar huma como co-
.r^r^ ^r> -V media de toda a variedade de acçóens > &
figurasaodiuino.Maricaâ he humaalagoa, que a tempos
íe abre ao mar, diftante fete legoas da Cidade do Rio ,
donde coílumam tirar os moradores grandes cargas de
peixe.
Figurasdciía 2 A cíla paragem mandou o Collcgio em boa con-
juncam os feruentes de caza com alguns Índios, & hum Ir-
mão por nome Pedro Lcitam, a fazer pefcaria pêra fufte-
to dos Religiofosno anno de 1584.com eíles quisacom-
^ panhar o Padre lofeph, com pretexto de fazer alh of-
£cio de Sacerdote , & dizcrlhes Miífa , & confeííalosj
mas os intentos principais eram tratar com Deos mais re-
tiradamcnte naquella folidam ,& por meio àtiít trato diui-
no deixar ao mundo a doutrina de tantas marauilhas , co-
mo iremp^.vendo. £ a primeira como introducçamfejaafe-
guinte* , . S . , ■ ■ , , r .■ r- m cat). : . ; . X3
dift.
LÍVroIV. Gap. Xlli V
2575
sdostil srn
.013;. -j
à Hia caminhando por terra para Maficaà lofeph » ^«'^''uiiu
& ós conipanheiros , fizeram noite no Caminho ao pè dec" So^:
hL>m penedo , que chamam Itaipuig cm huma chou- ''"°""p*"'^'*
pana de palha3 heo lugar furpeitofo de onças , & tiares"""
fcros,quepor alli aOaltamòsquepaíramjeisqUe alta noite ^""-^f'''
fcntioo companheiro que lofeph fahia fora ,( parece ""''"^ ^ '°'"
que a orar mais ao defcuberto do Ceo) , Centrando
depois de largo cfpaeo , tomou hum cacho de bananas,
& laaçandoas poucas . &c poucas pêra fora > dizia, tomai'
tomai vos outras vofla porçam , fem verem com quem fal-
laua,- fahio o Irmão ,ôcpergunrod!he , voífa Rcueren-
cia a quem lança eíTas bananas / Refpoddeolhe , a eftaá
minhas companheiras j ficou entendendo que eram as on-
ças que o acompanháramjôc riam feenganou,porque vindo
amenhamínocou & ^iooraftodeduasonças,que che^auá
areaportadachoupana,final.dehauelioacopanhadoj&ve-.
rificaramno niaisos Indios.que.viram na área o fafto do P;
juntamente cõ o daqueíles ammaes & c5 argumento ínfal-
huel da marauilha de íoíeph a quê rcfpeitauaõ como fenhor.
4 A fegunda marauilha Tejá , qufc por tr-aça, ôc
â)uda de lofeph colheram os miniflrOs da befca tam ^ran^-i'^*""'^^*
decant,dadedcpeixe,ded,uerfásíbrres,queparcceoatd-'cPÍ^^^^
dos mais milagrcque cazo natural , & foy de tal manei
ra 4ue encheio as praias , §c por mais que íalgauam pcra 1:1:^''^
conferuallo muitos feruentes, fícaUapatte delle inútil sc""'"^'''^'
que podeííemaproiieitallo.Tudo atribuíam os índios â
arte de lofeph , porque clle lhes moftrauaos poftos, em
que hauiam de Jançar as redes . ôclhc dizia dantes acarta
depeixe, quehauiamde tomar, como fe ostiuefa cm vi-
ueiro , fem q(3e nunqua fe tiutííe achado outra Vez no tal
fitio Succedeodcpoisdeílafegundá marauilha maíof- pot'-
que correndo ao cheiro de r^nta quantidade de peixe ba-
dosdeaues de rapina,mafitima.,ar "tefreííres,chcaarámá
fertsíntas que impediam os officíaisque obrauam a^ faíaá ^'^•^'^•^^'^
fofregas, & Voraces 5 Queixara mfe ao Padre- íofcph qué
Mm i; pêra
4IIÍI
^^'■"^■'Siillli
u'l!tMlli.lilll»ll
W<'
:i-ifi
^6 V pUADa P.IOSEPH A«CH.feTA.
, M,.«ai»;cr. ehíetálUfpftauammuka parte dot^'»?^'^^^"^^'^^
L.«s V.. r *7ehcndeo a. auíS , & lhes mandou , falando com
*" 5te eL»gPa Brafflica. cjue logo fe apartaflim . &
B S offcm,mais importunas aos que trabalhauani &
S"iabada a pefearia tornaírem porque .c^har.am feu
Lnham. Erao it«petio de lofepheffica^.avifta de to-
Ufe d^fpediram pellos ares . fem tornar huma fo, te que
acabada a obra toda foram viftas tornar a bandos bufcar
'■" Tl^fm\Snas aue.,mâsnosahimaismais fe-
...,Uaomermoimj^o.P«M^^^^^^^^^
nlws'5Endo os olhos cobiçofos aos que trabalhauam ,
,.ô„o.,..;Í'^;,Jiabemaos officiai? > tanta vefinhança pore
rr"' S o Irmaó comacomp^nhia de lofeph he d.Je^
qle folgaria vellas mais de ptrto , ( dcma entender ferrt
^^•'■'H- SeriS J certificou-oelle que afe feria; fallou as onças .&
?IÍÍ6//ffihes qíetornaíremp^o depois.porque algunsquc-
ÍÍme lai mais de perto :Affi o fizeram as fe.^
qracabado o tfabalho daquelle d.a , embarcados m
huma canoa lofeph com fua companh.a , foram corren-
do aquella praya . mui perto da nbeira , ôc aqu. entam.
fahiZdéfuasbrenhasasonças, & c_omo obedecendo
à" vkramiuntoaagoa.& fe tooftraram aprafvuej.
Iniuide efpaço a olhos de todos os queh.am por mar.,
romakgriaf& fem perigo, cc--tinhapromet,do^
ph. Aqultomou hu-^orjam de ?^^^;^^^^^^^^^^^
canoa na praya , pêra leu comer, w. j.iui g
minhíb .1;^^^^^ _ ^^ ^^^^ ^^^. j^ i^, ,cp3^,
to , entra o mar afazer figura nefta comedia . que rfe.
nrefenta aqu. o Ceo com feus elementos ,& creaturas deU
f '•'';«, les. Tornados outro dia a continuar fua pefca , em qu^»»-
^'■''■^ ''■ to os officiais eftauam. occupados . ret.roufc lofeph a lu^
garfeparado^namefma praya, onde nam era vfto &
f. Obedece
Jhe o rn«r
' r »i i-ív»orv-CAP. xir. 27i
pòt-R m em contemplaçam . & foy eHátal , & tam dé
efpaço.que falcando rto lugar fuâprefénça por largas oras.
(& por ventura era tempo de tomar refciçam ) nam fa-
bcndo algum onde eíliuelTe; foy o Irmaõ em bufca delk
pellas pegadas da área. que deixara 5 eis que vé ( ptodiaio
admirauel , ) que tinha o Senhor renouado alli por ?eu
feruo a marau.lha portentofa dos filhos de Ifrael ao f«i.4Í>,
^affar do mar vermelho , porque indo crecendoa maré cõ
fuascoftumadas enchentes , fora fempre rendo refpeito ao
que eftaua contemplando . & agradando áoSenhor da-
quelle elemento, & fobindo pelk praia afima grade efpaço
tmhade,xadodlefoaJofeph,comoentreparfdesde£oa
de huma , & outra parte , & elle no meio affcittado: sé
que nem o minimo rocio tocáflc fua roupa. Chegando o Ir-
mão a efte portentofo lugar.âtonitoque via nam oufaaâ mè-
terte por entre as agoas . forque cftaua muito longe , &
nam confiaua de fi , fizeffe Deos cotn eílc á maradithâ.
que obrara comfeu feruo ; de d chamou á vozes altas,
mas nam foram eftas baílantes . pêra erpertàr áquellá ai-
ma.que cftaua arrebatada i Sc embebida em softoser-
ceffiuos. Ate que confiado o Irinaó riâ graça diumá. fefoy
metendo entre as paredes de ágoa .chegando a lofeph. &
d.zendoqueera tempojade recolhcrfe. Efpértou loféph .
& poz- fe a cam.nho , porem aqui he de ver hum erítremés
dmmo graciofo . porque o Irmão quis vfár policia cotti
feu Super.or .deixouohir diante, ficandofe atras , mas
7lZ^^t "r° f^°"«i3^ porque a agoa vinha feguin-
dofeu natural cammho, áffl. ScdamefiSa maneira que lo-
hiÍL. P "Í°'^P°' confeguinte.vinhamo-
Ihando ao Irm.o que fícaua detrás , & a quem nam rei
conheçam ,mper,o ; te que ouué por bem arrependerfe
com o medo i porem lofeph que de propofito o deixara J ' -
cahir na dcíconhança . olhando pêra clle , lhe dilTe '* '■'•**
como reprehendendo o . IrmSo nam fabeis . que o mar
& o vento obedecem a Deos / & em chegando a lugar c5^
Mm iij petente
""'™;i
SfSobreofue
ceíTo de h
"Proc.C.f.tT,
Patsm.p 5 i §
e.à% Vidado P. losEPHANÇHfí TA.
perentc* fe juí«aramas agoaS , o caminho qúí hauia
entre cilas; fe fechou ,. & continuou o mar ftu eurfo
ordinário ; .deixaBdocciçbreàquella paragem > & ficando
ella por efpanto de tan? grande milagre ■= iazem delle r ef-
çecial mençam 05 proceffos.ôc efcritores da vida defte fet-
uo de Deos repetidamente, ^ ■
7 Eftaua certa noite ceando no lugar da meima
ce,.o .e .at pefcaria , quando olhando pêra o Irmio que comia ,_difle,
n^íqaeeftau. çljjpQflacle peixe guardaia;& perguntando o irmaope-
'""""" raque/Refpondeo guardaiaqueha defcruirabuma peffoa
neceffitada. E logo indofe por em oíaçam . d.ffe. encom-
mendemos a Deos hum atribulado, que eftahora eflae^m
perifio. Pairadas duas horas , ou mais de tempo , fendo
ia noite, eis que chega ao lugar daquellas praias hum^ mo-
ço por extremo cariçado,mclhado.cheo de frio & defomei
porque erainuerno,& os lugares por onde paffara dei-
prouidos , quevinhaembufcadeiófeph , com cartas da
Cidade , em vendo o moço. de quem ja tinha reuelaçam,
recebeo humanamente. &diire ao Irmão, que Ihc^defle
a ceara pofta de peixe queficára ; & ja fabc o Irmão . o
pêra que a mandara guardar : o a quevinhadeze)aua faber;
& lofcph . tendoas cartas fechadas na maó, antes que as
abriíTcílhe diífetiidooqueellas continham , que fulano
homem principal da Cidade . lhe mandaua pedir que
acudiíTe a feu amigo Aires Fernandes * que eftaua atribula-
do , em perigo da vida, como jalhe tinha dito i.ftohe o
que pede, porem eu. diíTe , mais de proueito lhe hei de
fer de cà que là.Ofeguinte dia teueoraçam, & diíTeMif-
fapello enfermo, & acabada ella , pergUntoulheo IrmaOi
fe hauia de morrer . ounam ? refpondeo. que paffariamal.
masque efcaparia com vida, & fuccedeo afficomopronQ-.
ílicou. .
"f»;fr»
CAP.
Livro IV. CapitvlóXÍÍR 170
CAPITVLOXIII.
!&cenafÈgmdadmmaramlhaidamefmaT?efçam.
ONCLtiDAa pefcaria com os fucceflbs
ditos . mandou lofeph fufpender a fabrica,
carregar o peixe, & fazer preftes â partida, ^"'fuf
- ~.^^ como era tam grande a copia de cargas , '''''"••
% necelTano conduzillas a Aldeã dos índios , q„e diftau ,„, , , ,.
três Icgoas. chamada de S.Bernabé , pêra que^eftes aju- ^-'Â'
daíTcni aleuallasao CoIIegio. Hauia de fera partida na tnc- *'*'• '"'•
nhamfegumte.eftauaotempocei-radocomgrandeschuuas,
diaclhe o companheiro, bom tempo cfcolhe voíTa Reue-
rcnciapera a conducçam deftas cargas , que eftà metido
o inucrno, & he o caminho trabalhofo , & fera pendfoa
efta gente ; íua repofta foy , ah Irriiaô , adi correfpondera-
mos nos a Deos , como elle tem cuidado de nolTa^ couzas
porque nam nos ha de chouer a menham . & ja def*
agora nos efta o Senhor preparando a via , porque hcftá
tam grande tempeftade de agoas. que viftes , nem gota '
cahiocm todaaeftrada.poronde hemos de palTar : con-
tentes como d,to prepararam . partiram em rompendo á
a.ua , & foram experimentando o caminho feco,& enxu-
to . por efpaço como de trinta pés pêra Os lados , qual fc
minqua chouuera , cftandoa mais parie da terra molhada.
& feita em poças , admiraçam , & alegria juntamente do
que hiam com cargas.
2 Porem aqui perá mais aíiuio . fahítíò'6eo coni .
alkntado no braço de huma aruore hum mono grande í,°''-^'°*-
barba o, aprafiue . gritando a oucrds , & fazendS '"'
t.diculos. ( fegundo feu coftume brutefco ) depozf car!
mH
'i'' I
' vil
ito Vidado P.Iosit>H AWCHiiTÀ ;
gá hum dospefcadores, &como fam deftros na frecha i
tanto como napefca, fez tiroi &cahíò cm terra o mo-
no , com queixas , Ôc eftrohdos de vozes , que atroâuam
montes , ôc vallès , âcudirani dé toda aquella mata , â
feus fentimentos todos os monos , que por alli hauia $
qualfamiUa dolorida àiiiórte do parente maísproximo,ôc
taõ atentos às dores do amigo. que deuia fer pai,ou auo>qué
chegaua5 arodealloemprefença dagête, como fazêdblhes
txequias funeraes,na5 menos,que feem fua folidam eftiue-
raò.Porè os índios que nenhua outra couzâ dezcjauam,efti-
mulâdos do caricato , & fome , entre tanto dcfcuídodos
bruços , aliuiandofe todos das cargas defcârfegaram nuuês
de írechãs , Ôc foram cauzaqueconuerteíTem erii pranto
próprio as exéquias alheas , Ôc fízerahi banquetes de fuás
carnesjmas recolhida quantidade baftanteimahdou lofeph
fufpender os arcos ,• Ôc fallandòlhes em lingoa Brafiíica ,
diíTe aosqueficauani , fazeis fazei vosoutras exéquias,
que eu vos aíTeguro ò campo. Foy efpeiflaculo feftitial, por-
que obedecendo fizeram prantos laftimofos , chorando
amargamente , como a choros * as triíles queixas da mor-
te defettrada defcu maioral^ leuantando humdelles como
Antiphohá, ôc reíporidendo outros em tom triíle 3 ré que
loíêph j depois de recreados os companheiros , íhcè
mandou que fe foííem eom faluo conduto do rigor dos ín-
dios
3 Chegados que foram a S. Bernabé, achou no
porto daquella Aldca occupados hunsJndios , em lançar
^*humacahoa ao mar? Êrà ella grande i o lugar mal difpo-
cóflo , cançauamfe os pobres , fem eíFeito. Vifatii a lofeph;
íiòmeme! Ôc pelto refpeito que tinham à fua fantidade , pediram que
interpofeíTeani fua bençam , nam fò a bençam , mas
^*''''^''^^^° minhas mãos porei, refpondeo o fanto , ôc foy de tal efiPei-
to.que lançando a bençam , ôc tocando com a mão , de re*
peílte fefoy a canoa ao mar 5 ôc confiderocu que fizeram
maior efpanto eftes Índios deíle milagre que de outro?
de
Miljgre da
noa que Ia
çouao masT
.*t.--); p
LivroÍV-Cai> Xill. 281
de maior porte , porque tem pêra fi efta gente, que sô el-
les fam os Hercules das forças , & íe prezam de robuílo^
fobre todos os homens, ôcdeuiaíer grande a hcccífidâde ,
que conílrangeo a confeíTar/qUe erahi maiores as forças de
lofeph , que as fuás.
4 Profeguio feu camihho perà o CdHegio , & co- hau «« ré*
mo tinha voado a fama da grande pefca. que loíeph fizera, ^^
da graça , & dom, que o Senhor lhe dera pcra dcfcobrir
poítos, & lanços de peixe , encontrando hiím homem ^'^^^«''"rúh
que vinha com apreftosa fazer pefcárias no mefmo lugar,
Ihepediolaneafít fua bençam fobrc fuás redes , pèrá que
tiucíTe fortuna qual dezejauâ j lançoua lofeph, & deulhe o
Ceo boa dica , porque as redes fe encheram de peixe,
até riam querer mais. Chamauamlhe os Índios o fenhor
dao pcícas 5 & quando hauiam de hir á ellas o confultauani
conioà oráculo, & nám lhes fahiam friíftradas fuás con-
fianças.
5 Chegaua ja embarcado em fúá canoa , á certa pé-
fagemdo rio da Aldeã , que dcíemboca em hUm braço de Milagre áoi
mar , fitio alegre , cercado de mangues, Òc ordinariàmen- f.^"/^" *^^
te pouoado de aues . que por alli nacem , a qiie chamam fo^tr*
goarazes , do tamanho de huma gailinha , àc de cor çar- -
meíim fíniífimo qUe tira i^eráro^o,; h2iCcmhnntúAo^^J^^
le tazem pretas , mas em crecendo iliáis , defpeni aquellá ^'''"- ^f'^^
cor , & veflemfedocarmefim jaditò, q^eretrea os olhos. IfZ^ã
Aqui tinham chegado os noflbshaueganteé , más dúândò^'**^^-'' í*-
hamam de gozar de tam fermòzâ viftaalegfè á todosòs due
paflam, os raios do foi eram denlafiados , ét cuftaualhe
caro ao companheiro o áliuiòdos ôího5 , tíuaftdó ò cor-
po todo fuaua , & íeabraíauam ós fcmeiros; bropoZâ-
loíephfua neceílidadc , & ham foynouoneUe ofemédio:
viotresou quatro dcíías áuespóftâsfbbrehúmmarièúè 1
chamouaspella Imgoa BYafilica entendida dos IndiÒsTque
ícmauam .dizendolhes, ide VOs outras, chaiTÍàia voííascÔ-
panheiras , & vinde aqunfâízer ÍOmbra a eítes^nCaímado^
Nn feruos
Bmiii.
Pceué huna
perigo ne»
tanel
Tíodr.p. 2,14
ig2 Vidado p.I oseph Anchieta:
feruos do Senhor ; eftenderam as aucsopcfeoço, como o-
bedecendo , Ôc logo voando foram bufcar as outras , &
cm brcueefpaço voltaram feitas em nuuem graciofa, &
fizeram reparo à canoa humaboa legoadcmar , até que
entrando viraçam frefca , as tornou a mandar a Teus vfos
Gommuns , defpedindofe ellas com eftrondo de vozes
tofcas , mas feftiuaes, entendidas fomente do Autor da na-
tureza , que as criará i acho que foy maior portento efte
que o da nuuem, com que Dcos defendeonodeferroafeu
Pouo mimofo do calor do foi , tanto quanto mais tem
de araciofo , & aprafiuelcfte chapeo de foi , que aquelle.
Nem foy nóuo efte milagre em lofeph , outro vimos
femelhanteem tudo , em S. Vicente,
CAPITVLOXIV.
pane do Rio de lan eiró pêra a Bahia , liura 0
- nauio de dom perigo s^aues , & alcança faude
ao Padre Igmcio de Tolofa,
Orriá oannode 1585- Tinha concluído
a vifua das partes do fui , & cmbarcandoíc
pêra a Bahia em companhia do Padre Vifita-
--^-^^^^^dorChriftouamde Gouuea, & outros Pa-
dres : hiam nauegando com tempos aduerfos , com que paf-
faramdifficultofamcnteo Caba f rio, & foy forcado lan-
çar ferro na Ilha , quechamamde Ancora poucas legoas
diftante. Eis que eftando nefta paragem cm bdla paz , fae
de repente Ix)feph de feu camarote , ôc diz ao Piloto, Irmão ,
mande leuantar ancoralogocomtodaapreíía, & déà vc-
lá.Obferucuo Piloto o tcmpo,namvio final alg& de muda-
da , diííimulou,- Porem lofeph , que via o perigo , inftou
com eííicacia. Irmão , faça o que lhe digo logo , logo, por-
que
LiviíoIV.GÁP.XIV. ifi
que, depois, quandoquizer fazello, nam podçrà. Ainda çf-
ftauamas palauras na boca , quando de improqifo çntroii
hum vento fui furiofo, que deixou arriados Piloto, & ma-
tinheiros , nam fabiam a qual primeiro acudiffem , fe à vç-
la , ou à ancora , & foy força vfar das velas , por ;iam
defcair fobre os arrecifesjéuando a ancpraafaftopòr al-
gum rempo , fem que podeíTem recolheis , com perigo no-
tauel Poítos em via , tornou o Piloro fobre fi , ôc arre-
pendido dodefcuido , com que obedecera , pedio perdão
tanto com mais cauza , quanco mais conhecia a íofeph,
ôcÍLias palauras que nam eram em vam 5 ficando certo '
que fem reuelaçám nam podia prédir o fucceíTo pois
dascauzasnaruracs dos ventos, nam tinha mais experiên-
cia que eile , & oè hortièiis do már.
t ^ Neftameíma paragem de Cabo frio , cahíoení
.cama o Padre Ignacio de Tploía , que juntamente vinha. Alcança á..
.3c com doença tam apertada , & perigofa. que poferam^^^ "'''^ê^'^^^
emconíultd os Padres , íe feria bcrn árribâ/ao kío\ p^-^^Slt"
ra remédio delia. 6c pêra que morrendo dcíTem fepultura
.decente a fugeito tam graue.Foy vifto neftc têpo íofeph re- ^""^' ^' '^
tirarfe a oraçam com Deos, & delia fahio refolutp & cha- "^^uí^^rU
mando a hum irmão, lhe diíTc, que deíT^ alguma mefinha
ao enfermo , & farariá,& continuariam fua viagem Per-
gantoulhe o Irmão , fe era certo que íiamliãuiade mor-
rer , diííe que fi , mas que lhe deííé a mcfinhi DeíafTom.
brou oefií^itoos Padres, porque em tomandoâ , ^ue fof
Jium caldo de galinha > ficou fàmde repente, com eofift-
.mumadmiraçám de todos.
,^ j Mais admirauel % o cazp (eguínte. Co^ntinua-r r . ^
ram fUa v,agem, éramos ventos fbrtes . fbraip leua-^iSí^''
.dos da força delles defcaindoaíé a enfeada q^e^liamam "*"'*' 'i'""'
.de Vafabarris , deixando por popa a Bahia.He.fflf^ enfça-"^f^^ft-''^
4l. medonha aos marcantes , ^mdaemtemposm^nas adJ^.l^c./.f/^
uerios , aonde tem acontecido naufrágios laílimofos cer- ^"^'-f-^i^
^adaellade recifes , Ôc entag^hafej^a d^^píip;^rra- '''""^''''
>7 * Nriif rio
ISi. y í Óibè P.' í OSÊ PH A NC ii I Ét A, .
rio^ò^'Poi't«g"ezes , & dtzéjozos do pafto de íuas Carnes.
OSÍefta paragem ft viam junto a terra, quando o temjporál
conuâkcen^ò, desfechou em tormenta desfeita cada vèz
maishorriutl^nam era poífiuel fazer ao mar , a terra e-
fíataa chea de aííombros de morte , eftar à capa nam con-
fentia o furor dos mares 3 que remédio .^^^ Trcs dias con-
tínuos paííaram em apertos da morte 5 té que defmaiado
Piloto. &c mareantes/largãtam leme, & gouerno, & trata-
ram do remédio dasalmas i pois que das vidas iiam po-
diam : cçnfcíTaramre Rdigiofos , & feculares , defpe-
diamfe huns de outros , ôc dauamfe o vitimo vale, Etii
erpeciâl fe diz do Padre Tolofa , homem aliàs decoraçam
5c animo , que pondo os olhos rio mar, & ha terra , rom.
peo neíias palauras 5 bendito fea Dios , que fe efcapa-
iiiosla fereza delVno> no efcaparemos dei outro, àUudin-
do a dos gentios feros.Namfoy viílo íofephneftas dcfpe-
didas, todos os três dias paíTou no conucs , amarrado com
" - os braços a hoílagâ > & coirdas do mafto grande , òs olhos
no Geo apertando com Deos fobre a faluaçam de tantos.
- -,;IXI Sahiohum Irmão de debaixo da tolda , fbiíea elle, & a^
;i.v|^..m.i braçandofe com Teus pés , pedio que o ouuiííe deconfif-
fam poz nelleos olhos lofeph , & diííe duas vezes, nam
he neceíTarioIrmão. Infíouo affligido, nam he verdade
que morremos aqui ^ Caíligou iofeph a profecia com al-
"Sumáacrimónia, & diííe terceira vez ninguém ha de mor-
rer mu daf éíTanoUa, diíí^ oirmáo, aos Padres, que e-
•ftaitíplanteandoo vitimo dá vida : reípondeó 0 fèruo
do Senhor , deixai, que nada perdem em cncommendar-
.,.,,^,.0-íe àT^éoi /ide vos defcançar. Jurou eftc Religioíoemféu
;.,.ii -«r^depbi^É^^cíltb folertine.cíue foía tal a fegurança , que lhe m-
.:::!;::;':;: ^ftíndirkm^ás palauras , que íeií. cuidado mais íefora der^
.. ,°t'^í tar a dèfei1^.^E nam íe enganou porque dahi a breue et-
^^>.^^;í#çcy ãplacoliio vento, & mar , deixando ffuftrados os
' ' ^ •;:^^ íoncos dòs recifes . & eíperanças dos moradores máís def-
-humanos vqirèosproprios penedos. Acudiram os marean-
^
LiVRò IV. C Aí»iT^LoXIIK ^^f
tésâ feu goucríio , guiaram o nauio , entraram com èllc
ctiipaè na Bahia de todos os Santos> & publicaram má-
tâuilha tam fingulalr, r. , i , . : ; jr^ , > f , f. , \ ç- '.
CAPITVLO %V: ,
Siíccejfos maraúilhofos ^^qúe obrou nà Èama atè
acabar feu Vromncialado.
-;-jJi O '
^
g Omêçarèi efte capitulo còm â profe-p^^^^^.^.^
cia do cazo defcftrado de Vicehte Gomes, morte dtfè-
Pedira eftc homem ao Padre Prouincial noSq«Íí
. Rio de lanciro, que oreccbeíTe na Còmpa- pn»pa
hhia poi irmão ; deulhe palaura j mas que feria depois Rdlgiofò!
que vólráííem á Bahia i & coneluiíTe eile negócios,
que trazia Ficou fatisíeito o requerente 5 vindo à BahiâS:^.'^^
punha cm èxecuçam a defcarga de feus negócios , fe-
náni quenefte meio tempo i ou o mundo, ou á carne
fraca fez que desfaleccííe de feus bons propoíicos , & pa-
la:ura dada. Era paífado tempo notauel , encontroufe á
cázDloíeph com eile, &perguhroulhe, fe acabara j a de
deíembaraçarfe do múndò .'^'Refpondeo, ja Padre , ma$
knho mudado deconfelhOi porque qiicrò hir acabara vi-
da a Portugal , & làcíitrarei na Companhia , & morrerei
nella; Aqui fé chegou a elle ò feruo do Senhor i & baten-
dolhe coma mão no hombro , diíTeaspalaurasfeguitítes,
com roftro feuero , como fentença do trjbunal diuin<>i:
Vitentc'Gomes , a Portugal hircis toSi,masa mqrrcr;
fteni fera lâ, nem na Companhia , mas cá no Brafil,& dá
maneira que merecequem vira as. cofias â.Deos.Tudo fe,
Vioàrifcá. porque efte pobre homem foj^a Portugal > 5c'
voltou ao Brafil com bcrh. diífcrentes intentos , de leuan-
tóíf Pouoa<^am no Cabo fria » com prouifam ,. que trazia
^^ Nn iij
«5 ViiíabôiB.Iôsíth^^'^'*'^'^*'
dVl-Rey. peca ter aliipiando .poremetaní outras as.W-.
andando pellos matos , que eram cerrados perdjdo
SScompLhciros entre a efpeçura.fetn que podefie achar
cammho.acabouavida.ôc foy achado dah.a hum an-
ho mirrado debaixo de huma lapa de hum penedo ; cum-
pdndofeemtudoaprofecia.quefuamortehau,adeferno
Braf.l,& da maneira que mereça quem V.raascoftas a
'^^"'í Partia defta Cidade a huma paragtm do diítri-
Mii.gte<io „„iírarpar9nçva.a2a2alhoure huma noite em
prcgodeuca flo por nome lacareacanga .dgata 1 _ . ^ , _
•"""«'• caza de hum morador nobre. Anton.o Cardofo de Bai;-
m.x/.4. ros, & veridoquefe lhe fazia cama aparatofa. entrou no
Lferito . & defenganouaosqaeaprcparauam^qucnam
caneaffem . que liam hauiade dormir em cama . fenam em
huma rede de Índios, differamlheque nam hau.a alh ef-
capulas em que a armaffem . olhou lofeph por huma
das paredes . vio huma argola . & repl.cou.ja ali. temos
humaefcapula.emlugar da outra buíquem hum prego i
& deixem^me com iíTo. Achoufc « Fego.mas nam martel-
iD pêra pregalo ; nam vai nada n.íío . d^ííç^ . da.o ca . &
foLndo o com os dous dedos . polkgar . & indes . o mç4
c^aparede.tamfi.o . &forte comofecommartel-.
lo fora prlgado j armou a rede . dorm.o a no.te nella. &
ao feguitít? dia fe kt experiência . & com huma torques o
Ltnloderamdefpregaf , ficando por memoriado po-
3»acfteferuodeDeo. -, Mo h>am ver por portento .&
feereantauam do nouo modo de pregar efcapulas. Ehe ce-
lebre tíacfjella paragem o prego de 'o^^ph- , . _ .
rrwca De maior contahe o milagre feguinte. Por efte
^;«"::.Aéíi4tempopaftiramdeftaCidadedaBah.a,peraod,ftri-
í:rr„" aoáehumanoffa Aldea.chamadadoEfp.ritoS.acertasd..
vcS!k licencias del-Eey , o Gouernador Lourenço da Veiga .
^:t"' '" OUuidor.Prouedor dafazenda.& maisOfficiais; ouue-
;::^cy "• ^^tn de partir junto cem elleso Padre lofcph Proumaal.
LíVRO IV. Cap.XV. 287
os Padres Vicente Rodrigues . & Gafpar Loúfciíço j eis
que chegados ao Rio . que chamam de loannc , acharam
que hiacemerolocom agoas do ferram 5 & em quanto paf-
fauam de vagar por ponte de varas, mal fegura , hiam os
índios leuando os cauallos a nado pellas rédeas 5 porem ó
cauallo do Gouernadorqueerabriofo,&dcpreço,nomcio
do rio fez tais brauezas que foy forçado o índio largarlhc a
rédea , & foy com eílâembaraçarfe na rama de humaar-
uore , queeíiauaeaida íobre asagoas , de maneira que o
cauallo íe hia afogando à vifta de todos , nam ouzanrfo ai-,
gucmacudirlhe. Hia o Padre lofeph ncfte cotnmenos no
meio da ponte, com o Gouernadoí^ , & dahi diíTe ao P,
Gafpar Lourenço , que vinha atras .Padre Gafpar , bo'
tefeao rio, & váliurar aquellc eaualíò f Omefmo foy di-
zer , que lançarfe o verdadeiro obediente da ponte abaixo
aflí) veftidocomo eílaua» còírícujo pe^o fe foy âo fundo,
porém em breue foy fdrgir aonde eftada o cauallo lidan-
do com a morte, defembaraçòulhé ò freio , & leuou-o
hurc ao Gouernadori admirou o cázoá todos , mas vi-
ramlogo juntamente outro portento; porque mandando
oGouernador aos criados, que prcparaííemveftido enxu-
to ao Padre pêra fe mudar. Rcfpondeo lofeph , nâm lie ne-
ceíTario, queo Padrenam VE molhado; efte foy o maior ef-
pantoda gente^porquc viram diante de feus olhoS andar o
Padre por baixo das agoas, & nam criam que podeíTe fcr feni
fc molhar . mas fizeram experiência, acharam fer verdade
coni pafmo de todos. Semelhança terii efte cazocòmò
do Patnarcha S Bento , quando mandou a fcu difcipolò
Mauro , que felançaííeàs agoas ^ ôcIiuraíTe delias a Placi-
do que hia afoga ndofc : fenam que o empenho de S.Behto
foy fobre huma peííoa rácidhál , & o de lofeph fobre hu
bruto: Em qual dcftcscazosmaisáuulce a potencia diui-
na , difpuraràm os mais delicados no efpirito^ que eu nairt
poflo det.:rme agora por fcguir os paíTos de íofcph.
i'43lol 3b ima f;fcÍ£i 3up >j ^ fmíi^porj u
An:
1
obsl
1
... Vidado iP.losEPH An CHiltÀ.
" ^ Anáaaaó Bifp^ D. António Barreiros viritan.
s«. liReitczi^Q 0$ iugares vcfinlios à Cidade da Bahia , adminiílrando
B:^fp\çi nelUsQA^erwemo dAçonfirma^am. Chegou a huma Al-
i'4íír«.^.i77^ea dos Padres da Cçn^panhia por nome S António 5 &
dep^S 4? f^^er nefta íbu officio com os índios , partio pe^
ra ôM^r^.,. chamada S. loam jnefte caminho quizeramacÕ-
mn^iaUo o Padre lofeph Prooineial , o Padre Gregório
Serrg^ , Reitor do CoUegio > & outros Padres que aUi
fe ^ch^ram. Partiram todos a cauallo, que era diftancia
de íeisie^oas , & trabalhoías de andar ; ÍÒ loíeph partio â
feumodoa pérdizendoa toda â companhia , íenhores
vofe mercês vam embora feu caminho, que eU os alcã-.
cáfr^ : picaram os decauallo , & por mais que andaram
de preíra. & cuidauâmdeixalo atras. Viram que indo che-
gando o Bifpo , vinha a rceebello íem prociíTam formada
o Padre Pedro da Coita Superior, da Aldeã , com os índios
delU , Ôc entíe ellesoPadre loíeph. Ficaram tam pafma-
dos dà diligencia > como dè íua humildade 5 poirqucteat.
do-odeixadoatras, & a pé , como podiam imaginac^il
que chégaíTe tanto diante , qile Vieííe eípcralos a cUes , c^^
do cuidauam elleserperallo. Semelhantes lígeirezas de ef-
pirito temos vifto ,:& veremos diuería. vezes.
íi,yvi^o S partio outra vez do Collegio a fazer miííatd
eieuadonoar^pj^^jg^ f^l^ai^er Miffa a Noíla Senhora da efcada >• &
Troes f.^ ^cá^é^m^ nptenipô em que tinha recolhimento dian-
&proc.cf.^ teoi^tar , foy viffio arrebatadoem eipiritono artora dos.
fcntidosi eram premes muitos dos que lhe ouuipnva.
Miftí * <^fpecialmertte4uas matronas por nome Mana de.
Atoeiída , ôc I^abei Nogueira , admiradas eftas comec^a-
í^fi^^^lfeer experiência, batendo com as portâs.&: clama- •
dpia vô^es, to^Bam.poderam diuertiro feruordo efpiri-
ro, que ficoiJ celebre por aquellas paragens. Aqui vem bem
Foy viftocíh o teílemunho jurado do venerauel IrmaòFrancitco de E -
^^ calante, varam beoi conhecido, teaemunhafora de toda
';'\ , a excepçam , 6c que íabiabem de loíeph , depôs eftc Ir-
.AraiH tiVRo VI. Cap.XV. í,^
tnaorantoèmfeu juramento as palauras fegijintcs { na
mermaforma que as cfcreueo o official,) que fabia pello
ver cllcmermo , que era o Padre lofeph de /Anchieta
muito dado a contempIaçam3& que hum d.a eftando o
djto Padre no coro em oraçam . achandofc elle teftcmu-
nha prefente Ihepareceo que o via com humas azas de
Serafim abrafado em amor de Deos com o fcruor <ia ora-
çam ; & queaquella vifam que elle tiueraaquelíe dia fe
felhe reprefenrira por toda ávida. &atíouxera fempre.
& uazia ainda quando ifto teftemunhaua , imprefla nà
6. AridaUa outra vez ehi ferulço de Detís por Tà-
pagipehuraalegoad.ftantedefta Cid:de , che<^ando ao™'?''''»^*''
engenho , que entam chamauam del-Rey . pedio emcaza iS. "
de huma matrona AntoHia Rodrgues , que alli moraua , ,
( nam(ediz aque fim , deuid fêr pêra alguní enfermo \""--^-^^>
três talhadas de abobara doce em conferua .• Irioftrbufe a
Donadecazamviipezaroíadeasnam térèmcaza oor-
quehum boiâm que fizera delia fe tinha acabado Poréni
lolephinaou i queviíTe bem que era rieceíTario aquelle
miriío , tornou a matrona a vero bóiam, & lhe affirmou
que nam hau.á nada. Viam niâisosolhosdeíofeph.tofhouá
dizerlhe obedeça agora võlTa.mercé.tòrne ao bóiam & tra
ga três talhadas de abobara; oBedeceò . tornou a ver &
achcuas, pàlas em hum prato. & troúxelhas.affirman-
do , que aquiilofora milagre; (orriGÍe lofeph ,dífpoz dei-
las , õc pregoaram os de Caza a marauilhav
T u ' j Pama í^ifa a^io tóápéitó o Padre íoam» ^ ^ >i
Lobato de noffa Companhia ságibl-o venerauel V'S^^
porlanto ainda cm vida . cujas virtudes fahiram a luz *"""*■-
cedo ; d.íTelhe o Padre lofeph vá' embora Padre , ^Pr^xf^
d.ga ia ao Padre amigo fcu. lofeph Morineilo , que digo
cu que fare, porque tem huma viagem Comprida que fa-
zer; notou Lobato o dito. & pareceolhe que feria modo
de falar, porque o Padre Slorinellò eftaua tempos hauiá
O o emreuarfd
^ VidX fio P.IOSEPHDU Anchieta.
irquepâ«iod.poispera Ualia.Depoz Lobato o fucccf-
SVo? tóíag-ofo. cm (e« folcmhc juramento.
•^0'z ' — s, * r
>M r
IIVRQ
Jl, v> ytt-
I
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waig^^ji^^jil^iM^M^Mjjtt*?;^^
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LIVROQVINTO
DA VIDA DO
P lOSEPH ANCHIETA
da Companhia de lefu.
CONTEM OS ANKÍOS Q^VE PASSARAM
de()oisde fer Prouíricial , até fuáditofa morte, que fo-
ram doze, defdeb annÒdei585. até o de 1597. ôcasobraá
niárauilhofa^ , que em todo eíte tempo obrou.
CAPITVLO 1. '''^^''
Deixa lofeph o cargo da Promncia , vai permà"
dado pêra o Rio de laneiro xeroque allifai^
ENTiÀss ja nefte tempomui de- y,^
bilitadoem forças, èom açhaquesi«i»"rgajíiB
& enfermidades , que o obrigauaõ ^'°"'''"*^
à cama, muito contra feu natural,
& coftume j que era feu-, erpiricó
promptoá feruir todos, & feíl-
tia chegar a terneceíTidade em que
foííc feruido de algum ; & como
ò pezo dos negócios eontinuos dèfeu officio hiam debilí-
tAtrdo cada vez mais aquèlle corpo canfado de trabalhou
tam cxceííiuos de mar , ôç terra, desfeito com peniten^:
ciáts i òc apertos grafndes^áigwnsmèzesi depois de chega-
Ooij dá
Í*K. '«■'
Tater»,\
«í Vidado P.IosEPH ANCHIETA,
.7»7. do à Bahia, pcdio inftantemmte ao Padre Vifitadof, que o
aliuiaffe confiderando o pouco que podiam )a fuás coftas
• fracas , em comparaçam de outras muitas . que poderiam
fer Atlantes de maiores pezos, Nam cuido fer>a tain fá-
cil o defpacho defta petiçaro . fenatn íora affas manifefta
apropoftadella. Ouue enfim o Padre V.Ctadorde coi>-
defcender a requerimento t3mjufto.& com effe.to dei-
xou o cargo defcu Prouincialado no fim do anno dci58j.
hauendo queoferuia outoannos. que tantos correm de
1578 até Híi,. fendo foftituido em feu lugaro Padre Mar-
çal Btliarte. Religiofo de grandes talentos, que depois
profeguioc pfficiopor efpa^o de fete annos coma fatisfa-
^am r que pedia hum fuçecffor immcdiato de tam grande
/ ^T FoypêrmudadoperaoCollegiodo Riodela-
He permuta- -1^ X, -inni he certo oue mudahdo O officio
dopsraoRiojieiro no deissí- cí aquinc ccrio4utiiiuu • ,
^' '""""■• nam mudou de coftumes . porque entre a falta de faude .
,„.r.f.j & luta de fuás enfermidades , jamais defcu.dou de feruir
a toda acreatura.vencendoa força do efpinto a fraque-
fa do corpo, tam contente no baixo, como no alto poito.
Eftefeu fentimentofecolligede huma carta fua , quedefte
lugar efcreueo a feu grande amigo o Padre Ignac.o de To-
lofa entre outras palauras dizia affi. A faude do corpo
' „ .. èe fraca , mas tal, que ajudada das forças da graça dura ;
'S'" "que Deos nam falta fe primeiro c« me nam deixo a
■r;u..,i, n .iGouernaua por eÔe tempo aquelle Collegio.
^''''^"'J^ iuhtajhetltt tom as Capitanias vefinhas de S. Vicente, &
Sr-"- &S fanto , o Padre Fernam Cardim . companhe.ro
aue fora do Padre Vifitador C hriftouam deGouuea ; nam
er.m muitos os Sacerdotes, que ajudauam, era força cair
âscoftasde Iof*ph grande parte do pezo de ram notauel
carga ; Eftàua fcmpre prefteso feruo fie pêra todo o tra-
balho, em que podia aliuiar o amigo, diffimulando feus
achaques . quer na Cidade, quer nas Aldeãs , que entam
^ ^ ; £ eram
9:,.
,AT!! LivroV.Cap.L V ^9i
eram numerofas.Sc faltas deobrciros.Porém à vifta dós def^
pcrtadorçsda morçe,.Gomo ellechamauaas cnfermidadesi
acrcccntaua aqui rigores a rigores , ^ hia dirpondo féU
efpirito com ados mais heróicos , pêra a hora derra-
deira , que fempre trazia ante os olhos. : cc<5
4 Tcue por cíle tempo humá doehçâ grande tam
apertada , que fe perfuadjam os Religiofos , que era mor- Profett^i
tal- SentiaoferuodeDeosaderconfolaçamdereusIrmaõs,'!"^"*™ ^*
& nam lhe fofreo ocoraçam verdefgoftadòsaquelles.que RiXírl^no
dezejaua fempre alegres. Tratou ( como he certo) o ne- ^^f""°^*"^**
gocio com Deos, ôc fahio a reíoluçamem tal for ma, que ^.,,,.2^.^^.
chamou a fua prefcnçaos mais amigos, & lhes diíTe, nin-
guém (edergoíie no Collegio , porque cií nam hei de
morrer defta , nem nefta Cidade > nó Efpirito fanto thé
efperam meus vltimos dias. Ficaram todos aliuiados , vi-
ram pouco depois a faude , & andados os annos o cum- ^^i^o
prunento da vitima parte da profecia , quando morreo no
Bipiritofanto. ■ 3i3ca?.oaa:);
- 5 Ncfta idade de loféph, â fama dé fuás Vi^rtudes he-
róicas , muitos pediam , &: dezejauam eílar com elle em
fua companhia, entre outros foj huin> o Irmaõ António ."í^^^^aff
l^ibciro , que enram feachaua em S.PaulodefcbnfoIado , «"^ ^^"'P*^
& lhe cfcreueofobreifto 5 & porque fe Veja a graça, que l^Í
Deos tinhacommunicadoa fuás palauras , pêra ahuiar os
cfpiritos, porei aqui fua repofta i que he â fcguinte.
6 lefus. írmaõ cm Chriao António Ribeiro ,
pax Chrifti. Bem enrendoque credes ,qtiepcllo amor que ^ > .
vos tenho , & dezcjo de voíío beíH efpjritiial, folgara de Tc^irpeto
vos ter fempre em minha companíhia, mas poi^noíTo Se- ^^^'^itlw'
iihor oucra couza ordena . coiíuèm que trabalhemos de "'"''*
ter fempre por companheiro , aquellé que cm todas
as partes. & em fodoo tempo eftà com nofcol Oqiial aiil-
^a queiíos às vezes oengeircmos , com tudo fempre eftà
i>;Vfendo à porta dônoíío coraçaiil , efperando que lhe
íkbcamos pêra entrar, & fazer morada em nos, virldojun-
Òoiij ta-
Gadid.dcc
Òíiqità.
Vidado P.Iòseph Anchieta,
taitienfecòm éllco Padre j & o Efpiritó Tanto , pêra que
nenhuma partie de nos fique que nam íeja cheia , nem haja
outrp: que ^tn nos poffa terquinham , nem no mais pi^
queno carnínho de noíía alma. Porque, ( como diz oglo-
êbejiciícía. ríofo S.Ffancifcojnam quer o diabo de nos,maisque hum
cabeUínho,pofque logo delle faz humagrande amarra, c5
que rios p rede» & té poríeus.Sehú dia queremos fazer noíTa
i mifHSijp Vontade em couza algua, por pequena que íeja , outro dia
oa muiufí faz que procuremos de a fazer em outra , & outras, ate que
<iniiiUMi>-á perdemos a obediência que ccnfiíle j em nam fazermos
noíía vontade , fenam a de Deos, que he interpretada pel-
los Superiores. Se humavez.nosdefcuidamosnum pcnfa*
mentofinho da carne * daquelle lança maõ , Ôc fc con-
tenta com eile , porque trás délle nòsleua a outros peores.
Se começamos a nos esfriar hum tamaninona oraçam,&
dezejo de tratar com Deos com muita humildade, pedin-
dolhe continuamente ajuda pefa noíías fraquezas i pouco
a pouco nos mete táto regello no coraça6,que vimos ma fò-
mete a não defgoftar dá vidá,& daReIigiã,de2ejidoliber-
^dade pêra poder ter goílos do múdò, Aííi he em tudo , pello
que chariífimojesforçaiuos, muito caminho tendes ja anda-
.; > " '^ do com a eraca do Senhor , clle fabe quanto vos falta
ch-nfiuseji , pof andar ,qtíe por ventura lera mui pouco , cevos quer
''^"'^^^'^'''ajudar nelíe fendo VoíTo companheiro , nam percais tal
companhia, porque ainda que vos pareça peregrino , co-
^«^•i4* mo pareciaaos diícipulos de Emáus,coQi tudo logo voífo
coraçam arderà,quandovoselle fallar,dandouosfuasc6ro-
tí^^J:^ Jaçp^ns efpirituais , como cufciquevos (ku muitas vezesr,
unAà.,:;t nrincípalmenté quando vos parte o paÕ na oraçam , &
quando.|QQ,n;\mungais. Equando wós achardes muito dei--
eonrolado.ôcaffligido, tomai por remédio íingular puxar-
Ihepdíacapav&dizerlhe, Senhor ficaiuos comigo , que
femefaz tarde, Ôc a noite da tentaçam vem fobre mim,
êc pedi licença ao Superior pêra commungardes. Porque
eu confio > que no partir deíle diuino pain , o conhecereis
com
"»">j{hM.
Livro V. C apiTtlo K ií^
com tanta alegria , & esforço , que nam pareis ate chegar-
des àceleftialHierufalcm.Elia podereis communicarcomò
Irmaõ noíío , porque lambem pêra clle efcreuo , dezejá-
do que vos , & elle , & todos os da Companhia íejamos
cheios de efpirito fanto , que hoje veioíobreos diícipu-
ios , ôc fiquemos confirmados com íua graça , que nunquâ
bais queiramos, nem poííamos oífendello , antes tendo
tam bom amigo , & tam fuaue hoípedè em'noilas almas
pcrfeuercmos até o fim emfeudiuiho amor.O Senhor co
a Virgem NoíTá Senhora fcja fempre com vofcb, Amen.
alerte Kiode lanciro hojeaiâdoErpirito íantoi^^y, VoíTò
Irmão em Chriíla, íofeph, ' j> - ^ -j
7 Outra lhe tinha jâ èfti^itbao nieímo Irmão, fèn- j^^ij,^
do ainda Superior , cuja fumma continha o feguiníe, que "" ''''''
moftrabemo grande típiríto defte Varam fantò. kfus fi-
que em voíTa alma , & huriqua delia fe âpárte , ainda que
de muitos enimigos fejá combatida. Amen. & á Virgem
Mana íua May , &iMay depiêdade vos de fempre o leite
de fua confolaçam , de cuja doçura fejaistam cheio , qaC
aíTicomo lhe pedis quefeja pêra com vofcò Maj , affi vos
fcjais pêra com ella filho humilde , cafto, obediente atJ
morte.Amen. Eftabençam vosdeixo por dcfpèdida.Ôc vos
peço que a metais no coraçam E quando vos virdes atri-
bulado, lançai mão defte papel , & prefenraioao Senhor,
Sidizcilhe , Senhor , o que cila em voíTo lugar , me
deixou efta bençam. Cumprí-a vos pelios mcreciíiiéntos
de voííapaixam,&da Virgem Maria voííâ May , & Se-
íihora minha , cu confio que vòs ouuirá , & cònfolar^,
& cu líío também lhe pedireifèmpre. Tende iftó cm mili-
ta eftima , como a derradeira manda de voíío Pay / quà
muito vos ama , Ôc rogailhé fempre por cfte pobre pec-
cador, Amen. lófcph; \> ^~
-•.í " :} í^9rí3:)il tUhbnEfn^íTií^bn ■ o^q :>ibG^ G i ^.
í"'Br- Iíi:ni£!m4/ib337. j m^ 5'L
.\.e .íw^T.
rrr
r-p
ii«9
196
ViDJiDÒ P.IoiíPH Anchieta.
CAPltVLO II.
Vaipermudado do Rio de Janeiro , peira a Capí-
tania do Efpirito Santo , &fat^ refidencia em
humildas Aldeai.
Ò mefttio aniio de i587. foy peránudádci
à Capitania do Efpirito Santo, fez rcfideni
ciacmhuma das Aldeãs * chamada Reti-
gba , & fera eíla o theatro das cxccllen-
çias vitimas de ftia vida í êc o Maufoleo
derradeiro de fua morte. Eílàefta Capitania em altura de
Sido d. Cápi vinte grãos, & hum terço, ( falando da parte principal
ianiííôEfpi cia Villa^ igoalmcnte diftantedeS. Vicente, & da Bahia;
'"°^' de huma , & outra,Geííto U vinte íegoâs. Tinha por fun^
dador , &fenhorionaquelle rcmpeVafco Fernandes Cou^
tinho fidalgo de igoal valor, & nobreza, dós mais llto
ftresi& antigos Solares de Portugal Èíla parte da Ame-
rica namhe das menos fauorecidas da naturezas fcusares
fam benignos , o torram fértil , os campos alegres, as ma-
taa , as delicias dos balíamos , Copaigbas, Almecegas, Sal*
fáfrazcs,que perpetuamente recendem, 5c os montes cheos
dearuores : Porém nenhuma deftás còuzas kuaua o cora-
raçam de lofeph , fenamsò as riquezas de almas {tm conto
que por aquellas brenhas habitauaín , neeeíCtadas de fo-?
Gorro.Nam podem explicarfe os fencimentòs de lofepb .
em matéria da faluaçanã de todos os homens do miando;
efpecialmente Brafis ; cftes fentimentos dirá milhor , &
com mais viuas cof es a carta , que deftá mefnria Aldeã ef^
Froc.s.f. ío-creueo ao Padre Ignacio de Tolofa grande amigo feu. Ediz
aífi. O Padre Prouincial me mandaua licença pêra que c-
ftiueffe em qualqwcr parte da Prouinciaque quizeíTe ,nãc^
quis
Sentruentos'
ds {jfepi-i em
matetia da
faluaçarndos
índios.
Livro V. Ca p. 1 1. 2^7
quis tanta liberdade , porque foe fer caufa de cegueira, ôc
errar o caminho, nam fabendo o homem cfcolher o que
lhe conuem. E fora grande defatino, hauendocu quaren-
ta , ôc dous annos que deixei em tiido a hure diípoíiçao
de mim na mn6 dos Superiores , querer agora no cabo dé
minha velhice , difpórdemim. l úsme nas mãos do padre
FcrnamCardim , ( Reitor do Collegiodo Rio de Janei-
ro ) &: ordenou noíío Senhor que acompanhaííc ao Pa-
dre Diogo Fernandes nefta Aldeã de Retírigba, pêra o aju-
dar na doutrina dos índios , com osquais me dou melhor
que com os Portuguefes, porque aquelles vim bufcar aò
Brafil , &nam aeftes: & ja poderá fer que ordene a diuina
fapiencia , que acompanhe ao meímo Padre em alguma
entrada ao ferrarh , a trazer alguns delles ao grémio dal-
greja ; 6c pois nam mereço por outra Via fer mártir , aó
menos me ache a morte defempárado erh algumas deílas
montanhas 5 ijbiporiam animam ''yteuinyrojratrihus mets. A
diípofiçam corporal he fraca , más eíía baila com a forca
da graça , que da parte do Setihor nam faltara , ôc porque
eú da minha nam falte , pomge tyi dextram ^ f^ henedic
mfht fiííolotuoin Ch-ifio Itln Oominonofiro. loíeph.
2 Dous pontos principais contem eíla carta , dignossu» humiiii=:
ambos que fiquem eftampados nas almas de todos Os fílhos^*^
da Companhia. O primeiro de íuàrara humildade , pode
confundir efta , Ôc enuèrgonharà efpiritos menos perfeitosi
que com tanto cuidado pretende na Religiam indulgeri-
ciadeànnos, & premiosde merecimentos pafíados, quã-
do os annos, & merecimentos fam tam deíif^oais dos de
lofeph.Ofegundo heoacezoamor deDeos, Ôc próximos
com que moílra dez ejar padecer os maiores trabalhos j^^^^^g^^^^
até dar a vid?. defempárado do focí^rro humano , por eíTesP"^»"™*»
fertoens em bufca de alma?. Efles eram féús fehtimentos
quotidianos ; caminhauahumdia deila Aldeã pêra outra
apédefcalço, & por caminhos afperos , cm companhia
do Padre Hieronimo Soares , quando leuado de efpiritd
Pp bro-;
x98 Vi DA Do P.I O SE PH Anchieta.
brotou neftas palauras. Padre Soares, alguns dezcjamqtae
os colha a morte recolhidos em algum Collegio , ou Refi-
dcncia > pêra paííar aquelle tranfe vitimo com maior ani-
mo , ajudados de feus Irmãos , porém cu vos digo, que
namha género de morte melhor que deixar a vida por e-
ftes montes , ôc por eftasalagoas por obediência a focorrer
os próximos O fentimentos de M lííionario verdadeiroíO fe
ofogodefte efpiritofeatiara em todas as almas dosMiffio-
narios dcíla Prouincia ? Que deíprezando cuidados pró-
prios , & commodidades dos Collegios., íahiííem a abra-
fareftâs matas incultas » cheias tanto de homens bárbaros,
como de feras , que quanto maisbarbaros, tantomais ne-
ceífitam de doutrina , 5c tanto troais obrigam a darlha aos
que tem porinílitutoafaluaçam das almas.
3 Toda a vida de loíeph foy exemplo de miííoens
Aíidou na? gloriofas. Neílas cm que aqui dczejaua acompanhar ao P.
DiagoFernâ-L^íogotsí^iianaes porcílcs íertoens alongados, namíabc-
**"' mos que tiueííee ífeito tanto, quanto pedia feu dezejo, por
fuás granes , & continuas enfermidades. Sabemos cora
tudo que ajudou a muitas , que fez o Padre Diogo , & eG-
fas illuílres ^defcntranhando por algumas fete , ou ou to
vezes as brenhas, & conduzindo à Igrep de Deos almas
íemcontoj cm cujos apreílos, , Ôc recebimenfos , nam
podia deixar de cabcrlhe parte grande ao noíío zelofo efpi-
rito , a quem ficar fora deftas emprezas , por refpeito dos
annos , tomaua elle por penitencia grande, como vin-
da do Ceo , à vifta da lembrança , das que noutro tempo
Nefta AHea fízcra , tam varias como vimos no mais florido de fua ida-
ÍGbi>deprto^g 3 Porém nefte retiro he certo, que fobio mais depon-
íeu trato cem ri *
Deos. to no tr^to com Deos ^ quanto menos fe diuertio com os
homens. Depõem os Relígiofos que o acompanharam j
^''^' '^^''■que gaftaua em contemplaçam a maior parte do dia ;
Ôc, as noites paííaua em continuos íufpiros , ôc ays ao Ceo ,
a vozes altas , muitas vezes, como quem nam podia reter
no peito as confolaçoens que fentia. Eram quatro ordina-
riamen-
LlV ROV. CAP.il 290
riamcntc os Sacerdotes naquclla Aldca, que acudiam tam-
bém dalli a outras : detodoseftcsouuiaasMiíTâs, alem da
que dizia , & fcrtiprc de joelhos ^ & sòaquimoftráua eílar
fem achaques. Era continua a alegria de fua prefença ,
comoaquellc que fempre andaua em doçura da gloria ^
& infundia paz, 6c fercnidade aos coquem fallauá/trabuf-
cado dos índios em rcusdefgoftos , & todos em vendo a
lofeph , lançauam deíi a iriíteza , & o tinham por Pay,
êc aliuio.
4 Defta Aldeàcfcreueo várias cartas eííe Santo Efcreuedaqui
Váràm ,que moílraram bem os quilates de feu grande ef- ^"jj"^*^"'*
pirito , das quais quero por aqui duas, que mandou ao Ir-
mão Francifco de Eícalante , grande afFeiçoadofeu , aquel-
le que no liurò precedente diflemos recebera da armada de
Diogo Flores Baldes com prefagios de fua perfetierança,
& faluaçam ^ & fam as feguintes em Cáftelhano , porque
o era efte Irmaó. Al Hermano Francifco de Efcalante : le^
fus. Hermano cáriííimoenChriílo, pax ehriíti. Porque
nueílro nauio , con quieri penfaua efcriuirle , no ha de ^ u
partir tanpreílo , me hcdeterrhinado de encomendar eftamaõ Francif-;
carta a la ventura , rogando a Dios la de búenaalos que^1°'^^^'*^*""'
lleuancfta, y nos lá de a nos otí-os. Búena ventura llamò
vna vidacohfcruadaengracia de Dios, y vna muerte quc^"^'^"?'^^^
torrefponda á tal vida. Para eftò le defarraygo Dios dei
mundo , y le iríxiriò en la Religíon , y en cHa le ha fuílentà-
do, y conferuádò tantos anos. Guarde diligentemente nò
entre cn fu còraçon defconfiânça , aunque mui pequeíia .•
porque aunque enfij en todas fúscofas no halle fino mi-
ferias , faltas , y grande fíaqueza perâ refiftir a los éncuen-
tros de los enemigos ; pêro Dios le dará fortaleza , Dios le
dárà todos los focorros de fu gracia , y fauorecido taií
poderofamente vencera , y triunfara de fus enemigos. Yá
fe que viue contento en la Compa5ia , y que hazè gracias
a Dios frequentemente por efte benefício 3 pêro tambieri
cntiendo que ha menefter cobrar confiança , ( como lo
Ppij di-
^a^ Vi DADO P-IosE PH Anchieta,
dixe) aííi cn Dios ,como èn el arnórdc fus Superiores 5
A<Ji3Íeaesfoa deeftimar en lugar de Dios , jpues eilos cui-
dan en primer lugar > cooio es rafon ', de que el ai-
<:anfe fu perfeccion, ypara efto de codas maneras procii-
ran ayu-darle. Guardcfe que ni iigeras rofpechas Ic quiteá
dei alma cfto conocimiento 5 tracen otros , o digan lo que
quifieren 3 el fe perfuada que en eífo Colégio no efta aotrà
cofajquea alcançar de Diosfu íaluacioh.Tengâ cuidado de
raluarre,y con eftofe contente,- de manera que amando en
fu eoràeon, y venerando a todos fus Hermanos j y íinrien-
do de todos que fon Tantos, el trás eíío tenga fu aniiftad ,
y trato efpccialmente còn aquellos , cuya vida i y coftíi-
bres conoce que k aprcuechan , inás en ta virtud. Procure
en primer lugar tener perpetua abogada toda fu vida á la
Virgen Niieftra Senora , y algtsnas vezes no deícuyde de
encomendarme a ella en fos oracjones. Nueue de Diziembré
de 1507. Su Hermano en Chriílolofepli.
5 Hermano en Chrifto cariffimo. Fax Chrifti, Gaíi
rne hauiá oloídado de efcriuirlc en Caftellaiio , però no
importa muchoellenguaje Todoel punto eílà rio en iia-
blar.fino en obrar , yen defear la virtud , y no faber otfá
platica ^quelaque fabe la obediência. Eílaesla que Dioscon
màs guftoeníiêde.yeíla es própria plancafuya.Ydohde noàj
obediência, en V ano fe hazen prolixos colóquios con el
queno oyepalauras dichas de derobedienre. De aqui enten-
derá bafíantemerlte , que quando la obediência le occupa-'
f€ en fus obras de manera queno le quede tiempopàra orá^r/
qucencônceslamifma obediência ora por el, y òràrapoif
el que;Gbedeciohaíla lámuerte Confio dela merced /que
Dios lehaze, quefabe eftobien, yque eonuierteeltrabajo
de fus manos en elexerciode Ia oracion. Quando comien.
ça , t qiiando continua fu obra , buelua el alma a Dios,
y ofrefcale en fácrificio futrabajo , y acabada la obra , ha.
gale gracias , porque le tuuo por digno de occuparle en fa
feriíicio, y en cofa que fabe cierto , es voluntad íuya. Y
> i' -i, ■ iuego
livro V. GAPitvLorrs joj
luego tome para fi los Domingos , y fieftas, pêra recupe-
rar el ticmpo paflado . oya muclias MiíTas , y alargue en-'
tcnccs la oracion ,.,ue en efte ticmpofatisfaz Dioslostra-'
bajoslleuados por obediência con confuelos diuinos Peró
quiero au.larlcaqui , que en eíTe tiempo leobliga vna gra-
de deuda.Preguhtarame qual /Que ruegue a Dios por
mi, que efta es deuda déuidaa lacaridad, alaqual aunque
mas paguemos . nunca tiene fim la deuda . ni la paga ■ por-
que la paga mifma , con que paguamos es deuda f que de
nueuo deuemos a Ia caridâd, y affi quanto màs pasas fe ha-
zen .tanto mas deudas quedara que pagar. Y no es pa
ra mi coza de poço gozo tenerle a el portal dcudor '
pues k me paga mejor , y màs què me deue , y det
«a tnanera es mas fu ganância, que fugafto, pUes 2a-
ftando en pagarmefe haz cada dia mas rico. Dios por fii
Lbertad acrecente en el fus immenfas riquezas , con las
quales puede hazerbieha n, y afcHermanôsrteceffitados
delias. A los Hermanos LuysHernahdo , Tinófio.y a to-
dos los demas, quequiflere , y pudiere, le ruego yo M
grandes faiudes mi^^s en el Sefior. De la Capitania dei
Efpinto fanto fete de lulio de ,59-. Su Hermano eri Chri-
ito. loícph.
jot ViDADO P. IqsEPH DE Anchieta,
Áaft«i FJfiO rjft^ asBA eJSi* <*jr.^
wpí Keí 'WW '«Pi W?9 'W?í
CAPITVLO III.
í)e õutrâ cana. digna de memoria , que efcreueo
a hum nouo Sacerdote , toda de palauras da
fagrada Bfcrimfa.
Àreceome, nam deuia deixar nefte lu-
gar a carta que por eftemefmo tempo ef-
creueo a hum Padre amigo, de nouo feito
Sacerdote , porque exprime ao viuo feu gra-
de eípirito, & como andaua coíido no dasfagradasEfcri-
turas féú coraçam, nam menos que o de hiá S. Bernardo, ou
qualquer daquelles fantos Padres antigos. Nam vfa nella
de palaura alguma fuá , todas fam palauras , & fentimen-
tos do efpirito dasdiuinas letras .• & he a carta que noutroi
lugar prometi ^lib, ^,cap. i.Diz aíTi.
ÍÈsvsMAkiA.
Ctírifitds lefus lux vera , c^ua ilUminat ortineinhomi'
nemvenienteminhuncmundum > tllurninet cortuum^
s li ^Píf^^^^or ejus fufertei ^ deãncatte m viam reãajn i
<vfqt4e ad montem fanãificationisfu a, montem coagulatum,
^pwguem , ^hi fatieris abvbenbus confolattoms, Qi^td
efi homOi qmájlcmagmjícatura Dommo i Ben, ^ núdtm
tertíus eras taruulus * Locjuebansvtparuulus t cogttabas vt
paruulus í nmc autemfaãus es Vír^ Sacerdos 'Dei aítíffi-
mi , panem ^ ^ vinum oferens. Sed quern panem f Tanem
Jtngelorum , ojui <verectbm efi» quemedt^mpauperss , f^
faturantur , panem Hjiuum t qui de Cosló defcefidit , vt e-
furtentes impleret bonis, quem qui manducai Muit in Ater-
num-^ panemcoelefiem omnedàeãamentumin fe habente l
^ omnemjaporem fuamtatis- Qjiod n^ero Vinum ? Vinu
bonum
Livro V. Cap, MI. ,g.
Oonum , c,Ho laun „os àpeccatis ncftns.reconciUms nc^l>Ã
'r fuo-Aluensforiesfilu S,on, per qnem tntromtmCanãa
p «. qn* ,n Urra Ecoe quamu magmficaun Òormnus Lere
tecu,aamtr.re dmnas honttms dmtn, . magr„ficetLima
tuaeum, qm te humtUmex^lUM.qmtradnjLuottãem
manns tuas . factem te habnaculumfut^m , mtmLmfuum
i^ diffenfatorem mftertorum fuorum. Labora ergo Lt fí-
dãtsmuer»ar.t,^U^refepties miordane; tt macíta
nonfitmte, i^fijam lótus es Iam pede^ f,p,us , accéden,
adfantes aquarum wuentmm , cuftod, cor tuum , ^t fan-
fM{^bernacHlumfmm^lt,ff;musthtrarisadte,iLm=
bular,smte , ç^unanstecum. Ocmaniagna, ò grande con-
ummm , quodr^onfeptem dtehus folum pupar.tur.fedno^
b,p.m e(t vfq:te ad emfumat,om„ f.cuh ^ ad Ld n$
ornms popdm folum , qui efi m Sufart . fedmundus
-unmerfus a maxmo -afque ad m,nm..m muitatur , m
..m-vmum-vt magn,ficem,aregu drgn^m eft, btbunt , ínm-
t^n akmaant ,^ pr^apuum imptrtguantes animas fuasl
Qj.,smiht detedere de hgnovit.? Nonne tu, qm foluses
■vua.O borre lefu qmregnaflta Ugr^o) Da ergo temthiò fru-
ãus henediãt -vtrgmet-vemrtsi da te mfht -vt inumiam tei
£5- mandticem , ^Pturermmh.necfrauder à defíderta
htt.sDomme ?^h, cubas . quo decltnap dtleãe mi . Be^
ctofe forma prsfitfs homtnum, amahilisfuper amarem íu-
Itemmicandtde , rubicunde i ^ eleãe ex m.lltbus ? Ouà
^btjftt a me?fug,l{ine fuper montes aromatum , w hinrttt-
lnsceruorum'ueloctftmus? Quomodo apprehendam te i fí
fxv.kas ,-vt gtgas adcwrrertd^m^.jiam ? Keuertere Ftli Ma-
ru, re>*ertmTttntucarti,,^,lda m,ht penna, ,fautcolu-
í-e. 'vt'vol(m.,.&reqmefiam,nre i-vtteneamteinecdimit^
tamaenecbtnedixms mi^ adh^reatqm anima med
fo'
J04 Vida© o P. I õsIph anchi eta ,
poft te , nec me ttmhrít. comprehendant ifedfecjuarte lúmen
WiS , ^innomine tuo 'videam U^men. O itm^m pUrje
mundatm ejfem à peccatis méis , Pater tariffime » ^vt nort
manducarem i nec liberem indigne corpus * ^ Janguinem
bominitfed tn fpmtuhumilitatis , ^ corde contrito tntroi-
rem adaltare Dei , 'vbt haurirem aquas de fonte , qui eft tn
medio í?aradip ^ finfe vmo , finte aquA fatie mis in "Ví-
tam otternam. Sed heu Mu» caputmeumplenum cogitatio-
mhiis,cjt4A funt fineintelleBti, armt cor meum tanquútn
finum^^ linguamea aâh&.(itfaucthus méis ^noncantansca'
íícum nouum Domino , qm tot mirêhilta fecit , cm tn efi
cam datum e(i fel» ^ tn Çttiohlatum eífacetum , vtduU/a
e£t ntfamihs mets eloquia ejus , ^ tpjius mufto plenus^fo-
lum Dommum Deum meum totó cor de ^ mente , ç^ammà
diligerem y omnia arbitrms ficut ftercora ^ ^tChn/tumíu-^
cr ifa cerem , in ejus am.ore jugtter dele Bar er. Sedfpero trí
^eo, quoniamadkuc confitebor tlli , ^mhulans immacuU'
tus in 'via > quia ipfe conuertetfactemfuam ad me ,^ hc'^
nedicet mihi , nec fecundum miquitates measfaciet , in&ter^
num ir afie ns mihi , fed omnium debitum dimittet , nort
pcrmttens meeijciintenebras exteriores, fi d dabtt lúmen fe-
mttís meís'verbi^m fuum^ 'Vt ambulem , dum íucevi babeam
n)tnon offendam,fitn tenebris ambulauero. Tu ergoeffunde
inconífeãti Dei orationem tUáim , fed fubvmbra ejus que
dejiderat anima tua , (^ cum ^enerit ad te cubiturus in
mendie , apprehende €um$ tntroducens íncuhiculum ma^
trís fuâ t 'Vt tbite doceatyquamdtlatatAfunttribulationss
cordis mei, quam muliiplicat^ ArnmnA , quam inuttlis fa-
ãm fim , & fie rejpíciens in me , miferearis mei , orans
fime tntermtffione , njt deleatiniquitatem meam Domtnus
^ det mtht fpintum bonum. Sed quare ^ffligo cor tuum ^
h AC ccmmem orans, gaude tn Domino chartffime, iteram di-
çpygaude^ quiapUntauittemdcmofua , 'ubi 'Vt oltua
fruòtifera , ^ fpectcfia in c^mpis , colluãationem habens
aduerfiusmundí Príncipes , ^ Reãorores tenebrarum ha-
rum
m
LivroVCap IÍI. 30S
YUm^vhcYt fruãus affers , predicans Euangeliumomnicrea-
tt4r& , ^ interponens nomen 'Domtni /eflt , quod oleumef-
fumefi , CÍ4JÍ4S fermones moíinfuperoUum tplifí4m jací4lal
^penetrabilíores ommgiadto anciptti.Vtgtla ergo ^^ opus
jac EuangeltfiéL , amhuUns in ^ta tmmaculaía , mimíita
Domino, ^ ne habitet m medto domus tuA fuperbta^fed per*
ambda. tn tnnocentiacordístmoffenns^Deohoftiamfanãã,
^imm , qu& tollttpeccatamundt, ^ cum fknãum IfJc
immolauertsfupcrjimem lignorum^ confedera ad de xteram^
^ ^tdebts Manem lefu áefolatam , ploranteminilla no--
ãe , qua faã/í funttenebra fuper ^nmerfam terram afex-
t£ hora ^fque a d nonam , quam 'vindimiauit , ficut locutus
eíf Domtntis in dieirafuroris fui. Vale . lofeph.
Em Português diz o feguinte.
iisvs Maria
Esv Chrifto verdadeira luz ^ que allumía a todo
homem exiftente nefte mundo , alIumievoíTo cora-
çam pêra que aíCfta fobre vos fuá diuina luz , & vos guie
pello caminho direito . até chegares ao monte de fua ían-
arificaçam monte chco & feruJ, ac nde vos farteis naquel-
les peitos de toda a confolaçam Quccoufa he o homem ,
que aíTi he engrandecido do Senhor /Cntem éreis de me*
nor idade , falaueis como menino , tinhcis penfgmentos
pueris , porem agora eftais fcitcfVaram , Sacerdote do aí-
tiíTimoDeoSjOÍÍerendo pam.ôc vinho.Masqqcpamheeíle/
Pam dos Anjos, verdadeiro inanjar , que ccmcm os po-
bres , Ôc ficam fartos , pam viuo que defceo dò Ceò pê-
ra encher de lodos os bens aos que delle temforrie , quem
come cftepam tem vida pêra fcmpre, pam celefte que
cm fi tem todas as delicias do gofío , & toda a íuauidade do
fabor. E que vinho heefte , vinho bom , com elle fenos
deu hum lauatorio a nclfas culpas, reconcihandonostomo
Eterno Pay , alimpandonos as maculas da filha de Siam 5
porelleemrou o meímo Chrifto na SaníSla fanâiorum,
Qq
I
§3-
«ii
306 Vida DO P. íosEPH Anchieta.
oanhândo aeterna redempçam pêra nos , que eílauamos
ena prifocns ãc pobreza, ôc ferro : com elle fopeou as po-
tencias úo Inferno, quebrou o arco , defpedaçou o ef-
cudo, aefpadadesfe a guerra , pondo tudo em paz , af*
fi no Ceocomo na cerra. Eis aqui; Padre quanto vos quis
o Senhor engrandecer 5 admiraiuos das riquezas dadiui-
oa bondadei voífa alma agradeça engrandecendo aquel-.
íe , que tam humilde vos leuantou , que cada dia fe entrega
cm voíías maôs , fazendo de voíío peito morada de feudef-
cançojclegendouospor miniílro fcu , Ôc defpenfeiro de
fcus mifterios. Trabalhai agora , ôc fazei muito , porque
vos ache fiel cmfeuferuiçoifete vezes vos lauainorio lor-
dam, pêra que nam haja cm vos macula, que deíluílre
tam fagrado minifteriojôc ainda queeftejais lauado.& pu-
to naconfciencia , repeti muitas vezes o lauaros pés, che-
gandouosas fontes das agoas viuas ; ponde cenrinelas no
eora^am , 6c guarda nalmâ,; pêra queoalciííimo Deos vos
fantifique com o fcu tabernáculo , entrando cm vos, an-
dando em voíTâ companhia , ^ ceando com Vofco. O
que grande çea .^ O que real conuite /Que fe nam prepa-
ra fo pêra fete dias , mas pêra nos manter até o fim do
inundo j pçra elle fe manda eonuidar nam fomente o pouo
de Sufah , mas o inundo todo , do maior até o mais pe-
queno; Nefta fobcrana meia bebem os conuidadosabun-
te vinho ,( como Conuêftv>^ magnificência Real defle ban-
quete, J &CO principal he , queíaem as almas fatisfeitas ,
& alentadas : ò quem me dera comer da aruore da vida f'
Nam fois vos meu bom lefu , oquefófois vida? Que rei-
naíles na aruore da vera cruz? Daiuos logo a mim bendi-
to fruito doVentredaVirgem,daiuosamim. pêra que vos
ache, & vos coma , & fique farto porhuma vez 5 nam fi-
que fruftradoefte meudezejo, porque minha alma vos ape-
tece i onde habitais Senhor ? Onde vos recolheis ; pêra que
parte foíles amado meu z^* O mais efpcciofo dos filhos dos
homens, o mais digno de fer amado , branco, ôc rofado
efco-
I
IlVRoV. Cap. III. 307
cfcolhldo entre milharcsj donde vos apartaftes demim ? por
ventura fugiíl CS pêra os montes aromáticos , como ceruo
veloz ? de que for te vos apanharei, fc faltais como Giga n-
te quando correis .'=' Tornai pcra mim Filho de Maria, tor-
nai pêra mim, pêra que vos veja 5 ou daiire azas pêra voar
como pomba , & dcfcançarem vospera que tenha maô,
òc vos namlargueatemenam laiíçardcsvoíía benzam, Ôc
minha alma featea vosdefortcqueas trcuasme nam apa-
nhem , mas vos íigua como lume da eterna vida & em
voíío nome alcance a luz verdadeira. O prouera a Dcos ca-
riílimo Padre , que me viííe tam hmpo de meus peccados ,
que namrecebeíTe indignamente o corpo , & langue do
Senhor , mas que comefpirito humilde, & Coraçam con-
trito entraíTea celebrar no altar de Deos , aonde bebeííe
as agoasda fonte, que eft ano meiodoParaifo, fonte viua
de agoa, que corre pcra a vida eterna 3 mas ay,ay de mim,
minha cabeça eftà cheia de fantezias , que carecem de
entendimento, & boa rezam j meu coraçam fc fecou co-
mo feno do campo 5 minha lingoaeftá pegada à garganta ,
fem cantar o nouo cântico ao Senhor , que obroú^antas
marauilhas , a quem deram a comer fel, & a beber vina-
gre , pêra que fuás palauras foíTem doces , & fuàués à mi-
nha garganta ^ fo a meu Deos quifera amar de todo o
coraçam , comtodoo entendimento, ôc alma, tendo tu-
do o do mundo por vil efcoria , pcra ganhar â Chrifto , po-
do em feu amor todas minhas delicias. Mas efpero em Deos
ja que ainda o confeíTo por tal, que andando pello cami-
nho de feu feruiço fem macula , queclle virara feu diuino
roftropera mim , botandome fuabcnçam, & que o nam
fará comigo fegundo minhas maldades o merecem , guar-
dando eternamente a ira contra mim,mas perdoará todas
minhas diuidas 3 nam permitira que feja lançado nas treuas
exteriores , mas dará luz a meus caminhos fua palaura, pê-
ra que ande, em quanto tiuerfua luz, nam tropece, &'caia
fe andar por treuas. Tratai logo de largar as velas de voíTa
Qq ij ora-
Vida poP. I oseph Anc hieta
oraçam diante o Senhor , aflcntaiuos à fombra daqudle
que dezeja voífa alma , & como vier habitar em vos ao
meio dia , pegai delle , metcndo-o no cobiculo de fua May
pcra que ahi vos cnfioe , qpam grandes fam os trabalhos
de meu corãçam>& quam;multiphcadas as afrontas.que inú-
til me tenho feitOr pondo os olhos vos compadecei de mim
cm voíTas oraçocns , pêra que o Senhor me perdoe meus
pcccados , & me de elpirko bom 5 mas pêra que vos mole-
ílo, dizendo «ftas couías f Alcgraiuos no Senhor , charif-
íimo, outra vez vos digo , que vos alegreis , porque vos
tem o Senhor plantado em fua caza, comooHueirafrudi-
fera , & mui fermofanos campos, armandouos contra os
Principes deftc mundo, Ôc Gouernâdores deílas treuasj
fazendo muito fruito , pregando o Euangelho a toda a
crcatura, entremetendo o nomede lefu , que he olco der-
ramado, cujas palauras de fobrc efteoleo famas mais for-
tes arremeçoens , & penetram mais que huma efpada de
dous gumes. Por tanto vigiai , fazei obras de Euangelifta
andando por caminho fora de culpa 3 íerui ao Senhor , ôc
nam hábue no meio de voíTa caza, que heo coraçam , a
fobcrba I ma5 caminhai pella innocencia da vida , ofiPere-
ccndo a peps façrificio fanto , & viuo, que tira os peccados
do mundo í^ quando ftcrifícares o fanto Ifac fobre o
monte de lenha » coníiderai pcra amaõ direita , ôc vereis
a May de leíu, fem confolaçam , chorando naquella trifte
noite r cm quepuue treiías íbbre o mundo todo da fexca
hora aiê a nona , na qual vindimou , aífi como diíTe o Se-
nhor, no diade feu furor. Vale. lofeph.
CAP.
LiVRp V. Cap.IV.
309
CAPITVLOIV.
Ca/os marauilhofos dcu profecias .à* reuelaçoens,
que teue nejla Aldeã,
Eíla Aldca de Rerícigba foy mandado pôf
efte tempo o Padre loam Fernandes Gato,
era zclofo da faluaçam das almas , & dc-
zejaua fazer algum fruito com as dos In- Pr^uéq^chi
dios, mas applicando muita diligencia por faber Tua lingoa, foTer!b'f »
nam fahiacom o cfFeito dezcjado 5 chegou a defconfolarfe 'írsoadoBu
grauemente, fendo fruftrado feu trabalho 5 conheceoíofc- metír
phfeu cuidadado , encontroufe com èlle , & diíTelhe ,
nam defanime Padre , và por diante que eu Ihé digo,qiié '''"' '^^■'^"
daqui a poucos mczes , ha de fahir liftgoa do Brafil > enfi-
narà jConfeíTarà, ôc pregará nellâ : & foy o cfFeito ma-
rauilhofo , porque fahio o Padre loam , quando menos
cuidou , deftro em todos os modos neceflarios de falar
Brafihco , ôc obreiro perfeito pêra com os Índios.
X Da mefma Aldea partia efte próprio Padre , cha-
mado à Villa pello Superior dacaza Marcos da Coíla porp;;,fX°-
ida, ôc vinda : foy a defpedirfe de lofeph, como quem logo ^^^'^^«^^
hauia de voltar. Porem elle lhe diíTe , vâvoffa Rcuercnciafm""f '
embora , ôc faiba que ham de paífar quatro mczes , os de
fua auzencia 5 coufa de que nam podia hauer conjeótura ai- T^J/plv
guma , & contra intençam de ambos ^ & ainda do Supc-'p'^'"^fi/-^i7
rior que chamaua ; foy com tudo á profecia certa , por-
que as couzasfedifpoferam de maneira , que por mais que
o Padre procurou voltara companhia de lofeph , cm todo
efte tempo nam pode. j.o'J-io'i
3 Depõem o mcfmo Padre em feu juramento, que co- Cochcceos
nhccia lofeph os coraçoens occultos , &que querendo hãa^,^^;'^^/^^^
Qq iij me-
3ip Vi DADO P.IosEPH Anchieta,
fnenham confeííarfe comelle, porfer confeíTor feujhedif-
diíTe 5 vávoíTa Reuerencia dizer Miíra,quenam tem ne-
ceífidadc de abfoluiçam, do que pretende confeíTarfe 5 ôc
replicando elle com eícrupulô , lhe diíTè mais claro a ma-
teria , que Ihedaua pena, aífi , & de maneira que elle
queria proporlha , fendo impoííiuel fabclla por outra via *
que por rcuelaçam do Geo "i>^\^
4 Depoz mais o Religiofo fobredito, que andando
tcreueiaçaô ^^^ ^ PadreJofephem miíTam pellasfazendasdos mora-
da ncceffidade <Jorcs circumueíinhoSj de improuifo, ôc antes de haucr
miô,ii V4i- cócluido ao que hiam, lhe diíTcjPadre vamos a Villa,porquc
ih^ acudir. ^^^ ^jj- neccííidade denoíTa prefença certo Irmão. Partiram
'Tree.S'f- 17. íen^ demora , & o Irmaõ de quem fallaua, no ponto que
Proc.B. /is. yioa lofcph , fc Ihefoy lançar aos pés , dizendo , ahPa^
dremeu,Dcos trouxe a Voíla Reuerencia a efta caza,
faibaquefe hojenam viera,fora trifteofucceíTodeminha
alma .«^ E fabido pçazo, era grauiííimo, Ôc arifcado a per-
der o Irmaõ ruaperfcuerança. Confolou-o, conipoz o
negocio, Ôc voltou ao primeiro intento. . - - j . i. :• :
Téreueiíçsm 5 Fov outra vcz O mcímo Padrc por companhci-
do intento oc- a|i • 1 /i ii
culto decer ro tcu , z outra Aldca , comintençam de eftar nella por
""fcy^t^^^^n^o^^g^^^ índios: quando
cô íua prtfcn a dcshoras trocou parecer , ôc diíTe , he neccíTario que mu-
^* demos de fitio , ôc vamos a tal Aldeã, com toda a preíTa
jhid. que importa aífi. Notou o companheiro a variedade , con-
Fmr»-f. m tra o que tinha ficado pouco hauia ; mas o fucceíTo lhe mo-
ftrou , que fora inftinto do Ceo , porque pouco depois
de chegarem , entraram na dita Aldca certos homens co-
mo cíeaíTuada, a perturbar com força os índios , os quais
em vendo lofeph , fe acharam corridos , mudaram inten :
to , ôc de lioens fe tornaram em fua prefença cordeiros , Ôc
tiueramavindado fcruo de Deospor milagrofa . porque
fabiam feu efpirito de profecia.
6 Andaua outro dia em miíTam pellas Aldeãs , che-
gou a fazenda de Manoel da Gaya na paragem que cha-
mam
Livro V. Capitvlo IV. 311
mam a ponra dafruita, pediollieallia molher deíle homêT«rcu(íaç«m
^ 1 /-r TA r • I I • dchunnhoaC
quccncommendafle a Ueos leu marido,qucnauia tempos que indau*
andaua cm Europa , Ôc nam tinha nouasdelle.Kefpondco/" E"'°p*-
fenhora , partafc voíía mercc a menham que vem , pêra a p^^^, s.fni
Villa , ôcahi o efpere, que no mefmo diao vera entrar
pellabarraafaluamenco. Nam cabia em íi a molher com
tal noua preparoufe logo , & foyfc à Villa , & vio com feus
olhos :, o que eíperaua , &: nam acabaua de crer.
7 Nam fby efte fucceíTo sò o cm que tirou de pe- ^^^^^ ^^^^1,.
na efta mefma Matrona. Outra vez achandoa em planto çío do mefmo
por fen marido , por fama publica que corria , que fora ^^^^^^ .
prefo dos bárbaros gentios , ôc comido delles 5 alumiado
do mefmo efpiritOjlhe diíle,nam tem pêra que chorar fenho-
ra , & alegrefe porque feu marido he viuo , Ôc ao primeiro
dia de laneiro depois das doze horas, lhe entrara pellas por-
tas dentro. Ceifou do planto a molher, ôc as mcfmai horas
recebco ó marido com nouo efpanto.
8 Maior cazo de íeus occultos conhecimentos , hc
o que referiremos. ConfeíToa nefta Aldeã hum Padre cer-
ta índia. Eíla fe accufou, que tinha commetido pcccado
carnal com hum Religiofo, dos que alliviuiam,nomcan-^^^j^^^^^
do- o por feu nome , & aííírmando-o huma, & muitas ve- ítgredosdè
I ^ Cif
2CS Ficou admirado, & compadecido O confcíTor , por- ''** *
que conhecia o fugeito de portas a dcntr o, Òc nem pot proccf.í^
penfamento podia ninguém imaginar tal riiina defua vir-
tude : nefta forma fufpenfo , & magoado com vários pen-
famentos , que nam podia communicar, depois de confif-
fam , foy a cazo rezar horas Canónicas rom lofeph , que
de tudo o fuccedido tinha rcuelaçam 5 & pondo os olhos
nelle, moílrou que conhecia fuatrjftcza,ôf fem pergun-
tar coufa alguma , lhe diífe , Padre meu , nam fedefconfo-
le , porque o mefmo que agora lhe aconteceo, paíTou por
mim emPiratininga , que confeííando huma Irdia^ fe ac-
cufou feriamente, de que fiuera peccado femelhanre com
outroReligÍQfo,examinando cu bem o cazo, achei que fo-
ra
m
Jíi Vi DADO P.I O SE PH An CHI ET A.
ra entre fonhos ; torne a examinar a caufa , & achara que
foy o mefmo , & lançara deíi eíTe cuidado , ram rude he
efta forte degentc,qucnamdiftingueofonhado do verda-
deiro 5 ôc tam arriícados eftam os que viuem com elles,
a leuantarlhe como verdadeiro, o que nem por fonhos
commeteram Foy neccífario remédio fuperior pêra hurar
â efte innocente RcHgiofo , ahàs digno de fama bem dif-
ferenie. He neceíTario eftarem fobre íi os que vigiam a
grey do Senhor por eftas eílancias dos índios : porque
nam sò em fonhos , mas também cm vigilia , acharam
crroisfemelhantes. Osque fam deítros tem aucriguado ,
que fam fuás informaçoens tam faUiueis , que muitos
índios nam fazem huma teftemunha legal. E de todas
cilas couzas fou teftemunha ^euqucifto cfcrcuo , porque
incumbindomeporoííicio examinalos,rara vez achei no fc-
gundo cxamcn o que diíícram no primeiro , fem que va-
riatíem , ou na fubftancia, ou nas circunftancias . Ôc a
pouco mais daua credito , que conjedturas , ou confron-»
taçoens de feus diitos , & tal vez nellas fe apanham ,
quais là os velhos Suzanareos , na circunftancia do lu-
gar.
CAP.
tiVRoV. Cap.V; ' ^^íii
r\ i\t ■ rj
CAPITVLOV. r,^„,w
p arte pêra â Bahia affijlir em huma Congrega-
prouincíal^ & torna pêra a mefma Aldeã ^ &
obra caXosmarauilhofos.
Orrendoo anno de 1591. oU principio
de 15Q1. foy chamado dos Superiores à Ba-
hia àCongrcgaçam prouincial , que enramp^^t^i Con-
íe fez , como profeíTo que era dos mais ari- ereg-^.amd*
rr -e 1 -JJ Bàhia.
rigos , ôc peíloa de tanta experiência, & autnòridade pe-
ia negócios da Prouiíicia \ neílâ Congrégaçam foy ^Xáioiuxuv^tem.
,0 Padre Luis da Fonfequâ companheiro qiie tinha fido '''^''^•* 7'''
do Padre lofeph.ôc amigo feu ^ por Procurador geral á
Roma a dar conta das couzas de importância daProuiii-
cia a noíTo Reuerendo Padre» Dca cuidado éftâ eleiçamd
certo Padre que eftaua em Pernambuco, amigo támbemHieiekoPxó
do Padre Fonfequa , por Tuas poucas forças, & í^^^^s ^To^^p^.Yu^"
faudc j efcreueo aíoíeph ,adm!randofc de haucr corífen-Fóíequacóbs
tidoemtalcfcolha,comnfcomanifcflodavidadehum Reli- i're)>V'^''
giofo t:.m fraco , & achaquofo . mas ja que eílauaTeaci-
do o negocio lhe pedia , que o auifafle do que feíitiâ , a ^^''^'
cerca de fehauia de tornar com vida, ou nam i" A repoftá
fov afeguinte, OPadic Fonfequa vai aonde Deoso man-
da 5 & luppofto i que te a Congregaram andáua com pòU-
ca faude^cõ tudo na mefma viagem quando auiftou Pernam-
buco eft aua ja melhor, êc áiiidaque còm grandes incommo-
didades chefiara á. fahiamento a Roma,conèiuirá oS ncgò-
cios afeu çofto , & comapròunçam de todos, & tòrriara
onde Dcos lhe tem áfináláao o fim vitimo de fuás jornal
dás: AíTiquepoiso Senhor o tem ordenado heneceíTafíò
que nos ajuílenioscom fuaíanCiíTima vontade. Toda efíá
R r rê"
i'm
i
5>ra
do.
8I4 V I B Aa O P. I © S E PH À N C H I ET À ;
repoftafoy huma reuelaçam dos paífos de Fonfequa , fè-
gundo o que depois fe foube ,• porque ávifta de Pernam-
buco começou a melhorar da faude , com ella chegou ã
Portugal , & dàlli a Kotiá) cohclbíd os negócios como de-
zejaua, & hauendo chegadoa Madíid, déu fim a feus ca-
minhos , concluindo a vida no anno de 1594.
2. Recolhido lofeph oUtfâ vez a fua ÀÍdèà^e Re-
ritigba , obrou os milagres fcguihtès. Entre as Icuas de ín-
dios gentios , que o Padre Diogo Fernandes eftando nefta
Aldeã com o Padre loíeph , condufio do fertàm , vinha hu
hfiíieí;. aleijado de feu nacimtemo i & tam disformemente que
nam podia dar paíío , fenam andando fobre pés , ôc maõs
froc-Rf^^, ^ ^^^^ ^^ ^fuío 3 ^ por iflb chamado entre os feus cogua-
&iA. çu , qtie vai o mefmo que veado : Sahioa charidade àt
lofcph como coftumaua a receber cíles filhos, que hauia5
deferdeDeos , matéria d^ fuás alegrias, & confolaÇânt,
ôc depois de dar ao Padre Diogo os parabéns do íucceíTò,
& boa chegada, deu também pclla hngoa Brafihca a^ bòás
vindas , àquella gente toda , fazendoihes pratica dô htxh
quealcançauam. Todos os índiosouui amem pé ; màsnò-
tou» queeílauahumaírentado, & querendo efíranhaflhè'
o modo íe riram os parentes, dizendo que era aleijado,
& nam podia porfe empe. Coufa marauilhofa , porquê
condoidõ da monílrofidade daquelfe pobre , &dc còmó
affi de pies, & maõs viera feguindo os demais , centos dé
kgoas', & por caminhos afperos $ chamou-oâfi,deulhereií
bordam , & diíTequeandaíIeem pé, & direito, que pe^
ra o Ceo queria Deos feus olhos como racional, nam pêra a
terracomobruto.Aífiofezo ditofo veado , porque eni
pondo a maõ no bordam ,comeIIe logo, & fem elle de-
pois por toda fua vida andou em pé , como todos os outros
correndo comogamo, fem íombra alguma do mal paf-
fado, a pezar de íua primeira monítrofidade 5 venturofo aê-
tio , pode chamarfeefte duas vezes 5 porque do modo que
lõfcph o Tara , podemos cuidar que nam folhe alcança cor,
po'
Livro V. Cap. V. 315
po rcífto pêra a tçrra , mas também alma re6la pêra o
Ceo.
3 Em outra Aldca pouco diftante, chamada de p^^^^,.^^
noíTa Senhora da Conceiçam, fc achaua o Padre Hiero- viu de hum
rimo Rodrigues companheiro , &: amigo de lofeph. Aju- ^'"^'°
dauanquia bem morrrer a hum índio graue , principal, Prec.s>fh
por nome Io(cph, depois de reubautifmoj&i Çamrara em feu
gcntihimo. x^contcceo pois que efte índio depois de confu-
mido de carnes , &: redufidoa pelle , Òc oííos fomente,
do rcmpo largo da doença , desfalecido de repente das
forcas vitais fez termo que morria, & com effeito ficou fem
vfo dos íentidos , de maneira que foy chorado , & plan-
tcadode toda Aldeã com ceremonias coftumadas entre
cila gente. Nefteeftadoacodioo Padre Hieronimo , man-
dou deípejar a caza dos enojados,& tirar os que eftauaõ por
mais hegadosíbbre o corpo do parente. em final de maior
fenti T ento , ôc palpando a carne achou que tinha qualquer
quentura , na qual fiado lhe adminiftrou o Sacramento
íànto da Vnçam , muito à prefía , com efcrupulo fc eftaua
viuo, ounam , mas com certeza que eftaria logo morto
quando o nam efi:iueírc , porque ficou como dantes , fem
fentido. Acerca do cazo defte efcrupulo , efcreueo logo
ao Padre lofeph o que paílara , ficando temido na confcien-
cia; porém lofeph lhe refpondep , tirando-o de todo o
género de duuida. Padre meu, deixe cfie cuidado , que
euencommcndeia lofeph a Deos , & nem morrço, 6c
nem ha de morrer defta. Foy oráculo do Ceo , porque lo-
feph nam morreo daquella doença , &: viueo depois mui-
tos annos, por mais que. fora tido por rnorío muitos dias»:
,4 Na mefma Aldeã de Reritigba , 'tratauam os Ia-
j" 1 ^ 1 11 I '/C5o toque
d!os lançar ao mar huma canoa 5 era ella grande , pao pe-dcru»ma5
zado , & pofto que muitos nam podiam 5. pediram focor- ""^^''^^"/c
r^oa lofeph, que conheciam ja as forças de feu efpirito jn^ui^osn-ôp»
dizendolhePay lofeph, temos metido noíTos braços ,na5^'^'"'"'°"''"
fam baítantesinam permitas que fique fruílrada aobra que j^rec s. /.»t.
R r ij nos
i
SÍÔ Vi DADO P. loSEPH ANC HIETA,
noscuílou tanto fuor. Ham ouue mifter iifiais , Vaife lofc-
ph ao lugar , manda que ponham elles o hombro , &: poé
elleamaó, & cm continente deram coma canoa na agoa
Tem canfaço algam , & clamaram os índios, que era ho-
mem braço de Deos>quecomhuma fomaô» vencera os
hombrosde cantos.
CAPITVLOVI
Entra lofephafer Superior na taXa do Efpirho
Santo, ^'Jua^ refidmcm , & ^omo fe ha no
Epôis de haucr eílado íofeph defde d
, anno de 1587.com fcus amados índios de
f Kcritigba , damaneira, que vimos 5 no an-
Sttodeó93.dérpedioo Padre Prouincial Mar-
T« rcu Uçanfl^âl Belcàrtc , humacarta fechada , em que ordenaua ,
rpeusup^que por feruíço de Deos, Ôc bem da Companhia, tomaf-
^^°''- feàruacontaogouernodacazadoEfpiritoS.&ruasReridé-
nurn- 168 ^^^^ Poréàqui antcsquc âceitc a entrega da carga, he bem
4ír«/>.i . ^^ aduircamos O como o Senhor , que tudo difpur.ha ,
lha tinha rcuelado. Andaua nefta occafiam cm miííoen^
com o Padre íoam Fernandes, hum dos companheiros de^
Reritigba,mandoLilhe recado o Superior , que era da ca-
2a , que importauâ verfe fuâ Reuerencia na Villa , nam dií-
fe nada do para que , nem mandou a carta do Prouinciai:
í porém íofeph que eftaua preuenido , cm ouuindo o reca ^
do , diíTeao companheiro. Padre loam ,fabe o que he ,
chamamme pêra Superior^vejavoíTa Reuerencia em que
eftado /^ Tornouíe a renouar aqui a profecia do principio
defeu Prouincralado, quando dandofdhe recado do Su-
perior cm Taparíca andando em miffoens , diííe, que era
^0 i chama-
LlVRC V. Cap. VI. 117
chamado pêra Prouincial j que parece nam dlfpunhâ ò
Ceo nada delle, fem que primeiro lho fizeíTc faber , & qua-
fi confuItaíTe com elle jaíTcntando o auxilio , & forças »
que pêra o intento lhe hauia de dar. Chegou â caza, & o
Superior lhe entregou acartado Padre Prouincial, cm que
diípunha , que conuinha à fanca obediencia> aceitaííeo
caríTo ; felloaíTicom afurniíTam deuida.
2 Eraneftc tempo aCapiCaniadé Efpirito fanto tam
fértil de trabalhos , como de índios, & eram eftes muitos
milhares , redtífidos a eyuatro Aldeãs de Reritigba , Gua-
rapari,S.Ioam,&: Reis Magos,íugeiías todas ao buperiorda
Villa.que ale dos Portuguczes, hauiâm de fer doutrinados.
Efta grande machinâde encargos nada fazia enfraquecer o
generofo efpirito de lofeph, que em nenhuma outírà couíza
cuidauaíenam trabalhos & mais trabalhos: soas forças dõ
corpo eram as que gemiam , à viíla do horroí* dos cami-
nhos , que eram fi^agofos , 6c lofeph Velho , enfermo »
6< quebrado , ?ot6iri ÍPintus eít qut mutficat , o (efpirito ^°»^*=^«»jr»**
he O que da forças , oc traças perâ tudo j âíli lhas deu âqui. tou ewre ícn
Fizeram concerto entre fi j corpo ^ &: efpirito de lofeph ^^"òf
quco corpofoífealiuiado , quaíido dahi mais em diante
nam podeííe , deixando leuarfe em rede , couza deteftãuel
ao feruo de Deos ateefta idade : & que o efpirito an-
daííe volante por todas âs Aldeãs , & ílâm peteccírem poí
fraqueza de hum corpo tarttosefpiritos ; com efta traça
acodiafugeitotam debelitado apartes tam diftances com
o grande fruito , que irá cocando a hiftotia.
3 Porém he bem que vejamos aqui ô como os fub-
ditos recebem em cazà efte Superior- Todos os que alli
refidiâm , tinham fidofogeitos a lofeph , ou nos annosque
gouernarâ S.Vicétèoua Prouiticiaicõnheciaômuibcmfeu
efpirito , zelo j & charidade , & como a tal lhe entrega-
ram a alma , Ôc coraçam : o modo com que lofeph lhe en-
tregou o feu hiràmoftrandoahiftoria. Subiram de pon-
to aqui aquelias cxcèllencias com que vimos, gòuernou S.
Rr iij Vi-
tUrn
? K
-319 V í DA DO P.I OSE PH An CHiETA,
íoíuT vu^ru"^'^^í5te,&: depois a Prouinçia 5 no trato eom Deos, alé
^^*- , de ruas pcrennes vigílias da mor parte da noite em con-
^ t emplacam, & fuípiros. parte da menham , depois de
. dizer MiOTa. , gaftaua de joelhos , ouuindo todas quan*
tas podia a outros Sacerdotes, arrebatado nos mifterios pro-
fundos daqqellediuino Sacramento, como ja fazia em Re-
ntigbd , nem pêra ifto lhe cauzgua horror , o quam caro
lhe hauiamcijftado em fua puerícia, as muitas que encam
ajudMua .atéficar quebrado de coílas. Em qualquer cou-
za que fízeíTe, grande , ou pequena , trafia lemprea Deo_s
prerente j & de maneira traraua com os homens , que sf
faltar emvrbanidade , & cortezia, eram as praticas à&
Deos , & vida eterna ^ nenhum kigar , ou occupaçam
podia díuerrirlheo cuidado do Çeo .• foy ouuido muitas
vezes çflandoà meza , deícuidadodõ comer, íalíar com
Deos, Sç-.fomi^tndoo peitoem fuípirosamoroíps.qae narn
podia recêT o atíeéto.CoCtumaua dizer muitas que nenhu-r
:m% cou>za impedia a huma a^lmaa confideraçam de íeu Deos^,
íail.^íllftí^arii^oxiçl^ti^ própria ,,& de prudência: & coníefí
54.oqio>f^y3 de rirmeímo ; que nenhum pení amento. o diuertia da
meditaçam ;..era aqueue coraeam hura.a rragoa fempre a,c-
çeía defogo vfupremo, , que punha em eCpanto os íubditps^
Pogor de fea . 4. V; s Fera^ CQnfio;o , a pszar de feus grandes achaques
id. p. J17. ereciaoíigG.r de leu corpo , parecia hum fifcal de fr mef-,
pio., eraií^i contínuos os e<:hx)s de feus açoites , as afperezasi
^ ífus^c^ 'icj Qs ,&abftínènçias 5 nam víaua de lançoes-,^
ou manta , fempre veftído|omaua o fono , qual foldado.
bsíígforííp^i^qjue., qualquer neceííidade otomaííe à lerra :
Se' .hauiana caz.a enfermo , que neceííítaífe de fer velado ,j
rjenbiiíp rpais^predes que. Ipíeph, ja mais confentio enii
f|u';C|jbiicíjrW; roupa ,^ folie precizamentc neceíía-
ria,&,eífap^mqpdad3,§cpob^^^^ dccaza, Nam fe via-
alHcrçritpno,; nem arca, nerr^^inda pennas pêra efcreuer,;
quç ,e/las folgaua de pe^if ;,empr€Íl:adas , flias alfayas prer
^?;^^v^^ê%7ÇÍjlcJos^ ., #é^#Bat?.?^ÍnfeTOen de fcu^-
nz.% 651.3::,; ■,
rigo-
rigores. O mefmo era em
•st
319
íeus caminhos , nunqlia ja
mais foy vifto lofepha cauallo , dando por cauzaque era
no^uo ao dcfcohcerto de fuás coftas , 5c aqucm lhe per-
guntou huma vez , porque nam hia a cauallo .«'DiíTe. que
vosparece, como iriam áirofas minhas cortas ? Nem em
rede coftumedo Brafil , quis andar fenam agora como
contrato que fica dito , & com ás cautelas que ahi ap5-
tamos , que vinha a fer huma sò apparehcia..
5 Pêra comos fubditos , 6c quaífqueir homens ou-
tros era extraordinária a igualdade de animo que guardauaia^idíô
Onde quer que eíliueíTe , qualquer negocio que trataíTe ,
com qualquer calidadc de hortiens que fallaíTe^fempre'^'''"'""^''^^
guardaua o mcrmofembrante, a mefmapaz, & benignida-
de de palauras , como íenhor que fenipre eradeíi mefmo,
efpecialmente com osquelhe dauam alguma òccafiam dê
ág^rauó Com hum veíinhp de noíTa caza téue certa pen-
dcnciá, acerca de aleuantar hum edifício, de maneira qiié
impedia a vida da noíTas janellas , falloulhe Ipfepíl comi
cfficáciá, porém caindo fobre fi , & pârccendplhe hàuiá
excedido os limites de fua ferenidade , diíTe a hum Reli-
giofo, pezamede hauer dado cauzá àquelle homem de
cnojarfe.mas eu lhe darei farisfaçamiôcàfatisfaçam foi tal ,
que fendo dantes aquelle vcfínho pouco aff^ótoà Compa-
nhia , nem téentam tratara de confeíTárfe com algum dos
nòííos j dalli em diante feveio lançar aos pês de lÒfcpha
fez corri elle humâ confiííam geral de toda a vida ^ coni
grande proueito de efpirito; & foy deuotiííimó da Corri-
panhia. Em todos os outros negócios tocantes ao beríií
da caza, & feu ofíicid, fazia de maneira que nám faltaíTé
ritíriqua aofocegò dê fetíèrpiritd, nem a obrigaçamde feri
cargo.
CAP.
320 Vida DO P.Iose ph Anchieta^
CAPITVLO VIL
DodomdefucuReuelaçoens,& Profecias nejlâ
Tcue reufía-
çati de bum
íucceílo ocul-
to.
Andara loreph a certo Sacerdote , ouuir
de eonfiííamhumamolher, que dizia eftauá
enferma , & mahdara chamar em particu^
proccf.i ' ^^^^ dito Sacerdote 5 porém a doença de*
T Him p x%l íkz molher era íicçam , com que pretendeo enganar o Rc-
Rtdr.f. 14,6 ligiofo , porque cm chegando dckubrio logo a maldade
com circunftanciaseuidentes defua intençam deshonefta;
liuroufe com arte » & manha , õctornoufe confuzo pêra
cazâj paíTaua pella fanchriftia a tempo, cm que erílaqa a
Padre lofeph pêra reueftirfe , & pondo os olhos nclle ,
Tem preceder palaura alguma , diíTcj Faia ego regam pro
te y^t non d€jiceret fides tua- Eu roguei porvoíTa Reuere-
cia, porque nam faltaíTena fé, que deuiaàReligiam.fícotí
admirado o Religiofo , tendo por certo, nam podia faber
câzo tam occulto . de que fò Deos fora teílimunha , fenaõ
por reuelaçam diuina. Mas nam parou aqui a proua da cer-
teza, porque paliados quinze dias , eíla molher ( ja arre-
pendida ) veio à Igreja pedir hum Padre pêra fe confeíTaf
atempo emqiie lofeph eílaua rezando as horas mcnor^,
com omefmp quetinhaido a fuacaza^ & dandolhe reca-
do o Porteiro, diííe perá o Padre , voíía Rcuerencia hira
confdírar aquella peoi.ente , em acabando de rezar 5 ficou
fobrcfaífado , d rtípondeo , voíía Reuefencia fabe onde
me manda > tornouihe iofeph , íifei , và voíía Rcueren-
cia remediar efta alma , porque fe namíedefcubriraclle ,
íiamíchadedefcubriraoutro ôc da parte de voíía Reueren-
eia nam ha inconuenicntealgum. Aqui ficou de todo per-
íuadi
I
Livro V. Cap VIÍ. mi
fuadido , que tiuera reuclaçam do cazo > foy com confiã-
ça , & aliuiouaquclla peccadora.
2 Achauafeanguftiada huma molher Vefinha dos
padres, nameíiiia Villa doEípirito íanto. Porque dcuen- ^.".'^/h^^^f
dolhe hum Gaípar Carualho quantidade de dinheiro «'"^^P"^''''*'*
& requerendo o porclle em atadicncia' , nam áchauao ef- , . .
cricodd diuida , depois de grandes diligejncias íeni cfipeico
ôc poíla em tcrmosde perder fua diuida , & fer abfolto
odcuedor3 recorreoa lofeph , que por meio da Virgem
Senhora NolVa, alcançaííeo efcrico perdido Acudio iogo
à molher aíl^igida , mandoulhe dizer i que bufcaíTe em^ cer-
ta ciixa dcíuacaza, que entre as dobras de hum (eu man-
to, acharia o papel , que bufcauaifoy marauilha grande;
porque efte manto tinha bufcado muitas vezes, òl comei-
ieíahira fora , depois de perdido o papel , 5c nam parecia
podiueloque diziaj tornou a bufcarcomduuida, mas achou
cÕ certeza no mefmo lugar aíTinadOi o fcu efcrico ; admirou
tal dom defegredos, & depoí o cazo ella, Ocos de íua<:a-
7a E namheefta a vez primeira , que vmios a íofeph in*
terceííor de couzas perdidas.
3 Trcs dias hauia, que eftaua de parto Catherinâ
Gomes moradora da Vi lia da Vicloria , com dores grauií- pa^a^^om cie
íimas, ôc perigo de morte , veio a íofeph Luís Gomes ''"'^*"'*"
p:y delia , comoera cofl:ume,a pediílhefocorfo^diíTelhe
ide embora , que vos a porta jôc eila panda tudo ha de (et Proc.k> f.\o^
hum ; o ponta eftâno tempo adiante porque voííafilháha
deter rrespartosfeguintespeioresjmas os que reguitêjferam
bem afortunados:Foy alli, porque pario depois de chegado à
cazas&nos três partos * que depois fc Icguiram , pario
três crianças mortas com graues dores , 6i perigo, 6ã
foram os demais fáceis Sc felices.
4 Foy celebre a reuelaçam , que íeue dós infortu- R ueláçám
nios dehum Relisiofonoíío por nome Manoel Quintal. '^''*f"^''^°*
<^ * . ^ qu ' híuia de
Tinha chegado das Aldeãs dos gentiosfoyrecebeílo ao por- fa<ieccrhuin
to por dentro de huma cerca noíía, ôc ao primeiro abra- /vc^r*/ m.
Ss ço
ohibizc: o:
m
Reueliçtm
do peccadj
oculto.
i^l^VBMPWiP««n«Hi«iii«Vi^B^^
|ti Vida do P. Ioseph de Anchieta,
ço lhe diííc , ahManael , quantos trabalhos vos efpei
ram cm toda voíTa vida? ficou o Religiofo perturbado^
ignorando a cauza , & eftando certo que nam foubera ^
porvianatural. defeito algum que mereceíTe o trifte pre-
íagio,mas conhecia bem o efpirito de feu Superior. & íabia
que naõ failaua fem fundaméto,temeo,& tremeo, porém sé
frutO} porque depois foydefpedido da Companhia. & padej
ceotal tropel de trabalhos , que toda fua vida trazia àme^
moria o dito de Iofeph,& o depozaííi em feu juramento. O
eertó he , que quando o auiíbu , veria juntamente os traba^
lhos ,<!& a cauza delles em fua confciencià.
5 Namefma Villa da Vidoria, eftaua humamo-
Iher em paííamento , hauia outo dias , nem acabaoa de
morrer ; a cauza, deziamfer hum efpafmo ,quc a tfjlhia ,
& priuaua da fala, com dores graues, recorrcoa Jofeph á
deuaçam commua ? mas conheceo ellefer outro o mal,
chamou hum Padre, & diílelhe,và voíía Reuerencia aquel-
lacoitada,digalheêm.íegredoquediz lofeph. que nam pode
hir là , quelhe manda dizer , confeífc logo tal peccado ,
dizendolhe o género , que fezfendo moca, ha trinta an-
nos , & nam confeíTou arcgora por vergonha , porque
cftaheaeauza de feu mal, ôc logofarara. Foi o PaJre ,
mandou aíaftar osque lhe aíliíliam , & quafi píanteauam,
deulhe o recado , o qualouuindo, deu hum gemido a mo -
Iher, ÔcdiíTe, ah Padre, verdade he , que eáe he o meu
mal > preparouâ o Padre , o que permitia a occafiam Dre-
fente , confeíibu com lagrimas feu peccado , com promef-
fa de fazer depois geral confíffam de toda fua vida 5 & fi-
cou fam alii de repente , com admiraçam grande de to-
dos, leuantoufe ,foy dar as graças a feu bem feitor , 6c
viueo depois muitos anoos , lembrada de fucccíío tam
graue.
CAP.
I
<n omoD
,-v:l .i-
i^
. A T 7 . u Í^if-R O V. C A |, Vilíí i V jií
ííín ot}ol .':'orjfir'V' ^up 'i )^iuub !>ríp ^>5:?,o-jG loq obniv o- ;
>s .«ooi.»q = c APITVLO VIU, ■' ''^ • '■""?'■
'■ÉMfà O irmáv loàm dè Almeida ajfèr dijfcipòU
do Padre lofeph ^ & de como aprende era fuâ
^\: e/cola^
V M Ã das prouas do grande eípirito de He-
lias colhem os Santos do dom de Magiíleriõ qo granáe
com que formou difcipolos, que foram af- ^°^'^'= ^*8^"
fombro de marauilhas 5 & entre ellcs humphf° ^ ^ ^"
Elizeo iníigne em zelo , fé , & profecia5> na-
^iiellas idades antigas. Do dom de Magiíteriò,quc Deos cori-
cedeo a lofeph neftesnoíTos tempos , podemos tambêcolle-
git a grandeza de íeu efpirito. Doze difcipolos formou ení
fua primitiua efcola, ôc perfeitos todos còmu vimos no
primeiro liuro , cm fé , & zelo da falúaçam das aljnas 5
niasfobre todos cllcs auulta hum Almeida, que agora entra
por fuás portas, nacaza do Efpirito fanto > anno do Se-
nhor de 1593. oufo di2er , que mandado fello ínefmo
Deos , a fer difcipolo de tam grande Meílre. Da boca de-
íle difcipolo ouuimos , fora chamado de Deos por
fuámefmavoz , em idade tenra , fora de fua pátria Lon-
dres, terra de abominaçoens, quálx^brahamde í^r CaldAo^
rum 5 más nam lhe diíle ò Senhor , a que parte dd
mundo ; o effciro moílrou que áo Bfafil, á fer difcipo- f
lo de lofeph , & hum Elizeu , de tal Helias. Hurií
arino hauia , que tinha entrado na Companhia , & fido
nouiçona Bahia, masodeítino fuperior»que o guiaúa ;
traçou que foffe mandado pellos Superiores, a ter outro
anrio de feu nouiciado de baixo da obediência de loefph ,
& feu grande efpirito.
2 Recebeo cmcaza lofeph tam grande hofpcde, co-
Ss \) md
1
m
1 ^
1
fl4 Vii>Â&ó P.fÒsfpti Anchieta,
pomo rcce- ^q vindo Dor DeosjÔc quê duuidou que coíiheceo loeo aíli
b:o, & indu- . * 11 ri » nii
ftciou c: õ grío aeftinp ,com que eraniandaao, peraíer hum Apoítaijo da
dehofpedc. ^^Qf\ç^ ^ ^ hum^ obradoT dc portentos de profecias , &
milagres /'pêra tam grande intento ^ começou o Meftreâ
dlfpôr o difcípolo em fundamentos tanto mais baixos quãtò
Cizò tao, niaís defejaua foblllo em efpirito; Começou poí potqueirò ,
moitifi açam, g^ ^j-^^Qj. Jos aniiíiais do féruiço dacaza,&deftes cuidauá
dcAímeiia. com aquelle feruof , & diligencia , com que o nÉerà de
corpos humanos , porque nam atendia aõ género, mas aos
^^c^t/^.^^qtíWesda obediência, que exorçitauai A qui chegou aqúêl-
/.^ . le êxceííd raro , que referimos cm fUá vidâ i poucas vezes
=',u?. .:i ouuido em Varoens fantos , porque fentirido afcòeíti eú-
'^^ ^„ rar a ferida encancerada de nurii aíiímal dc carga , que
âjudauaa caza , ajuntou por vetes ú matéria j & bichos
mal cheirofos , que delle tirauá , ôc os meteo na boca > &
leuoU ao ventre , com valor , & efpiritOi auendoque náiti
cumpria com feu oííicio , quem nelle fe acóbardaíTe á diffi-
Guldadcs.
3 Paííou daqui á cauádor das hortas ^ varredor
dos corredores , ajudante da cofmhâ , refeitório , Ôc mais
íeruiços dos R eligiofos , em qucobrauá, ham como hurií
delles , mas como eferauo comprado : Trazendo às cofías
a lenha pêra o fogo , & as mais couzas neceíTarias, igual-
mente , que o animal deílinado pêra trabalhos femelhari*
tes, porque o conceito defi , era de jumento , aííi fe cha-^
mou por toda ília vida.
4 Aqui lançou os fundamentos de fuás eftremadas
afperezas , aííombro hoje de penitentes , a quem nam
Icuaram ventagem as dos Carmelos , ôc Thcbaidcs mais
duras j & chegou a porfe em qucftam, fe excederam as do
mefmo Mcftre > Nem fera marauilha, quebcm podehauer
difci polo fobre feu Men:re,erpecia1 mente em certo género dc
perfeiçamjporê eu lendo em fcus aponta mentos o aranzel de
feusrigores,achoaUi que foram aprendidos de feu Mcftre
lofepb 5 aííi o proteílou certo dià^ noíandolhe feu Superior
Seus tííicios
b* ixos.
De raíSafpe.
rezas raras.
o
r - L I V H O V- C j^ p. V 1 1 1: ( ^ V 3i$
b ^ftrcmo rigor de fcus faccos; meios faceou , caHcas,Ôc
mais géneros de penitencias , com que o acfaou armado
por todo o corpo em idade de fecenta , & féis annos, lhe
fcálo per ^l/cera Chrtfii .namintentaíTeinnonar couza al-
guma, porque aífi o aprendera de fcu venerauel Meftre '
lofephjôc por toda a Vida o vfarâ fem detrimento de forças;
ou faude. O mefmolheafíirmoupor efcrito , da Aldeã do
Cabo Frio , onde fora mandado por obediência : Padrs
Reitor 5 dizia , graças aó Senhor , qiie ainda tiue forças
jpera chegar a eftc Cabo frio, (& era caminho demais de 20.
legoas ) por meu pé muita parte da praia defcalçò , os ça-;
patosna cinta, com alembrancádomeu S. Meftre lofcph;
que afíl paflaua os caminhos > em que eu o acompanhei »
fendoelle de grande idade , ôc aííiandaua pêra meu cn-
íino , & grande confuzam-
5 De lofephaprendeo efiedifclpoloaquella rara pu- Sui cxcdíeii»
reza de Anjo , com que chegou , nam fô a éfpanrar , mas^ ^°""'
a confundir os mais cuidadoíos amadores defta virtude ;
porque akni de trazer fopeada fua carne, com os rigores
de íuas raras penitencias , a qualquer fombrade tentaçám,
a tizouradas feria, &magoaua as partes mais fenfiueis, ôc
doloridas de feu corpo 5 exemplo iinguíar , a quem náni
òuuimos, chegaíTe penitente algum : fobindò com liçoénsí
tam feueras a tal pureza , quefe lé dèlle que fo coírí feu
cilicio tirado de fuás carnes , & applicado a pcíTòas tenta-
das de larciuia,osdeixauâ liures,ôc fora da torpe tcritaçam.
6 De lofeph aprendeo áquclla arte de amar a;
Deos, cam leuanrada. cõ que chegou á fazer de feu coraçam J^ ^''"o*"'®^
hum quaíi Ceo , onde trazia comoinfculpidó em Cárneo
melhor daquella corte celeftial , por ordem concertada 5
em primeiro altar , as trespeííoas da ' antiííirha Trindade:
em fecundo o Sarialfimo Sacramento : em refcèiro a Trin-
dade da terra ( como elle dizia ) a Virgem Sahtiffima , á
Humanidade fanta de Icfu , & S lofeph cfpõzo da Senho-
ra. A maneira do portento infigne de S. Ciará de Monte
Ss ii| falco'
•V . \^/--.- -^
15o atnor dã
próxima.
^26 ViDAD b P;:I asE PH A Ncríi ETÁ ;
fâlço líSe deâexorajçamcheiò dí Deos pí^cediam c<ki(l
mturas os affeébos v aysí, & ítjíjpiros ailiõroíbs do CéO^
em que pcfennementeandáuá, ôc pel los quais era Còhhèn;
eido, ôc achado onde qaer que eftaua* . - 3 . , cib^^q
7 Do meímo Meíke aprendeov ô ârn<5t dd pm^í
2cinio tamviuo, que he rentimentosde algurts , quehaué-
dofe de pintar ao próprio, fe d cuia retratar volante* cõniô
Miírionario,a pé defcalço com feu bordam ao hombfo, ôc
nelle pedentea rede quelhehauiade feruir de cama.eorreridtí
osreconcauos dos moradores, batendolhe às portas, feit<f
pregoeiro do Ceo , Ôc perguntando feha quem queira
aproueitarfe de feusminiílerios , a fim defaluarfuas almas*
8 Finalmente de feu Meftre Jofeph aprendéo aqui
aquelle alto eípirito de profecia , òc dom de prodígios, de
Dóáeprofe 4"^ cílâcheia fua vida , & tem admirado ao mundo :nellà
cias, & mi!» fe pode ver, que confeííauaodifcipulo humilde repetidas
vezes , que fe alguma couza tinha de bem , efpeciál-
mentenas maõscom que obraua, era tomado, & aprendi-
do dos pés de lofeph Meftre feu. E na verdade quem let
a lenda defte venerauel aprendiz, vera hum retrato das ma-
^ rauilhas de íeu Meftre lofeph •. verá o portento dos wc-^
ninos rcfufcirados na guerra de CaraGurufu ; do campo de
fogo abrafador licenciofo , que sòteue refpeito aá couzas
de Almeida: do mar tempeftuofo, quebrado em flor, que
com fua bençaõ ficou enfreado. Do monílro marinho furio-
foquecomoutraficoumanfo; Do campo efteril, que atoa-
do com hum fo alguidar dagoa, brotou com fruitoadmi-
rauel ; Da índia Grimanczacega, & moribunda , queconi
o toque de fuás maõs cobrou vida , & viíla : Do braço
quebrado com exceííiuas dores , fam de repente fo com
eftes palauras , nam diga mais, cfte braço me doe : Vera fi-
nalmente os prodígios de tantos enfermos , de tantos en-
treuados, de tantos tizicos , de tantos moribundos , tor-
nados a faude, & vida por meios defte grande aprendiz de
lofeph , fuás profundas reuelaçoens , & profecias j & di^
TA
I
• Livro V. Cap. VIÍI. ?27
rà que foy grande ocípiritodo Meílrc, & grande o efpi-
litodo diícipolo; cm tudo remeto o Leitor ao proceííoda
vida de A Imeida , que hoje admira ao mundo , & pregoa
o magifterio grande de lofeph.
CAPITVLO IX.
De outras Reuelapens ,& Profecias do Padre
lofeph ^ que mo firam mais a facilidade defie
dom fupremo.
S T A V A íofeph huma hora em feu cubícu-
lo , em occupaçoenscoflumadas , quando
de repente foy viílofahir delle , dando vo- Uur» hum
^^^^^zesao porteiro , que logo, logo fem tar<q^'^^^;;^*f^.
dança foíle abrira porta, & recolheíTe pêra dentro humgidDàjwfti-
homcm que tinha fcMto hum homicidio, & vinha fogindo
à jviftiça , & nam permitiííe entrar os Miniftros. Andou ^fríi./.n^í
a toda a preíía o porteiro , ôc efquaçamente chegou à por-
ta, quando o delinquente fearremeçou a entrar por ella;
efcapando aífidas maós do Alcaide , & da pena infalliucl
que tinha merecido.
2 PaíTeaua outra vez por huma varanda, don M»nci»dic
de fedefcobre o quintal , daqui como leuado de crpirito J'^^' -'^JlIJj^g^,
chamou a deshoras húmoçodecaza,Õc diíTe ,ideàpreífaa
carado Capitam da terra, dizei que digo eu que mande tan- ^'-"^^/m^
oer caixa , & difpor ordem de defenfa , porque cedo ha5
de chcearnauios deFrancezes CoíTarios a Barra. Aííi o fez
vieram osnauios, acharam preuençam na Villa, ôc vol-
taram fruftrados.
3 Nam foy fó efta vez , noutro tempo diuerfo, eftã- m^^j, tocir
do a terra cm paz , ôc focego , leuado de efpirito mais »'"""*•
efíicaz , chamou com a meíma prcíTa o porteiro manda-
dolhe
328 VlDApo P.I O SE PH An CHiET A,
dolheque fobiííe à torre dos finos, ôctocaíTe ai arma ; fel-
lo íiííi,& aoromdofino fe perturbou a Vi lia, nam en ren-
dendo o nouo modo de final, que fahia da caza dos Pa-
dres. Vieram pergufar a caufa^Reípondeolhe lofeph, guarde
voílas mercês a Villa, eftejão em arma porque a menhani te-
rão inimigosconfigo. Deram credito comocoftumauam á
profecia, dirpuzeram àscouaasimportantesjeis que no pró-
prio dia feguinteientram no porro inimigos , falcam cm
terra , & principiando hoílilidades , viram a Villa poíla
em defenfa , quando cuidauam vinham de repente , nam
oufaram acomnretella , &: tornaram a fahir lem effcito.
Tanto monta a preuençarn íolicita , 6c tanto monrou o
auifo antecedente dei ofeph a quem ficaram os moradores
mui obrigados , & ficou celebre o cazo do rebate da torre
de lofeph.
4 Nam tinha chouido todo hum veram nefta Ca'
pitania defdeo principio de Março até fim de Agofto. Re-
correram-os moradores a íoreph , & ellc a Deos, deu-
lhes por coBÍelho, que fizeíTem procinram,& preces ao Ceo5
queredopor eíla via atribuir íó ao Diuino fiiuor que na ver-
•Páíff>-«;> i^j^dade ja tinha alcançado > como veremos. Pera efFciro da
prociílam folemne , pediram empreftado hum pendaõ nouo
6c luílrofo, queíabiam mandara fazer certo morador de
S. Vicente, que alli íe achaua , & pertencia a huiiia Ir-
mandade da mirericordia daquella Villa . Duuidaaa o ho-
mem empreftar o pendam alheo , porque podia aconte-
cer molharfe , Ôc ficar dcílufirado : mas aííegurado do ré-
" po > que nem por peníamento , (aparecer de todos , )
prometia agoa em tam brcuc efpaço, ouue de fazer o
empreílimo. Porem lofeph, que tinha ouuido a duuida,
vendo aruoradonoar o pendam olhou peraelle , &fur-
rindofe dilfe . & que bem molhado virà í Fizeram reílec-
çâm os ouuintc:. porque viam que a pi ociíTamfe fazia em dici
deS.At^oftinho^S de Agofto,eftandoo Ceo tãofereno,qual
prometiam féis mezes de fecca extraordinária , &; nem
mínima
Profecia, íí
milagre do
pcnda.n.
Li\^Ro V. Cap. th 7 ti^
mínima forpclta apparecia de agoa. Porem defengariaràm-
fe em breue eflcs moradores, porque cm começado a pro-
ci^fam aíahir pellas portas de nofiaIgreja,donde rinha prin^
cipio.de improuilo íecobriodenuuenso Cco, & logoeftas
íe desfizeram cm tam grande cop'a de agoa, que todas as
ruas inundou,&foy forca desfazcrreaprociííamfem ordê ,
nem tornar a noíTa igreja, como eftaua determinado. Aqui
viram entamaquelles moradores , ocortiovinha molhado
o pendam da conrcnda3 &c como eram fcm fallencia as pro-
fecias dei ofcph »& incertos osfinaisdos tempos.
5 Em hum lugar fora da Villa fe achaua huma mO- Profèdá, u
Iher por nomeCamilla Pereira no vitimo da eida , cho- "^''gi^^de
rada )a, & com o aprelto neceílario , pêra ler enterrada .*
Ncfle cftado mandaram chamar alofeph à caza da Villa p«c.r/.4x.
onde eftaua , nam reparou o zelofo proredVor ds enfer- ^''"'''^■?-*®^
mos na diftanciadolugar, partioapé , & com a preíTa que
coílijmaua,aqui mais neceíTaria. Achou a enferma quaíi
priuada de juiío , com a força domai ; confolou em pri-
meiro lugar os circunftantes , cercifícando-os que nam
morreria s em fegundo lugar pozlhe a maõ fobre a cabe-
ça, ôc ficou com jaizo. Ao didfeguinte tornou a vifital-
la , depois de dizer Milía por cila, & lhe difjíe, que o mal
que padecia era terriuel , porém que ficaria liure dclle , de
maneira que nunqua o tornaria a padecer em toda fua vi-
da , & lançandolhe huma bcnçam , ficou de todo fam $
nem maislherepetio o mal , como lofeph profetizara.
6 Semelhantemente fe achaua o Padre Diogo Fer- & ,u ^
Jc • 1*111 •-. ^ ScrHelhánté
nandes buperior da Aldeã de Rerixigba , de quem ja falia- profecia, &
mos, cm camadefconfiado da vida, 5c preparado pêra mor- ""^"S"*
rer : era grande a dor dos Companheiros de hauer de per- vmiLf. i/ô
der hum tam infigne zelador das almas 3 recorreram ao
remédio vlrimo , mandaram chamar a roda àpreíía o Pa-
dre lofeph , que eftaua na caza da Villa diftance quinze
legoas ( que a tanto obrigauâ a magoa ) fabendo que
hauia de hirape', & gemendo com íuas moleftas enfer-
T c mi-
SjO Vi DADO P. losÉPH AncHíETA,
invades) nam reparou Ior<pbêm diftancia ^ nem afpere*
zas do caminho, <juando menos fe efperaua ,oachou con-
íigo ocnfermo, & a primeira palaura foy defcnganalo que
namliauia de morrer. E logo põdolhe a maõo deixou liure
do mal que padecia , com alegria geraldos que chorauaõ,
&preparauam aprcftos funerais j nam admirauam porém
|a aòsnoífoseftes portentos por coílumadcs*
CAPITVLO X.
RemlaçoenSy & Prófeàaspanm/arâs èmfãm
fòs de raí^^^^
Ok eftê tempo anno dt r$94- pouco mais
ou menos ínoueram guerra os moradores
defta Capitania do Eípirito fânto , contra
huma naçam de gentio permcioío , bárba-
ro , Ócterriuei por nome Goaytaca , cujas noticias quero
dar aqui breuemente 3 porque íe veia a importância done^
gocio.
2 Era eíla forte de gente a mais feros , & dcshiima-
na qu€ hauia por toda aquella coíla, em corpos erâiti agi-
gantados, de grandes forças , deílrosem arco , inimigos
de codas as na^^oens , & tragadores fobire maneira da car-:
Defcrippti,^^!^^ ^^^ de cuios oííos faziam grandes montes em
dos tíoeyfaca ' ' _ ^ i r i r r ■ \
feus terreiros, ôc era efte o mor braíam deieus íeuos herói-
cos as muitas ofíadas dos que matauam , & comiam em
guerra , aííombro perpetuo daquella Regiam O diílridto
que habltauam ,era pequeno dentro dos termos dos Rios
Paraiba , ôc Machae, altura de 21, grãos , & meio do
Cabo frio, & Efpirito fant^ ; fuio porém horriud , &
inexpugnaue! 5 porque em vez de montes , comm uns aos
mais Tapuyas , quais crocodillos , v iuiam nas agoas ,dç
ze».
gran-
.il-u:
LlVROV. CapX. 311
grades alagoas , de que abundauamfcus campos , chama-
dos poriílo dos Goaytacazes, em choças de palha funda-
das cada qual fobrc hum cfteio de pao metido na área ,
por mòrfegurança de feus contrários : cercados fobre tu-
do de matas eípcíTas , rios, & charcos inacceíííucis. Dcftc
lugar rahiam,quaisdolagoAuerno,a daraíTaltos nos ca-
minhos , & praias , fazendo pafto def^us ventres tudo o
que encontrauam , ou foííe bruto» ou peííoa; humana 5
& nam podiam ellesfer commetidos , fenam com. grandes
dificuldades , & em talcazoapelidauam as naçoens das
ferras em íeu fauor, todas feras, & barbaras, quefò pc-
ra eíFeitos femelhantes confentiam entrar em feus diílridos,
& vinham ajudalos a bandos, ôc quando a cazofe viam
cm perigo, acolhiamfe a fuás alagoas, & nadando fc me-
tiam nas cazas , donde nem a pé , nem a cauallo podiam
fcr acommetidos.
Ncftc lida , pois , & perturbaram viuiam os Portu-
guezes moradores do Erpiritofanto , quando no anno de^í„ílf ^^i
^y)4- juntaram forças, a prouar ventura contra gente ta5 £í*dehúho-
dcshumana j em cuja expediçam fuccederam cazos dignos ™^*
de jiiílorias , mas nam tam próprios defta ; direi fomente ''''«^- ^-f *9
OS que íazem a noílo intento. Entre os Portuguezes
que foram neftas leuaspartio também hum António lorgc
morador defta Capitania, feguindo bandeira de Miguel
de Azeredo, tinha paífado muito tempo , nam vinhanoua
de eífeito algum , & arreceauaíe mao íucceíTo. Neíles ter-
mos lahio lofcpha vifuar a molher de António lorge,
achoua laftimada ,& affligida do fucceíTo de feu marido
que em tanta tardança fe entendia nam íer bom , como
nem o dos mais. Porém lofeph animou feu cuidado , di-
zendo , que cedo teria nouasdo fuccedido & que Antó-
nio íorge feu marido ,fappofto que ferido de huma frecha
no ladoefquerdo , nam morreria , ôc queaíTi fe tinha re-
tirado das eftanciasa curarfc, & dahi a ouro dias o teria
cm Villa Velba.Coufas que fcm reuelaçam nam podiam
Tc ij fa-
.«".■r^v
35A Vida DO- P.' Ioséph AÍ^ch íeta.
fabêrfe/FoyanTolhcr efptrarfeuínâFido lio lugar dito ,
j& pôtltuaíinenteoaclioil allinodía deftlnado,
vidad.^òutto 4* ' ^^'s apeffaáo foy a cazo fegiiinte. Outr aMa-
pormoito trona Tefinhaa noíís^tz , cftaua tm planto pôr ftu ma-
, , í id o íoam Sx)ares j que tinha ido à mcfíria cmprefa , & còr-
riam nèu^s coirJot?crlas»depois de lâfgorcpo,que tora mor-
to em hum dós €onfli€i:os§ denoíTacaza feoiítiiamas Vo-
ze^ da mòlhcr aííligida,a portas ja. ôc janellasfcxhádas 5 de-
pois deto coftiimadá oVáçam íahio lofepli a confolalla »
ÓcdiíTé; filha dam chorais dt balde , abri as jantllas»
ceííaV do planto , que vúííò marido tiam he morto j antes
vira viíStoriofo com preíâde muitos ca ti uos pcra voíFá ca-
2a , & derítro, em três dias tereis recado certo do que vos
digo. Abriò janellas > ccííou o planto j & teue recado
datertezá ,t!o diâaííinalâdo. ^'^^^^-
5 Duraua a mefma guerra com pertinácia , Ôc pre-
Tireueitçsta tj-^^^ íofenh nà Matrisdá Villa humdiá fanr3dcnoíra Sc-
ensp patpUo, o, X , .
«edenanci» o fíhôrã. Eís quc dé repéntc , nomeio do iermàm , depoiS
ToYo^noEi dthátser tòmadô â graça , ficou fuípcnro, amododediuer-
tidacòííi alguma vizam, & depois de breue efpaço leuã-
PvhMf.^^, tou â voz , & dilTe \ réèem todos hum Padre noíío , Sc
huma Aú^ Mana , por noílos Irmãos > que andam na guer-
ff^\^^ que íiefta hòrà eílam cercados com grailde aperto
dos inimigos . notouíe o tempo , & paíTados dous me-
^es vieram relaçoens , & confiou que fora o cerco , St
aperto nâquelk mefmo dia, & hora , & com as meímas
cifcunftSnciasque o plntouno pulpito-
PCA.
L I V R o V. C A li. X í.
m
E<SK t*S- m 8<i4S(íAí«>í«^*-^*WC«5««ME*4t«««íW^
CAPITVLOXI
'^'' Milaqresquevbrouporefle mefmo tempo ^
*ID
OvsA rrtuy ordinária he ém lofeph , obc*
decercmlhe osanimaisjparece tinha Deos nd-
letrerpaííadoodominio qucderaa noííoPáy ''■'
Adam , & Iam alguns de parecei", que aíiilô
dcue pintar , imperando elle, & obedecendolhe os ani-
mais. Tocarei agora os cazos qile pertencem acílc íugar ;
porque todos os liuros , & lugares tenham neíla mataria
que admirar ncfteferuo deDeòS.
si. 1 Achauarenodiftridto do Èfpirito Santo , & en- ,
genho de Miguel de Azeredo,a tempo que no teóto delle foj ^jl^iíon» *
vifto huma mona extraordinária (dêuia vir dos matos ve-
fmhos ) correram logo os de caza,cercaranina por humã'^'''*'^-^/^^^*
& outra parte , porém de balde, que hc efte animal fa-
gaz , & ligeiro. Acudio loíeph > Ôc diífe a todos , eíperãy ,
cfperay * nam vos canceis que ella vira: Chamou o animal,
( por quelingoâ falou, rtarriíediz ^ diz-fe que elíe obc-
deceo , & veio logoamaõde lofeph, o qual o afagou, &
deixou omanfo, que andou por tempos no engenho, feíií
fogif deninguem,&: ficoii íerUindo de mcrnoria do mi-
Iagre,ôc poder de lofeph E nam falta quem diga que efteue
àjuizocfte animal, ouuio fentença, ôc foy deíl errado afuâs
brenhas.
2 Notaueis foram por eíle tempo às hiftorias , que
corriam por fama nefla Capitania , dedouspaííaros cha-ási,,eV'^
mados Canmdcs, fermozosem pennas, maiores que Araras
de hum Tuim , & humas Andorinhas Dos Canindésreaf-'^'''"''^/^^?*
firma, que andau.uii tam promptosà (ua obediência como
fe foram douskruos feus-.Quando hauia de hir pregar Jofc-
Tt ii) ph
PV
Tuim
S;54. VlDAJ> o P.Io^E PH ANCHIETA,
ph a outras Igrejas da Vilia , acompanhauamno , como
fc tiucram rczam.a pé,ôc voando,ôc fobindo elle ao púlpito,
fôbiamellcs ao campanário, Ôcperreuerauamefperádo em
quanto o Padre ptegaua,ôc o qdc mais admira hc, que quan-
doeralongo na pregaram, gaínauam alto pcraqucosouuir-
fem , Sr, acabaíTe ; £ craçu ram entendidos do Pregador,
que por vezes foy ouuido refponderlhe do púlpito , di-
zcíído , logo acabaremos , logo acabaremos, ôc o«|ra
vez difl^ ao auditório , lie bem que acabemos que tem re-
zam > alludindo as vozes de feuspaífaros , qut clle ente-
dia , & Iheferuiamde admonitores da parte de Dé0s^Do
Tuim , temos aquelle leílemiinho celebre do Padre Gaf-'
par de Sampares Varam Religioío, que ja tocamos noutro
lugar , que affirmauâ , que neiia Vilia vira muitas vezes :
quando loíeph fobia ao púlpito, hum paíTarinho verde
fermo-Zo a modo de Tuim, andar voando, pondofclhc de
bumhombro em outro , como fazendo fefta , fendo que ^
naquelle lugar hc extraordinário cal paííaro. Quem pode
ignorar , queheeíle paíTaro mcniageiro do Ceo,que faz
applauzoa feu pregador, òc dà ceftcmunho de fua doutri-
na. Da Andorinha he depoimento folcmne de António
Borges , que fendo mo^o feruindo de porteiro na caza
do Efpirito Santo, por falta de Irmãos Religiofos , indo
leuar recadosao Padre lofcph , Superior da caza , o achou
na varanda que cae pêra o quintal, recreandoíc com híí paíTa-
rinho que parecia Andorinha a qual em vcndo-o,lançoudo
hombro onde a tinha , a voar com as outras O mefmo af-
fírma o Padre Manoel do Qf-iintal que foy de noííâ Com-
panhia , vira com feus olhos muitas vezes. Eram tam vá-
rios , ôc frequentes os aélos femelhantes que ja por vfo
nam admirauam.
Mouehfiapc 3 Fov cclcbrc , 6c nototio O milagre da Dcdra do coge-
cõairrãJs ' nho de Miguel de Azeredo alima retendo. Tempo nauia
?rctf.«./Ho^yç dezejaua eHe homem aquella lageapera mcza de fua
ofíícina , mas era de i mmoderada grandeza , Sc coda a gê-
te
Andormbâ.
I
LiVRoV- CaP XÍ. 33t
trqílcf^pòíTuhiâ í nam podia moucrla 5 lofeph , que
tiniu animo de fazer bem a todos , achandofe prefence
foy com elle ao lugar delia , & diíTe mande vofsa mercê
vir a gente, que eua)udarei,& erpcroem Dcos, que lhe ha
de cumprir (eu dczejo. Veio agente , & pondoo fcruo
òo Senhor huma íb mao na pedra , comeíjOU ella a mouer-
íc com íjcilidade , 6c mandou que a fofsemleuando pêra
o engenho j fizeramno alli , enuergonhados das difficui-
dadcs primeiras , ôceípantados da grande virtude de lofe-
ph i mas porque íofse mais claro o milagre,- ao entrar da
caz<3 . tornou a lagea a parar, pediram fegunda ajuda, tor-
nou a por a mao , & aíscntaram-na com a facilidade pri-
meira no lugar dezejado , onde íeruio , & ficou por co^
lumna da maraudha até o dia ds hoje ,chaniandolhe a pe-
dra de lofeph.
4 Porem nam faiamos defteofficina de Azeredo sê ab&a H^*«^*f<^ .
. . o em p orundft
mirauhha Chegoufe o tempo de jantar quis o fenhor da cmeiapi»
cnza conuidar pêra elle a lofeph , buícoufe por todo o en- '^ "*'
genho , ôcnam apparccia , mandou criados por huma, j[»„,.R./.,og
òí outra parte , & foy elle também cm peííoa , & viram to-
dos que eftaua enkuado em publico fora dos fentidos , em
profunda contemplaçam, fem que dcíle fé de alguém , 138
alguém delle : Tiueram o cazo por milagrofo , porque no
mefmo lugar fora buícado fem que alguém o viííe.
5 Nam foy efta vez fingular , outra foy vifto nefta ^^ v ftoeip»
Capitania em extafis foberanos. Ha huma Ermida famo- "í*^-
za , fuftentada no cumedehum caluo penedo , que qua- „
u compete com as nuuens , na melma Capitania , como
meia legoa da Villa : He romaria continua de deuotos ,
que vam alli ter fuás noucnasà Viracm S Noííacuja inuo-
caçam tem : Aqui com efpanto grande foy viílo lofeph
em preíença de muitos , que alli fe achauam , & foram
teílcmunhasdo cazo , enleuado em extafi admirauel ,
& tora de feniidos , no meio da Milía, depois de aleuã-
tara Hoília , <k Cahx. Ac(^am ordinária em lofeph , que
m\
Milagte celt
qu; falle M
mudo.
154 Vida'ó:oP.I O SE PH Anchieta,
jâcançamosdeercreuer , ôcíporiíTo deixamos cazos feme-
melhantesdefta, & doutras partes, por ferem osmcfmôs,
& querermos euirar o faílio aos que lêem.
rjí - ■ 6 Ponhamos fim a cíle Capitulo com outro mila-
gre celeberri mo , publico , ôc notório em toda a mefma
Capitania. Faz iamícfeflas em huma Aldeã de S. loam ;^
no orago della,& entre applauíbs.feftiuaiscorriam os ca ual-
^.o.. R. /.44 ieiros hum pato, redundo coílume, â competência de qué
Tatcrnp iii mais dcftro O Icuáua. Leuamoulequeltam poríiada entre
ItLje^Por oscâDalleiros,aoqual com maisrezam^ pertencia o pato, &
tHgaLf.^oí.co^ jjaj^ âcabauaõ de refolueríe: Achauafe â fefta lofeph , v ieram
todos que foííe elle o luis da contenda , aceitou a judicatura
comfua boa graça , & porque pareceííe derintereílado,
chamou junto a íi hum menino de fmco annos de idadc^
mudo de feu nacimento , ôc pôr tal conhecido de todos,
ôc poz em íeualuedrio âíentença diííiniEiua docazo > fica-
ram furpenfos os caualkiros > vieram todos na eieiçam,f
& quando admirados notauam o fucceíTo , ouuiram
• . a voz do menino , que clara , ôc intelligtuelmente
pronunciou as palaurasfcguintes. O pato he meu , a mim
k. me ha de dar pêra qiic o leue a minha may. Nam ouue.
cm todas aquellas feflas efpeâraculo mais feíliual, riue-
ram os pretendentes a refoluçampordcDeos , acclan^a-
rama virtude de Teu feruo lofeph, & foifc o menino com
,^.,, pato , &: falia pêra caza. D ar falia a mudos, bem fabemos
que hefo do mero império de Deos,& a raros amigos feus
concedido 5 hum deíles vemos que he lofeph.
íi
CAP.
I
Livro V. Cap. XI Í.
Hf
CAPITVLO XIL
Dâ^m lofephafeu Superlorado ^ torna pêra à
Aldeã de Reritigba ,& os fucccejjòs queneUa
teue.
I ( ij è. I
I ll^i^M^^ Ntrava o anno do Senhor de 1595. ( fè-
%FÍ H^Si^ gundoconjeauró ) & hiá fentindo lofcph
abaladas, &proxiinàs àruinadc feú fraco
corpo 3 namfò com a força do tempo, que Depõem à
tudo acaba , mai muito mais por combati- «"g* ^«^"cià
Bãsdecófitinuos achaques, & etifermidadts , a cujo rigor ''^''"'°
\6 pòdera'ieíiftir Èfpirito talB forte. Depozá carga immo-
dcrada do tropel de ntgocios defcu officio , ôc retiroufe á
fua air.aJa Aldeã Rerifjgba , como a jazigo , que hauiadc
fer de Tua morte , Ôc como officina m ais própria da cOnuér-
fam dos índios , por cujo refpeltodera vale ao mundo i
pátria , parentes , & Colícgiòs de Europa.
2 Partio dacázadò Eípirito Sanro leuadoâhom^ododcfca
bros de quatro Indio^, (coílume do ferâfil)aíri por corri- '^'"''^^-
?razef ajs Padres , quefc eondoiam de fuas poilcâs for-
cas , corno lembrado dos concertos que aflima diíTcmos j
jiitrc feu corpo, & efpirito tinha afferitado. Porem con-
fidcrandofe naquclla rede amortalhado , como leuadò á
enterrar em vida, arrependido pouco depois de fáido da
\i illa , cobroj nouo cípirito, áíiuioU os que cârrcgauàtri
kpando'eapéregundofeu coílumc, carninhoii de riia-
icira , que deixou atrasos mores ân dadores , rezam pòr-«
^ue os Índios lhe tinham pofto nome homem deazas,fof
mgoa Caraibcbé.
i Ch:gou à fuababiraçam amaJa , foy recebido ^«^^ '««^»-
!os Religioròs, ôc índios como pay , commum á quem """""^
Vr vene-
ro esto.
j
.;iu ^ !!!;
SeiíSfõmús
fentiroétos
da morsc.
Suasoecu
paçoés, -
53è ViDADÓiP;. la^i-pH DE Anchieta,
véncrauam, qual fe entrara por fuás portas hum Anjo. A?
qui he certo , que ^epois de entrado lojeph neíla Aldca
foy notado "âos.cqn)pahl^eiirô3 íobir ina^s de ponto cm fen-
íimentos defai^vltimd traiifiío\ ò cubículo tinha por Çq-
pult\íiif^,ÇLji^^do]^vmom\h^ , ôc os exercícios da vi-
da, lte^j)areciamj a fan^^^ cohiò pôr figura 5 da
tóòrèèHie^a^adaUàtiluitoa pratica , ôcíè íahe que tinha
reuelaçam de feu vitimo dia > ôc como tal o trazia
fempre prefentcnocoraçani.
,i 4 JNJaijijdeixatóa dom tudo deoccUparfe coiti fuáco-
muâeífiçia^rj^ quanto permitiam astregoasde feus acha-
ques , a que chamáua menfageiros da morJDè O tempd
que4eftçsihe,vagauà » metido eiii leu cub^o gaílaua
- ' : em eícreuer vidas deiLeligiofos mortos , que acabaram na
Taur^pm CQi^panhia , & ellefoppunha na do Ce© 5 era çftâfua cbi
foíaçam, 6c defta Aldeã eícreueo áfeuâmigoo Padre Ma- '
noel Viegas A poílolo dos Maramomis, hum anno antes
de morrer, que tinha jacompoíla huma boa parte i que
determinaua mandar a Roma 3 & foy aííi que ficou eftâ
depois de fua morte , de íua letra própria , que tenhôcni:
meu poder , Ôc do que rtluico me ajudei no primeiro tomot
■ daChronica,queercreuideílaProuincia, como de Autor
de tam grande fé, & certeza. Ouxala acharemos femelhã-
tes noticias dos que depois acabaram a vidanameímaem-^
$ : Neíias,ôcfemelhantesoccupâçoensandàua lole-
ph entretido, quando o curfo de feus achaques , que pa-*
rècia, tinha concedido algumas tregoas , começou a fa-
zerlhe guerra tam apertada , que julgauam todos fe que-
braua entam o fio débil de fua vida. Cahio em cama , cor»,
reramos remédios poífiueis em parte tam dcsfauorecida
Troc.yfs, de médicos, ôc boticas, nada era baftante, entendiafe fcr
frccs.f. 1. Q vitimo prazo de feus fentimentos tam efficaZcs : Mas ne-
íleeftado entrararam logo em efperanças como fucccíTd
que referirei. Tinha cuidado de fua doença em particular of
Temhda
graue enfer ■
profetiza que
raó hs de
morte
1
Livro V. Cap XII. ^}
Padre Hieronimo Rodrigues intimo feu afFciçoado 5 en-
trou humahora cm feu cubiculo , & vio a lofcph , coni
hum pedaço de efpelho na maõ , que o mefmo Padre Ro-
drigues junto a elle tinha deixado perà reparo de huma
imagem , ôc em chegando a elle diííeaífi , Padre Hierò-
nimoj
V/me agora nefle efpelho
E comecei de dt\er
Corços tomji bôm confeiho
Efajj bom apure lho i
'porque cedo has de morrer.
Mas com juntamente ver
O beiço hum pouco "vermelhai
^Dtfe fraco eflàs , ^ velho ,
Mas pode fer que Deos quer
Qj^evmoí para confeiho,
6 Daqui tiueram efperancaso^ P^Ar^ o* • ^
mo Rodrigues /díooo Fernande S.a ! ^^f"'" f ? 'T "°"^
i. M rr ^ '"'*"^^-' ^f3s Lourenço, & ou- ^''^^'''*?
& que alguma couza de ma,s a nu>s lhe fora reuelado
a cerca de confeiho ; porque fabia que fua. pafauras nan^
redunHaL-im.nelM eram a cazo. Efoyaífi norn,,..
paliado mu,totcrt,po quando chegaram cSdr" '"
?oue,n.a:> a. parteí do fui , pêra Isup^río Ja ViL*^"""
ofleIofephad.o„icor.&„Lfi.ej;arrS Ô„T
lho ficaram certificados os Padres do juifo que deram á
uas vitimas palauras. que viuáperaconriího.
7 Hia com tudo o furor da doença pordiantc te'
pe por efta cauza . & por rezam da cLa . oúTàffe c ■
nos efcreueo o Padre Superior da caza a lofeph aue""-^'*
^.fta fua enfermidade. & odezejo grande, que cíe 'tX'"""- '
le oterconfigo, pêra valerfe de feu" confeiho , lhe S.a--/*•
=lmzert•e irfe pêra a Villa . aonde teria .«ais remeLÍ
Vv i; &
•1
I' 1
fu3. aiiú.
VlDÀDÒ P. loSlPH Aí^CHIETÃ,
técâmâírâ de fuás pròtáidencias , ôc fueceííòs futuros , Sc o
aponte com o dedo , antes queíua omnipotência bs pónh
^em execuçám/ fazendo pafmar ao mundo. Viram os de Re
ífrigba câe portento , èc ficaram certos daquellas duas pro
fccias*
i Sitico, ou féis mezes tardou o ruccefTor Pcdrit
rSpares , ôc outros tantos gouernou IorephaCaza,& fub
ditos i com fua fabida , 6c coílumada ferenidade ; ma
Curi Kum en ncílc tcmpo , òc no mâis que ahi efteue atê voltar á Re-
fermosò eô fiji^ba , porouc nam ceíícm íuas continuas marauilhas
o toque de ^ .* ^ . , ~ r q
apontarei as mais celebradas , que neíte tempo faz , &
fam as íeguintes. Nefta Villado Efpirito Santo achauafí
às portas da morte loam Soares , aquelle de quem fize-
mos no liuro terceiro muitas vezes mençam, grande ami-
go delôfeph , criado com os Padres , muito da Compa-
nhia. Era a doença , diíTenteria de Tangue , que o confii
feia com febre , 6c faftio. Foy vifitallo o feruo do Se-
nhor , ôc queixândoíe o enfermo, que morria de poro de-
faíTocego, ôc fraqueza , porque sò aquella noite , & dia
fora forçado leuantarfe da cama , neceífariamente , mais
de duzentas Vezes 5 foy a mefinhá que lhe applicou , hu
toque fomente defua mão, que lhe toquouo corpo. É fei-
to iíTo, dilTe, ora filho nam vos kuanteis mais, Ôc tende
fé ique haueisdefarar. Couza marauilhoía daquelle ponto
em diante, nem fe leuantoumais, ceifou a diíTenteria, foifc
Òfãílio, comeo , & bebeo .vinho tinto , que lhe mandoii
lòfeph, & fícoufam. Achoufe nefta Villa prefenteo Padre
Adminiítrador Bertholameu Simóés Pereira, o qual certi-
ficado das circunftancias , julgou por milagre o cazo.
' ^ PáíTaua certo dia por caza dehuma Matrona md-
ra3óra da Villa , conhecida , ôc deuota , que tinha pof
coft ume mandar aos Religiofos alguma couza todos os
froc. F.f. jy ^^^^ Queixoufelhe efta da tardança de feu marido que
hauia outoannos andauaauzente comgraucpenafua. Arc^
pofta foy profecia dobrada. Olhai, lhe diíle , aquillo que
man:
:za A
Profet!
vinda de hu
abíente.
tiVRoV. CapX.' iV
'iÁ-l
mandais aos Padres todos os dias ,juntaio, ôcgiíardaiopc-
ra tal dia , notandolho ao certo , porque «eíle tócis! em
caza- YoíTo marido , &; vem neceffitado , que «am trás
de fcu mais que o veílido fobre ú ; notou o dia , cíperòu
o marido , & recebco-o tam pobre, Ôc neceffitado, conio
loíeph lhe tinha dito. . .!::;.''.,/?; ,?.-\-^,,i
.4 A eíla caza de lofephfoy remetida dePçrtíarri;
buço ( conjedturo que no tempo ern que eftamos) huma Reudaçam
cfmoía eonhderaucl, dcpano, & drogas importantes, por jí.
meio de hum Padre de noíTa Companhia ; que nefta
Capitania tinha eftado , Ô^fabia a pobreza delia , com car- ^J^^/^^^-^^'^^
ta fua quQ dizia aííi. Neíle Villa de Olinda me deu certo ho-
mem eira efmola , perâ que a mandaíTe repartir por po-
bres deíía terra: voíTa Reiíeirencía como amigo delles,
òc que bem os conhece,pòr charidade tome à fua conía eíla
obra de mifericordiá -, èc nam lhe eícreueoo home do ho-
mem , nem elle deuiá de quefer que o nomeàíTènlí Po-
rem lofephaquem nem fe efcondiam couzaâ inais fccre-
tas , depois de repartir a efmola refpondeo ao Padre na
forma fcsuinte. A Chriílouam Paes ( aííi fé chámátíá d.
cfmoler J diga voííaReuerencia , que recebi acrmolã qae
deu pêra os pobres de Deoss que nam deíifta hunquâ de
tam boas obras , porque da parte do mefmo Deos lhe âíTe-
guro^s riquezas do Ceo por meio delles. Nam era houd
a cíle Padre o efpirito de lofeph , foi porém â Chriílouam
Paes , porque moílrandofelhe a carta , & certificado , que
fe nam defcobrira Teu nome i como efpantado fcpôs de
joelhos , & a beijou , §c venerou como de Santo , fazen-
do voto aííi como cílaua , a Deos noíFo Senhor de con-
tinuar por toda fua vida com efmolas dobradas. Foy cou-
za fabida que cumprio Chriftouam Paes feu voto , ôc
que por meio delle foy fauorecido do Ceo 5 nam fô em' ,
fazenda , mas èmbens da alma. Tomou a carta de lofe- ^ ^
ph,& por relíquia a trouxefempre configo , cm,quan-.i
to ayida lhe durou.. . 2»'. [Ç^/y: -»
^ ' Eílauá
U'
34**' Vi d a d g P. I o s e p h A n c h i e t a,
o l<l J v^ftauaa terra notauclmcntc falta devirho,ôc!
farinha detrigo pcraofantofacriíicicda Aíiíía , era quei-
xa commuâ dos moradores , & por . ventura lançauam >
culpaacoríefpondentes de Portugal Ouuio lofeph as quei-
xas , & confolou a todos , dizendo j namvos canfcis fe-
nhores, porque à menham a eftas horas , notando as que
eram i entrará neftc porto hum nauiodo Reino, que tra-
ga viAho , ôc farinha. Ceflou o cuidadado do Pouo , ef-
peratam o dia , ôc hora (inalada , ôc viram entrar o
nauio , com ambas as drogas prometidas.
'^,v' ^ CÁ'PITVL0 XIV. '',""'"
TmmTêftp , poemM àfud
péye^inãçamyà' conta/e o modo de fua dm-
Z^mom.
Êparadas algum taíito as fofças, chega-
do fucceííor pêra áCaza , pouco depois pa» >
recçndolhc eftar com alento , ou leuado
do amor de fcus Brafis, por cujo remédio
cm toda â parte fufpiraua ,. ouuede tornar a feus trabalhos^
& occúpaçoens mais pregadas.
2 Porém antes que parta , fique ja daqui cm me-
moria 3; profecia vh ima deíua morte, depois veremos o
cumprimento delia. loam Soares o amigo que aífima dif-
profícia vitifcmos , (arara , & com quem tinha vfado obras de Pay ,
mlte. " muitos ànnoshauia ,fcntido da auzencia foy a dcfpedirfe
delle , & acompanhallo aié o porto , onde hauia de cm-
PrccXf 71 barcarfc. Aqui lhe diíTc lofeph entam leuado da aíFeicam
JFne.X'/ 17. 11 • 1 n 1 Ml /• •
&pmvif}i. que lhe tinha , citas palauras. Filho meu fícaiuos embora ;
ja mais nos nam communicaremos neíla vida , & ainda
que vos me haueis de tornar a ver nefte ircfmo lugar, íc^
tá
LrvubV- Cap. XIV. 345
i cm tempo em que vos nam poderei fallar. Fique embora
pcrãdo o cumprimentodcfta profecia loam So3rcs,& vcU
► ha banhado cm lagrimas, quando voIte,amortalhado cm
Lima tumba , & nos , que até aqui acompanhamos , com
icilidade , & amor eftecelefte peregrino, rcguindofem-
re os paííos que kuaua, da pátria a Coimbra , deCoim-
ra à Religiam , da Religíamao Brafil ; do Brafila defcr-
>s ^miílocns, caminhos de mar, & terra; Entre traba-
los , perigos, tempeftades variais agoira que vai chega-
o(c ao termo , & porto vitimo da jornada , nam fera bé
lie fiquemos no mais difficultofo 5 auante iremos , nota-
rmos íeus fins , &c Teremos teftemunha cabal da morte,
>moofomos de toda fua vida.
3 Profcgue fcu caminho lo^eph , aonde o leua o s-,
eftiho, chega a Aldeã, & foy o primeiro recebimento dar*'?"/^^^**
, I *-' . . . r ^ r aos índio$ &
negada , o primcro deípertador dá morte, os plantos foi5íi'ici£ça6.
ides, &lagrimas dos Índios , que atroauam os ares /'' '"''°"*°
Tora mais que nunqua. He coftume detoda efta gents
ouamente decida do íertam, receber oshofpedes que mais
naõ comfemelhantes demoftraçoens de plantos triftcs ,
: chorofosqual entre Portuguefesplanccamosaderpedida
:fla vida, do amigo mais intimo, & tanto excedem mais em.
u choro lúgubre, quanto hede maior reípeito ohofpede
cebido ; ôcíendo-o tanto feulofeph , vefebem, o que
:cederiam tantas mil almas jãtas poftas cm planto. Sobre
taacçam ha conjedtu rasque reparou lofephdeíla vez, nam
)r ignaro do coftume que lhe era notorio^mas porque nal-
alhc ditauao planto vitimo dadefpedida défuavida, que
mpre trazia na memoria : cada vez daquellas lhe parecia
timo pregoeiro da morte, ôc extremo vale da vida.
4 Sabia lofepho dia , & hora de íeu vitimo tran- dífu/moTt*;
o, de que nam podeduiiidarfc. Na Bahia diíTe ao Pa- ^p^cpraa»-.
e Gregório Serram , que hum mefmo lugar os hauia de **
intar a ambos , & eíle foy o de fua morte ; No Rio de
ineiro , diíTe , que hauia de morrer no Efpirito Santo. A
icroni mo Rodrigues naquella fua troua que cedo hauia
14^ Vida nò P. Iòseph anchieta ,
d€ morrer. A Joam Soares, que jafenam communicariai]
xieíla vida , & que ellcoveria morto , fem que lhe podeíl
fallar.Que aíritraíiaaírentadoolugar,ôc circúnanciasdefu
morte, como nam traria a do tempo?E ccmo vinha accrd
doCcfeus cuidados eram todos da morte. Que Pay defami
liashauerà,dizo Serhoràquerabêdoahora,cm queoladrá
lhe ha de entrar em caiza , nam eílcjá alerta /'Sabendo po
cfte Payde familias a hora em que o ladram roubadc
das vidas , lhe ha de entrar emca2a , ccmo poderá defcu
darfc? He certo que dtíde a hora que defta vez entro
na Aldeã , até a de fcu tranfito , tudo foram fufpiros , ai,
íaudadesda vidaperduraueL
5 Hiam correndo ja os mezes , fomanas, & dii
doanno vlíimo de Tua peregrinaram 1597. E corriam nai
menos apreíTados os correios , & menfageiros dofim de
radeiro de fua vida , os accidentes , enfermidades i ôc d(
res , tam de veras, que foy forçado lançarfe em cama
Sua ara F*«ê á maior pena pêra Ioreph,que todas, chegar afer feruido c
«» outros. Aqui foy raro exemplo de paciência Religiofa
porque entre tam vários apertos , quanto fe coníidcran:
cm hum corpo jaconfnmido, 6c emhuma tam larga do
ca , nunqua foy ouuida de fua boca huma fombra c
queixa,ou ay de fentimcnto: Aííi fe entregou defapegac
do próprio amor, & juizoà difpoíiçam dos que curauai
delle , que tudo tinha por acertado , todas as mefinh
tomaua.a todos os mádados cbcdecia,com íumíiia proraj
tidam j fendo feu enrendimento tam kuantado , que na
podia ignorar a pouca fuííiciencia de medicamentos , j
Mefíres, que naquelle lugar quafi deferto fe achauamv<
o que mais he a pouca conueniencia que tinhaõ pêra o fii
pretendido pois fabia que era de balde , & nam hauiai
de cuitaramorre.
^**l'*id ^« 6 Correndo aííi a enfermidade . fucccdeo hum c:
m bem digno das vitimas rcfoluçoens de lofeph, & que f
que aos da Companhia imprcífo n alma, Trataua de f
zak cm caza hum enxarope , ou purga , pcra outro et
' ' Livro V. Cap^XIVí a; V 347
fermò , f namfc di^íccrâ índio, ou Rèligiofo.) nam auiá
dcftreza no exercido deíle medicamento, parccco a lofc*
ph , que podia hauer falta; era de noite , leuantoufe da ca-
ma onde cftaua, foifc àcofinha , Ôcdeu ordem do qUé
hauia defazerfe , que pêra tudo tinha preílimo Tua cnge-
nhofa charidade .• Porém veio a cuílarlhe mui caro eftc
exccíTode amor , porque eftandotam debilitado, ôccon-
fumido aquelle corpo , da força de doença , que nam ti;^
nha mais , que osoííbs ,cahio em terra defmaiado , & frio,
qual fefora o accidenrc derradeiro da morte^ foy leuadò
ao leito em braços , ôc começou deíleaccidence a defcair
o alento vital , a paíTos apreííados , tais que nam dauam
lugar a humanas efperanças. Aqui foy entam pêra ver o
grande animo de lofeph , deíafíaua eílc meímoa morte i.Preparife á
feas accidentes , & carrancas medonhas ; chamaua por el- ^aiorparià
la , luípiraua com Paulo Tanto, por verfe apartado do cor-
po pêra eftarcom Chrifto Era tao vehementes as fauda-
dé» do Ceo,& faftio da tcrra,quetudoo delia lhe parecia
cifco, fonhos, ôc enganos, em comparaçam dos de Chri-
ílo j & fua May SanttíTima , com cujas imagens fe abra-^
çaua , a cada paíío , com aíFedos dalma deuotiíTimos.
7 Achauafenefta Refidencia, ôc commummen-
te â fua cabeceira finco Sacerdotes , Religiofos, filhos, Òc
difcipolos , criados em fua doutrina , a quem coníigo
leuaua a alma vendo que perdiam tal Pay ,& iVíeftre, A
eí^esconfolauacom palauras de vida,6c lhe pedia lhe fallaf- PíJcoíSac-á
fem das couzasceleftes , até a vitima boqueada. Tc queem°gonu!2
paliado tempo largo de enfermidade, confumido a força ^*''j**°
de calor , ôc tormentos , o alento , & humidora-
dical , querendo o Ceo premiar os trabalhos de feu
feruo fiel , fenfindofe hir disfalecendo 5 pecíio com preíTa
os Sacramentos vltimos do Viatico, & fanta Vnçam, ôc
recebidos hum , & outro com deuaçam grande de fuaaU
ma , pouco depois começou à entrar em agonia , & \o^ò
CQtre fufpiros , ôc faudades i com o nome de Iefu,ôc Ma-
Xx ij m
m
S4« VfDÂbo P.I o ?E i»H Anchieta,
fia na boca , cm braços de Cneo Sacerdotes, que o a ju*
dauam , hum Domingo noue de Junho do anno do Sc-
nhor de 1597. quarenta Ôc quatro depois qUe entrou no Bra
fil, quarenta , & íetc de Rcljgiam , & fcflènia , & quatro
de idade , foy deíatada aquella alma venturofa das ca-
dcas da carne »& voouafcuCreador. Ficou feu corpo aluo,
bem aíTombrado , nam como aquelle que eftauafem al-
ma , mas como quando iranfporííado em extafis^ , fora
etn vida muitas vezes achado. E temos dado fim à hifto-
rianotaueldavidade lofeph de Anchieta Apoílolo do
Brafil , luftre da Companhia, & exerôplo rarodefeus MiÇt
fionarios* , » ^
g Foy o Padre íofcph de Anchieta de eítatura me-
íííp^&a^i^diocre, deminutoem carnes, em vigor de eípirito robu-
«»*• íto , & aaruofo, em cor trigueiro, os olhos parte âzuladosi
tefta larga, naris comprido i batba rara, mas no Cem-
blante intci-ro , alegre, & amaud. Eram magnânimos
feusefpiritos , & leu coraçam generofo pêra cmprefas
arandes, quais as quê vimos por efta hiíloriâ , & verant
hojeíosbemauenturados premiadas nefte Reino celefte.
CAP„
tivSB y.càp. xví
CAPITVLO XV.
Smnwentos dos índios na morte de íofeph, é* cú?
mofoyporellesleuadoàVillaem pYoci^amde
piamos.
o M p o s T o o corpo , & amortalhado , éH-
tre lagrimas , & faudades de fcus Irínaõs , be»oftraç«j^
vertido em ornamentos facerdotais, ôc fe- fti«or«r
chado em huma caixa de madeira , fizeraô
bs índios a demoftraçam coftumada de fcu ditofò tránfitoj
a cujo Tom foy muito pêra Ver a dos corações de fetis índios» bo
atroaram os montes vefinhos feus la (li mofòsplántos; ho-
mens , molheres.miniríosdefemparararri fuás cazas , ÔC
correram a defpediríe de feu bcmfeitor. Elegeram á íeii
modoTiluertre pregadores , que rodeando as ruas , & ter-
reiros j prcgoauama vozesfeus feitos heróicos ;, íuá man-
íidâtn » íeu amor , & os grandes trabalhos que por elleá
padecera em vida : Queixauamfe aò Ceo triftemênté , ôt
moftrauam querer também morrer com elle.
2 Trarauam os Padres de efcolher de entre clles ^''''^*^' /•* •
íhancebos robuftos , que oiiueíTeni de leuar a feus hombros
o corpo defunto, a enterrar à Villá , dando refócns pèílas
quais namconuinhafazcllo na Aldeã \ mas era tam grarí-
deo pio affedfeodcfta gente , querefolueram acompanhàré
todos , o que a todos tinha obrigado 5 íuíccedera aííi, dei-
xariam a Aldeã defempáradá,& partiriam milhares que crao
de almas , feriam òsempediramrafoèns forçofas.
3 Ouueram em fim de partir , formaram prociííam teuaô «eorpi^
r 1 ^ I I r n. 1 t defunto cm
com pompa r merai, Cruz alçada diante , o t^adre loam píociíTm
iemandes reieílido com aíua , eftola, & grande multi- g^^°**^*'*
dam de Brafii^poftos em ordem, & em canto fúnebre : & FrocBf%9^
A X uj len- Váttm. fft^
3|,95 VlDAj:í<3^rP.Jtó5E^f!3/\NClílETA.
^^oa%^ffl TenJo caminho de quatorze , ou quinze legoas foy comi
osqueoieuâo aucf iguada , quc nenhum dos que carregaram , ícntiope*
zo ^ OU cançaflo algum ^ aptes confokçam , & aliuio. Ni
poíij , ni poíij , diziam aos outros pòrfua língoa , nam pe^
z^^íTifimpezaefte corpo. Defiteâemunha o Padre loarft
Fernandes , que ind© a pé de dia , & de noite tam gran-
de caminho , ja mais fentio fono, ou cançaíTo ^ antes hia
gozando de humcheiro, & confolaçam como do Cco :
O mefmo depoz o Padre Pedro Soares , que tinha vindo
ao caminho acompanhallo. ^^
4. Aqui fe conta agora hum milagre grande ( q'ue
nam he rezamfaltena morte, aaquelleque cantos obrou
^=^ ^o^ven ^^^ ^^^^ ^ ^ foy que íendoforça hauerdepaíTarhumrio.
los pêra po- autes dcchcgar à Villa, entraua ncllc o mar furiofo , âç
odefuato ^^^^ ^^^ capaxacanoa a contraftar as ondas 5 porem vio-
fe aqui naprefença de hum corpo morto , amarauilha da
^roc. F./ 70. barquinha do Euangelho na prefença de Chrifto VÍU03 ertn
trou o cadauer na barca , & parou logo o furor de ventos
& maries , ficando as agoas como leite. Segundo aquillo,
^ma maré , ^ ^ventí ohedmnt et» ■
5 Chegou finalmente ao Porto da Villa toda t^à
pompa funeral 5 fahiram a recebello o Capitam da terr^
Miguel de Azeredo í o Prelado x^dminiílrador Berthola-i
/r>!íím> 381 meu Simões Pereira , acompanhado do Clero , Religio-
fos de S. Francifco , Irmaõs da mifericordia com andasri^;
camente ornadas , Confrarias de todas as Igrejas com to»
chasacezas, ôc todos os vefinhos da Villa , porque to»
çauaatodosa obrigaçam, ôc fentimento. Porém aqui no
mefrno corpo , antes que a prociíTam fe ordene pêra vol-
S^pTír daíe ^^^ ' ^ 1^"^ o corpo , he tempo que chegue loam Soares
loam íotres. a vero cumprimento de fua profecia. Pedio hcença pêra
i^tn-íoòurjfazeílo ao Aminiílrador ,por força do cazoaffima refc*
a.>.oAv> -^j.j^JQ ^ quando dcfpedindofe de lofeph naquelle lugar , lhe
•^ diíTe, que ja mais fenam communicariam neíla vida , ôc.
ainda que ellc o hauia de tornar a v er naquelle mefmo por-
to
Sit toda a
Villaa rece
berocorpo.
I»30
lo, lhe hàm poderia fallar. Oquefupoftopedia Soares in-
ílamcnte , que cm quanto fc ordènaua a prociífam , ôc
antes que pafaííem o corpo às andas da Mifericordia , mã-
daíTe fua fenhoria fe abriííe a caixa , & fe lhe dcíTc vifta del-
le fov concedida fua pstiçam , abriófe o depofito â vifta
de' Soares , o grande numero de Pouo, qUe fe desfaziam ^^V^^^^^^^^
cm lagrimas , ficou Soares fatisfeito , & foram rodos te- dcpoi^s^dc
ílcmurthas doutra marauilha , àffirmando que aquellc^' *"
corpo bendito cílaua incorrupto, fem cheiro mao algum,
haucndo quatro dias , que fora Teparada da alma, dcfde.
D Domingo paíTado , ate dia <le quarta feira , cm queíe
achauam,%am fendo prcferuado com defeníiuds , & ten-
d oândadoafol, & ferenodousdias. Bem diíFcrente do de
Lazaro antigo, de quem deu teílemunho a Irmam í ^tia-
6 Ordenoufe poisa prociiTamco todo ò aparato poíliuel
dadiielles Cidadôes que dezejauão fazello fupremo Leuauiò
ocorpò nas andas fobreditas , os Confrades de^S.Mifericor- ^^ ^^^^^^^^^j
diáatéa «^orta de noíía Igreja.ôc dai o recolherão Sacerdotes losConfradci
da Cópanhia Fizeramlheexequiasdetresnoótúrnos,ôcniu-^J^^l'^^''^^^^^
ficafolcmnc de inftrumétos, o Prelado Adminiftrador, Cie- m^ac^noir*
ro, & Relit^iofos dcS Francifco. O feguinte dia cantaram ^''^**
a Miiía . & pregou nclU õ Prelado louuorès conuenicn-
tes a ram^^rande defunto: Chamoulhebemauenturado, A-
pottob do Brafil , Miífionario fánto, & referio algumas
de fuás maraííilhas , excitando a memoria ddlas aquelk
poúoraoiaífejçoádo.qucfederretiaemlagrimas. ,,
7 Ouueporfim deferefcondidoaosolhos.cm fua fc-^^j^^^J'""^
palrurá ,âquelle que tinha fido aluo da vifta dos coraçoen?
de toda aqueliaVilla. Foyfeu jazigo na Capella de Santiago
íúto à le pukura de feu amigo Gregório ScxxloJtcf4t m vtta
dtkx^r-Utfti fta ih morte non funt fffyraí/.E zqm fô vé agò-
ía cumprida a profecia de feu ajuncamento , quando na Ba-
fcankdiíTeparcindopcrao Rio de laneiro , a^uellas pa-
lautas d€ S. B afilio a SXhrifoftàmo. Vad^fratcr , non lo nga
ènim
$St Vida ncP, IcsÊPH Anchieta
emmdies nos lococon]ungtt. Ide embora , quenam ,^
longo tempo que hum mefmo lugar nos ajunte. As relíquias
dçftc grande Varam foram trcfladadas depois em parte
pcra o Collegio da Bahia,cabeça do Eftado por mandado de
noíío Reuerendo Padre Cláudio Aqúauiua de boa memo-
tia , annodo Senhor deión. & collocadas decentemente
ao lado do altar maior de nõíía Igreja Onde foram vifita-
das , ôc veneradas dos Cidadões daquella nobre Cidade
com deuaçam louuaucl , Ôc cffcitos grandes , té que pro-
mulgado o Brcue de fua Santidade Vrbano VIII. que cha?
mam denGnculíu,{ox2imx\x2,àz% daquelk lugar , & repo-
ftas noutro , efpcrando por dias os Pouos defte Eftado de-
hei «íql° ^^^^^^'^^Ç^"' ^^^^^^ rontifícia. pêra poderem Ter venera-
def.ucofpo das com culto mais fobido.Defías relíquias foyhuma a Ro«
a Roma. niapor ordem de noíToReuereíido Padre, que allifeguar^
fns, c./tf4.^^P^^3oíi^ermoefFeito.Dâsmarauilhas que obrou lofc^
ph depois de morto, iiam pode caberá noticia cm pouco
papel , faremos liuro de per (\ , Ôc relatallas hemos em su^
ma , porque poíTam andar ciíi volume accommodado a
deuaçam de todos.
Eícreueram defte Seruode Dcos em primeiro lugar
òP. PedroRodriguesda Companhia de lefu, Prouinciaí
do Brafil.o P. SebaftiamBeretario, o P. Efteuam Pater-
íiina.os annais , & Chronrcas da Companhia.o P. Bal thczaç
Telles no 1. 1. das Chronicas de Portugal, o P. Eufcbio Niç-
remberg, nasideasde Varoens claros da;;, su. pordiantc^
ondco intitula nouo Taumaturgo, loaõ Burguefio no liuro
de P atroe tnto Vtrgtnis in Sõaetate lefu , I acobo Biderman o
no/i.dereusEpigramas.<?/?/Vr^;».i2o celebra fuagrandc vir-
tude de obrar milagres; lacobo Damiam faz delle hum
«elegante elogio v\oLm. s de fua fynopíi cap, n. & lhe dà
tóulo de Adaminnocente.
xiv:
LIVRO SEXT
DA VIDA D O
P lOSEPH ANCHIET
da Companhia de lefu.
CONTEM OS MILAGRE S,Q^VÈ d B RO Vj
depois de fua morte , por meio de appariçoens, ou dó
cuUo , & veneraçam dos Pouos , ou de fuás relíquias.
r ^fl i*l«*i *H i^ e*6 9*3 í^í- í*S**3-fc#3-£S*e?>3 -KW -feéJíiííá «grc &*5 t*í £#?■ im í*í •í^;65?a€*^
Aduenencia^ aoscaphuíosfeguintek , •
'V M fe acabou com a vida á" |fáíi'de
esfera da charidade de loíeph j làj^a6 hi c«pi
da outra bemauemurâdá qoè go-ta^JanoBra-
za , põem os olhos nas neceílida-obrafle miia-
dcs dos homens , pefa àiudallos.8'"'*^?''***^^
^amíem numero as maraúilhas ,
que aeftcfím tem obrado , ham fo
nefta Pfouincianíiascm todofí^mú-
do. Eu tiácarei das uaprouincia cm queeftamosj porque
das mais , pofto que renho z^ noticias , nam tenho as
prouas neceííarias. porém ncfta aduirto em geral que naS
ha Capitania em todo o Eftado do Br:ifil , em a qual nam
tenha obrado a piedade defte feu Apoftolo fucceábs dig-
nos de hiftoria , que fe ouneramde referirfe por extenfo ;
fariam volume immoclera:do. Nem mudou no Ceo eíliíío
cfte Santo Padrej Alli como neíla vida era de todos , &
■ Yjr ^
•
'i'
5^2 Vida DO P. Ioseph de Anchieta ,
a todos focorria, aíli da outra procura o mermo com maís
veras , ôccoma mefjma facilidade, & como cá nam fazia
fxcciçamde peíToas do rico, pobre, grande ou pequenoj
aííi de lanam faz difFerença entre neccàitados , até o po^
brefmho índio, & Angola mais rude, experimenta fauo-
res feus. De tudo direi quanto baile, pêra excitar as gen-
tes àdeuaçamdeftegrandc obrador de milagres , a hon-
ra , & gloria de Deos , que delia fc confeguc.Tudoo que
differ 5 fera tirado de proceííos autênticos, ou dos que fo-
ram originados por ordem da fanta Sede Apoftolica, em
ordem à fuacanonifaçamsou doutros proceííados nos tri-
bunais dos Bifpos , ôc Ordinários. Em todos os lugares ,
ôc Capitanias defte Eftado , he tam ccmmum recorrer a
deuaçamdos enfermos , ao fauor , & auxilio de lofeph,
como a medecina dos Phyíicos: pêra o que na facriília de
de cada qual dosCollcgios, oucazas, eftà continuamen-
te preparada huma relíquia de oíTo feu ,enpaftadocmpra-
•' ■ " ta , a rim de dar expediçam dihgente aos que vem a pedir
que lhe benzam com ella , vazos de agoa , a qual depois de
bénta^obra as marauilhas, que veremos : fam tantos cm
. ^ , numeroosquc vem abufcalla , que depõem hum dos Sã -
íi criftaês BertholameuGonçalues em feu juramento , que
J, ' cm dez annos que vfou cfte officio , era tanta a frequên-
cia do Pouo 5 que hauia dias , em que vinham a pedir a
dita agoa , dez, doze, & quinze vezes ;& proporcional-
mente o mefmo he nos outros CoUcgios , & cazas , co-
mo affirmam os mais facriftaÕs.
CAP.
Lir»òVl. Cií t
III
i»»tMm«Meffii«m«»}«i>6«4«»t«iiiii««w«»4t»iiíiii«i
GAPITVLO I:
Sara muitos de diuerfas fones de doM, ' '
A M os milagres ofteníaçamque Deos faz ii
cílima,emquetemreus Santos;aosquais, co-
mo cfcolhidos, beneméritos , & grandes ^ítt^lçltá
_ _ _ de feu Reino , conflitue quafi aíTcíIores dos cfti""^*^**
foderes , que Toa elle iam deuidos : que poííam difpen- *'''°**
íar nas leis do Vniucrfo , enfreiar elementos , mandar ná
terra, agoa, fogo , ari & obrar prodígios infolicos , nai
vida , faude , almas , & corpos dos viuentes 3 auínculã-
do pêra eíleseíf eitos fua omnipotência a feus corpos jOÍÍos,'
reliquias, cilícios , cadeas , ôc mais inftromentos das pe-
nitencias , com que fouberam agradar i Ôc feruir ad
Criador. E pcra que vejam os homens , que fe beni
acaba a vida dos Santos, nam acabam fcusmerecimé-
tos. O qucfupoílo começam as obras marauilhofas deílc
que tanto agradou a Deos. E refumida? ellas acharemos
quehe auogado efpccial de dores,de febres, de partos, de a-
poftemas , & geralmente de todas as doenças, & perigos-
De tudo direi por capitulos diftinófeos ^ òc primeiro co-
Inohe aiiogado das dores.
2 O Padre Pedro Leitam ReUgiofo da Compa-
nhia de lefu amigo cípecial de íofeph , de quem fallaStnoP.Peá.
mos muitas vezes, eftaua doenre de dores exccííiuas queí^^r^'^*^^^
Iheaitligiam o interior das entranhassem que remédio dasnJ'"'^»'^^-
medecinas. foíle baílantea mièigallas. RecorrconómaiorpõSs^mortW
rigor delias ao ferdo de Deos cõm cilas palauras amoro-
fas. Santo íofeph , nam me acudis? Onde eftais /* lem-
braiuos de quantas vezes vos ajudei em voíTasneceííidadesv
òc fui enfermeiro fiel em voíías doenças, nam'mederem-
wm
^¥ Vii>-4D0p.lGst PH Anchieta,
pareis agora na que padeço, & dizendo eftas couzas, erl*
trou emfottincÔc entre íonhos lhe pareceo que viá o Sâto
Padre aííi, ôc da mefma maneira , em trajo , & vulto,
como quando viuia, ôc traraua com clle 5 <k lhe dif-
fe , ó fraco 5 ja vos agaílais , & peleijáis commigo ?
Ora aqui me tendes, & pondolhe a mão na parte mais do-
rida , fegundou , ja eftaisfam, fícaiuos em bora. Efpertou
neíle ponto . ôcachòúfer tam de veras a faude, que nam
fentio mais dor alguma , & pode leuantarfe da cama, &
certificar ao Padre Prouincial , & mais Religiofos de co-
mo eftauafam » & prcíles pêra qualquer fcruiçO-Succedeo
ocazo naBahiaannode 16Í6.
3 A fama do cazo íbbredito , que fe diuulgou na Cidade
Sara outro ho por efte mefmo tempo hum morador nobre , chamado
Jjf^^j^*^ *Jj^" Belchior de Sotomaior, achando fe com femelhant es do-
res, nacidas de humores nociuos peftilentes, quefrequentc-
Jíidcm. mente oacommetiam, & affligiam, nam obftantes remé-
dios humanos ; afíe(5buoramenre fez a íeguinte petiçam ,*
Santo Padre lofeph, liuraime defte tormento em que viuo,
aííi como foftes feruido tiralo ao Padre Pedro Leitam. Foi
coufa efpantofa , que em continente ceifou a dor prefence,
Ôcoquemaishe , nam tornou mais em toda fuavida^ fen-
do queo humor radicado, cofíumaua brotar cada paíTo,
em femelhantes dores. Tudoreconhecco , & tudodepoz
com grande milagre cm feu folemne juramento.
4 Na mefma Cidade da Bahia anno de 1619.0 Có-
nego Gonçalo Rodrigues contrahio grauiííimas dores , ef-
pecialmentedaface , & olho efquerdo , nacidas de ar que
Sír. o Cone- lhe deu por aquella parte. Affligido fobrc maneira , & ef-
po Gonçalo aotados OS mcdicamcntos communs , veio a bufcar o re-
dcdotcs.&c médio a noíTa igreja da Companhia , & poílo ahi em
docaçade ar ^j-^^gj^ ^ juuto ao fcpulchro , 6c oíTos do Padre lofeph ;
Pr,c.c.f 40 bebendo huma pepuena deagoa , em que fora tocada fua
^ relíquia, de improuifo ficou iam, &fem fombra de dor,
ôc mal que padecia 5 hindo naquelle mcfmo dia à Sé aju-
dar
a>
Livro VI- Cat. I. 357
dar a MiíTa do dia , & rezar com os mais companhcIróSi
5 O Padre Francifco Carneiro da Companhia de ícfu Fuídfc! tá!
ProuinciaiqucfoydeílaProuincia depõem em fcu folem-n=i'odedordé
ne juramento , nos proceflos tirados em ordem a Cano-
nifaçam defte Seruo de Deos, que padecendo elle dores de?r#f.'c/.4
cabeça grauiflSmas, do mal, que chamam cnxaquequà ,7^.
parecia que lha fendiam de humadas partes 5 eítando huni
dia em cama atribulado delia , no CoUcgio da Bahia , lhe
dera o Padre Toam de Oliua da mermaKeligiam hum co-
po de agoa , em que metera a Relíquia do Padre lofeph »
& bebendo parte delia com fé , tocando juntamente com o
mcfmo oííoa parte leza, de repente céííaraa dor, femqué
tornaíTe mais por toda íua vida , fendo que dantes a pa-
decia cada fomana duas , ôc três vezes.
6 Francifco de Sampaio morador da mefmà Cidade
da Bahia fe achou huma noite fobrefâltado de fortes dores, . 4 ^ a
Ôcchecrou a eítadoquc nam podiá abnr boca, nem prorju-defortejdo
ciar palaurâalgua mandarão chamar huReligiofo da Co-*"**
panhia pêra confeííallo, mas como nam podcíTe tirar delle Tr,c.c.f.^,
materiade abfoluiçam, pelloexceíTo grande das dores , Ôc^A/??-.^»*
aperto de dentes, 6c eftar quafiíemfcncido; Tirou do pef-
cofohuma relíquia do ícruo do Senhor > lofeph de An-
chieta , ôc benzendo huma pouca de agoa , fez que leuaíTê
parte delia fò até a garganta :ôc com ifto fomente adorme-
ceo logo . & efpertando pouco depois, fe achou fam de to- •
do , Ôc deixou a cama, Acoriteceo anno de 1618.
7 Semelhante cazo depõem Marlóelde Carua-Oiátrodaâ
lho, & fua molher Catherina Rodrigues , ambos conte- ^;^^™;/^^°;.^^
ílcs em Teu folemne juramento 5 que eílandoo diro Ma-
noel de Carualho, defconfíado da vida.porrezam dchu-P^ocCf.jL
ma^Jtrraues dores de entranhas , <k vomitosímpetuofosque^*'
o coníumiam: Lembrado de huma carta que tinha do P.
lofeph , mandcu que lha applicaííem fobre o eftama-
eo , a qual applicada , de improuifo aquietou a dor, ador-
nicceo, ôc efpertando fe achou fam de todo , com admi-
Yyiij rajatri
IjjS Vida BoP. losiPH Anchieta.
raçam dos que viram 5 ôc foram fcmpre eíles dous cazados
dcuotiffimòs do feruo do Senhor* Saccedeo na Bahia anno
dei^í^.
Saía hú hoaii ^ Migucl dc Abrcu morador na Bahia de huma que-^
^dedorcsdc da perigofa ficou quebrado de huma coftella do lado direi-
quebrada * ^^ » ^^m dorcs cxccííiÉias 5 lançadoemcama fe lhe applica-
rara por Çurgioens j ôc Médicos, vários remédios jfem ef-*
pm.c/.75. feito 5 até que vendo que continuauam ás dores 5 & oale-
to fe lhe hia debilitando , tomou refoluçam de hir vifitar
o fcpuchro do feruo de Deos lofeph de Anchieta , pelía
fama que corria de feus milagres 3 fez-fe leuar à Igreja da
Companhia , ôc procurou quanto pode vnir a parte leza
ao dito fepulchro, cisque depois de breue efpaço fazenda
o raçam ao Santo Padre ^ com a mor confiança que pode.
fentioem fi , vigor , & alento vital diíFerente 5 pararam a^
dores , que padecera tantos annos « & foy pêra caza perfei-
tamente fam : ficando deuoto do Santo Padre , & perfua^
dindo feus remédios , a todos os que neccífitauam.
Sara híía roo ^ Hauia dozc annos , que padccíâ Izabcl dc Barrou
jherdcdarcsmoradora na Villa deS. lorge, huma doença perigofa,
porque lançaua pella boca quantidade grande de fangue'
& a volta delle padecia dores de peitos , & cofías, que
grauemente a moleftauam , fcm queachaííe melhoria por
meio de mqfinhas humanas 5 mandou pedir aos Padres dà
• Companhia a agoa da relíquia do venerauel Padre , Sc be-
bida ella encontmente fe achou liure das dores de peiíos ,
ôc coftas 5 que actualmente padecia. E fogo dando da mef-^
jma agoa a huma filha fua doente de febres, ôc dores de
m d. febresíí garganta, da mcfma maneira ficou fam, & liure, ôc ambas^
^Tftl^"' deuotas de feu bemfelror. luram o eazo milagrofo qu3^'
tro leílemunhas conteíles.
Sara húamo. jq Margarida Banha moradora da mcfma Villa ,
drjargama eílaudo mal de dores de garganta, hum dia de S. ígnacio
í «. af.i. ^Q Loyola , lembrada de feu filho lofeph de Anchieta , ôc
dos milagres que obraua , mandou pedir aos Padres da Co -
panhia
de peiiOS3&
coftaí-
Troe G ft>
y& 4. 5.
Livro VI. Cap. í. I359
panhia fua àgoa benta. E íoy o mefmo beber delia , qiJc
ficar fam de rodo , & depoz como milagrofoocazo
II Annode 1609. no mez de lulho íendoVifirador ge- pei Dcó$
raldefta Prouincia o Padre Manoel de Lima, ôc Prouincial °?""" "^^ra.
o PadreFernam Cardim , por ordem de noíToReucrendojad4'm de
Padre Geral Cláudio Aquauiua.de noite a portasfechadas por ^^"^-^^J^fH'
temor do Pouo , fe defencerrou do fepulchro em que eftaua rciiquiaf
hauia doze annos^o corpo venerauel do Padre Jofeph de An-
chieta,ôcfctreíladou em parte ao Collegio da Cidade da Ea- í7.^ ' ^"
hia.No tépodeftatrefladaçampormciodealgQs oíTosí que
cntam fe repartiram a peíloasíeculares , & Religiofas que
as pediram , he fama publica , que obrou o Senhor muitos
milagres, efpecialmence em enfermos de dores, O Padre
Fernam Cardim Prouincial, quealli fe achou, efpecialmê-
te depõem cm íeu juramento, que com a agoa benta de hii
oíío que lhe coube, fizera Deos marauilhas , em diuerfoá
receílliados , quecom fé opediam.
Huma molher de Manoel Coelhonamçfma Vil-
Iz.
la doEfpirito fanto , padeciagraues dores, que lhe ficaram ^^g"*^f^/°'^^
de hum parto , bebeohuma pouca de agoa benta com hú^^^íi^f^iquia
dosoííos,&: ficou iam na mefma hora. A vifta dcfla maraui- «Vamrou?*
lha António daPonfequa paydadita molher, applicoucõ fé^'*^»-
a mefma agoa a hum filho feu de idade de féis annos, doen- p
te de afma , toíTe , febre , & dores de cabeça , o qual no
mefmo tempo em que bebeo entrou em fomno , Ôc acorda-
do fe achou fam de todos eftes males , km mais outro
remédio. Francifco Carualho cunhado do mefmo Antó-
nio da Fonfequa, tinha em cazahuma efcraua poíla ja em
graues afíBiçoens, ôc extremo da vida, pedioa agoa, & cõ
milagrofoefíPeitofaroufem outro medicamentoalgum. De-
põem deftes cazos o Padre Gafpar Samparés da Compa-
nhia de leiu , & foy fama notória
13 Hum mez inteiro hauia , que eílauam retidoá
no porto doEfpirito Santo na occafiam do dito defentef-
ro , o Padre Vificador , & mais companheiros ^ por falta
de
36Ó ViDÀ noP. T dsÈPH Anchieta
de vehtò acommodado pêra fazer viagem à Bahia , corri
pena íua t Ôcdcípeza dacazá , que era pobre ; ouuiofe ntí
cabodelleàvòzdehum Religiofo , embarquem no nauio o
corpo venerauel,& logo teram vento 5 fez fe aíri{admi-
íando adeiiâçam de todos o fucceíío J & foy o meímo en-
trar o corpo no nauio $ que o Sul na veilá, vento accommo-
do , o melhor que podiam dezcjar , & logo fegundo ú
vento foy profpeifa também a viagem.
if Partira o Padre Manoel do Couto do mermo
^nhTpizcl' P^^fo ^o Efpirito Santo cm hum nauio pêra Liíboa , òc té-
hiuferatem-do vcòcidoa viagemtânto auanié , como a lihade S. Mi-
^' * ' g"^^ * ^^^ fobreueio huma horrenda tempeftadctam peri-
Príc.c./.óé.gofa , quedcfmaiado o Piloto lhe diííe , Padre , ajudenos
com fuás deuaçoens , que nos come o mar : Tirou do pei-
to huma Reliquiado feruo de Deos , queouuera da traíla*-
"^ daçam aílimadita ^ & lançandoa ao mar por huiiia linha,
em continente abrandou a tormenta ; coufa que todos atíi-
buirsim à inrerceíTam do vcncrau<:l Padre , & aíii o entení-^
deo ,& jurou o meímo Religiofo.
CAPITVLO ÍI
0ue heauoiado daí febres i
'Jl
■'Ji-
Sara huEina
rT>ollicr de
fehac perigo-
la.
Capítulo primeiro moflrou que he o ven©°
rauel Padre lofeph de Anchieta aucgado'
das dores 5 tanto depois da morte , como
em vida : oprefente capirulo moftrara. que
he auogado das febres. Marta da Cofta molhcr de Bernabe
Soares moradores da Cidade da Bahia adoecera de febres
perigofâs, & chegara a ferdefconfiada dos Médicos 5 neíle
cftadofazendoqueixaíeumaridoa hum Religiofo noílo
da Companhia , por nome Fernam Lopes, lhe deu huma
Kebquia
Livro VT Cap. II. 361
relíquia do fcnio de Deos o Padre lofeph de Anchieta, di-
zendo que Ília poztíTc aopeícoço , ôcaencommendaíTc ,
tiuelíc fc } que por ventura lhe alcançaria melhoria jfel-
lo afl] , & experimentou o cíFeito , porque no ponto que
lhe applicou a Relíquia . parou a febre. Ficando molher , &
marido dcuotos do Padre vcneraucl, tendo o por fanto,
ôcapplicando dalli em dianteamefníareliquia aos neceífi-
tados , com eíf eitos marauilhofos > fuccedeo no anno
dei6i5. ' '
2 Francifca Nunes de Fre itas moradora da Bahia . s»" o jtro de
eftauaemcamadoento de febres, & faftio, que a dtbili ftio
tauam, ôcaífligiam; depois de experimentar remédios c 6 ^^^''•^•^•^s.
muns ,rem melhoria, mandou pedir aagoa benta do vene-
raucl Padre , & logo que abebeo comdeuaçam , & con-
fiança ficou de todo fam, íemíefoens ^ nemfaílio,
3 António da Silua Pimentel Cidadam da Bahia , doé-
te de febres malignas , nam melhoraua com mefinhas , Jg7 b^cT^
chegou aferdefconíiado dos Médicos ; fòy vifitállo o Pa- ib'dimp 8u
dre loa m de Mendonça da Companhia de lefu » & appli-
candolhehuma relíquia do venerauel Padre , de improui- . ..
fo ficou iam , fem mal algum» Aconteçeo no anno de
1615. /líiuríjf/jibi^fn ?,ínm :/> , 'í-ii^:^"'''
4 Dona Lourenca áe Mello moradoranamcf-Saraíiíí moço
ma Cidade» anno de 161 5. tinha cm caza hum moço por j/nte «1^».^"
nome Manoel Tauarcs , ao qual adoecendo de bexigas , bituiiho.
& lahindocom menos cautella com élla^ainda verdes ao ar,
fobreuieram huns inchaços coro pintas negras por baixo ^j.
dos braços , & verilhas , que enf aboandofc lhe tornaram a ■
refufcitar a febre, de maneira que dieíconíiarâm os Mc-»*
dícosdefuavida , & julgaram qÚetinha^paíTado o mal das;
bexigas a tabardilho. Nefte perigo acudio a dica Di Lou-
renca de Melloao remédio efpiricdal , & que tantos ti^
nham experimentado , benzeohuma pequena de agoa com
huma Relíquia do Padre lofeph, & dandoa a beberão en-
fermo , vio queenconiinente fc lhe íumirara ,^& defapa^
Zz re-
ÍJ
112 V íDaIiJo P.loSE PH AnC lETA,
Teceram , huns, & outros encha ços , & junto com elícs
as pintas negras de que cftauam rodeados ficando fam de
todo 5 o que tudo depõem em feu folemne juramenro
cila , & fea fobrinho António da Silua Pimentel , que
íe adiou prcfente. . i L .,! :
5 Annodei6i9.:Cin-cazade FrancifcoCoelho Fal-
StTihíí» ef- ^^ morador da Bahia , adoeceo huma eícraua de grandes
««uâdefebresfebrcs , dcpois dc aucrlhe apphcadoícu fenhor asmcíinhas
Tr^ Gf.s convenientes nam melhoraua. Teueconfelho, que xxpe-
iíX&^. ^ fín^enraíícaintcrceíram do venerauel Padre Anchieta,
obrador de milagres ,-fcllo aííi, & dandolhe a beber hum
copo de agoa benta com relíquia do S. Padre encontinenrc
fe achou fam E o que he mais , que foy dobrado o fauor
defta eferauaiporquetornandé a adoecer dahi a tempos tam-
bém de febres,applicandolhe ofenhor fegunda vez a aí?oada
reliquia, çomamefma brcuiidadeo-êcmarauilha fe achou
íâmdof^'
ifínjnúhm 'tvnri'
»> í% (f . 'r^ í !
« Maria dé Faria na;tírâl de Liíboa ,& moradora .
na Bahia eâenetres^diasfemi falia, nem víodos ícntídostj^
Défaadca ^^^}^^^ à<^Mcókos ; Sc com mortalha preparada de hum
«ramoihcr ptiorís forteidc queficara eí&âuffa de fansue com dezoito
de prioris. í^ngrias , & mais medicamentos. Dcfconfiada de remédios
^ ' humanos ítècorreo aos " folbrcnaturais , deram! he a be-
Pr^Bf.rs,\yQY humsí poucz dc âgo^ , tocada nz rehquia do Fadrc
- lofeph , ôcbomeímo tempo , que kuou pêra baixo a ãi-
,i: vv ^^ agoa,. tornou em: fi ,;cobroa falia , óc inuocanáo o
nomede lofeph, pedio de comer vSí^íieou fam, com ef-
panto de todos , & pouco depois fe leuantou,&foY à igreja
doColIegioda Companhia dar as graças a feu bemfcitor. E
jurou o milagre no proceíío dito , cila , & feu marido.
7 O Irmaõ Francifco da Cofta Religiofo do CoIIegía
da Coínpanhiade lefuda Bahia, duas vezes cahío em cama
'.iode febres moleílas , que o afligiam i em ambas eftas doen-
de hú voto cercas dçpoem cm fcu juramcnto, ouc Jnuocando o fauor do
Proc.£>.f. i}, radre loleph , ôc fazendolhe hum voto no mefmo dia fe
'••N achaua-
Liurade fe-
bres por m
outro
mà dòc
a por meio
Lr V HO VI- Ca íp II. 365
achou fam , ôcliure dascefocns, fcm que mais lhe tornaf-
íem ; dcpozmais quefoy por muitos annnosSacriftam de-
ite Collcgio da Bahia, ôcque benfia cada dia vafos de agoa
com a relíquia do fcruo de Deos , a rogo , & deuaçam
do pouo , que concorria a pedilla , com fama pubhca , que
obraua grandes marauilhas nos que a bebiam,
8 O Padre Diogo Caluo da mefma Companhia
teftemunha no próprio proceíTo , que cftando doente de^^'""
de febres rigofas na quinta do Collegio , em tem- nça^^po
po da reílauraçam deita Cidade , anno de I625, foram **' ^'''"^^*"
leuadas alh por alguns Rehgiofos as relíquias do Padre
lofeph, retiradasda Capella morda Igreja, onde tinha5 ^^'^•^^'''
eítado por refpeito da perturbaçam dos Toldados 5 &: que
duuidando alguns dos Religiofos de hum dos oíTos fe era
verdadeiro, ou fora trocado com outro de diíFerente cor-
po /Conuieram entre íi , fe apphcaíTe com fé o oíTo de
que fe duuidaua , a elle enfermo , & que fe ao toque delle
paraííem as ceíoens , feria final íuperior , que era o ver-
dadeiro , quando nam, feria tido por eílranho foy couza
marauilhofa , porque depois delançarlhe adita rehquiaao
pcfcoço , parou a febre , & nunqua mais dahi em diante
teue cefam alguma; tiuéram todos o fucceífopor milagre
grande , por nam poder parar de repente o mal > por via or-
dinária, eítando em vigor tamconftantej qre duraua ca-
da cefam 24. horas ; & dalli tiueram o o íTo da duuidâ
por verdadeiro, Ôc como tal fe guarda. Foy celebre a proua
ôc.femelhante à que antigamente fe fez na verdéira Cruz de
Chrifto.que pcra aueriguar fe o era,ou de alguns dos dous la-
droens tocaram com cila hum enfermo, a quem deu faudej
a cujo final foy tida por verdadeira 5 tal no cazo prefente
foy jurado o milagre, & hepíhblicafama,
9 Gafpar Carualho morador da Bahia depõem ttn
feu juramento folemne , que eítando doente de febres ai- s»rí
gumas vezes , bebendo com fé^dicaagoa bentafem mais*"'"^"'*'''^''^
outro remédio , o deixaram as cc£ii)c;i8i ; & que aplicando p,<,c,d./ i&.
Zzij a
GUCt'0SCO
l^i^v
i'T ir:T<f"
3«4 VíD ADO P.TosEPH Anchieta,
a mefma meíinha a hum fobrinho de Francifco Lopez Gi-
ram, ccbrou logo faude, tudo com marauilhofos effci-
tos^noiorios na Cidade, anno de i6^o.
s»raoP.Fran '° . ^ Padfc Francifco Piresda Companhia de Tcfu do
àlTbxT\i^ Colkgio da Bahia padeciabauia muito tempo buma febre
n\4.í'r'' que alguns julgaram por ethica , ate chegaremos Médi-
cos a largar maò delle , derconíiados das medecinas. Eftan-
p'l?l/^z; ^° "^^^^ termos affligidoem cama , em huma menham vef-
pora de Natal do Senhor, fentio hum impulfo de implo-
rar o auxiho do Padre lofeph, à viíla de tantas maraui-
Ihas , ôc tomando hum pequeno de oíTo íeu , fez com el- ■
le três cruzes em hum púcaro de agoa , inuocando o no-
me de lofeph , ôc logo bebendo parte delia fe achou fem
febre, & feergueoda camafaó , fem que maisatiueíTe até
aquella hora, cm que depoz o cazo por feu folemne jura-
mento , Aííirmando que nam podia obrarfe por forças hu-
manas, fenam fò por virtude diuina 3 & foy celebre o
fucceíío , pubhca a vot :, & fama. Aconteceo na era
de 1614. I obu fÃTj' .
ç'"etbrcs' *í Huma criahça fiíhâ de AfFonço Gonçalues mo-
conuuaas.& rador na Villa de S. iorge dos Ilheos, eftauaem cama de
"^^ hum mal que chamam de baço, & febres continuas; de-
?r.c.G/,.j pois que íe lhe applicarana vários remédios da medecina sé
^u.^crjcf^ efFeito, lhe mandou húma vefínhafua Jzabel de Barros hu-
ma redoma de agoa tocada com ar^Iiquia do venerauelPa-
dreque ouuerado PadrcGabriel de Miranda da Cõpanhia
de lefu 5 6c bebendo delia a dita criança , fe achou bem ,
ôc ceifaram as febres fenr ourra medecina. Foy tido por
milagre ôc o juraram no proeeíTo varias teftcmunhas Suc-^
cedeo noannode iMí. l,.;. . í:.;
s.ra outros r , ^^ ^^"^^ "^ ^^^^ ^'^^^ ^^^ HhcôS Outfo ènf^èrmc) de
de f.bres. f'^bres , em tal aperto que chegara a receber o Sacramento
ir..G.fii. tíaíantaVnçam, fem melhoria das medecinas , que tinha
apphcado , bebeo aagoa dareliquia do venerauèl Padre.
& Jogo fe achou bem, ôc rcconhcceo o milagre. Na mef-^^
,* -^w\
ma
1
LlV ROVI. Cãp II. 365
ma caza huma cunhada dcfte mcimo enfermo , cha-
mada Margarida Banha , cahindo cm cama de lemelhanie
mal de febres, pedio ao cunhado lafam, rogaíle ao Pa-
dre Superior da Companhia Miguel Rodrigues, lhe deííe
huma pequena deagoa bentajcomqueellefararasôc experi-
mentou o meímo efteito porque no ponto em que a bebeo
ceííaramas febres. Succedeo no anno de 1617.
13 António Garcia Pereira Tabaham publico do ju-
dicial, &: notas , na mermaVilla de S. lorge, adocceode5j,,,çut,„H^,
feíoens tam fortes que chegaram a tirarlhe a falia , & víof^c/^^^^^"*
dos fentidos, enfraquecendo-o de maneira , qutí eílaua 2l '
morte , ôc facramentado ja, Òc vngido , fcm que reme*/»^ef. g./. /•
dio algum de medecina approueitaíTe j recorreo aos fo-
brenaiurais , mandou pedir ao Padre Supericr Miguel
Rodrigues a reliquiafantafqueaílí lhe chamauam^Ôc bêbe-
do com fé dtí fuaagoajfentiologonotauel melhoria > por-
que perdeo a febre o rigor, com que o deixaua km falia ,
éc fora dos fentidos , &c a terceira vez que bebeo ceifou de
tudo , íemnunquamais tornar , &fem remédio outro al-
gum , que fe lhe applicaíle ; efiBcito que nam podia fazer a
natureza , fenam fo a graça , fuccedeo anno de 16; 8*
14 No anno de 1622; na Capitania de Sereguipé
del-Rey , andando viíitandoaquellas partes o Doutor Pe-jç'!^^"^^^! "^
dro Cafqueiro da Rocha , com alguns officiais , acharam de 3 anuo
hum homem , quehauia trcs annos padecia febres ^^^^^' ^^^^r, f
tas , confumido , Ôc debihtado, lançado em huni curral de
Gaí^par Maciel j compadecidos do miferanel cftado do en-
fermo, lhe deram a beber huma pouca de agoa dá dita re-
líquia , dizendolhe que tiueífe fé viua , queéra déhum S,
que fazia milagres, bebeo a agoa , Ôc côm ella a faudc
que dezejaua, porque logo fefentio com aliuio ,& o deixa-
ram de todo as maleitas^ comefpanto dos que o viram.
• 1$ Nam he menor a deuaçam de todaaDioceíi do RioSai
iraamuito»
de laneiro , nem menor a fé comqueprocUramíuàs ^^^'i- ^llf'^'^ sv.
quias os moradores delia, Conílantino Rabello morador cr f^^-f./í)*.
Zz iij da-
16^ ViDÁ DO-P. lòSEPH AncH lETA.
daquella Cidadc^dcpoem em féu fokmne juramento, que de
menirio ouuio fempre fama publica na dita Cidade &
terras da Díoc^fi por onde andou -, que obraua o feruo
de Deos loíeph de Anchieta muitos milagres por meio àc
fuás relíquias 5 & que era tam grandea fé, ôc deuaçam ,'
quencllds tinha em efpecial fuacaza, que vfaua ordinária-:
mente em íoas doenças de fua interceííam , cm lugar de
mcfinhas , & medico , & com effeitos milagroíos , como
moftram oscazosfeguintesque experimentou,ôc viocom
fcos olhos ; que tendo ires efcrauos doentes de febres,
por diocrfas vezes, em cada huma delias , mandou pedir
ao Colkgso da Companhia a agoa benta, que coflumam
a tocar com hum oáodo vcnerauel Padre , &:que bebê-^
do os enfermos delia ficaram faõs fem mais medecina al-
guma E adoecendo depois outras duas peíToas de fua caza,
acodio h mefma agoa benta > com o mefmo eífeito . íem
mais medecina. E finalmente que adoecendo elle teílemu-
nha da mefma rtianeira de febres perigofasjpondofe em cu-
ra de Médicos , chegou a termos de morrer , masarrepê-
di do , recorrendo adita agoa benta , com elía ficou fam
de todo , km que mais làe tornaífem j jugando todos
eílescazospormarauilhai^ueffcm milagre nam podiam
acontecer . & na mcfma conformidcjde ouuio dizer a
muitas peíToas ,que applieada a reliquia do feruo de Deos
a diuerfas molhercsperigoíasie parto, por nam poderem
lançar as crianças, parirain logo , com felices íucceífos.
16 AíifoniodeJMorais morador da mefma Cidade
rilha hum filho chamado ioam de outomezes, cm peri-
^^^ ^ ^ g^ ^^ morte , por caufa de febres ícm poder mamar,
prl B.f.llM^'^^ 4^"^ <^^2s, & duas noites 5 lançandolhc a relíquia
do Padre Santo aopefcoço, tomou logp o peito, & ficou
^Zf^T' '^ ^^ ^^^"^^ ^í^^de eílaua à mortehummoço
gof*,. por nome Athanafio,da caza de Maria da Cunha de fe-
bres continuas de grandes accidentes , fem fcntidos ja , &
loa»
LivRC VI. CapII. 3«7
defconfiado ; lançandolhe a dita reliqu.a aopefcoço. tor-
„ou lo"o em fi . pediodc comer , & leuantoufe fam.
.g" O Padre loam Fernandes Gato da Companhia g^^^p ,^,„
de kfu , achoufe molcftadode cefoens, que lhe durauam ,^^^c.^
hauia quatorzeannos, fem remédio algum das medecinas; ^^. ,^^,„ho'
& luntamente de hum lobinho demaf.ado , que cada vez
ae'aamais com impedimento notauel no cotouello do..../ .o.
braço cfquerdo. Lembrado das marauilhas . que o Padre
lofeph obraua em tantos, tomou-o por interceíTor para co
a Vireem Senhora Noffa da Conceiçam , inuocando o
nome de lofeph , & foy couza digna de efpanto . porque
cm continente fentio abaxarfe olobinho. ScceíTar a febre^
O que tudo jura. nam podia nacer de caufa naturaU&
fov publico , & notório à vifta do Padre loam de A l-
méida . cntam feu companheiro . & outras peíToas fide pl-
enas, que como tal o diuulgaram. Aconteccoem fam Vi-
cente no an no de i*,?: ri!<iJí..S'n tf; Jins;"
, ■ ,9 o ■"«fmo Padre loam Fernandes Gato efta- ^^^^
do noutro tempo na AldeadeS.Bernabé doRiodelanei- ,,.,b,^ • _
ro foy fobrefaltado de hum prioris forte . & graues pon- iM/. ro.
tadas /em occafiam que nam tinha, quem lhe acudifle.
ou foubelTe fangrallo ; nemainda quem podefle leuallo a
Cidade diílante fete legoas. Nefta afflicçaro .nuocou o no-
me de lofeph , com fé . & dcuaçani . & bebeo agoa ben-
ta com fua relíquia . & logo ficou aUuiado. Succedeo o an-
node.é.0. . ;flsjErnorumnoD^
íc 20 O Licenciado Lourenço da Cunha deCabedo. Vi- ^,^.^ ^^^^
eaito eeral & Commiflario da Santa Cruzada, em rer-j^fc„s„,u
nambuco . ém feu folemne tettemunhodepoz as couzas.g--';-
cue fe íeguem pella mefma ordem com que as difle. lurou
primeiramente, quehe confiante, publica vox, & f^^^-íí^/f^;
em todoPernambuco, ter oferuo de Deos lofeph; de An- ■" -
chieta obrado depois de fua morte por meio de fuás relí-
quias ' Sc a<^oa benta como toque delias , innume.^ueis
milagres 5 t^ntoaíTiqucconuencidoelle dafamade tahtas
^ ma-
pa;to
U$d.f.iZ
}í8 Vidado P. losÈPH DE Ancheta
marauilhasfôddle trazia huma rdiquia ao pcfcoço ' cm,
grandccftima . & veneraçam. '
WV..^, ,- /' ..^""[^ 'n»'^o<l't'> \^igairogeraIquepormeiode.
he c. de ítafua relíquia jqne fempre trazia aopdcoço vio com 'eus
■'• ;°'hos.& experimcrítoucomíuasmaósoscazosmiljorolos'
fegumtes Que. achandofe quatro mollieres cm ,?mpos
^^.uerfos cm perigo de parto . com g.ande traba-^
lho , &: agonia ,( algumas delias ja defconfiadas da vi-i
da J lançandolbe a dita relíquia ao pefcoço . immcdiata-"
mente Luraram. &efcaparam do pe.ig6.com felm fucccf-
fo, & que correndo a fama dcfta relíquia , cntrcos mora-
dores daquella Diocefi . começaram a concorrer a ell* os,
enfermos . & necefntados-.dcmanciraquedentrodcefpa-
ço de algunsannos . comamcfma reíiquia. Sc a?oa del-
ia , que daua a beber , foram rcft.tuidas à faude , paíTantc;
í.nl^T^fr'^"'""^"'"'' ^^ diiierfas.doençis.ipscwl,
mente defcbrci .cem marauilhofos tfíeitos.rí :, nav : .'
"=" j ^*ii ^^'"P*"*'^*''*"'^'^P<«''quc'ndQconfeírar íiGa'
fa do^Se' * ^"^'^ ^ pcrigodfi. doença de febres . de trcs .
5'; 1 =" «" q"""-» W«« . fcm melhoria dciwmanas medicinas ^
<<c f .b,c.. pedio a enferma inôantèmíme lhe deffe huma pouca de-
agoa, tocadacom a relíquia do; feruo de Deos , porque
eíperau^ alcançar faude .éomo ja outras vezes lhe focce-
dera j benzendo a agoa. &daádÉílbá àbeher .pedio licen-
ça pêra dar parte delíaa outtàs< trcs doenres .que tinha em
caza domefmo mal . aflife fez . 5c no ponto que beberem
ficaram todas faãs de isfhtm ^ & teeí da febre , ou? as
Emsixds
/^í/
'> oí7í: íí.rfiríio:)>D , ]:
r- ^ is cirtú -
âácias.
CvnfumJa.
ti BiiTc Riaià o dito ticeneíáíío > ^mno^níH>àê
1637 tempo em que os Glaiídczesr^mperan^ a ampanha.
em Pernambuco . fora chamado a cohfc<&r,&,ajaaa:rabâ
morrer hum mancebo de>vimei &: deas ániw?, ci^jò non^q
Jgiora, IrmaÕ de Anaílafia Rodrigues , & cunhado de, Pe^
dro /vlueres, o qual mancebo Tclle diroVigaírogeralaGhQu,
çm íucido imeruallo dcgrandcs ferneííns , que padecia cp.
1
Li VRO V I. C APlTVLO II. 369
a força do mal 3 ôc informado da doença, íoubc que era ta-
bardilho mortal , &: fc confirmou mais pella rdoluçam
de hum Medico, que tinham mandado coníultar,&: reípõ-
deo , que a doença era fem remédio, erpecialmentefevif-
íem que lhe fahiam pello corpo pintas negrassôcíe aíTicraj
trataílemfôdos remédios da alma.- O que viflo , & como
cftaua com os ditos finais de pintas negras lhe aconfelhou,
quetratalíe de veras defuaíaluaçam , com breuidade na-
quelle lúcido inceruallo, que Deos lhe daua , pois nam
fabia , fe lhe concederia outro 5 porem depois de coiífef-
fado , Òc apparelhado , lhe diííe que tiueííc fé , que lhe
hauia de dar a beber agoa benta com o oiTo do veneraueí
Padre lofeph, tam afamado em milagres , que podjeria
obrar também com elle marauilha. Bebida a agoa acoti-
teceo hum cazo (obre todos os aííima ditos milagrofo 3 poí-
qucimmediatamente fe vio o mancebo tranfportado eni
hum como fomno fuaue , 5c doce 5 6í logo eíperro , cm
todos feusfentidos, vio diante de fio Padre loíeph de An-
chieta, com barrete , & roupeta da Companhia , & cooi
bordam na maõ , que tocando o com elle tres^vezes ., corri
roílroaIegre,&: riionho , lhe à'i[se 5 nam tens que temct
filho , nam has de morrer deíla qtle De os holfo Senhor te
faz mercê da vida, ôc eftàs perfeitamente iam, Ôc defapafe-
ceo.Leuanrouíe o enfermo da cama, & com moftras de ale-
gria pedio de comer dizendo que eftaua fam 5 pareceo aos
de caza delírio, ôc que tornaua a feus fernefmsi porém el-
le lhes certificou o fucceííocomo paíTarapor /ua alma, 6c
como vira o Padre lofeph , ôc lhe alcançara faude , prouã-
do efta comacçoens ordinárias , que namhe poífiucl fa-
zer fenam homem fam. Succedeo eííà marauilha humá
fexta feirado mezde Janeiro do anno referido de 1637. ôc
logo ao domingo feguinte foy vifitar ao P. fcu confeíTorj
quemoraua no cabo de S. Agoftinho , diftante algumas
legoas ,leuando efmola, ÔC pedindolhe dizeííe miíTa na
Gapella de S. lofeph , efpozo da Virgem Senhora Noííi
A aa qué
■rf»» 'Wl''"/
370 Vidado P. íoseph ancieta,
que ahi eftaua , ofFerteida ao venerauel Padre lofeph de
Anchieta , em acçam dé graças do beneficio tam notauel
como nelleobrara. Namlhe approuou o Padre Vigairo
o exceflbdo caminho tàm longo , em tempo deveram , &
por grandes calmas , quê parecia tentar a Deos , &c arrif-
car outra veÉ a faude que Iht tinha dado ? Refpcndeo qué
quem lhe dera a faude lha confirmara de maneira que nam
temia perdellai por occafioeiis fcmélhaiices i porque nun-
quaem íua vida íe fehtira tam forte , cOmo ao prefcniè. E
perguntando mais fè por ventura fora em fcnhos a vifahi
que tiuera Z' Rcfpondco, que vira o Santo Padre acorda-
dado, & em todos feus fentidos fcm duuida alguma , &
tanto lhe ficara fua imagem imprcíTa nalma , qUefe torna-
ra a ver o feruode Deos entre mil Religiofos do mefmo
habito da Companhia » clle o conheceria mui bem. E
conclue o dito Padre Vigário geral * ôc Commiííario da
Santa Cruzada , que todos eftes cazos , que depõem af-
ííma referidos , examinou mui de vagar , & os tem , Sc
teucfempre por milagres verdadeiros , & mui euidenres^
por refpeito de fuás circunftancias , & que paíTaram ta-'.
dos por feus olhos , òc mãos*
GA?}
Livfco VI. CAí.IIt
irií
CAPITVLO III.
:^e he auogadô departos ^ & àpofiemas.
' Ow'> ■ií/j.! oj:y}..: ] ■■ ..
O lugar chamado de Matuim , tèrhio dá
Bahia teuc Dona Antónia de Menezes humâ ^»'» ^^« «^-f
, r _ ■ > í * • craua de ptrÊ
eícraua por nome Mana , em graue perigo godé parto,,
de morte , pôr rezam de hum parto viokn i^^"^^/- »i-
to cm que cóiltinuouqmnze dias , com dores exccfliuas ;
&c fluxo de fatigue , que á enfraquecia fobremaneirá , fcm
poder lançara criança. Neíle aperto vfou defua coftuma-
da deuaçam a dita Dona Antónia de Menezes, lançou ao
pcfcoço daferuâ afíligidaareliquiá do venerâucl Padre ,
inuocárido o nome de lòfeph , & no mefmo inftante pa-
rio a criatura, 6c com tal impeto i que cahio no cham;
com à cabeça pcra baixo , masfem damno algum , quà
cathbcm fc julgou pdr marauilha j ficando aííi á may , 'Be
D filho liures do perigo, & agradecidos fempre ao Santb
Padre. luram b cazono proceíTo a mefma Dona Ahtoniá '
de Menezes, feu marido Diogo Lopes Franco , & Antó-
niadoValle, que foram prcfentes. Succedeo anno de
j lóam de PadiíhaReligiofo da Companhia de Ié°
ru,en1 juramento folemne depoz.que vira, & experimenta-
rá, que huma molher de parto , pofta em perigo da vida
Sc defconfiada de todos j por felhe ter atraueíTadô a crían- f;'"" *^"» ™©
fá,& nám poder parir. Láçãndolhe a relíquia do Padre Io- fcHgo^df hT
ph ao pefcoço , no mcfffio inftante pario < ficando aliuiada , .Ç"° ^ r
5c fora de perigo.
3 Domingas deOliueira moradora da Cidade do
Rio de laneiro citando de parto mui temeròfa • mandou ne- ^^"°'"« <t
,. |. , - * •' i parto uc nu£
dira relíquia do vcnerauel Padre^í ôclançandofelhaaopef- '««^hcr.
Aaa ]| CO- ^
9«
Faaorece hâi
molher de
parto
Troer.f ij.
372 VlD ADO P. lOSEPH AncHEITA,
COÇO , dentro cm dous credos, pario, & ficou liurê de to*
do o aíTombro. Foy publico , & notório o cazo. Succcdco
anno de 1620. .- i •■ - ^ q > • --^ -
' 4 Na Villadé S. Paulo eítaúaliuma molher emca-
za de bum feu cunhadp , por nome Matheus Luis Grou ,
atribulada de hum parto nioIeílo,& perigofo. Lançoulhc
o cunhado ao pefcoço hum oíTo do Padre lofeph , & pa-
rio logo fçrp ajuda de parteira ^Ôcjcomjmaráuiíhdfá fàci-
■ iídade, :^ - ■■ ■ - ^ ''■ -•'^: :•
,^'„ Sr '! Em Pernambuco quatro molheres de partos pcri-
de parto tiuc gofos , dcfconfiadas algumas da vida , tiueram o eífeito fe-
T^Cncilfr^^^ , que vimos no capitulo fecundo , no teftemunho do Li-
có fua reli cenciado Lourenço da Gunha de Cabedo Vigário geral , &c
^'^*** CommiíTario dafanta Cruzada , por meio de huma relí-
quia defte venerauel Padre. De outras três fazem mençam
muitas teílemunhas do Rio de latieiro í ôc fe ouueramos
derepetir aqui o grande numero de fucceíTos , cm que
fauoreceo aàos femelhantes por toda fu a vida , conuence-
ramos com muito fundamento quefceeíle venerauel Padre,
auogado dos partos perigofos,& que com rezam efpecial
deue íer buícado pêra eíles effeitos. O que fe fará mais pa-
tente aos que lerem fua vida. ' onoiíi.j o iiifiíul .aii;i:'i
6 A hum Religiofo Sacerdote da Companhia , por
nome António Forte, pofto cm perigo femelhanteda vida
LmrthúReiiporcaufade huma apoftema interna , gerada na boca do
ng°ode húz eftamago , que os Surgioens queriam abrir a rigor de fer-
•poftcnna. ro j dcpois dcconfeíTado , Ôc commuugado pêra hauer de
entrar em conflicSto tam perigofo , & dolorido ; a confe.
Ihou-o oirmaõ loam de Padilha Religiofo da mcíma Co.
panhia , leuandolhea reliquiado feruo de Deos , que inuo-
caíTe com fé feu nome, & que efpcraííc em feus fauores,
que podia ter bom fucceíío ; felío aífi o Padre , & fentio
em primeiro lugar animo conftante , com que eílcue ven-
do aquelle 'ado a natureza tam borriuel , quafi de fa-
crificio , fcm arreceio , ou medo algum : em fegundo
lugar
LimoVl- Cap. III. 37J
lugar namíentio dor na lancetada , fendo que era apo-
ftemafunda, ôc foy neceíTario hir rafgando a carne , até
chegara tocar na matéria ;& fobre tudo foy logo julgado
porhure do perigo, cm breues dias conualeceo , farou per-
feitamente, & viuc hoje quando iíloefcreuo , fem fombra
de mal que padecera , & fuccedeo no annode mil, & íeis
centos & quarenta & outo. • :^ :..í\í .. ju f>:.uo
7 Eftaua em perigo da vida hum Gâfpar Carualho mo-
rador da Cidade da Bahia, de huma|apoftema, que tinha na
garganta com grande inchaçam , & dores, que nem agoa
podia Icuar , fem que montaíTe mefinha alguma. Neíla def- ""^f
confiança de remédios , ouuio dizer as marauilhas , quej*"*''*,^'
obraua em tantos a interceflam do feruo do Senhor , man- '"'
dou pedir a agoa benta de fua relíquia , & em metendo ^r... d/ ji.
na boca huma pouca delia , lhe arrebentou a poftema , em
quantidade de maccria , ficou liure da õppreíTam , ôc fav
rouem breue , & foy publicavoz ,.& fama. Succedeo an:
no de 1620. r \->
De outros vários ca/os mdrauilhofo&i^ ^'^Á'-
-. ,,.
R A N c I s c o Coelho Falcam , ja referido
noutro lugar aífima depõem , que eftando
humfobrinhofeu em perigo graue de huma SaràhúrreDi
inchaçam de garganta , tal , que lhe impe- "^ *'%^"*'°-
dia o fôlego, femaliuio de remédios humanos. Dandolhe gZ ^"
a beber a dita agoa benta logo ceifou o mal, & perigo.
Aconteceo annode 1619. ,.; , „.í^ ;gii /''"'' ^'^'^^
2 EmMatuim termo da Cidade da Bahia ahno%~iií44Í
vinte domezdeoutubro , fuccedeoo cazo feguinte , digno 1
de particular memoria. Dona Antónia de Menezes ,mo-
Aaa iij Iheiç
374 Vida BO P.IosiPH AlNCHlITAj
Cazonottueijj^ dc Diogo Loots Efanco , leftauacfe eáma, hauiã teih-
dcoulra iro- .